Organizado pelo Jornal
GGN, evento pretende discutir manipulações e espetacularização midiática.
Arquivo pessoa
O jornalista Luis
Nassif, diretor do Jornal GGN
Nos últimos anos, o
Judiciário brasileiro se viu frente à frente com dois desafios, frutos dos
novos tempos de Internet e redes sociais. O primeiro, o desafio da
transparência, presentes na Lei da Transparência e na disponibilidade de dados
na Internet. O segundo, o da superexposição aos veículos de mídia, como ocorreu
no julgamento da AP 470.
Como deveria se
comportar o sistema judiciário, Supremo, Ministério Público, tribunais? Até que
ponto o excesso de exposição é sinal de transparência ou de subordinação da
Justiça ao clamor das massas?
O jornalista Luís
Nassif, diretor do Jornal GGN, estará conduzindo as discussões sobre esses
temas, sobre as relações delicadas entre mídia e judiciário em dois seminários
que serão realizados esta semana pela GNN em parceria com a Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB), um deles em Brasília, amanhã (27), e o outro em São Paulo, no
dia 29.
Os eventos são
destinados a juízes, promotores, procuradores e demais operadores do direito e
jornalistas e profissionais interessados em entender como as ferramentas da
internet e as redes sociais podem interagir com o judiciário.
Servidores
especializados mostrarão aplicativos de como acessar as principais informações
dos bancos de dados dos tribunais. O evento “Judiciário e Mídia” terá como foco
também o papel da justiça diante de velhos e novos meios de comunicação, que
tanto difundem informações pulverizadas quanto transformam em celebridades
personagens antes restritas ao mundo jurídico.
Haverá uma discussão,
também, sobre o papel dos blogs e redes sociais, como contrapeso a eventuais
excessos da midia tradicional.
O exemplo mais recente
é a ação penal 470, popularmente conhecida com o mensalão, onde – segundo
Nassif – episódio no qual a pressão da mídia e a superxposição dos Ministros
lançou indagações por todo o meio juridico sobre os limites desse modelo de
ministros celebridades.
“O mensalão trouxe
muito desconforto ao Judiciário. O STF (Supremo Tribunal Federal) saiu de um
campo fechado para um campo muito aberto e até hoje não sabe quais são os
limites”, diz Nassif. Para ele, ficou claro que a mídia jogou pesado,
pressionou e influiu num julgamento. “Nos Estados Unidos, por exemplo, a
transparência não resulta em pressão contra juízes”, lembra.
A amplificação do
julgamento, a influência da mídia no voto de ministros mais suscetíveis e a
falta de informações sobre questões técnicas, segundo o jornalista, deixaram um
rastro de confusão na cabeça do brasileiro e riscos de desmoralizar o próprio
judiciário.
“Não houve filtro”,
afirma Nassif. Segundo ele, a falta de noções de direito na cobertura jornalística
permitiu o predomínio de uma certa visão técnica dos julgadores que, no
decorrer das discussões públicas, acabaram alimentando dúvidas sobre a própria
técnica jurídica. Até que ponto o conhecimento do especialista servia de álibi
para decisões políticas?
Nassif lembra o caso da
teoria do domínio do fato, que foi peça central no julgamento, permitindo
condenações sem provas. Inicialmente aceitou-se como verdade jurídica até o
próprio autor vir a público questionar a interpretação dada pelo Supremo.
Os alvos de Nassif são
os exageros que transformaram o julgamento num espetáculo midiático, a falta de
equilíbrio na cobertura, o desconhecimento da população sobre temas complexos
e, especialmente, a manipulação, que prejudica o julgamento e põe em risco as
próprias decisões do judiciário.
“A boa tecnicalidade dá
margem a manipulação. Basta usar o discurso do fim da impunidade”, diz Nassif.
Nesse sentido, afirma, as denúncias de desvio de recursos públicos da Visanet
ficaram sem explicação detalhada.
Ele lembra que, como
pelo senso comum o criminoso deve ser condenado, as penas de alguns réus e
aplicação de alguns tipos de crime foram dosadas de forma desproporcional,
atropelando direitos que só agora, no julgamento dos embargos infringentes, o
STF está corrigindo. Nassif cita como exemplo de contradição dois momentos do
ministro Celso de Mello. No primeiro, ele flexibilizou todas as regras para
condenar e, num segundo, voltou atrás dando o voto de minerva por novos
julgamentos.
O desequilíbrio de
opiniões e de informações sobre o caso, lembra o jornalista, gerou o que ele
chama de “efeito manada”, onda que não só interferiu no julgamento como também
acabou prejudicando a imagem do ministro Ricardo Lewandowski, embora este tenha
amparado seus votos como revisor no que havia de coerente para condenar ou
absolver os réus.
“Quando o Judiciário
usa a opinião pública ou se rende ao clamor incorre na barbárie”, diz Luis
Nassif. Ele enxerga as redes sociais como novas ferramentas de freio ao que
chama de “cartelização” do poder de informação e de opinião. O efeito do
mensalão, diz o jornalista, está obrigando o STF a repensar seu papel para
corrigir abusos e evitar que vícios que geraram “ministros-celebridade” se
propaguem por todo o Judiciário.
Nassif diz que no mensalão
a mídia ultrapassou todos os limites ao influenciar o julgamento, mas acabou
fornecendo os “anticorpos” que protegeram os réus nos debates sobre os
embargos. “O governo também aprendeu e na recomposição do STF colocou nomes de
peso jurídico, que têm respeito e amor ao judiciário e não se rendem aos
holofotes. O juiz é ele e sua consciência. Não pode se dar ao exibicionismo”,
afirma. Segundo Nassif, a pressão indevida da mídia cria um quadro anormal em
que “o juiz suspeito tem medo da denúncia, e o sério, do deboche”.
É nesse sentido em
entram a transparência dos bancos de dados dos tribunais com toda a produção do
Judiciário. Nassif lembra, no entanto, que sem informações e ferramentas
adequadas, que permitam acesso com isonomia e a possibilidade de acompanhar e
cobrar resultados sobre as demandas (denúncias, inquéritos, processos, etc...),
a transparência é parcial. O controle pelas redes sociais será facilitado por
um manual e aplicativos elaborados pela GNN/OAB, que darão os caminhos, passo a
passo, a tudo o que estiver tramitando na máquina do Judiciário.
“Vão se abrir novos
campos para blogs e sites, que poderão se profissionalizar. É uma forma também
de romper a inércia no judiciário e combater os abusos”, afirma Nassif. Segundo
ele, as redes sociais criaram uma nova demanda, que pode ser atendida pelo uso
das novas ferramentas e isonomia no acesso às informações.
Os dois seminários
terão a participação de nomes relevantes do judiciário, como o MInistro Ricardo
Lewandowski, assim como representantes do MInistério Público, do Conselho
Nacional do MInistério Público, do Conselho Nacional de Justiça, de associaçoes
representativas da magistratura.
Do IG
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