“Mandato
parlamentar é coisa séria e não se mexe, impunemente, em suas prerrogativas”,
disse o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello ao devolver o mandato de
senador a Aécio Neves, quem tinha sido afastado do Senado pelo ministro Edson
Fachin em maio.
O ministro
Marco Aurélio ainda devolveu ao tucano todas as prerrogativas que lhe haviam
sido suspensas por ordem de Fachin, tais como manter contato com outros
investigados, testemunhas e, até, deixar o país.
De repente,
nada aconteceu na vida de Aécio Neves. Gravações em áudio e vídeo, lista de
nomes e valores apreendida em sua casa com a sigla CX.2 grafada no alto da
página… Tudo isso desapareceu (!?)
O argumento
para tomar uma medida como essa? O Supremo não pode afastar um senador do
mandato porque “mandato parlamentar é coisa séria”. Só mandato parlamentar, é?
À luz dos
últimos acontecimentos no país, a gente acaba achando que mandato parlamentar é
coisa séria, mas mandato presidencial é brincadeira…
Entende,
leitor?
Enfim,
podemos até ceder ao argumento de Marco Aurélio. Se essa proteção aos mandatos
populares – e não só mandatos parlamentares, queremos supor – valer para todos,
sejam tucanos ou petistas, nada a objetar.
O que não dá
para aceitar é o STF tratar petistas de um jeito e tucanos de outro. Aliás, o
STF destituiu o presidente da Câmara dos Deputados, mas não destitui um simples
senador?!
Nem estou
questionando a medida tomada em relação a Aécio. Respeitar seu mandato
parlamentar não significa que está absolvido. Após o recesso do STF seu pedido
de prisão será julgado, inclusive.
Ah, mas
postergaram por UM MÊS tal decisão. Enquanto isso, ele ficará livre, leve e
solto para obstruir as investigações.
Perdoem-me a
indignação, mas estou sendo perseguido pela República de Curitiba por acusação
de ter “obstruído a Justiça”. Ver a Lava Jato Suprema dar instrumentos e
liberdade a Aécio para ele atrapalhar investigações contra si faz com que meu
estômago pegue fogo…
O que está
em questão aqui, portanto, não é nem o respeito às prerrogativas
constitucionais, não de Aécio, mas de um senador da República. Se ele tem
direito a manter seu mandato enquanto não for julgado por seus pares,
respeitemos a lei, a Constituição.
Qual é o
problema, então, Eduardo?, você vai perguntar. O problema, caro leitor, é que o
que valeu para o senador Aécio Neves não valeu, por exemplo, para o senador
Delcídio do Amaral quando ele ainda integrava o PT e foi preso porque, como
Aécio, uma gravação o revelou cometendo um crime.
E nem vamos
lembrar como a Lava Jato prende gente a torto e a direito por muito menos que
Aécio, mas, com ele, medida cautelar nenhuma se sustenta.
Devia ser
assim mesmo? Talvez. Os constitucionalistas que se manifestem. Mas convenhamos
que parece uma tramoia danada, convenhamos que a sociedade fica indignada como
ao menos parte dessa “sociedade” ficou com a soltura de José Dirceu – contra
quem, aliás, só existem delações sem provas.
Delcídio
está solto, Dirceu também, mas amargaram cana dura antes disso. Dirceu cumpriu
uma pena de dois anos “preventivamente”. E Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, que
ficou cerca de dois anos preso por provas que a segunda instância da Justiça
considerou INEXISTENTES?!
Não importa
se Aécio é senador e Vaccari é sindicalista, ambos são cidadãos brasileiros e
não existem castas no Brasil – ou não deveriam existir.
Segundo o
Capítulo I, artigo 5º da Constituição Federal, no que tange Direitos e Deveres
Individuais e Coletivos, “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza”.
A lei maior
do país, portanto, veta a existência de castas, de privilégios a poucos.
Os
privilégios concedidos a Aécio se chocam frontalmente com o tratamento dado a
outros cidadãos submetidos a condições iguais perante a lei, só que opositores
do grupo político de Aécio Neves.
Pela segunda
vez desde 2015 o STF faz uma deferência inédita a outro acusado de corrupção.
Naquele ano, quando o ex-presidente do PSDB Eduardo Azeredo estava para ser
sentenciado pelo mensalão tucano, a Corte devolveu o caso dele à primeira
instância, para começar tudo de novo.
Desde então,
o caso dele está parado lá em Minas Gerais.
Apesar de
tudo que Aécio Neves fez e está comprovado em áudios, vídeos e documentos, ele
obteve um tratamento que só é dispensado pela Justiça brasileira a membros de
um partido político, o PSDB. Nem grandes empresários têm tal regalia.
Uma “casta”
tucana acaba de ser instituída “oficialmente” por um membro do Supremo Tribunal
Federal. Espera-se que os outros desfaçam essa injustiça.
Ora, mas que
novidade há em o Brasil ser um país de castas? Quem é branco e de classe média
tem mais direitos do que quem é negro e de classe baixa, no Brasil, e não é de
ontem – é de sempre. O problema é que o caso de Aécio oficializa um tipo
diferente de casta, a casta política.
Nem queiram
saber quanto mal castas políticas, raciais e religiosas podem fazer a um país.
E o Brasil tem os três tipos.
PS: após
vazar a cumplicidade entre Gilmar Mendes e Aécio Neves houve uma reviravolta e
o STF passou a tratar o tucano como rei.
Blog da
Cidadania
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