O
que mantém Temer em seu lugar?
Para
parafrasear um assessor do Presidente Americano, Clinton: são as reformas,
idiota!
O
temeroso está fazendo de tudo para aprovar a reforma trabalhista e conseguir
pôr em marcha a da previdência.
Seria,
portanto, interessante examinar os resultados de reformas similares na
Grã-Bretanha, um dos países que primeiro as introduziram a quase 40 anos atrás.
Obviamente
que não é possível transferir experiências diretamente de um país a outro. Mas
o exercício de comparação é válido.
Primeiro
já advirto, aqueles que esperam ver neste artigo os fundamentos de sempre para
qualificar o que é uma ‘economia exitosa’, não os encontrarão aqui.
As
seguintes perguntas norteiam este artigo:
001 - Quais são as reais consequências
para a sociedade da destruição da social democracia e do retorno do Estado
liberal, que não proporciona proteção aos que necessitam?
002 - O
que acontece com as pessoas, quando elas vivem em sociedades individualistas e
não se juntam em coletivos para lutar contra os mais fortes?
003 - E
considerando os anos do Thatcherismo e o surgimento do New Labour ou, se
quisermos, os últimos anos da guerra fria até o tal ‘fim da história’: Mesmo se
aceitarmos a anunciada ‘morte da ideologia’, será que realmente não importa
qual agente (público ou privado) atua em prol do Estado, portanto que atue
eficientemente e sob conceitos científicos (a chamada terceira via)?
004 - E
especificamente em relação ao Brasil: o que 40 anos de experiências britânicas
de privatizações, terceirizações, flexibilização das leis trabalhistas e a
forçada redundância dos sindicatos poderiam nos ensinar para que evitássemos os
mesmos erros?
Recentemente,
uma série de eventos, já bem documentados, tiraram a pacata política britânica
dos eixos.
Relembremos:
–
eleições que desembocaram na falta de maioria (ou maioria pequena) num
parlamento acostumado com maiorias partidárias;
–
o Brexit;
–
maior polarização entre a direita e a esquerda, num sistema acostumado a apelar
para o ‘centro’ e;
–
o crescimento exponencial da popularidade de Jeremy Corbyn, líder dos
Trabalhistas. Primeiro na sua base partidária e de esquerda e depois no país
como um todo.
Isso
tudo nos leva a perguntar:
001 - A
reviravolta da política britânica não estaria relacionada às consequências
acumuladas das políticas liberalizantes aplicadas nos últimos 40 anos?
002 - E,
em relação ao Brasil, se isso for o caso, quais as lições que podemos tirar em
relação às reformas que este Congresso e o Presidente ilegítimo querem forçar
goela a baixo?
Já
debati em outro artigo os ganhos dos Trabalhistas e as razões pela sua
‘inesperada’ popularidade. Sinalizei que um dos motivos seriam as políticas
progressistas do programa de governo proposto.
Para
que fique claro: apesar do que dizem muitos, não estamos falando do
‘ressurgimento do comunismo’. O que Corbyn propõe não é mais que um modesto
retorno à social democracia.
O
fim do consenso social-democrático
Em
1979, Thatcher assume o poder depois de um período de turbulência política e
econômica.
Mais
especificamente, o Partido Trabalhista não conseguia fazer maioria e – reza a
mitologia política – nem manter o controle sobre os sindicatos, para poder
estabilizar a economia.
Thatcher
é eleita na primavera de 1979, depois do chamado winter of discontent (inverno
de descontentamento), frase emprestada de Shakespeare para descrever as grandes
greves dos setores públicos, que atrapalhavam o dia a dia das pessoas,
inclusive com quantias de lixo não recolhido, que se amontoavam pelas ruas.
A
Primeira-ministra britânica estava determinada em quebrar o poder dos
sindicatos, como de fato o fez, e introduzir uma nova ideologia, o
neoliberalismo, acabando com o consenso socialdemocrata estabelecido durante o
segundo pós-guerra.
O
auge da sindicalização dos trabalhadores Britânicos se deu, justamente no final
dos anos 70 e, de tudo que Thatcher fez, talvez o mais significativo tenha sido
enfraquecer os sindicatos.
Quando
Thatcher entrou, 13 milhões de trabalhadores (aprox. 50%) eram sindicalizados,
número que se reduz para menos da metade em 2012, quando a força de trabalho
total é maior do que era nos anos 70.
Thatcher
mudou as leis trabalhistas, privatizou grandes empresas públicas, algumas das
quais, como a mineira, desapareceram completamente e outras, como a
siderúrgica, se mantém por um triz.
De
uma economia de produção para uma economia de serviços
Como
também já explicado em outro artigo, a base econômica do Reino Unido, mãe da
revolução industrial, mudou da manufatura para os serviços, que hoje empregam
aproximadamente 80% da força de trabalho, em setores como finanças, comércio,
turismo e educação.
Atualmente,
o Reino Unido vive de e exporta know-how. As poucas indústrias que sobraram são
de alta tecnologia e empregam um número pequeno de trabalhadores (8% da força
de trabalho; 10% do PIB).
Sem
sindicalização a erosão dos direitos trabalhistas é fácil
Estas
mudanças podem ter sido ótimas para a riqueza geral do país, mas não para
grande parcela da população. Isso porque os chamados ‘serviços’, apesar de
empregarem trabalhadores colarinho branco, incluem inúmeras profissões, muitas
das quais não proporcionam boas condições de trabalho ou salários.
De
acordo com estudo do OCDE, a incidência de trabalho meio período é maior no
setor de serviços, os contratos mais curtos, e parcela dos empregos de menor
qualidade.
Apesar
das más condições, não há nestes serviços, um ‘chão de fábrica’, local propício
para a sindicalização e a reivindicação de direitos. Situação que se aprofunda
uma vez que boa parte de serviços públicos são terceirizados.
Depois
de Thatcher, Major (Conservador) e Tony Blair (Trabalhista) continuam as
reformas:
Major
introduziu o ‘mercado interno’, trazendo a concorrência para dentro dos setores
públicos, como saúde e educação, e fez das Parcerias Público Privadas (PPPs)
formas corriqueiras de prestação de serviços públicos.
Assim,
muitos serviços que antes eram executados diretamente por servidores públicos,
e garantiam aos trabalhadores contratos formais e direitos, foram terceirizados
ou diretamente privatizados.
Em
outras palavras, em muitos setores, o Estado compra serviços de empresas
terceirizadas que, por sua vez, também os terceirizam.
Assim,
o Estado, que tem o dever de dar condições decentes para os trabalhadores, pode
fechar os olhos para as más condições oferecidas pelas empresas contratadas por
eles.
Os
efeitos da flexibilização, gênero e classe
O
mais emblemático exemplo talvez seja o que aconteceu com os serviços sociais,
prestados principalmente por mulheres, com salários baixos.
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Quando
havia financiamento, durante os anos Blair e Brown, estas trabalhadoras
conseguiam sobreviver.
Com
a crise, os governos locais, buscando economizar, cortaram o que lhes parecia
mais fácil: os custos da terceirização que, por sua vez, afetaram as condições
destas trabalhadoras.
Estudos
mostram, que mesmo as organizações voluntárias (das quais se esperaria melhor
ética), optaram por modelos que não beneficiam os trabalhadores.
Resumindo:
o mais ‘flexível’ mercado de trabalho da Europa resultou em baixos salários e
poucos direitos.
Flexibilização
e produtividade
Aqueles
favoráveis à reforma trabalhista dizem que a flexibilização melhoraria a
produtividade do trabalho.
Isso
não se constata na Grã-Bretanha.
A
produtividade do trabalhador britânico fica a baixo não só da Alemanha, mas da
França e da Itália, países conhecidos pelas suas legislações inflexíveis.
Os
custos da flexibilização recaem sob os ombros da ‘sociedade’
Mas
há outras consequências negativas da ‘flexibilização:
O
governo britânico gasta £43bn ou R$181,5bn (17% da conta de segurança social)
em benefícios para trabalhadores (complementação de salários baixos). E £27bn,
R$ 113 bn (10%) em subsídios ao aluguel.
Em
outras palavras, a Grã-Bretanha gasta £70bn ou R$295,5 bn, ou seja, mais de um
quarto do gasto total da segurança social, para compensar a ‘flexibilização do
mercado’ – seja complementando salários baixos, ou ajudando as pessoas a
pagarem aluguel ao preço do mercado. Em ambos casos, em vez do governo ajudar
os mais necessitados, está subsidiando os mais ricos.
É
bem verdade que esta ‘flexibilização’ resultou em pouco desemprego (o nível o
mais baixo desde 1975). Mas a que custo?
Salários
baixos não só implicam nas empresas serem subsidiadas pelo governo, mas também
em menos arrecadação de impostos.
Além
do crescimento da chamada ‘gig economy’, onde os trabalhadores são pagos por
serviços específicos e não têm contrato (porque, aparentemente, são autônomos),
houve também o crescimento de contratos ‘zero horas’.
Uma
grande parcela destes autônomos não trabalha tempo integral e metade ganha
abaixo do mínimo.
Para
dar um exemplo, algumas empresas preferem contratar 4 faxineiras para trabalhar
2 horas do que uma por 8 horas. Assim, se desvinculando do ônus empregatício e
dos impostos devidos.
Alguns
dizem que a ‘flexibilização’ é boa para os trabalhadores. Como sempre, ela pode
beneficiar os trabalhadores altamente qualificados.
Porém
esta não é a realidade da maioria, com menos qualificação.
É
só prestar atenção em mais um fenômeno da economia britânica: o empobrecimento
das famílias trabalhadoras.
A
situação é tão séria que 55% dos denominados ‘pobres’ estão em famílias em que
pelo menos uma pessoa trabalha. São 3,8 milhões de trabalhadores pobres, dois
terços são mulheres.
E
o que dizer do fato que na quinta maior economia do mundo, 8% dos adultos não
tiveram o suficiente para comer em 2016 e uma boa parcela da população depende
de cestas básicas para sobreviver?
O
que pensar quando enfermeiras estagiárias do mais famoso sistema público de
saúde do mundo precisam complementar suas rendas com um segundo emprego ou com
‘bolsas pobreza’?
Será
que é de se surpreender, que num cenário destes, a população se recuse a
continuar jogando o mesmo jogo político dos anos 80 ou 90?
Quem
paga é o povo
Neste
mundo em que as grandes empresas podem comandar a economia e ameaçar a se
retirar de um país se não ganharem o que querem (sim, isto acontece aqui
também) é o governo, e portanto os cidadãos, que acaba pagando.
Se
é bem verdade que não seria possível reverter a queda de algumas indústrias,
como a mineira, e que uma economia desenvolvida se transforma necessariamente
em uma economia de serviços. Não foram feitos esforços suficientes para
integrarem as pessoas que perderam seus empregos e nem assegurar que os
empregos que surgiram das novas formas econômicas garantissem os direitos e os
salários dos trabalhadores.
No
meu artigo sobre o Brexit, citado acima, expliquei que as antigas zonas
industriais não conseguiram se recuperar economicamente, mesmo 30 anos depois
do desaparecimento de certas indústrias.
Depois
de 40 anos de liberalização, o sistema político-econômico britânico está em
crise.
Poderia
falar sobre a crise de moradia e o fato que a maioria dos mais pobres já não se
encontram em moradias sociais, mas em alugueis privados, e o custo
socio-econômico disso para os indivíduos e para a sociedade.
Poderia
mencionar aqui o incêndio na Torre de Grenfell, que mostra como governos
locais, regidos pela tal “custo-eficiência” se esquivaram das regulamentações,
e que depois de ter perdido absolutamente tudo, os moradores estão lutando para
poderem permanecer em seu bairro e não serem enviados para localidades
distantes, realidade relatada por Ken Loach em seu filme Eu, Daniel Blake.
Poderia
falar de Kensington & Chelsea, bairro do incêndio, o mais rico e desigual
do País. E mencionar o crescimento dos índices de desigualdade. Mas vou parar
por aqui.
No
Brasil, o auge da liberalização se deu nos anos 90, interrompido pela ascensão
do Partido dos Trabalhadores ao poder. Tanto que, o objetivo econômico deste governo
é fazer as reformas, parte intrínseca da aliança entre empresários, banqueiros,
políticos de direita, e os corruptos envolvidos na Lava Jato.
É
importante que nos demos conta do que isso significa.
Temos
um Congresso comprado, em um Estado de exceção.
Se
há algo que os verdadeiros donos do poder têm consciência é da dificuldade de
passar tais reformas na democracia. Por isso tem que ser agora. Já! Com ou sem
Temer.
Já
deixamos passar a PEC do teto dos gastos, um absurdo mesmo em termos de
economia ortodoxa. Como podemos fixar um teto para vinte anos num mundo
volátil? A desvinculação da arrecadação do governo e suas despesas é a
instalação do Estado Mínimo.
Deixamos
também passar o absurdo da PEC da terceirização, múmia retirada de seu túmulo
pelos mesmos Congressistas desdenhosos da população.
Não
podemos deixar que passem a reforma trabalhista. Porque a não ser que
consigamos anular todos os atos que foram passados durante este Estado de
Exceção, os danos que estas reformas trarão serão imensos. E isso é quase
impossível.
Como
tentei mostrar aqui, quarenta anos de liberalização transformaram a
Grã-Bretanha em outro país.
Sim,
continua sendo a quinta maior economia do mundo. Sim, continua ditando o que
deve ser feito nos outros países, exportando o seu know-how, mesmo sem saber se
os resultados serão bons. A confiança que os britânicos têm em suas ideias não
necessitam de provas.
Junto
com os americanos, os britânicos exportaram o liberalismo para o mundo. Agora
tentam lidar com as consequências.
E
nós ainda queremos imitá-los? A que custo?
Do
Cafezinho
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