domingo, 4 de dezembro de 2016

Em nome do combate a corrupção, acaba-se gerando mais corrupção

Imagem ilustrativa

Pense-se, por exemplo, no paradoxo que seria uma campanha, paga com dinheiro público, com o objetivo de recolher assinaturas para um projeto de lei de iniciativa “popular”, na qual se pede para “quem for contra a corrupção” assinar o documento, isso sem que os signatários sejam informados do conteúdo do projeto, das repercussões constitucionais, sociais ou mesmo econômicas das medidas propostas e, em especial, dos reflexos do projeto no campo das liberdades públicas: sem o necessário debate público, pautado por informações corretas e dados confiáveis, um projeto como esse corrompe-se em instrumento de manipulação da população.

Vive-se um momento delicado que conjuga o empobrecimento tanto da linguagem, típico dos momentos de fascistização (que se caracterizam pela ode à ignorância, o medo da liberdade e a aposta em soluções de força para os mais variados problemas) quanto do imaginário (instaurou-se um modelo de pensamento simplificador, incapaz de compreender a complexidade dos fenômenos, a partir de imagens binárias e bélicas) com um processo de mutação do simbólico, com a perda da importância dos limites ao exercício do poder e dos valores transcendentes (tais como “a dignidade da pessoa humana”, “os direitos fundamentais”, etc.) em proveito do regime valorativo das mercadorias, de modo que nada (nem mesmo a ética ou os valores constitucionais) possa ser tido como mais importante do que a livre circulação das mercadorias, o desenvolvimento do espetáculo de imposição de penas, a implementação da visão de mundo de atores jurídicos ou a satisfação dos desejos/ perversões da parcela da sociedade que detém o poder econômico e/ou político.

Por tudo isso, não causa surpresa o tratamento simplista conferido aos fenômenos da “violência” e da “corrupção”, bem como falhas na percepção da conexão entre esses dois dados da realidade. A violência, por exemplo, só é percebida em seu sentido vulgar, naquilo que Zizek chamou de “violência subjetiva[1], a violência de uma pessoa contra outra, o aspecto visível do fenômeno violência.

Esquece-se que, ao lado da violência vulgar, existe a violência estrutural/sistêmica[2] (aquela que é consequência do funcionamento e das perversões dos sistemas econômico, político e, por evidente, do sistema de justiça) e a violência simbólica (a violência encarnada na linguagem, i.e., na imposição de um universo de sentido, muitas vezes condicionado por preconceitos, por pré-compreensões autoritárias). E o pior: não se enxerga que a violência visível é, em regra, produto de uma outra, oculta.

Por desconhecer a conexão entre as diversas formas de violência, ações que, no plano do discurso oficial, direcionam-se à redução da violência ou da corrupção, no lugar de reduzir esses fenômenos, podem aumentá-los. E fazem isso, por exemplo, ao manter prisões desnecessárias, determinar conduções coercitivas fora das hipóteses legais ou, o que se tornou moda entre atores jurídicos que buscam o reconhecimento de um auditório autoritário, decretar prisões cautelares (sem que exista uma condenação irrecorrível) para obter delações e/ou confissões, em clara instrumentalização da pessoa e consequente violação da dignidade humana.

O mesmo se dá em relação ao fenômeno corrupção. Corrupção, por definição, é a violação dos padrões normativos do sistema. Não raro, com a boa intenção (a mesma que enche o inferno) de “combater a corrupção” do sistema político, acaba-se por corromper o sistema de justiça e mesmo as bases democráticas.

Pense-se, por exemplo, no paradoxo que seria uma campanha, paga com dinheiro público, com o objetivo de recolher assinaturas para um projeto de lei de iniciativa “popular”, na qual se pede para “quem for contra a corrupção” assinar o documento, isso sem que os signatários sejam informados do conteúdo do projeto, das repercussões constitucionais, sociais ou mesmo econômicas das medidas propostas e, em especial, dos reflexos do projeto no campo das liberdades públicas: sem o necessário debate público, pautado por informações corretas e dados confiáveis, um projeto como esse corrompe-se em instrumento de manipulação da população.

Pense-se, também, na violência sistêmica que a ampliação das hipóteses de prisão preventiva para o “combate à corrupção” causaria, levando-se em consideração o quadro de hiperencarceramento já existente e diante da constatação de que “para combater a corrupção seriamente é preciso antes melhorar o sistema institucional de controle porque o Direito Penal sempre chega tarde, quando o dano já está feito. É como dizer que punindo o genocida, evita-se o genocídio. É justo punir o genocida e o corrupto, mas não vai prevenir a corrupção nem evitar o genocídio. É mentira dizer que a corrupção vai ser derrotada com o Direito Penal”.[3]

Nos últimos dias, a população (que continua desinformada sobre o tema e, quando muito, é levada a perceber a questão como uma “luta do bem contra o mal”) tem presenciado o confronto (pontuado por declarações messiânicas e comentários dignos de um jogo de várzea no qual se disputa para saber quem viola mais a legalidade democrática) entre os idealizadores das chamadas “Dez medidas contra a corrupção” (que, vale esclarecer, inclusive para aqueles que assinaram a proposta de projeto sem ler, são bem mais do que dez medidas… e muitas das quais contrárias à Constituição ou aos princípios éticos) e os parlamentares que produziram mudanças no texto original.

Famoso ator jurídico (que, em razão da exploração midiática sobre um caso penal transformado em espetáculo, todos sabemos também fazer palestras em igrejas neopentecostais) chegou a afirmar que o Congresso Brasileiro estava a produzir um Frankenstein (na realidade, a citação era ao “monstro” que Mary Shelley fez nascer das mãos do Dr. Victor Fankenstein). E com certa razão (embora, aparentemente, o autor da comparação desconheça que esse “monstro” da literatura foi pensado como um Prometeu moderno).

O projeto aprovado é péssimo (criou, por exemplo, novas hipóteses de crime de responsabilidade para magistrados e membros do Ministério Público a partir de conceitos jurídicos indeterminados e abertos, o que é um risco não só à independência dos atores jurídicos como também abrirá oportunidade ao arbítrio e aos controles ideológicos no momento da aplicação da lei) e pode, de fato, ser chamado de um Monstro.

Todavia, os defensores das “Dez medidas” patrocinadas pelo MPF (na tentativa de criar, como percebeu o jurista Marcelo Semer, “um código para chamar de seu”) esquecem que o texto inicial, se não era um Frankenstein (na medida em que é integralmente voltado à ampliação do poder penal, mesmo que isso custe o afastamento da legalidade democrática), poderia ser chamado de um zumbi de tendências fascistas, no qual o desejo de “comer cérebros”, imortalizado nos filmes de George A. Romero, foi substituído pelo desejo de relativizar e afastar direitos e garantias fundamentais. Um projeto “zumbi”, vale frisar, porque parcela considerável da população assinou e foi levada a apoiar uma alteração legislativa sem conhecer o conteúdo do projeto ou ter consciência das consequências de sua aplicação.

O que há de comum entre o projeto zumbi originário e o “monstro” criado pela Câmara dos Deputados? A crença, por vezes ingênua, por vezes repetida por má-fé, na lei penal para resolver os mais variados e graves problemas sociais. Se as “dez medidas” originais, em nome da “guerra contra a corrupção”, corrompiam o sistema de direitos e garantias individuais, o texto aprovado na Câmara dos Deputados corrompe o sistema de prerrogativas necessário à atuação dos atores jurídicos. Leis que são apresentadas como soluções mágicas para problemas complexos como a corrupção e a violência, mas que acabam por gerar mais corrupção e violência. Leis que não funcionam e que serão substituídas por novas leis penais que também não vão funcionar.
       
RUBENS CASARA é Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais, Juiz de Direito do TJ/RJ, Coordenador de Processo Penal da EMERJ e escreve a Coluna ContraCorrentes, aos sábados, com Giane Alvares, Marcelo Semer, Marcio Sotelo Felippe e Patrick Mariano.
[1] ŽIŽEK, Slavoj. Violência. Trad. Miguel Serras Pereira. São Paulo: Boitempo, 2014, p. 17.
[2] ŽIŽEK, Slavoj. Violência. Trad. Miguel Serras Pereira. São Paulo: Boitempo, 2014, p. 17.
[3] ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Entrevista ao Conjur. Encontrado em: http://www.conjur.com.br/2015-nov-01/entrevista-raul-zaffaroni-jurista-ministro-aposentado-argentino


Do Justificando

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Há 37 anos Buriti realizava a primeira ligação telefônica por meio de DDD

A esquerda o  posto da TELMA de outrora em Buriti.

No dia 28 de novembro de 1979, há exatos 37 anos, o então prefeito municipal Bernardo Costa de Almeida acompanhado de autoridades municipais, bem como, da representante a época da empresa de Telecomunicações do Maranhão – TELMA, a senhora Maria das Graças Lopes, por volta das 10 horas da manhã, inauguravam o primeiro ponto telefônico interurbano da cidade de Buriti de Inácia Vaz.

Inaugurava-se assim uma nova era nas comunicações da cidade, ação esta que colocou o município de Buriti no mapa mundial das comunicações interativas por voz, a parti daí o buritiense passou a se comunicar por voz com seus entes queridos que se encontrassem distantes em outras plagas.

Esse processo era muito dificultoso, mas para aquele momento significou uma revolução, visto se tratar de um único posto, fisicamente localizado ao lado do Cine Teatro Municipal, em que, via de regra uma atendente ciente do destino da conversa desejada, usando um aparelho telefônico discado de dez números, contando com o zero, punha-se a discar para o número desejado.

Após várias tentativas e insucessos, a ligação se completava, se fosse para alguma residência com aparelho o serviço estava encerrado. Mas quando a ligação se destinava a outro posto em outra cidade, ou ao próprio, daí entrava em ação um outro profissional, o mensageiro, aquele que se dirigia ao endereço do destinatário para transmitir o recado, para que tal pessoa em determinado horário se encontrasse no posto telefônico, pois que alguém desejava lhe falar.

Desse modo, a cidade de Buriti por alguns anos integrou a cobertura do sistema de comunicação popular via telefone, até que veio os fixos residenciais com alcance interurbanos, surgiram os orelhões com fichas e muito recentemente foi interligada a telefonia celular, que por sinal ainda reclama por melhorias na cobertura, assim como, maior oferta de operadoras em face do longo monopólio da Telecom Italia Mobile – TIM, no município, entretanto, agora divide a oferta de telefonia com a Claro Telecom Participações S.A, e internet 2G e 3G, respectivamente.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Luís Roberto Barroso se apequena quando a leitura é a situação do país

Luís Roberto Barroso é menor do que a sombra que projeta (chamada original)
 Ilustração

Em entrevista à Folha (http://migre.me/vuDiG) declarou o Ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal):

“O nosso maior problema é a mediocridade, é a escassez de pessoas pensando o país lá na frente”.

Sua entrevista é um belo exemplo da dificuldade do país em desenvolver um certo pensamento de qualidade. E prova maior de como os lugares-comuns da economia e da política entranham-se de tal maneira no modo de pensar do leitor médio, a ponto de transformar juristas em meros repetidores de slogans disseminados por essa fonte de conhecimento mundano, que são os jornais.

Nem se avalie Barroso por seu pouco conhecimento dos fatores de desenvolvimento, do papel da educação, da inovação, das políticas sociais, das políticas regionais, das políticas de estímulos às empresas, sua incapacidade de se aprofundar sobre os desdobramentos da parceria Judiciário-mídia, o primarismo de não conseguir tratar a corrupção além dos aspectos meramente penais. Mas por sua própria estratégia de driblar as perguntas com amontoados de lugares-comuns.

Barroso se viu frente a entrevistadores fora do padrão atual da mídia – Mônica Bergamo e Reynaldo Turollo Jr. Em vez de cumplicidade, teve que enfrentar perguntas jornalísticas. E o resultado final acaba mostrando que sua estatura é bem menor do que a sombra projetada pelos holofotes da mídia ou por votos bem intencionados sobre costumes.

O pensador econômico
Indagado sobre o maior problema brasileiro, diz que não é a corrupção, mas a educação. Ótimo! E dá como exemplo da perda de prioridade o fato de, com a entrada de Temer, a discussão se restringir ao melhor nome para a área econômica (pelo visto, ele considera Henrique Meirelles o crème de la crème) e não para a educação, apesar de reconhecer a enorme simpatia do atual Ministro da Educação.

No entanto, indagado sobre a PEC 55, e os possíveis cortes que adviriam para a educação – aquele que é o maior problema do país, apud Barroso -, o Ministro apela para a lógica do possível:

- A vida não é feita de tudo que a gente quer. Ela é feita do possível. A responsabilidade fiscal não tem ideologia.

E toca a despejar acriticamente todas as opiniões medíocres (de leitor médio) sobre questão fiscal e juros:

- O Estado não pode gastar mais do que arrecada porque os juros sobem, gera inflação, e isso penaliza os mais pobres.

O Beto, do Bar do Alemão, outro dia recorreu a esse argumento. Nem discuti, porque ele conhece bem a história do samba e não vou exigir do Beto o domínio de conceitos complexos de economia.

Há toda uma discussão sobre o papel dos gastos públicos no estímulo à economia, sobre o fato da maior parte do orçamento ir para pagamento de juros, estudos e mais estudos mostrando a inutilidade da política de metas inflacionárias, uma literatura secular sobre as disputas entre bancos e Estados nacionais em torno dos orçamentos públicos. Mas um Ministro do Supremo, que diz que nosso maior problema é a mediocridade e a escassez de pessoas pensando o futuro, sintetiza toda a discussão em um slogan de boteco!

Todas as discussões sobre limites de políticas industriais, instrumentos de financiamento do longo prazo, são resumidas pelo nosso brilhante jurista a refrãos tipo “é preciso diminuir o Estado. Não há alternativa. Vamos precisar é de menos Estado, menos oficialismo, mais República. E talvez até um pouco de capitalismo, que aqui vive de financiamento público e reserva de mercado”.

Não tem a menor ideia sobre o papel de instituições públicas no desenvolvimento dos países centrais. Fala em cidadania e demonstra não ter lido absolutamente nada sobre a concentração de renda trazida pela falta de regulação econômica.

Sugiro ao Ministro ir à página do Eximbank (Export-Import Bank) dos Estados Unidos (http://migre.me/vuDYf).

Lá verá que o Eximbank funciona como uma agência governamental, com o objetivo de facilitar o financiamento de exportações de produtos e serviços americanos por meio da absorção de riscos de crédito que estão fora do alcance dos bancos privados. Todas as obrigações do Eximbank são garantidas por total confiabilidade e crédito do governo dos Estados Unidos”.

E é protecionista:
“Pelo menos 50% dos produtos a serem exportados devem ser produzidos nos Estados Unidos. Para financiamentos a médio prazo, o Eximbank segurará até 100% dos produtos com conteúdo americano, mas nunca mais de 85% do valor do contrato. O importador deverá efetuar um pagamento inicial, a título de antecipação, correspondente a 15% do total”.

E o que oferece? Taxas de juros normalmente mais favoráveis que aquelas oferecidas pelas instituições financeiras locais; taxas de juros fixa ou variável; financiamento concedido diretamente ao importador sem a necessidade de garantia ou carta de crédito do banco local; prazos de cinco anos ou mais; carência para a instalação de equipamentos.

O que o Ministro taxa de “pouco capitalismo, que aqui vive de financiamento público” nada mais é do que os instrumentos globalmente utilizados pelo capitalismo mais avançado, mas que no Brasil, por conta de um pensamento primário e ideológico, foi transformado pelo senso comum em sub-capitalismo. E, pior, um discurso desse nível acabou assimilado por um Ministro que diz que “nosso maior problema é a mediocridade, e a escassez de pessoas pensando o país lá na frente”.

A Lava Jato e o Estado de Exceção
Barroso reitera sua defesa do Estado de Exceção, ao enfatizar que “não se consegue mudar um paradigma pervertido de absoluta impunidade fazendo mais do mesmo”. Nenhuma palavra sobre a blindagem a políticos do PSDB, à própria Rede Globo – para quem advogou. É um garantista no genérico e um juiz de instrução no particular.

 “Tudo o que envolve persecução penal deve ser olhado com cautela” diz o nosso garantista do genérico.

Então há abusos na Lava Jato? Responde nosso juiz de instrução do particular: “As decisões de Moro têm sido mantidas pelos tribunais superiores. Olhando à distância, eu não acho que haja ‘Cinnas’ em Cutiriba”. Cinna é um poeta que, confundido com um conspirador, é linchado pela multidão, em “Julio Cesar”, de Shakespeare.

Aí, os entrevistadores apertam a enguia.  Como analisar um juiz que divulga conversas privadas, como fez Sérgio Moro com as da família de Lula, quando a lei diz que devem ser destruídas”?

Responde o nosso garantista do genérico: “Falando genericamente, vazamentos de conversas privadas não associadas à investigação são reprováveis”.

E, aí, o xeque mate dos entrevistadores no juiz de instrução do particular: “Um agente público à frente de uma grande operação não tem responsabilidade redobrada? “.

Consumado o curto-circuito, a resposta de Barroso foi o silêncio, devidamente registrado pelos entrevistadores.

Na sequência, perguntas sobre a anistia ao Caixa 2, a maneira encontrada para livrar as principais lideranças do PSDB. E o Ministro cheio de opiniões, não opina: “É uma questão de varejo político sobre a qual eu não gostaria de me manifestar”.

Mas se diz contra uma operação-abafa. Genericamente falando, é claro.

Os entrevistadores, implacáveis: “Mas há uma operação-abafa no ar? “.

E Barroso, depois de um silêncio de sete segundos: “Eu acho que não. (...) É uma possibilidade”.

Falando para a história
À pergunta seguinte, se o país não perdeu a roda da história, cita um fantástico time de iluministas-padrão, todos juristas, diz que o iluminismo chegou ao poder com Fernando Henrique Cardoso e, com Lula, veio o “aprofundamento de coisas boas que já vinham ocorrendo”, mostrando seu notável desconhecimento, nem se diga de história brasileira do século, mas da própria história contemporânea.

Finalmente, indagado se Lula sofre perseguição, o Ministro que aceita dar entrevistas e emitir opinião sobre tudo e todos, pede que os entrevistadores respeitem seu recato.
- Tenho muitas opiniões, mas eu vivo um momento em que não posso compartilhá-las todas. Peço que entendam a minha situação”.

Embora polêmicos, os antecessores “iluministas” mencionados por Barroso – José Bonifácio, Joaquim Nabuco, Ruy Barbosa, San Tiago Dantas – tinham uma visão sistêmica de país, noção clara sobre os rumos a serem seguido e a capacidade de entender os diversos fatores de constituição da Nação.

Mas a história que Barroso ambiciona é a superficialidade da mídia de massa nesses tempos de redes sociais. Como disse, agora há pouco, uma juiza pela Twitter: "As pessoas vão aprendendo qual é o discurso que dá mais popularidade, vão se adaptando e ficando todas iguais".

A diferença entre o pensamento dos clássicos e a superficialidade de Barroso é a prova maior da grande crise nacional: a falta de figuras referenciais em todos os quadrantes institucionais e a escassez de pessoas pensando o país lá na frente.

Do GGN

domingo, 30 de outubro de 2016

Procurador diz que acordo da Odebrecht está ameaçado por governo Temer

Carlos Lima

Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos principais procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, afirmou que o acordo de delação premiada da Odebrecht pode levar ainda, pelo menos, alguns meses ou sequer ser finalizado. Um dos braços de Sérgio Moro nas investigações assumiu que interesses do governo de Michel Temer podem interferir.

Muito estranho que a “brava força tarefa do MPF” por meio de seu prepotente e “valente" procurador Carlos Lima, que sempre negou ter posição partidária, seletiva e lado, após golpearem um governo legítimo, sem desassombro, agora amarela, se acovarda, e em recente reportagem a Reuters alega um rosário de dificuldade para prosseguir com a lava jato, coisa que quando o alvo é Lula e o PT, não existem.

Tudo isso não passa mesmo de um grande engodo, pois quando as investigações começam a fugir de seus interesses se aproximando dos seus protegidos, fazem corpo mole apontando uma série de dificuldades, fazendo crer que o aparato montado pelo MPF, PF e o Judiciário (Moro), usurpando competência constitucional e cometendo gritantes ilegalidades. Imagine-se, agora precisa de apoio político do governo. Durma-se com um embuste desses. Veja abaixo o que disse o Procurador.

"Não tenho confiança absoluta em fechar um acordo, porque estamos num ambiente de instabilidade institucional no Brasil. (...) Não sei se há interesse do governo federal em que essas colaborações se efetivem. Boa parte do que é falado nessas colaborações, e não estou falando só da Odebrecht, se refere a personagens políticos que foram ou são do governo", admitiu o procurador.

 "Não há um acordo firmado com a Odebrecht, não há nenhum acordo. Existem muitos detalhes para resolver", disse o procurador à agência de notícias Reuters. Segundo a reportagem, o aguardado acordo de delação de Marcelo ou outros executivos da empreiteira com os investigadores, a nível da Justiça Federal do Paraná, pode não ser fechado "devido à resistência de políticos".

A negativa ocorre após notícias darem conta de que os depoimentos de executivos, como o de Pedro Novis, ex-presidente da Odebrecht, recaírem sobre o tucano José Serra, ministro de Relações Exteriores, além de outras delações envolvendo o próprio governo de Michel Temer e sua grande base aliada.

"Todas essas negociações são muitos complexas, demoram muito para terminar porque envolvem muitos fatos, muitos pessoas", negou Lima, nesta quinta-feira (27) em entrevista ao jornal em seu escritório em Curitiba, onde a Polícia Federal, procuradores e o juiz federal Sérgio Moro vêm conduzindo a Lava Jato.

 Em mais de uma vez, o procurador da República negou que haja avanços no acordo com a Odebrecht, seja com os funcionários e ex-executivos, seja de leniência a nível do Ministério Público Federal com a empresa. A reportagem consultou os advogados da Odebrecht, que afirmaram que não poderiam falar sobre negociações em andamento com os investigadores.

 Após inicialmente negar colaborar com a Lava Jato, desde a sua prisão em 2015, Marcelo Odebrecht resolveu informar o que sabe, com o intuito de abrandar a sua pena de 19 anos em prisão em Curitiba.
Lima, que vê possibilidades de conseguir boas informações na Lava Jato, admitiu que acordos desse tipo que interferem membros do governo Temer podem representar uma ameaça para o próprio andamento da investigação.

Citou como exemplo o projeto de Lei de Abuso de Autoridade, em tramitação no Congresso e defendida pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). "Estão, na verdade, desincentivando que as pessoas investiguem, é muito simples", disse Lima.

"Não tem realmente proteção em relação a sua investigação e não ser ameaçado pelo poder político, e isso vai impedir que novos casos apareçam. Por que eu vou arriscar e fazer isso se eu ganho o mesmo salário no final do mês se eu não fizer absolutamente nada?", completou.

Com informações do GGN/Reuters

sábado, 22 de outubro de 2016

A seletiva parcialidade despojada do juiz Moro na prisão tardia de Cunha

A quebra de protocolo da prisão de Cunha é gritante e merece explicação. Visto que o tratamento dado aos outros acusados no momento de suas prisões foi de uma humilhação sem tamanho, com cunha parecia coisa de amigos em troca de gentilezas.

Sem show e sem alarde na prisão de um parceiro do GOLPE

Das estranhezas da prisão de Eduardo Cunha, a mais gritante é a quebra de protocolo com relação às anteriores, supondo-se que haja um protocolo.

Primeiro, não há um apelido genial. Operação Malparido, digamos.

Não houve vazamento para a imprensa preparar o show. Não havia equipes de TV com câmeras.

Num despacho, Sérgio Moro determinou que “não deve ser utilizada algema, salvo se, na ocasião, evidenciado risco concreto e imediato à autoridade policial”.

Continua: “Consigne-se que, tanto quanto possível, não se deve permitir a filmagem ou a fotografia do preso durante a efetivação da prisão e deslocamento”.

Cunha não foi eternizado algemado com as mãos para trás, como aconteceu anteriormente. Segundo o criminalista Paulo Sérgio Leite Fernandes, a finalidade dessa prática é impedir o cidadão de cobrir o rosto, o sinal mais instintivo de vergonha.

Cunha estava no apartamento funcional da Câmara, que ainda está desocupando, apesar de ele ter perdido o mandato. Foi em torno das 13h — e não às costumeiras 6h da manhã.

Seu advogado estava com ele no momento. A malinha pronta. Ao chegar a Curitiba, os jornalistas foram autorizados a filmar a passagem do carro da PF e só.

A costumeira coletiva de imprensa em que procuradores brilham diante de perguntas feitas para levantar sua bola não ocorreu.

O Jornal Nacional dedicou em torno de 7 minutos para o caso, espremidos entre uma “reportagem” sobre a triunfal viagem de Michel Temer ao Japão e mais alguma irrelevância.

No dia seguinte, depois de passar pelo IML, Cunha reclamou que “é uma decisão absurda”.

A Lava Jato deve uma explicação para a diferença de tratamento. Que nunca será dada. Mas ficamos combinados que a imparcialidade está acima de qualquer suspeita.

Do Vi o Mundo 

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

A PEC 241 é um grave erro e juros são imorais, diz Flávio Dino em entrevista

 Flávio Dino

"O Brasil não precisa de menos estado, precisa de mais estado, porque as carências são enormes e a desigualdade vergonhosa, mesmo os liberais sabem que as instituições políticas são imprescindíveis para corrigir as assimetrias de mercado, a falsa concorrência", diz o governador do Maranhão, Flávio Dino; "Nós somos o único país do planeta que pratica hoje juros reais crescentes e isso é imoral, objetivamente, é imoral. É isso que ameaça o equilíbrio fiscal"

A Proposta de Emenda à Constituição nº 241, também conhecida como PEC da Maldade, que limita o teto de gastos públicos do governo federal para os próximos 20 anos, aprovada em primeiro turno no Plenário da Câmara dos Deputados, é um retrocesso aos direitos sociais estabelecidos na Constituição, é a avaliação do governador Flávio Dino (PCdoB).

Em entrevista "Na sala de visitas com Luis Nassif", a íntegra da entrevista realizada nesta quarta (12), ao GGN, Dino destaca que a proposta "é um grave erro porque parte de uma perspectiva errada", prosseguindo:
 
  Vídeo: Pedro Garbellini

Um cálculo realizado pelo professor do Instituto de Economia da Unicamp, Pedro Rossi, já comentado aqui no Sala de Visitas, aponta que a proposta federal de fixação do teto de gastos vai levar o Estado brasileiro a reduzir de 18% para 12,5% os investimentos sociais em 20 anos, lembrando que só os gastos com a previdência vão exigir 8% desse montante. Apesar dessa previsão, compartilhada por outros economistas, durante uma coletiva realizada recentemente Michel Temer negou que os gastos com saúde e educação serão reduzidos.

O governador Flávio Dino destaca que não há dúvidas de que é preciso ter responsabilidade fiscal, entretanto o estabelecimento de parâmetros absolutos não significa melhora da eficiência das despesas públicas.

"Eu acho muito interessante quando se fala do endividamento da relação dívida-PIB no Brasil e não se olha a média dos países da OCDE, acima do que nós temos. Não quero dizer com isso que é bom o endividamento crescer. Não, não é bom, mas, por outro lado você tem endividamentos mais altos que [esses países] conseguem [manter. Além disso], numa conjuntura dessas, em que muitos países praticam até juros negativos, juros contracíclicos, como é que nós vamos praticar juros crescentes que é o que nós praticamos hoje? Isso é uma anomalia que tem que ser enfrentada", questiona.

O ex-juiz federal acusa, também, que o discurso de combate à corrupção e da necessidade de um forte ajuste fiscal é montado para justificar a aplicação do aumento da taxas juros, refreando o crescimento do setor produtivo nacional.
Governador do Maranhão, Flávio Dino, critica PEC 241.

"Nós somos o único país do planeta que pratica hoje juros reais crescentes e isso é imoral, objetivamente, é imoral. É isso que ameaça o equilíbrio fiscal". O gasto do Brasil com juros da dívida pública é considerado hoje o 3ª maior do mundo, e quando o governo aumenta a taxa de juros, alegando a necessidade de controlar a inflação, aumenta diretamente os juros pagos da dívida pública que, em 2015, foi calculado em R$ 209 bilhões.

Com informações do  247 e GGN

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

O “rei de Curitiba” critica jornalão por ceder espaço para crítica a seu reinado

Sérgio e Rogério

Moro critica folha por abrir espaço a crítica contra sua conduta. O juiz da lava jato manda carta ao jornal em resposta ao artigo do professor Rogério Cezar de Cerqueira Leite, que em sua coluna, escreveu que "Moro não percebe, em seu esquema fanático, que a sua justiça não é muito mais que intolerância moralista"; para o magistrado, o jornal deveria evitar "a publicação de opiniões panfletárias-partidárias e que veiculam somente preconceito e rancor, sem qualquer base factual".
                                  
O juiz Sérgio Moro, que cuida dos processos em primeira instância da operação lava jato, mandou uma carta à Folha de S. Paulo em resposta ao artigo do professor Rogério Cezar de Cerqueira Leite, que criticou duramente o magistrado em sua coluna nesta terça-feira 11.

Cerqueira Leite, que faz parte do conselho editorial do veículo, diz em seu texto que "Moro não percebe, em seu esquema fanático, que a sua justiça não é muito mais que intolerância moralista" (leia aqui).

O magistrado diz que, "embora críticas a qualquer autoridade pública sejam bem-vindas e ainda que seja importante manter um ambiente pluralista", o jornal deveria evitar "a publicação de opiniões panfletárias-partidárias e que veiculam somente preconceito e rancor, sem qualquer base factual".
Íntegra da carta de Moro, publicada hoje:
”LAVA JATO
Lamentável que um respeitado jornal como a Folha conceda espaço para a publicação de artigo como o "Desvendando Moro", e mais ainda surpreendente que o autor do artigo seja membro do Conselho Editorial da publicação. Sem qualquer base empírica, o autor desfila estereótipos e rancor contra os trabalhos judiciais na assim denominada Operação Lava Jato, realizando equiparações inapropriadas com fanático religioso e chegando a sugerir atos de violência contra o ora magistrado. A essa altura, salvo por cegueira ideológica, parece claro que o objeto dos processos em curso consiste em crimes de corrupção e não de opinião. Embora críticas a qualquer autoridade pública sejam bem-vindas e ainda que seja importante manter um ambiente pluralista, a publicação de opiniões panfletárias-partidárias e que veiculam somente preconceito e rancor, sem qualquer base factual, deveriam ser evitadas, ainda mais por jornais com a tradição e a história da Folha.

SERGIO FERNANDO MORO, juiz federal (Curitiba, PR)
NOTA DA REDAÇÃO - Os artigos publicados na página Tendências/Debates não traduzem a opinião do jornal, que é expressa nos editoriais sem assinatura da pág. A2.”

Com informações do 247

terça-feira, 11 de outubro de 2016

lava jato rejeita delação que não incrimina lula, justiça de desejos!

Alexandrino Alencar
Os investigadores da operação lava jato e a Procuradoria-Geral da República rejeitaram acordo de delação premiada com o ex-diretor da Odebrecht Alexandrino Alencar, um dos executivos da empreiteira mais próximos de Lula; a versão do executivo, que nega que a reforma no sítio de Atibaia (SP) tenha sido uma contrapartida ao ex-presidente por contratos da Odebrecht como o governo federal, não parece ter agradado à cúpula da investigação.
A versão oficial do grupo da lava jato, segundo a Folha de S. Paulo, é de que as informações de Alencar seriam incompletas e de que haveria indícios de que ele protegeria alguns dos personagens de seu depoimento, como o próprio Lula.

"Reservadamente, Alencar tem relatado que um dos fatores que incomodaram os procuradores, por exemplo, foi insistir que Lula, de fato, fez as palestras pagas pela Odebrecht. Para os investigadores, parte delas não foi realizada e há indícios de casos de superfaturamento.
Outro empecilho é que Alencar tem versão contrária à hipótese dos investigadores sobre a empresa Exergia Brasil, do sobrinho da primeira mulher de Lula Taiguara Rodrigues, que foi alvo de denúncia do Ministério Público Federal nesta segunda (10). A Exergia foi subcontratada pela Odebrecht para atuar em obras em Angola. Os empreendimentos contaram com recursos do BNDES."

Do 247

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Na SAÚDE a PEC 241 condena à morte milhares de brasileiros, diz Temporão

José Gomes Temporão

Quem afirma é o ex-ministro da Saúde, José Gomes Temporão; “Estamos falando de fechamento de leitos hospitalares, de encerramento de serviços de saúde, de demissões de profissionais, de redução do acesso, de aumento da demora no atendimento”, afirma; segundo ele, o caminho seria rever a injusta estrutura tributária do País, cobrando mais impostos dos mais ricos.

O ex-ministro da Saúde, José Gomes Temporão, avalia que a aprovação da PEC 241, que congela gastos públicos por 20 anos, condenará à morte milhares de brasileiros.

"Na verdade, não se trata de números. Estamos falando de mortes. Essa decisão do Congresso é uma condenação de morte para milhares de brasileiros que terão a saúde impactada por essa medida irresponsável. Estamos falando de fechamento de leitos hospitalares, de encerramento de serviços de saúde, de demissões de profissionais, de redução do acesso, de aumento da demora no atendimento", disse ele, em entrevista a Rodrigo Martins, na Carta Capital.

“Se existe um problema macroeconômico a ser enfrentado, do ponto de vista dos gastos públicos, há outros caminhos. Mas este governo não parece disposto a enfrentar a questão da reforma tributária”, afirma. “Temos uma estrutura tributária regressiva no Brasil, que penaliza os trabalhadores assalariados e a classe média, enquanto os ricos permanecem com os seus privilégios intocados”.

241/Carta

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

MA PC do B faz 46 prefeitos e SP o DÓRIA o Berlusconi brasileiro, F Dino

Flávio Dino

Para Flávio Dino, vivemos uma “berlusconização” da política: “Agora temos nosso próprio Berlusconi, o Doria”.

O governador do Maranhão fez uma profunda análise do momento político que vivemos a partir dos resultados das eleições de domingo. Falou sobre o sucesso obtido pelo PCdoB em seu estado, onde 46 prefeitos comunistas foram eleitos, e fez projeções para o futuro da esquerda. A partir dos resultados das eleições do último domingo (2), faz uma análise do atual momento político do país.

Para Dino, que em 2014 acabou, de forma histórica, com a era Sarney em seu estado ao vencer as eleições, a forma como a Lava Jato foi instrumentalizada, inspirada na Operação Mãos Limpas, da Itália, somada a outros fatores, provocaram uma “berlusconização” do país com seus primeiros frutos já dando as caras. A vitória do empresário João Doria (PSDB) em São Paulo seria um exemplo dessa situação.
Ìntegra da entrevista.

Como vai, governador?

Tudo bem, Renato. Sobrevivendo…

É exatamente essa a palavra para definir esse momento…

É verdade… É um desafio. Mas já era uma tendência clara. A gente veio em uma viragem à direita muito nítida. O eleitor de 2014 foi o último suspiro de uma etapa da luta da esquerda no Brasil, e agora acho que esse quadro eleitoral força uma revisão.

Qual a sua avaliação desse resultado em nível nacional, não só do ponto de vista do Maranhão, mas de tudo o que aconteceu e o quanto isso tem relação com a eleição de 2014, manifestações de 2013, o próprio impeachment?

Nós tivemos uma trajetória ascendente do campo democrático, progressista e de esquerda de, praticamente, 1982 até 2014, de modo continuado. Se você observar a eleição de 1982, o Brizola ganhou no Rio, por exemplo, como um símbolo. Um mês depois veio a Constituinte, aí depois veio a campanha das Diretas, a derrota do Maluf. Na Constituinte, uma articulação progressista, que conseguiu contribuições importantes. Em 1989, o Lula vai para o segundo turno. Enfim, mesmo com derrotas, era uma trajetória que apontava para as vitórias adiante, porque Lula perdeu em 1989, mas em 1988 o PT havia elegido a Erundina, Olívio Dutra, em Porto Alegre.

O que acontece é que em 2013 houve uma disputa ideológica em torno do sentido daquelas manifestações e houve um movimento extraordinariamente que surgiu com uma agenda de esquerda. Era uma agenda de fortalecimento e ampliação de um serviço público de transporte, de mobilidade, uma agenda classicamente à esquerda, que acabou sendo fantasticamente apropriada ideologicamente em uma outra direção. Há uma mudança da palavra de ordem principal, que era a questão dos 20 centavos, da mobilidade. Virou a questão da corrupção. Acho que o marco zero está ali, nessa mudança do sentido das manifestações de 2013.

Em 2014, vem um ponto que desequilibra esse jogo, que é a estruturação do partido da Lava Jato, desse bloco de poder. Qual a resultante do fortalecimento desse bloco no terreno da política, já que gostam tanto de falar de Operação Mãos Limpas, sem entender direito as consequências? Nós temos uma situação similar, meio italiana nesse sentido também, que é “berlusconização” da política. Agora nós temos o próprio Berlusconi que é o João Doria.

Quais são as características? Um afastamento da população da política, resultados indo na direção da abstenção, voto nulo e branco. Ou seja, uma descrença, uma crise de representação muito aguda, uma fragmentação do sistema partidário, de forma que você consegue identificar derrotados, mas tem dificuldade de identificar vencedores, porque tirando essa vitória notável do Doria, em São Paulo, você vê que o próprio PSDB teve derrotas. O PMDB teve derrotas expressivas. Então, temos uma desestruturação de todo o sistema institucional e, em terceiro lugar, que é o elemento que nos diz respeito diretamente, que é uma profunda crise da esquerda. Como vimos, fomos reduzidos a praticamente 20% da sociedade. Quando você olha para São Paulo, Haddad mais Erundina, dá 20%. No Rio, Freixo mais Jandira, dá 20%. João Paulo em Recife, 20%. Alice, em Salvador, 17%. Saímos de um modelo em que nós representávamos um terço da sociedade e disputávamos o centro para uma perigosa tendência. A esquerda foi pulverizada e reduzida a 20% praticamente da expressão institucional da política. Isso, naturalmente, não pode ser afirmado de forma aritmética. O pensamento de esquerda, a meu ver, é maior que 20% da sociedade. No que se refere ao jogo institucional, nós fomos reduzidos a um quinto. Qual o problema? É que com um quinto você não polariza o centro político, porque não há força suficiente. Isso explica por que nós ficamos fora do segundo turno de Porto Alegre: foram dois candidatos mais à direita. Nós estamos diante desse desafio enorme, de crise de representação política, fragmentação da esquerda, que tem dificuldade de se colocar para a sociedade em outros termos. E aliado a isso você tem uma recessão e um desemprego brutal, que naturalmente leva à ‘direitização’ da política. O nazifascismo surgiu do ventre de uma grande crise econômica. Crises econômicas agudas levam a saídas autoritárias, normalmente. A crise de 1929 foi o combustível do nazifascismo dos anos 1930. Nós vivemos isso em termos internacionais. Não somente na política brasileira. Mas qual é o desafio? Falar de esperança e de propostas que sejam galvanizadoras no sentimento, no quadro objetivo de muitas derrotas, porque há a Lava Jato como território hostil. A sociedade indiferente à política, o desemprego e a recessão dizimando a luta social. Não é uma coisa simples. A vantagem é que a história não acaba, você não pode ser fatalista de achar que tudo acabou.

Isso que eu ia te perguntar, Flávio. Esses processos costumam ser cíclicos e, de alguma forma, a sociedade tem outra velocidade, inclusive por conta das redes digitais e da globalização. Você não acha que esse ciclo pode durar menos do que se anuncia nesse momento?

Eu tenho convicção disso. Porque uma sociedade perversamente desigual e injusta tem impasses muito profundos que você não consegue resolver. A meu ver, com políticas que reforcem exatamente a desigualdade, injustiça e a negação de direitos, isso conduz a uma inviabilização da sociedade, por que significa, por exemplo, aprofundar a violência.

Acho que é um ciclo. Mas também acho que acertando o movimento nós conseguimos sair disso. Agora, o que não pode é acreditar no princípio da inércia. É aquela história do Marx lá no Manifesto: em última análise, “o capitalismo cairá de podre. O proletariado é o coveiro do capitalismo”. Bom, tem que ter o elemento subjetivo. Não adianta uma subjetividade conduzir a uma certa tendência histórica sem você, ativamente, construir os sujeitos para fazer com que essa objetividade se materialize nos fatos. Essa á principal questão, reorganizar nossos sujeitos históricos em um quadro profundamente adverso. Acho que houve uma desestruturação do nosso campo, você não pode acreditar num fatalismo às avessas, de no fim tudo vai dar certo. O que seria uma bobagem, não é o mais do mesmo que vai resolver. Acho que é uma revisão profunda em duas questões: primeiro, reconhecer que não se pode disputar eleição com agenda de denúncia, o que foi tentado em alguns estados. Pela agenda de denúncia do impeachment, do golpe, não é suficiente. É preciso, portanto, agregar um programa que seja prospectivo, porque não existe na sociedade voto de gratidão, por mais que as pessoas reconheçam os feitos do passado. Elas precisam acreditar que o que você apresenta vai ampliar benefícios para o futuro e, no mínimo, preservar conquistas ou ampliar benefícios. Essa é a primeira questão. Uma questão mais programática, eu diria, que demanda mais debate de atualização mesmo. Acho que aí a questão mais aguda é a agenda dos serviços públicos e da igualdade de oportunidades. Como você coloca isso muito claramente, é a questão que nos coloca em contradição, com esse modelo mais privatizado, centralizador. A gente tem que ir por aí, nesse sentido um pouco mais profundo de uma agenda de conciliação. Mas uma agenda de um viés distributivo mais agudo. E em segundo lugar, além dessa questão programática, a estrutura, porque em um quadro de defensiva, não se pode desperdiçar energia, não se pode desperdiçar forças. O povo do nosso campo fez isso intuitivamente. Ao fazer voto útil no Haddad ou fazer voto útil no Freixo, a sabedoria do povo…

Você tem que encontrar um jeito de repactuar as relações com o que se identifica mais claramente com a esquerda, mas também com outros rostos que podem e devem ser repolarizados, como o PDT, o PSD. Você tem que tentar um diálogo, apesar das dificuldades óbvias com cada um desses. Mas você tem personalidades. A própria luta social, movimento social, a mídia progressista. Você tem outros atores que não estão na burocracia partidária que você tem que traduzir em uma organicidade que seja expressão eleitoral desse pensamento, desse ideário. A grande lição é que hoje ninguém está em condição de fazer isso sozinho. Nem o PT, nem o PCdoB, nem o PSOL. Também vi algumas análises malucas dizendo que o PSOL é o novo PT. Isso é um delírio. Cá para nós. E nós do PCdoB não podemos apontar o dedo. Nós também estamos no mesmo barco. As derrotas que o PT colheu, nós também colhemos, com a exceção do Maranhão.

É isso que eu queria te perguntar. Você foi muito bem aí, percebe-se que tem um modelo que deu certo, queria que você falasse dele.

Acho que o nosso principal mérito para colher um resultado tão bom foi ter conseguido paradoxalmente manter vivo o sentimento da mudança. Em pouco tempo, um ano e meio, conseguimos mostrar para a população que é possível, ainda que de modo incipiente, claro, fazer mudanças assertivas na vida das pessoas, no modo de governar. Nisso nós conseguimos manter credibilidade, apesar do governo enfrentar dificuldades econômicas, fiscais, do desemprego na sociedade, a gente manteve um estoque e credibilidade para continuar falando de mudanças e a população acompanhar. O tempero principal foi a capacidade de em pouco tempo, com poucos meios, gerar alguns resultados simbólicos que mantiveram nossa capacidade de aglutinar o campo pela alta aprovação popular.

Quantos prefeitos vocês elegeram no Maranhão?

Somando PCdoB e aliados, são 217. Do PCdoB são 46. O principal partido. Os partidos que mais elegeram foram o PCdoB, em segundo o PDT e em terceiro, o PSDB, que aqui é o PSDB do B, aliado aqui também. Mas são os três principais partidos. Aí depois vem o PSB, que também é nosso aliado, aí vem o PT, que hoje também é nosso aliado. Então, temos um campo ampliado, que apoia o governo e elegeu 217, tendo como vértice esse apoio ao governo, que é liderado por um dirigente, um militante da esquerda. É aquela história: você só consegue um estoque de força capaz de polarizar outros setores e foi isso que a gente perdeu. O Lulismo só foi possível porque teve a força popular capaz de polarizar outros setores políticos. Na hora que a gente perdeu isso deu um conjunto de tragédias, que perdeu força própria e a capacidade de exercer uma força centrípeta, uma força de atração ou gravitacional, sobre outros setores. Aqui a gente manteve. Acho que por isso o resultado foi tão bom.

Parabéns, Flávio. Eu não consigo comemorar direito, porque a porrada no Brasil foi tão dura. Não bastasse a do Brasil tem a da Colômbia.

Pois é. É uma questão que alguns desses aspectos que a gente falou tem uma certa dimensão global, internacional. A crise da democracia é tão profunda que o principal líder político do planeta é um monarca, o Papa Francisco. Porque você tem a política muito deteriorada, isso é próprio das crises econômicas e da recessão. E dá nisso, um cara como o Flávio Bolsonaro, um farsante, faz 15% só no Rio de Janeiro. As pessoas estão comemorando a chegada do Freixo no segundo turno, detonando os paulistas, e eu falei: vamos fazer as contas. A votação da Jandira e do Freixo é exatamente igual a da Erundina e do Haddad. Só que lá para ir para o segundo turno teve um Bolsonaro que é pior que um Russomanno. Não dá para falar que o Rio é uma maravilha.

Russomanno, quando foi deputado comigo, tinha todos os problemas do mundo óbvios, mas pelo menos você consegue estabelecer minimamente um acordo semântico e uma gramática para, pelo menos, falar com ele. [Com Bolsonaro] É outra gramática, outro dicionário, outro mundo. É a barbárie, fora dos marcos da civilização, fora dos marcos da filosofia liberal, da civilização ocidental, como se fosse fora do pensamento grego, é outra coisa. Não dá para você realmente imaginar isso, fez 15% dos votos.

Forum - Renato Rovai