Na
quarta matéria da séria sobre a indústria da delação premiada da Lava Jato,
feita em conjunto pelo Jornal GGN e o DCM, destacamos os principais trechos do
áudio do encontro dos deputados Paulo Pimenta e Wadih Damous com o advogado
Rodrigo Tacla Durán. As anteriores estão
aqui.
Os deputados Paulo Pimenta e Wadih Damous, integrantes da CPI da JBS,
viajaram por conta própria a Madri, na Espanha, e ouviram o advogado Rodrigo
Tacla Durán, processado pela Lava Jato por lavagem de dinheiro.
O áudio foi protocolado na CPI e divulgado por alguns sites. O DCM e GGN
têm o áudio desde segunda-feira, mas, antes de ser publicado, foram checadas as
informações e colocadas em seu contexto, com observações ao final dos trechos
separados por tema.
Também se preferiu transcrever, para facilitar o entendimento e dar
oportunidade para reflexão e assimilação, dada a complexidade das informações e
situações tratadas.
É uma forma de explicar um caso complexo, não apenas jogar gasolina na
fogueira.
Tacla Durán é um homem-bomba. Pode aprofundar cada caso abordado por
ele. Fala com propriedade.
Mas, é claro, acusado, tem interesse de fazer sua defesa.
É um direito dele, mas não se pode esquecer que ele vai até onde a lei
não o alcance.
Foi, efetivamente, operador da Odebrecht. Trabalhou lá.
O depoimento de Tacla Durán à CPI da JBS é uma oportunidade para revelar
ao Brasil as entranhas de um sistema que parece apodrecer antes mesmo de se
tornar maduro.
É uma operação que atinge alvos pré-definidos, daí a plausibilidade das
informações de que provas são montadas e versões criadas, como se juntassem
peças de um enredo.
Os leitores desta série já estão tomando conhecimento dessa máquina
perversa, que está longe de produzir justiça. Com o depoimento à CPI,
transmitido ao vivo, o alcance será muito maior.
A CPI, se não não deve nada a ninguém, precisa aprovar o depoimento de
Rodrigo Tacla Durán.
A TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO
Nós estamos aqui em Madri. Eu, deputado Paulo Pimenta, deputado Wadih
Damous, juntamente com o Dr. Rodrigo Tacla Durán, e seu advogado, Emílio
Naranjo, para buscarmos uma série de informações relativas a questões
relevantes sobre a conjuntura do Brasil, que têm sido recorrentes objeto da
atenção da imprensa, do País, a partir de informações prestadas pelo advogado
Rodrigo Tacla Durán.
QUEM É RODRIGO TACLA DURÁN
Deputado Wadih: Rodrigo, os procuradores da chamada Operação Lava Jato
sustentam que o senhor, na verdade, não atuava como advogado, o senhor não
prestava serviço de advocacia à empresa Odebrechet, que seriam serviços de
lavagem de dinheiro. O senhor pode esclarecer esta afirmação para nós? O senhor
efetivamente prestava serviço de advocacia para a empresa Odebrecht?
Tacla Durán: Sim, eu trabalhei como advogado da Odebrecht de 2011 a
2016, é público que eles solicitaram a banco a abertura de conta para pagar
meus honorários. E eu estou, inclusive, hoje respondendo a um processo de ética
no Tribunal de Ética da OAB de São Paulo, justamente em razão de suposta
violação de sigilo profissional. Isso não aconteceria se eu não tivesse
trabalhado, de fato, como advogado da empresa.
Damous: O senhor recebia honorários da empresa pela prestação de
serviços advocatícios?
Tacla Durán: Correto.
Damous: Esses honorários eram declarados para o imposto de renda
brasileiro?
Tacla Durán: Todos. Todo o meu patrimônio no Brasil e no exterior foram
declarados à Receita, inclusive os honorários que eu recebia da Odebrecht no
exterior. Tanto é verdade que, depois de dois anos de fiscalização, eu não fui
multado, não tive nenhuma sanção da Receita Federal.
Pimenta: Consta dos registros contáveis da construtora Norberto
Odebredht pagamentos mensais de aproximadamente 10 mil reais ao seu escritório.
Que pagamentos são esses?
Tacla Durán: Esse pagamento de valor aproximado de 10 mil reais não foi
pago ao meu escritório, foi pago à minha pessoa física. Ele consta da minha
declaração de imposto de renda pessoa física. E na verdade se trata de recebimentos
de aluguéis, uma vez que eu alugava um apartamento de minha propriedade em São
Paulo, para uso de seu Hilberto Silva, que era custeado, pago, pela Odebrecht.
Damous: Quem é Hilberto Silva?
Tacla Durán - Hilberto Silva era diretor da Odebrecht, diretor que
coordenava o Departamento de Operações Estruturadas, meu superior hierárquico.
Pimenta: O apartamento que o senhor Hilberto Silva alugava em São Paulo,
a empresa Odebrecht alugava diretamente do senhor?
Tacla Durán: Sim. Por isso, as acusações que me fazem, de doleiro, etc.,
não têm o menor cabimento porque jamais você iria alugar o apartamento do seu
doleiro.
Pimenta: Evidentemente que esse pagamento, por si só, revela uma relação
formal pública entre a empresa Odebrecht e a pessoa física do senhor.
Tacla Durán: Sim.
Pimenta: É atribuída ao senhor a propriedade de doze empresas. Essas
empresas controladas, ou de propriedade do senhor, o senhor confirma a
existência de todas essas empresas?
Tacla Durán: A existência sim, nem todas são de minha propriedade. Isso
já foi, inclusive, esclarecido, porque a Odebrecht… Essas doze empresas foram
declaradas pelo sr. Vinícius Borin.
Damous: Quem é o senhor Vinícius Borin?
Tacla Durán: Vinícius Borin foi um testa de ferro da Odebrecht como
acionista do Meinl Bank Antígua. Ele declarou que havia doze empresas de minha
propriedade. Na realidade, não são doze, são seis.
Damous: Quais são?
Tacla Durán: As minhas empresas são Vivosant Corporation, que não é
offshore, é uma empresa espanhola, cuja tributação é inclusive mais cara que a
do Brasil. A GVTEL, idem, é uma empresa espanhola, não é offshore, a Ocean, a
Cumberland, a Bonarda, e a Nevada, e Discovery.
Damous: As demais não são suas.
Tacla Durán: Não são minhas. A Vivosant é uma empresa holding, está aqui
o manual, as demais são subsidiárias delas. Estão declaradas tanto no imposto
de renda pessoa física quanto da CBE (Capitais Brasileiros no Exterior) do
Banco Central Brasileiro.
Pimenta: As demais empresas o senhor reconhece?
Tacla: Essas outras empresas são de pessoas ligadas ao Meinl Bank.
Pimenta: Nicolas James Baker?.
Tacla: Nicolas James Baker é genro do Thimoty Lee. Thimoty Lee é amigo
do Luiz França, um dos acionistas do Meinl Bank, inglês. Thimoty foi, ou é,
testa de ferro das empresas offshore da Odebrecht. O Thimoty é inclusive
proprietário do domínio web do Meinl Bank Antígua.
Pimenta: Importante que a gente consiga obter mais informações do Meinl
Bank Antígua. O Meinl Bank é um banco que já existia nas Antígua. Ele já
prestava serviços para a Odebrecht antes da mudança de seu nome, do banco?
Tacla: Eu não tenho conhecimento para te falar isso com precisão porque,
nessa ocasião, eu não trabalhava para a Odebrecht. Mas entendo que não. Essa
relação começou a partir da aquisição do banco.
Pimenta: Como se deu esse processo de aquisição do banco?
Tacla: Eu soube, já trabalhando na defesa, que foi comprado pelo Luiz
França, pelo Vinícius Borin Marco Bilinski, Olívio Rodrigues, e pelo Luiz
Eduardo Soares e Fernando Migliaccio, esses dois já vinculados diretamente à
Odebrecht e, então, eles não apareciam no quadro de acionistas do banco. E, ao
meu ver, e eu fiquei sabendo, a Odebrecht sequer sabia que eles eram sócios
desse banco.
Pimenta: Foi adquirido um banco em Antígua para operar
internacionalmente para a Odebrecht e parte dos acionistas desse banco era de
executivos da própria Odebrecht…
Tacla: Sim, correto. Na verdade, esse time, esses seis nomes que estamos
falando, eles operam aí juntos há muitos anos. Antes do Meinl Bank, eles
trabalhavam via Antígua Overseas Bank (AOB), que era o mesmo sistema. Esse
banco teve um problema de liquidez e foi o que levou eles a adquirir um novo
banco. Inclusive essa relação desses seis personagens veio de antes do AOB,
prestando serviços para inúmeras empresas, bancos, para a Odebrecht. Uma
relação de mais de dez anos aí. Eles são sócios. Eles são funcionários da
Odebrecht os dois, os outros não, prestam serviço para a Odebrecht em razão dos
dois, mas na verdade eles têm um negócios à parte, em sociedade.
EXTRATOS MONTADOS
Pimenta - Parte deles são delatores da Odebrecht?
Tacla: Os dois: Fernando Migliaccio e Luiz Eduardo Soares.
Pimenta: Os extratos apresentados pela Odebrecht na sustentação das
delações, emitidos pelo Meinl Bank…
Tacla: Não, não foram emitidos pelo Menl Bank. Aqueles extratos não são
do padrão do banco. Pelo menos os que eu vi. Aqueles a que eu tive acesso. Não
são do padrão do sistema do banco. Tem incongruência do sistema de datas. Tem
incongruências de referência, de descrição de movimento.
Pimenta: O senhor afirma que aqueles extratos apresentados pela
Odebrecht e aceitos pelo Ministério Público na delação da Odebrecht…
Tacla: São montados.
Pimenta: Não são extratos do padrão do Meinl Bank?
Tacla: Não.
Damous: O que leva o senhor a afirmar isso?
Tacla: Porque eu tenho contas no Meinl. As minhas contas no Meinl foram
declaradas. Eu tenho os extratos verdadeiros, como o sistema emitia os
extratos. Usei esses extratos em diversas situações legais porque minhas
contas, ao contrário do que eles alegam, eram declaradas. E me estranha muito
que eles tenham declarado que minhas contas são irregulares porque eles têm
perfeito conhecimento de que o dinheiro chegava na minha conta no Meinl Bank
Antígua via Banco Central do Brasil. Saía, debitava da minha conta no Banco
Itaú, eu enviava o contrato de câmbio fechado com o Banco Itaú e ele sabia
muito bem que a conta era de minha propriedade. Inclusive eu sempre documentei
isso.
Damous: Perfeito. Em relação à sua conta, a seus extratos. Mas, em
relação a terceiros, o senhor pôde verificar pelo padrão de emissão de extratos
dos bancos que aquele que foi apresentado aos procuradores e os procuradores
aceitaram como verdadeiros são planilhas de extratos falsos?
Tacla: Sim. Além dos extratos verdadeiros que são os da minha conta, tem
outras incongruências, como movimentação na mesma data quando as pessoas já
estavam presas e o sistema do banco travado. Ou seja, não era possível ter a
movimentação.
Damous: O senhor pode apresentar algum caso concreto que o senhor pode
constatar ao verificar esses documentos?
Tacla: Em um dos inquéritos que estão correndo no Supremo Tribunal
Federal, um dos anexos apresenta um extrato que tem uma determinada data que
tem saldo positivo. No mesmo anexo, juntado por um delator, no mesmo inquérito,
o saldo está negativo. Com a mesma data. Ou seja.
Damous: Quem era o delatado?
Tacla: Os delatados eram o deputado Pedro Paulo, o ex-prefeito Eduardo
Paes e, se não me engano, o senador Humberto Costa. Esse extrato só poderia ser
verídico se houvesse movimentação nessa data, no mesmo dia, entre a emissão de
um extrato e outro. Entretanto, essa movimentação é impossível. Primeiro porque
as contas deveriam estar bloqueadas devido aos crimes, e de fato estão. Segundo
porque o beneficiário das contas estava detido em Curitiba.Terceiro porque ninguém
mais movimentava conta nesse banco porque o sistema estava totalmente travado.
Então era impossível haver movimentação nessa data.
Damous - Nós poderíamos chegar à conclusão de que se trata de uma
tentativa de comprometer essas pessoas?
Tacla Durán - Sim, como com relação a mim próprio.
Pimenta - Se fosse fornecida a documentação original do Meinl Bank,
ficaria evidente que esses extratos são falsos?
Tacla Durán — Correto. Entretanto, o sistema do banco também foi
fraudado para impossibilitar o tracking (rastreamento) do dinheiro.
Pimenta — Na medida em que sócios do banco são também executivos da
Odebrecht.
Tacla Durán — Aí havia interesse duplo. Um dos interesses era
atender a empresa. Qual o interesse da empresa? Cortar o tracking do dinheiro.
O dinheiro, a origem era da Odebrecht e tinha saída para um determinado pack
estrangeiro ou o que seja. Com a fraude que foi feita no sistema, é inviável,
como é inviável se rastrear o dinheiro, do momento que entrou, por exemplo a
Odebrechet, até a saída ilegal. Então não dá para saber que a saída ilegal que
aconteceu tem como origem a Odebrecht. Esse tracking foi cortado. E outro
interesse que aí existe, é interesse deles próprios, evidente que havia
dinheiro nessas contas e ninguém vai lá reclamar. E eles tiveram oito meses
entre a delação do Vinícius e a intervenção no banco para movimentar. E mesmo
antes da delação, houve um tempo para a movimentação.
SUBORNO A AUTORIDADE DE ANTÍGUA
Pimenta - O suposto pagamento ao primeiro ministro de Antígua
(Gaston Alphanso Browne) teria por objetivo também omitir informações a
respeito da movimentação do Meinl Bank?
Tacla Durán — A idéia…
Pimenta — Aconteceu esse pagamento?
Tacla Durán — Sim, aconteceu. A ideia era brecar a resposta à
cooperação jurídica formulada pelo Brasil.
Pimenta — A respeito da transação do Meinl Bank.
Tacla Durán — Correto.
NEM TODAS AS CONTAS FORAM REVELADAS PELA OPERAÇÃO LAVA JATO
Pimenta — No caso da suspeita de que em determinadas delações são
obtidas informações a respeito de contas como uma estratégia de negociação,
onde o delator recebe determinados benefícios, entre eles a proteção de contas,
envolve também essa movimentação no Meinl Bank?
Tacla Durán—Tem contas no Meinl Bank que, por exemplo, eu não vi
reveladas na delação do Vinícius. Isso a própria Polícia Federal já constatou.
Damous — Por exemplo?
Tacla Durán — Por exemplo, de uma pessoa que é vinculada ao
presidente do Panamá (Michelle Lasso). Não foi vinculado ali.
LAVA JATO ESCONDEU CONTA DE JOÃO SANTANA NAS ILHAS CAYMAN
Pimenta — Mas, sobre as delações no Brasil, você já ouviu falar na
conta Deltora Company?
Tacla Durán— Sim, mas Delatora é uma offshore (Deltora Entrerprise
Group) que não tinha conta no Meinl Bank. Tinha conta em outro banco, nas Ilhas
Cayman.
Pimenta — Chaobin (grafia pode estar incorreta) também operava em
banco nas Ilhas Cayman?
Tacla Durán — Não, Chaobin era conta, se não me engano, na Suíça.
Damous — Deltora é vinculada a quem?
Tacla Durán — João Santana.
Damous — Publicidade João Santana, e a mulher, Mônica Moura.
Tacla Durán — Sim.
Damous — E essa conta, Deltora, ela não aparece na delação da
Mônica Moura e João Santana?
Tacla Durán — Não que eu tenha tomado conhecimento. Tudo que eu li,
no que foi público, não vi nada mencionando.
Pimenta — E a conta Alpha Internacional Company, o senhor conhece?
Tacla Durán — Não, essa não.
Pimenta — E a Shellbill?
Tacla Durán — Shellbill faz parte de uma planilha que me pediram
para fazer um estudo e buscar os beneficiários finais.
Pimenta — E, além da Shellbill, apareceu outra conta nesse estudo da
planilha?
Tacla Durán — Sim. A Deltora e mais duas, uma pessoa física e outra
pessoa jurídica.
Pimenta — Era João Santana…
Tacla Durán — Sim, essa conta era de contas vinculadas a pessoa de
João Santana.
Pimenta — Essa planilha envolveu quatro contas.
Tacla Durán — Quatro contas.
Pimenta — E na delação aparece só a Shellbill.
Tacla Durán — Até hoje eu só vi a Shellbill.
ODEBRECHT PEDIU A TACLA DURÁN PARA RASTREAR CONTAS: QUERIA PRESSIONAR
DILMA ROUSSEFF
Pimenta — As outras duas contas não apareceram?
Tacla Durán — Não.
Pimenta — Mas, nessa planilha que o senhor elaborou, elas aparecem.
Tacla Durán — Não, não fui eu que elaborei. Foi alguém do
Departamento de Operações Estruturadas, uma das moças lá, eu não me lembro,
acho que a Ângela, não me lembro, eu tenho o arquivo com o original.
Pimenta — O senhor tem arquivo original dessa planilha.
Tacla Durán —Sim, tenho.
Pimenta — Onde aparecem as outras quatro contas.
Tacla Durán — Sim. Quando eu não consegui localizar o beneficiário
final das contas e relatei isso ao Hilberto, ele ficou muito chateado, porque,
aí sim, ele me colocou que era o pagamento ao João Santana, que era muito
importante a gente conseguir isso, porque a ideia da Odebrecht era pressionar a
presidente Dilma, através dessa informação, a paralisar as investigações ou
coisas nesse sentido.
Pimenta — A Odebrecht, de posse das informações de pagamentos a
João Santana, usava essas informações para pressionar lideranças de outros
países e foi também usada contra a presidenta Dilma? Chegou a ser utilizado?
Tacla Durán — Creio que não, porque o Hilberto ficou muito chateado
porque eu não consegui ter sucesso naquele estudo.
Pimenta — O Hilberto que o senhor fala é?
Tacla Durán — Hilberto Silva.
Pimenta— O Hilberto Silva foi identificado como responsável pelo sistema
Drousys.
Tacla Durán — Não, não. O Hilberto era o responsável pelo
departamento.
Pimenta —De Operações Estruturadas.
Tacla Durán —Sim, sim.
Pimenta — Ficava na Bahia.
Tacla Durán — Ficava em São Paulo porque eu alugava o apartamento a
ele.
O QUE FAZIA O DEPARTAMENTO DE OPERAÇÕES ESTRUTURADAS
Damous - Esse Departamento de Operações Estruturadas era de fato
destinado ao pagamento de propinas?
Tacla Durán — Quando eu cheguei, já estava criado. Mas havia
situações de pagamento também que não se trata de propina, situações
estratégicas em que a empresa tinha que fazer pagamentos, em que a pessoa não
queria aparecer, por uma questão fiscal. Eram coisas normais de uma empresa.
Eu, por exemplo, comecei a trabalhar lá, eu não podia detectar que aquilo era
voltado para esse tipo de prática ilícita, até porque, se havia esse tipo de
prática ilícita, isso não era disseminado, falado com qualquer pessoa recém
chegada. Eu trabalhei cinco anos com pessoas que tinham 30, 35 anos de casa.
Claro que, a partir de determinado tempo, você tinha confiança, etc. Agora eu,
em dois três anos, dizer que sabia de coisas. Não, o que eu via uma série de
operações, procedimentos fiscais, que eram normais do dia a dia de uma empresa.
Pimenta — O Hilberto não era o responsável pelo Drousys?
Tacla Durán — Não. O Drousys, quem era o responsável era o irmão do
Luiz Eduardo.
Damous — Explica para nós o que é o Drousys.
Tacla Durán — Drousys é o sistema de comunicação. São desk tops
virtuais que criavam o login e senha, e você se comunicava.
Pimenta — Uma rede interna.
Tacla Durán — É, uma rede interna. Só que essa rede interna era
controlada pelo Luiz Eduardo.
Pimenta — O Luiz Eduardo ficava no Departamento de Operações
Estruturadas.
Tacla Durán - É. Uma pessoa só poderia falar com a outra e esta
autorizasse.
Pimenta — Ele era da equipe do Hilberto.
Tacla Durán — É.
Damous - Mas o Drousys foi concebido com que objetivo?
Tacla Durán — A de comunicação segura.
Pimenta — Só para a gente entender aqui. O Luiz Eduardo fazia parte
do Departamento de Operações Estruturadas, do Hilberto, mas ele era também
sócio do banco em Antígua.
Tacla Durán — Sim, correto.
Pimenta — O Fernando era diretor de que setor da Odebrecht.
Tacla Durán — O Luiz Fernando era diretor, tesouraria.
Pimenta — Tesouraria.
Tacla Durán — Ele sempre trabalhou na área de tesouraria, ele
estava na área de Operações Estruturadas e…
Pimenta — Os dois faziam operações em nome da Odebrecht no Meinl
Bank sem que a Odebrecht soubesse que eles eram também sócios do banco.
Tacla Durán — Que a Odebrecht sabia que eles não eram sócios do
banco, certeza. Que eles faziam operações que a Odebrecht sabia, não…
Pimenta — A Odebrecht não sabia que eles eram sócios.
Tacla Durán — Não, a Odebrecht não sabia que eles eram sócios. E
eles faziam operações que a Odebrecht sabia e operações que a Odebrecht não
sabia. Como eu falei, são sócios. Eles são tão sócios que o imóvel onde o banco
se situava em São Paulo é de propriedade dos quatro acionistas banco, e do
Fernando e do Luiz Eduardo. O imóvel é de propriedade dos seis.
EXECUTIVOS DESVIARAM DINHEIRO DA ODEBRECHT COM PROPINA SIMULADA
Damous - Salvo engano meu, o senhor teria declarado nas entrevistas
à imprensa que algumas operações de entrega de dinheiro — para políticos ou
seja lá para quem for, legais ou ilegais —, o dinheiro não chegava ao
destinatário, eram embolsados por aqueles que deveriam entregar o dinheiro.
Tacla Durán — Sim, sim.
Pimenta — Eles lançavam no sistema como se fosse propina.
Tacla Durán — Sim. Havia entrega simulada de dinheiro por pessoas
que roubavam dinheiro.
Damous — O senhor tem exemplos?
Tacla Durán — Dinheiro físico? Dinheiro em espécie?
Damous — Uma operação de dinheiro que seria destinado a políticos.
Pimenta — Consta no Drousys uma operação de pagamento para alguém,
mas, na verdade, isso era uma simulação para que o próprio executivo ficasse
com o dinheiro.
Tacla Durán — Veja bem, eu não posso assim… Um caso que chamou a
atenção é que foi solicitada a entrega de… Houve uma discussão muito grande em
relação a Leandro Azevedo.
Damos — Quem é Leandro Azevedo?
Tacla Durán — Leandro Azevedo era um diretor da Odebrecht
responsável pelo Rio de Janeiro. Falar a verdade, eu não sei exatamente a
função dele. Ele trabalhava no Rio de Janeiro e era responsável por esse tipo
de serviço, obra, etc. Que aconteceu ali é que eu presenciei uma discussão o
Álvaro Novis (diretor da empresa), o Luiz Eduardo e o Fernando Migliaccio, num
almoço, que o Álvaro reclamou que o pedido de entrega, que ele teve que
entregar recursos dentro do escritório da Odebrecht na mão do Leandro Azevedo,
e que, eu não sei qual o valor, nada, eu vi a discussão. Não era um assunto meu
e eles não foram tão transparentes, justamente por eu estar na mesa do almoço.
Ficou claro que eles ficaram muito aborrecidos e transpareceu é que esse
dinheiro foi para lá e ficou com uma pessoa, que não foi, e eles acharam que
estava acontecendo algum tipo de desvio.
A CONTABILIDADE PARALELA DA ODEBRECHT
Pimenta — Uma última pergunta sobre esse mesmo assunto. O sistema
My Web Day é um sistema que até agora não apareceu de maneira integral.
Ocorreram várias solicitações de acesso a esse sistema e, nesse sistema, estão
registradas todas as movimentações contábeis legais e ilegais da Odebrecht no
mundo inteiro. O senhor tem ciência da existência desse sistema, e como é que
ele funcionava.
Tacla Durán — Sim. Quando eu estava trabalhando na triagem de
informações, na defesa da empresa, porque muitas informações, antes de ser
passada aos advogados constituídos, internamente a gente fazia uma triagem —
alguns advogados da empresa, no caso eu, dr. Gideon, dr. Marcos Simões e outros
advogados, e os próprios funcionários, diretores. Nesse trabalho, eu não
conhecia o sistema My Web Day, nesse trabalho que eu estava fazendo, aí me
informaram que havia esse sistema e que esse sistema se tratava da
contabilidade, era um sistema de contabilidade da empresa. Ficava também em
servidores seguros. Na ocasião em que me contaram, me disseram que já estava
desativado. Isso foi em 2015. Em 2015, ele já estaria desativado.
Pimenta — O My Web Day ficava hospedado onde?
Tacla Durán — No exterior também.
Pimenta — Sabe onde?
Tacla Durán — Que eu saiba, na Suíça.
Pimenta — E o Drousys?
Tacla Durán — Também.
Pimenta — Essas planilhas que têm sido apresentadas extraídas do My
Web Day, o senhor acha que, sem o acesso ao sistema original, é possível
afirmar que elas sejam verdadeiras, a exemplo do que foi feito com os extratos
de Antígua?
Tacla Durán — Sem acessar o sistema, afirmar que é verdadeiro é
tecnicamente impossível. Acho que nenhum perito faria isso.
Pimenta — E esse sistema, na sua opinião, hoje ele já não existe
mais?
Tacla Durán — Quando eu soube, ele já era desativado, e eles não
demonstraram tanta preocupação. Acho que não havia risco.
Damous — Ele pode servir de prova contra ou a favor de alguém?
Pimenta — Não quer dizer que algo que esteja dentro do sistema seja
verdadeiro também.
Tacla Durán — Como eu disse, havia coisas que podem ter sido
simuladas, sob o próprio interesse de algum dos diretores. É como um sistema
normal, você gera uma despesa, e a despesa pode existir ou não. Nesse caso
aqui, é uma despesa que não tinha suporte de documento, nota fiscal, nada.
Pimenta — Tanto o Drousys como o My Web Day eram alimentados por
executivos da empresa.
Tacla Durán — O My Web Day 100% certeza, seguro.
Pimenta — Que lançavam a contabilidade da empresa, oficial e
paralela.
Tacla Durán —E executivo de alto nivel.
Pimenta — Informações não obrigatoriamente verdadeiras, na medida
em que estão surgindo informações de que executivos desviavam dinheiro.
Tacla Durán — Sim, com certeza há inconsistências. Seguro. Há
inconsistências. Não é 100% verídico. Isso sem nenhum tipo de fraude no
sistema. Havia inconsistência por lançamento individual.
Pimenta — Deve ter também operações registradas para além das
relações da política. O mundo jurídico, grupos de comunicação.
Tacla Durán — É um sistema de contabilidade. Então ali consta,
acredito, tudo. No My Web Day.
O Drousys é um sistema de comunicação.
Damous — Uma espécie de whatsapp.
Tacla Durán — Tinha o chat, tinha e-mail.
Observação: O juiz Sergio Moro negou todos os pedidos da defesa do
ex-presidente Lula para ter acesso a esse sistema de contabilidade paralela da
Odebrecht.
COMO ZUCOLOTTO, O AMIGO DO JUIZ MORO, ENTROU NA HISTÓRIA
Damous — Eu gostaria mais de saber sobre sua situação jurídica.
O senhor foi delatado.
Tacla Durán — Fui.
Damous — O senhor estava sendo investigado.
Tacla Durán — Por três anos.
Damous — E preocupado, como qualquer pessoa ficaria, resolveu
contratar — e o senhor estava sendo investigado pela Operação Lava Jato —
advogado em Curitiba, onde é a sede da Operação, e o senhor escolheu o
escritório Zucolotto para…
Tacla Durán — Não, foi um um pouco diferente. Eu tomei conhecimento
de que havia sido delatado pela UTC, pelo senhor Ricardo Pessoa e pelo diretor
da UTC, Valmir Pinheiro. Tomei conhecimento disso por outros advogados que
também trabalhavam para a UTC. E, com a desculpa de que queriam me ajudar com a
indicação de advogados, talvez os mesmos advogados, poderia até ser. Até com as
mesmas referências “a panela de Curitiba”, advogados da panela de Curitiba.
Damous - O que o senhor chama de panela de Curitiba?
Tacla Durán — Eles me disseram que eram advogados que tinham
capacidade de resolver o assunto melhor, por estarem ali, por conhecerem o
mecanismo, as pessoas. Uma proximidade de contato. Eu optei por não contratar
ninguém que eles haviam indicado, continuei com meu advogado — na verdade,
constituído na frente das negociações que eu travei com o Ministério Público,
que foi o Leonardo Pantaleão —, tentei prestar meus esclarecimentos, ter as
minhas prerrogativas de advogado respeitadas. Não tive. Vi algumas
dificuldades. E o escritório do dr. Zucolotto era meu correspondente.
Damous — Que dificuldades?
Tacla Durán — Eles queriam me imputar crimes que eu não pratiquei.
Damous — Eles quem?
Tacla Durán — Os procuradores.
Damous — Os procuradores.
Tacla Durán - Me imputar crimes que eu não cometi, converter o
trabalho de advogado. Eles queriam criminalizar o trabalho do advogado. Não é
porque você tem uma informação que você está protegendo seu cliente ou você
está orientando seu cliente, na prática, se ele praticou ou não crime, não é o caso
de você ser criminoso. Não é porque você recebeu de um cliente que você está
lavando dinheiro. Eles falam que eu saquei 61 milhões em uma entrevista
coletiva e, ao mesmo tempo, um informe da Receita Federal mostra que em dez
anos eu saquei 435 mil.
Pimenta — Quais eram os procuradores com quem o senhor conversava?
Tacla Durán — Roberson Pozzobon, Júlio Noronha, Carlos Fernando dos
Santos Lima, Diogo Castor de Mattos, Deltan Dallagnol, Sérgio Bruno, Athayde
(Athayde Ribeiro Costa) e Marcelo Miller.
Observação: Carlos Zucolotto é padrinho de casamento de Sergio e
Rosângela Moro.
PROCURADORES AMEAÇAVAM ENVOLVER A FAMÍLIA PARA FORÇAR DELAÇÃO
Damous — O senhor se sentia constrangido nestas tratativas, nesses
interrogatórios?
Tacla Durán — Com certeza. Eu sou advogado, Advogado há mais de
vinte ano anos e a gente tem um pouco de experiência com essa situação. Para
nós advogados chegar ao ponto de se constranger, eu imagino quem não é operador
do direito. Constranger no sentido de quererem trazer para dentro da
investigação familiares que não tem nada a ver com isso.
Damous — Houve essa ameaça?
Tacla Durán — Sim.
Damous — De quererem trazer algum familiar seu?
Tacla Durán — Sim. Simplesmente por ser sócia no escritório de
advocacia.
Damous — Quem é?
Tacla Durán — A minha irmã.
Damous — Sua irmã é advogada também?
Tacla Durán — Sócia no meu escritório, ela (Flávia Tacla Durán)
nunca trabalhou para empreiteira nenhuma. Até porque ela trabalha em outra
área. Ela faz direito de família, direito civil, trabalhista. Não trabalha na
área de empreiteira. E eles colocavam: “é melhor fazer, é melhor por para
dentro do acordo, que te protege.” Na verdade, é aquela coisa: diz que está
ajudando, mas na verdade está te colocando…
Observação: Pela lei, as delações devem ser espontâneas, voluntárias.
TACLA DURÁN FOTOGRAFOU AS MENSAGENS TROCADAS COM ZUCOLOTTO, DA PANELA DE
CURITIBA
Damous — Mas, na verdade, essas ameaças objetivavam o quê? O que
eles queriam do senhor?
Tacla Durán — Que eu celebrasse o acordo. Foram feitas as reuniões,
eu acabei procurando o Zucolotto para tentar ajudar nessa questão .
Damous - É isso que eu quero saber: por que o escritório do
Zucolotto?
Tacla Durán — Porque ele já era meu correspondente em Curitiba há
tempos. Então é natural que eu procurasse uma pessoa de Curitiba, da comarca,
que evidentemente teria mais acesso. E aí nós estamos falando o que não acesso
ilegal, nada. Ali é uma negociação, é o direito penal negociado.
Pimenta — O Zucolotto não é advogado trabalhista?
Tacla Durán — Eu nunca fiz direito penal.
Pimenta — O senhor procurou o Zucolotto pela sua capacidade
jurídica?
Tacla Durán — Ele fazia não só. Ele fazia execução fiscal, cuidava
de execuções fiscais, cuidava de assuntos trabalhistas, na questão como correspondente.
Essa questão, eu coloquei que era uma questão pessoal/penal, perguntei se ele
podia ajudar.
Damous - O senhor sabia que a esposa do juiz Sergio Moro era sócia
do escritório do dr. Zucolotto?
Tacla Durán — Sim, soube depois.
Damous - Depois ou?
Tacla Durán — Sim, depois que eu contratei ele. Antes disso aí.
Antes de contratar, eu sabia.
Damous - Não, se o senhor sabia que a esposa do juiz era sócia do
Zucolotto.
Tacla Durán — Sim, antes de contratar para ajudar na negociação, eu
sabia.
Pimenta — O senhor acredita que um escritório de advocacia possa
ajudar no processo de acordo de delação? Que tipo de relação é essa que o
senhor esperava que ele pudesse ajudar?
Tacla Durán — Eu me pautei um pouco no que o pessoal da UTC havia
comentado e falado: olha, a gente te arruma advogado, o pessoal da panela de
Curitiba,
Damous - O Zucolotto faria parte da panela de Curitiba?
Tacla Durán — Eu não queria um advogado vinculado à UTC, eu queria
um advogado meu. Então, eu não aceitei. Mas aquela questão de que advogado de
Curitiba poderia resolver e, como por experiência própria eles já tinham feito
o acordo do Ricardo e da própria companhia, eu acreditei que aquilo tinha algum
fundamento. E como eu tinha um correspondente em Curitiba, não para assunto
penal, mas para outros, eu liguei para perguntar: se ele não fosse, quem
poderia indicar para tratar desse assunto para mim. E ele se prontificou
a tentar aconselhar e resolver.
Damous — As tratativas com o dr. Zucolotto se deram como?
Pessoalmente?
Tacla Durán — Não, eu já estava nos Estados Unidos, viajando, eu
talvez até estivesse por alguns dias no Brasil. Eu estava viajando bastante
porque eu também já estava tratando da colaboração com os Estados Unidos.
Damous - Como é que se deram essas tratativas?
Tacla Durán — Pelo Wickr, pelo aplicativo Wickr..
Damous - Wickr é o que criptografa.
Tacla Durán — Criptografa e apaga as mensagens automaticamente nos
dois dispositivos.
Damous — O senhor se apresentou a ele e disse que precisava dos
serviços.
Tacla Durán— Me apresentei não, ele já sabia que eu era correspondente.
Damous — Qual era a solicitação — quero contratá-lo para…
Tacla Durán — Eu não liguei para contratá-lo. Eu liguei e disse:
olha, eu estou com um problema pessoal, ai em Curitiba, a Lava Jato, eu não sei
se você tem como ajudar, trabalhar nisso, ou indicar alguém. Aí ele disse que a
ia ver como estava o caso.
Damous — Ele fixou honorários?
Tacla Durán — Depois de algum tempo. A priori, não. Ele ia levantar
como estava o caso.
Pimenta — Estas tratativas que o senhor teve com ele, o senhor pode
comprovar que elas realmente existiram?
Tacla Durán — Eu tenho as mensagens, eu fotografei as mensagens.
Damous — Qual é o conteúdo dessas tratativas?
Tacla Durán — Eu pedi a ele, ele disse que ia verificar se havia
possibilidade. Não falamos em honorários.
Damous — Verificar o quê?
Tacla Durán — Verificar se havia a possibilidade de fazer o acordo.
Damous — Como é que ele ia fazer isso?
Tacla Durán — Conversando com os contatos dele. Entendi que era o
pessoal da Procuradoria. Um tratativa de uma negociação normal.
Observação: Essa panela, no que diz respeito aos advogados, já se formou
também no caso da Máfia das Falências, revelada nesta série de reportagens.
Segundo o ex-deputado Fábio de Souza Camargo, atual conselheiro do Tribunal de
Contados do Estado, a Máfia dirige a administração de massas falidas para um
restrito grupo de advogados. Marlus Arns e Rosângela Moro já atuaram nesse
grupo.
ZUCOLOTTO É ADVOGADO DO PROCURADOR CARLOS FERNANDO
Damous — Ele tem um cliente procurador, não tem?
Tacla Durán — Eu não sabia, eu soube pela Folha de S. Paulo,
Dr. Carlos Fernando.
Damous — É cliente dele?
Tacla Durán — Eu soube pela Folha. Carlos Fernando dos Santos Lima.
Então conversamos sobre isso, ele ficou de verificar. Aí ele verificou, deu o
retorno e falou que havia a possibilidade de reduzir a multa que estavam
propondo. E que, então, pagaria um terço da multa. No acordo. E pagaria outro
terço como honorários para ele. A partir daí a gente faria a minuta, essas
coisas.
Damous — Formalizaria um contrato de prestação de serviços e
honorários?
Tacla Durán — Não, isso não. A princípio, deixou claro que não. Eu
também não avancei nessa conversa porque, primeiro, eu não fiquei satisfeito
com o que estava sendo proposto. Não em questão de valores, mas em questões
pessoais, porque eu continuava tendo minha atividade penalizada, de advogado,
continuava sendo acusado de coisas que eu não havia cometido. E isso, por
princípio, eu não aceitava. Como eu não aceitava essa questão pessoal, eu não
me preocupei na questão financeira.
Damous — Esse terço que seria pago como honorário dele, como é que
isso seria feito? Ele pediu para formalizar?
Tacla Durán — Não. Informal. Ele, a princípio, pediu informal.
Damous — Informal como? Por fora?
Tacla Durán — Por fora.
Pimenta — Que valor seria isso?
Tacla Durán — Cinco milhões de dólares.
Damous — E esses 5 milhões de dólares seriam para quê? Para ele?
Para viabilizar o acordo?
Tacla Durán — Exato. Como motivo de horários .
Damous - Exato. Mas ele precisaria para ele?
Tacla Durán — Foi a forma como ele colocou. Se ele iria usar de
outra forma, não sei.
Pimenta — O senhor poderia nos disponibilizar cópia desse diálogo
que o senhor teve com o dr. Zucolotto.
Tacla Durán — Sim, eu já submeti à perícia, aqui no exterior.
Damous — Está sendo periciado.
Tacla Durán — Sim, está sendo periciado.
Pimenta — E essas tratativas, feitas no sentido de melhorá-las,
foram feitas com qual procurador?
Tacla Durán — Com quem ele falou? Para falar a verdade, ele não
nominou. O email foi enviado pelos procuradores Roberson Pozzobon, Carlos
Fernando Santos Lima e Júlio Noronha.
Pimenta — Foram eles que encaminharam para o senhor?
Tacla Durán — Enviaram. Enviaram numa sexta-feira e exigiram que eu
fosse assinar na segunda.
Pimenta — Foi antes ou depois da conversa com o Zucolotto?
Tacla Durán — Depois.
Zucolotto — Essa minuta é fruto do trabalho do Zucolotto?
Tacla Durán — Sim.
Damous — Numa dado momento, o dr. Zucolotto disse que traria o
procurador para a negociação?
Tacla Durán — É.
Damous — Isso está nas mensagens?
Tacla Durán — Isso está nas mensagens.
Observação: No livro “Testimonio”, que está escrevendo, Tacla Durán
disse muito mais do que isso.Veja um trecho: "Carlos Zucolotto então
iniciou uma negociação paralela entrando por um caminho que jamais imaginei que
seguiria e que não apenas colocou o juiz Sergio Moro na incômoda situação de
ficar impedido de julgar e deliberar sobre o meu caso, como também expôs os
procuradores da força-tarefa de Curitiba.”
Em outro trecho, ele escreveu: "Ao se prontificar a me ajudar,
Zucolotto explicou que a condição era não aparecer na linha de frente. Revelou
ter bons contatos na força-tarefa e poderia trabalhar nos bastidores”.
Na troca de mensagens com Zucolotto, relevada pela jornalista Mônica
Bergamo, da Folha de S. Paulo, o amigo de Moro teria escrito:
"E você paga mais um terço de honorários para poder resolver isso,
me entende? Mas por fora porque tenho de resolver o pessoal que vai ajudar
nisso.”
Os deputados poderiam (e deveriam) ter aprofundando mais esse ponto.
Haverá uma nova oportunidade, caso a CPI aprove o depoimento de Rodrigo Tacla
Durán.
E-MAIL E MENSAGENS DESMENTEM O JUIZ SERGIO MORO
Damous — O juiz Sérgio Moro afirmou, peremptoriamente, quando essas
informações foram divulgadas, se não me engano pelo jornal Folha de S. Paulo, o
juiz Sérgio Moro veio em defesa do dr. Zucolotto, dizendo que ele atua na área
trabalhista, não atua na área criminal. Disse peremptoriamente. O que o senhor
tem a comentar a esse respeito?
Tacla Durán — Olha, o site do escritório do dr. Zucolotto tem no
portfólio que ele atua, sim, na área criminal.
Damous — E mais. Disse mais o juiz Sergio Moro — eu estou abrindo
aspas aqui. O relato de que esse advogado em questão, Zucolotto, teria
tratado com o réu foragido, Rodrigo Tacla Durán, é absolutamente falso. Ou
seja, esse documento que o senhor tem, da troca de e-mails e a conversa
registrada com o dr. Zucolotto, desmentem o juiz Sergio Moro.
Tacla Durán — Não, eu não troquei e-mails com o dr. Zucolotto sobre
esse assunto. Sobre esse assunto, eu troquei mensagens no Wickr. Há e-mails
trocados do meu escritório com o dr. Zucolotto de anos, em razão do trabalho
que ele prestava para meu escritório como correspondente.
Damous — Eu me refiro ao e-mail dos procuradores.
Tacla Durán — O e-mail dos procuradores é absolutamente verdadeiro,
é da rede do MPF.
Pimenta — Está assinado?
Tacla Durán — Sim, com cópia a três procuradores. Com cópia.
Copiados três procuradores e copiado meu advogado. Meu advogado me encaminhou.
Pimenta — Isso é importante. Depois da troca de mensagens com o
Zucolotto.
Tacla Durán — Sim.
Pimenta — Se o senhor tivesse aceito, teria também subentendido que
o senhor teria aceito também os temos propostos pelo Zucolotto.
Tacla Durán —Sim. Foi depois. Eles encaminharam o e-mail para meu
advogado e meu advogado me encaminhou o e-mail. Nesse e-mail constavam três
procuradores, são os três que eu falei e o meu advogado.
Pimenta — O senhor não aceitou?
Tacla Durán — Não aceitei.
Pimenta — Por quê? Porque continuava ainda penalizando minha
atividade.
Tacla Durán — Pois é. Continuava penalizando. Eles não consideravam
que meu patrimônio — uma das coisas que eles mencionavam como se nele houvesse
irregularidade — é e era de fato declarado. Falava que eu sacava dinheiro.
Minhas contas não têm saque. Que eu recebia de cliente, sacava e devolvia para
o cliente. Isso não aconteceu.
Observação: O comportamento de Moro, diante da revelação da Folha de S.
Paulo, de fazer a defesa do advogado é suspeitíssimo. E esta não é a única
fragilidade. Zucolotto aparece como advogado do juiz — não só amigo —, em uma
ação criminal contra o advogado Roberto Bertholdo, que acusou o juiz de
favorecer Alberto Youssef, no primeiro acordo de colaboração dele, em 2004.
Pela acusação, Bertholdo foi condenado por injúria e difamação. Ele queria
provar que o que disse era verdade, mas a Justiça não abriu o processo para a
possibilidade de exceção da verdade. A outra advogada da ação era
Rosângela Moro, esposa de Sérgio Moro, o que desmente a informações do juiz de
que ambos só compartilhavam o escritório, sem compartilhamento de honorários.
PROVAS OFERECIDAS POR TACLA DURÁN DESMONTAVAM VERSÃO DO MPF E, POR ISSO,
FORAM RECUSADAS
Damous — O senhor tem conhecimento de que o procurador Pozzobon
ameaçou com nova prisão o executivo da UTC, Ricardo Pessoa, para que ele fosse
obrigado a dizer que seus trabalhos eram ilícitos?
Tacla Durán — Sim, foi o que me foi falado.
Damous — Por quem?
Tacla Durán — Pelo advogado Ivan Carratu.
Damous — O Dr. Ivan Carratu quem é?
Tacla Durán — É advogado da UTC. Aí depois eu vim a saber que, de
fato, isso se confirmou, porque, nessa ocasião em que ele me contou, isso aí
estava sob sigilo. Entretanto, quando foi pedida a minha prisão, eu tive
acesso, aqui na Espanha, a cópia, a parte dos autos. Pelo menos é o que chegou
aqui na Espanha. Aí, nesses autos, consta também uma complementação de delação
premiada, com declarações do Ricardo Pessoa e do senhor Valmir Pinheiro. Essas
declarações foram feitas no endereço do escritório da própria UTC, sem a
presença de qualquer autoridade policial ou do Ministério Público.
Subentende-se que estavam sentados na mesma mesa, sem qualquer autoridade, os
dois delatores e seus respectivos advogados. E, diga-se de passagem, uma
advogada deles também é advogada da Odebrecht.
Damous — Qual é o nome?
Tacla Durán — Dra. Carla Domênico. Eles dizem, basicamente, que o
que eles me pagaram eu devolvi a eles em dinheiro. Como? Perguntados pelos
advogados, deles próprios, eles disseram que eu ia regularmente, a cada
determinado tempo, à garagem do prédio da UTC. Isso é mentira. Eu nunca estive
no prédio da UTC, gostaria até de ter a oportunidade porque, até hoje, não tem
inquérito policial, não tem investigação, gostaria de oferecer meus telefones
para que fossem verificados que eu nunca estive nessa região, da UTC. E nessa
situação da questão da UTC e, perguntados pelos advogados: o senhor tem algum
registro da presença dele na garagem? Não, não há.
Tem algum vídeo? Não, não
tem. Outras perguntas que eles fazem lá — ao senhor Valmir —: o senhor sabe
como o Rodrigo transformava ou convertia o dinheiro em espécie? Ele disse que
não sabe nem nunca teve interesse em saber. E juntam documentos. E quais são os
documentos? Os meus recibos da sociedade de advogados, que tiveram impostos
retidos. Documentos que não são nenhum plus, não são nenhuma prova que o
Ministério Público não tivesse. Por exemplo, me chama muito a atenção que são
documentos muito menos valiosos, muito menos importantes, que eu propus ao
Ministério Público entregar, quando tentaram fazer o meu acordo. Entretanto,
eram documentos que desconstituíam essa versão que o Ministério Público criou
em muitos aspectos. Então eu senti, nesse momento, e hoje vendo o que a UTC fez
comigo, e aceito, eu vejo que parte do meu problema — que o meu acordo não foi
aceito — é que eu descontituía uma versão que já vinha sendo criada. Então, em
vez de eu somar, de eu construir uma versão de acusação, eu estava
atrapalhando.
Damous — Com base nessa afirmação de agora, pela sua própria
experiência nessas tratativas, nesse interrogatório, e aquilo que o senhor ouve
ou possa ter ouvido de outras pessoas na mesma situação, o senhor acha que há
um padrão, nessas tentativas de obtenção de delação, um padrão de selecionar
aquilo que interessa, de selecionar aquilo que não interessa, do ponto de vista
da verdade que a operação quer construir?
Tacla Durán — Sem dúvida. No meu caso, como eu trabalhei muito com
a Odebrecht no exterior, eu tinha uma situação de ter mais informação do
exterior, isso também nunca foi do interesse deles. O interesse deles é voltado
ao Brasil, e principalmente voltado a políticos.
Damous — O advogado Vicente Paula Santos, o senhor conhece, já teve
alguma relação profissional com ele?
Tacla Durán — Não, não tive. Mas ouvi falar agora, recente, que ele
foi sócio do Zucolotto ou tem escritório no mesmo endereço. Ou defende ou
defendeu o procurador Carlos Fernando.
Observação: O depoimento de Tacla Durán, nesse ponto, confirma que a
Lava Jato arma situações para produzir resultados pré-definidos. No processo
que envolve Lula, também existem graves acusações de uso de documentos falsos.
Sergio Moro até hoje não autorizou perícia em e-mail que a defesa de Lula diz
serem apócrifos.
MARCELO MILLER QUERIA QUE TACLA DURÁN GRAVASSE REUNIÃO DE ADVOGADOS NA
ODEBRECHT
Pimenta — O senhor teve algum contato com o procurador
Marcelo Miller?
Tacla Durán — Sim, ele esteve presente em uma reunião em Curitiba,
nas negociações.
Pimenta — O dr. Marcelo Miller era da equipe de Curitiba?
Tacla Durán — Não. Ele era de Brasília.
Pimenta — Mas participava da conversa com o senhor?
Tacla Durán — Participavam de Brasília o dr. Marcelo Miller e o dr.
Sérgio Bruno. Eles participaram a partir da segunda ou terceira reunião que eu
tive, não me lembro bem, mas a partir de um momento eles participaram sim. Eles
tinham interesse de saber se eu tinha alguma informação ou situação que pudesse
envolver pessoas de fórum privilegiado.
Pimenta — Marcelo Miller, no caso…
Tacla Durán — Foi a justificativa que me deram para que eles
estivessem presentes na reunião.
Pimenta — O Marcelo Miller, o senhor se recorda de alguma situação
especial dele, nos depoimentos que foram prestados ou nas conversas?
Tacla Durán — Sim. Como eu comentei que havia iniciado uma
negociação, eu procurei ser, primeiro, mais leal e mais franco possível. Nesse
meio, entre uma reunião e outra com a procuradoria, eu havia sido chamado para
uma reunião na Odebrecht, com o advogado na Odebrecht, e para que não houvesse
nenhuma dúvida do meu espírito leal de que eu queria colaborar, etc., de
prestar esclarecimento e resolver a situação, eu comentei a eles que eu havia
sido chamado para uma reunião na Odebrecht. Eu não queria deixar que eles
soubessem de outra forma e parecer que eu estava enganando. Então eu
comuniquei. Quando comuniquei, eles, o Marcelo Miller e o doutor Sérgio Bruno,
eles deixaram claro que tinham interesse em saber o teor ou o conteúdo dessa
reunião.
Damous — Eles queriam que o senhor gravasse a reunião?
Tacla Durán — Sim, o Marcelo Miller.
Pimenta — Falaram formalmente par gravar.
Tacla Durán — Sim, o Marcelo Miller falou para gravar.
Damous — A reunião com os advogados.
Tacla Durán — Sim, daí eu falei: é reunião de advogados, doutor.
Damous - Nisso, o doutor Sérgio Bruno foi um pouco contra. Ele se
mostrou contrário ao que vinha sendo proposto. Ele disse: você vai lá e conta
para nós depois.
Pimenta — Mas ele chegou a pedir que o senhor gravasse a reunião
com os advogados.
Tacla Durán — O Miller sim.
OBSERVAÇÃO: A declaração de Tacla Durán reforça a suspeita de que
Marcelo Miller orientou o dono da JBS, Joesley Batista, a gravar Michel Temer e
Aécio Neves. Esse tipo de orientação enfraquece o valor da prova, já que pode
ser considerado como atitude não espontânea, flagrante armado com auxílio de
autoridades.
PROCURADOR IRMÃO DE ADVOGADO QUE RECEBE PARA ORIENTAR DELAÇÃO DISSE NO
TELEFONE: “ELE VEM CONTAR HISTORINHA OU CONFESSAR CRIME?"
Pimenta — Quem é o senhor Orlando Martello? Procurador também?
Tacla Durán — Acho que ele é um dos procuradores.
Pimenta — Mas o senhor nunca teve contato com eles.
Tacla Durán — Nunca.
Pimenta - O senhor Diogo Castor.
Tacla Durán — Diogo Castor de Mattos, ele foi o procurador que
atendeu o primeiro telefonema do meu advogado, o dr. Leonardo Pantaleão, ele
atendeu o telefonema e foi com ele que o Leonardo marcou a primeira reunião.
Ele inclusive falou para meu advogado: o seu cliente vem aqui contar historinha
ou vem aqui confessar crime? Porque, se vir aqui contar historinha, não precisa
nem vir.
Pimenta — Diogo Castro e Rodrigo Castro?
Tacla Durán — Me parece que é irmão dele. É advogado. Não conheço o
Rodrigo. Eu sei que ele advogou aí para algumas pessoas.
Pimenta — Nas delações?
Tacla Durán — Sim, nas delações. Advogado do Carlos Alberto Pereira
da Costa, se não me engano.
Pimenta — João Santana?
Tacla Durán — Eu li notícias que sim.
Observação: Há outros advogados especializados em delação premiadas que
têm relações próximas com o Ministério Público Federal de Curitiba e o juiz
Sergio Moro. Marlus Arns é um deles, que já advogou com Rosângela Moro, na
defesa de uma massa falida no Paraná, administrada por uma família acusada de
chefiar a Máfia das Falências. Marlus e Rosângela também são ligados à Federação
das APAEs, de Curitiba. Como diretora jurídica da Federação, Rosângela
encaminhava a Marlus as ações das diversas APAEs do estado.
PROFISSIONAIS QUE ORIENTAM DELAÇÃO AGEM COMO ADVOGADOS DE PORTA DE
CADEIA
Damous — Me diz uma coisa: o senhor está escrevendo um livro?
Tacla Durán — Sim.
Damous — A respeito do quê?
Tacla Durán — É um livro contando um pouco de todos os
acontecimentos, de tudo o que eu passei, preso também. Antes de ser preso.
Estas tentativas de acordo, como foram os meus contatos com diversos países
sobre os acontecimentos. Eu atendi autoridades de Andorra, dos Estados Unidos,
da Suíça, Equador, não só as brasileiras. As brasileiras, na verdade, foram as
únicas que eu não consegui atender.
Damous — O que o senhor pretende com esse livro?
Tacla Durán — Eu não terminei nada ainda. Eu, na verdade, estava
escrevendo tudo, eu comecei a fazer quando estava preso. Mais uma forma de
passar o tempo. E eu não terminei. Vazou aí, infelizmente, eu estava fazendo um
trabalho gráfico para poder ir arquivando, e acabou vazando.
Damous — Me diz uma coisa. Me ocorreu agora. A partir da sua
experiência, daquilo que o senhor tem conhecimento, da experiência de outros
que passaram…
Tacla Durán - Só um parênteses sobre o livro. Eu não publiquei,
ainda não está pronto, eu não sei exatamente quando vai estar pronto, se vai ser
publicado, porque eu tenho agora essa questão com a OAB. Porque ela entende que
eu, por ter dado uma entrevista à Folha de S. Paulo, eu havia quebrado o sigilo
profissional. Entretanto, eu sou acusado pela empresa, que diz que eu não era
advogado. É uma situação inusitada. Se a OAB entende que houve quebra de
sigilo, então eu sou advogado, como, de fato, eu era. Entretanto, para me
defender, o dr. Wadih conhece bem o estatuto, o código de ética, eu posso me
defender, eu devo me defender.
Damous — Claro.
Tacla Durán — Então a OAB abriu procedimento, eu vou responder, vou
respeitar, vou lutar pelo meu direito de ser advogado e as minha prerrogativas.
Embora tem aí uma situação, extra a ser advogado ou não a empresa, ao fazer o
acordo de leniência, ela (a Odebrecht) abriu mão do seu próprio sigilo. Se
alguma coisa que eu estou falando, está incomodando, e significa que ainda está
sob sigilo, subentende-se que ela, então, não abriu todo o sigilo. Se ela não
abriu todo o sigilo, ela está irregular com o acordo que ela firmou. Eu, como
não aderente ao acordo dela, com o Ministério Publico, não tenho como saber o
que ela quebrou de sigilo ou não, mas que eu sei é que ela deveria abrir todo o
sigilo. Então, eu entendo que, nesse procedimento ético que eu estou respondendo,
e eu tenho muito liberdade de falar para você, Vossa Excelência, por ter sido
presidente da Ordem (dirigindo-se a Wadih Damous), tem conhecimento do assunto
tecnicamente. Inclusive tem a perda de objeto. Porque, se uma empresa abre o
sigilo, por que ela exige o sigilo em relação a mim? Ainda mais querendo me
defender. Mas eu vou respeitar o procedimento.
Damous - Vou fazer uma última pergunta ao senhor: pela sua
experiência como advogado ou por tudo aquilo que o senhor está passando, Enfim,
ao longo da vida, nós às vezes somos procurados por pessoas não por força da
capacidade técnica — algumas pessoas acham, ele é amigo do juiz. É muito comum,
por exemplo, na área criminal, o advogado de porta de cadeia, chamado de
advogado de porta de cadeia. Eu não gosto desse tipo de expressão, é
preconceituoso. Mas as pessoas procuram aquele advogado que aparece porque é
amigo do delegado, que é amigo do carcereiro, porque é amigo do investigador,
do escrivão. Você está percebendo isso, a existência desse tipo de
profissional, nessas operações, ou seja, o advogado que é contratado, que é
procurado porque tem condições de resolver o problema.
Tacla Durán — Sem dúvida. Sem dúvida nenhuma. Nós, na nossa
profissão — a questão que você levantou do porta de cadeia, uma expressão
que denigre inclusive a classe, eu não vejo de maneira saudável, mas nós não
podemos dizer que não existe. Existe. Existe o advogado da madrugada, que é
chamado quando tem um problema de noite na delegacia. Isso é uma coisa inerente
na nossa profissão. Conhece o escrivão, o delegado do plantão. Eu acho que a
única coisa que a gente deve traçar um paralelo, acontece, é que esse tipo de
ambiente, de crime, etc., de delegacia, na madrugada, que acaba entrando esse
tipo de profissional atuando, foi trazido para dentro da Operação Lava Jato.
Pimenta — O senhor acredita que, assim como existiam ou existem
advogados que têm mais facilidade, em função das suas relações para agilizar a
soltura de alguém de uma delegacia na madrugada, existem advogados que
especializaram pelo relacionamento que têm no mundo jurídico da Lava Jato?
Tacla Durán — A única coisa é que muda o crime e muda o ambiente.
Na delegacia.
Pimenta — E os valores.
Tacla Durán — E os valores. O modus operandi é o mesmo.
Damous — Parece que o Dr. Zucolotto atuaria nesse sentido.
Tacla Durán — Pode ser, pode ser. Como outros profissionais. São
competentes. Não é a questão. Cada profissional na sua área. É uma forma de
atuar.
Observação: As delações premiadas começaram a ser feitas por uma advogada
sem nenhuma expressão, Beatriz Catta Preta, que foi durante muitos anos
defensora de Lúcio Funaro, agora delator, mas em Brasília. Beatriz começou a
carreira no escritório do ex-desembargador federal Pedro Rota, em São Paulo. É
casado com um ex-operador do mercado paralelo, preso no passado com dólares
falsos. Beatriz Catta Preta, depois de fechar uma série de acordos de delação
em Curitiba, anunciou que estava desistindo da advocacia e mudando de endereço.
Iria morar nos Estados Unidos.
TACLA DURÁN ESTÁ DISPOSTO A DEPOR NA CPI POR VIDEOCONFERÊNCIA
Pimenta — Dr. Rodrigo Tacla Durán, a gente quer concluir esse
conversa, dizendo da importância das questões que foram colocadas, a denúncia
de que planilhas, de extratos que suportam a delação da Odebrecht, são
documentos que foram elaborados para a delação, não o contrário. Ou seja, a
delação estar sustentada em documentos previamente existentes, revela um modus
operandi que também concorreu na delação da JBS, possivelmente da UTC, que,
enfim, o senhor que teve oportunidade de prestar depoimento nos Estados Unidos,
em outros países, consegue perceber essa distinção de procedimentos
investigatórios do Ministério Público e de órgãos governamentais do Brasil e de
outros países?
Tacla Durán — Sim, sem dúvida. Eu atendi diversos países, na
qualidade de testemunha. E, em alguns deles, a condição de testemunha teve que
aguardar uma certa maturação entre o que era informação privilegiada no sentido
da investida de advogado até para não contaminar o caso, porque seria uma prova
nula, e, a partir de determinados parâmetros, respeitadas as prerrogativas de
advogado, eu poderia ser testemunha. Como, de fato, aconteceu. Eu vejo que
alguns países, no caso que eu tive, tem a mesma legislação de acordo como
outros não têm. O Brasil não tinha. E a justiça não deixa de ser tão eficaz ou
não por conta da legislação do acordo.
Damous — Para encerrar mesmo: O senhor estaria disposto a depor,
publicamente, perante órgãos brasileiros acerca de tudo o que foi relatado
aqui?
Tacla Durán — Sim, eu sempre estive à disposição. Colaborei com
outros países, não teria por que não com o Brasil. Repito: eu nunca depus na
Polícia Federal, porque meu processo, minha denúncia, não tem inquérito
policial. Então eu nunca fui ouvido. Eu nunca consegui esclarecer. Deturparam
as minhas informações fiscais. Escreveram e falaram, e deram entrevistas
dizendo o que queriam. E eu nunca fui ouvido. Nunca consegui. Então, não tem
problema nenhum. Eu já tinha colocado à disposição, me colocado à disposição da
Comissão de Segurança Pública, da Câmara dos Deputados. Houve um problema
técnico, acabaram adiando. Mas estive à disposição.
Damous — O senhor não foi mais procurado pela Comissão.
Tacla Durán — Não, não mais.
Pimenta — O senhor tem uma documentação muito grande, que envolve
autoridades de diferentes países, autoridades judiciárias, informações
bancárias, e toda essa informação disponibilizada certamente será periciada,
objeto de análise, mas, com certeza, são muito relevantes e demonstram, de
fato, um procedimento em relação às chamadas delações, que colocam em cheque
esse próprio instituto da maneira como ele vem sendo observado. O senhor
gostaria de colocar mais alguma questão para nós concluirmos essa nossa
conversa?
Tacla Durán — Eu estou à disposição, da Câmara ou de qualquer
autoridade brasileira. Sempre que procurado, eu vou procurar e ajudar dentro do
que for possível, como foi a minha trajetória nesse processo todo que foi até
agora.
Pimenta — Quero agradecer então ao Rodrigo Tacla Durán, ao Dr. Emílio.
Observação: É muito estranha a atitude da Comissão de Segurança Pública
e Crime Organizado da Câmara dos Deputados, presidida pelo deputado Capitão
Augusto. Marcou e desmarcou a audiência, alegando problemas técnicos. Hoje,
isso é injustificável. Qualquer aplicativo, como Skype pode viabilizar uma
transmissão à distância. Pode fazer isso até por WhatsApp. Houve alguma
interferência política para que o depoimento não se realizasse.
TACLA DIZ QUE NÃO É FORAGIDO E É VÍTIMA DE UM MANDADO DE PRISÃO ILEGAL
Tacla Durán — Só uma questão, doutor. É que falam por aí: foragido,
etc. Veja bem: eu vejo as delações, os acordos de delação aí do Brasil, e isso
falo como advogado, que isso se transformou em um instrumento de defesa. E isso
vale, porque todo mundo pode se defender como deve. Mas, para se defender de
uma prisão preventiva, na maioria das vezes arbitrária e ilegal. Eu até contei
esta via do direito como um dispositivo de defesa. Entretanto, diante de como
caminham as coisas no Ministério Público Federal, que além de não fazer o
acordo comigo, sempre inviabilizou e trabalhou contra que eu fizesse o acordo
em outros países. Diante desse quadro, eu como advogado quero ter estratégia
que eu passei a usar que eu usei, a extradição como procedimento jurídico válido,
regular, um instituto que é reconhecimento na legislação de diversos países
como defesa a uma prisão preventiva ilegal e arbitrária. Minha extradição foi
tirada desta forma: como estratégia de defesa diante dessa irregularidade,
dessa ilegalidade. Não sou foragido, tenho meus passaportes em mãos.
Posso
viajar para onde eu quiser, quando eu quiser, respondi a todos os processos
aqui na Espanha, carta rogatória, a todos os procedimentos de cooperação
internacional e de outros países. Eu só não posso viajar, porque sou ameaçado
pelas autoridades brasileiras, de quererem insistir em fazer uma detenção
ilegal preventiva. Preventiva é o quê, depois de responder a tudo isso que
respondi? Eu não estou fugindo, tenho endereço, tenho domicílio, profissão. Se
eu fosse foragido, a Justiça daqui teria me prendido. Eu não sou foragido. Só
queria deixar esse registro, claro. Se pudesse, eu iria até a Câmara dos
Deputados pessoalmente. Não vou por isso. Então, para atender a qualquer
autoridade, etc., nesse momento. Por que a 13a. Vara de Curitiba insiste nessa
ilegalidade, eu tenho que, infelizmente fazer essa colaboração a meu país à
distância, via videoconferência.
Observação: de fato, Rodrigo Tacla Durán não foi preso quando estava nos
Estados Unidos e a prisão foi decretada. Ele viajou dos Estados Unidos para a
Espanha e não foi detido, apesar do determinação de Moro de colocar o nome dele
na Interpol. Ele foi preso em solo na Espanha, em um hotel, depois que
desembarcou. A Justiça julgou o pedido de extradição, concedeu no primeiro
julgamento, mas negou no recurso. Tacla Durán tem nacionalidade brasileira e,
filho de espanhol, também espanhola. A Espanha não extradita seus nacionais. A
justiça decidiu que, se o Brasil quiser, deve mandar as provas que Moro tem
para lá e, em corte espanhola, ele seria julgado. Moro não mandou prova
nenhuma, mas decidiu processá-lo em Curitiba, à revelia.
GGN/DCM
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