A crise
política entra em um momento crítico, submetido as uma ampla entropia.
O único fio
condutor da aliança – o antipetismo – esfumaçou-se. A facilidade de atribuir
todos os males do país à Presidência volta-se contra o golpe. E o fato da Globo
pular do barco Temer e tentar comandar o próximo barco tornam ela – e o MPF –
daqui por diante, os únicos responsáveis por tudo de mal que acontecer no país.
Sem o fator
de coesão, o golpe tornou-se um vale-tudo. De um lado, Temer mantem aliados
comprados a peso de ouro – deputados, com cargos e emendas; imprensa, com
verbas publicitárias. Mas esse jogo de interesses vale apenas até o momento em
que cai a ficha de que o governo não tem mais futuro.
E se está
muito perto desse momento.
Com essa
investida sobre Temer, sem a blindagem do antipetismo, a Globo definitivamente
virou o fio. Ela e o MPF se tornam – agora, aos olhos de todos – os grandes
agentes de desestabilização do país.
Essa pode
ser a grande contribuição dela, de se tornar o fator de aglutinação do que
resta de bom senso no quadro político atual. E, tudo isso, poderá desembocar em
eleições diretas-já.
Vamos
entender um pouco melhor os desdobramentos do golpe.
Momento 1 – o avanço do estado
policial
Por qualquer
ângulo que se olhe, por qualquer capivara que se analise, a operação da
Procuradoria Geral da República contra o presidente da República foi abusiva.
Amplia-se de forma inédita o estado policial no país, com a delação e o grampo
entrando por todos os poros da vida nacional, incutindo a desconfiança em todas
as relações sociais e convertendo o país no paraíso dos criminosos delatores
Gravar um
presidente da República – ainda que seja um desqualificado como Michel Temer –,
e expô-lo ao julgamento de uma emissora de televisão é de uma gravidade
extrema, típica de países doentes.
Essa conta
será cobrada da Globo e do Ministério Público Federal, ao menor sinal de
recomposição do poder político.
Mesmo assim,
não se pode varrer para baixo do tapete o que foi levantado.
Trata-se do
presidente mais sem noção e mais inescrupuloso da história.
Momento 2 - dar baixa no governo
Temer
A desfaçatez
de Temer, de reunir-se às escondidas, em pleno Palácio do Jaburu, com seu maior
financiador, é do mesmo nível da falta de limites de sua turma, Eliseu Padilha,
Moreira Franco, Geddel Vieira Lima. A única coisa que os diferencia é o uso da
mesóclise.
Agora,
aliados antigos e eventuais, oportunistas de todas as espécies, pulam do barco:
não há a menor probabilidade de sobrevivência do governo Temer.
É uma guerra
inglória. Temer é uma das fichas mais sujas da República. Há um caminhão de
episódios e evidências o envolvendo que, certamente, não estão restritos aos
grampos praticados.
O que já se
sabe sobre suas estripulias garantem um mês de cobertura diária da Globo.
A ficha conhecida de Temer
1. O coronel
da reserva da PM, José Antunes Sobrinho, há muitos anos conhecido como
receptador de caixa 2 para Temer e cujos arquivos foram recolhidos pela
operação. Há tempos sua atuação era conhecida da Lava Jato do Paraná, que nada
fez para aprofundar as investigações (https://goo.gl/h1xXbC).
2. Os
esquemas com José Yunes e seu arquipélago de offshores, já levantados anteriormente
(https://goo.gl/FlcCEE).
3. O longo
histórico do deputado Rodrigo Rocha Loures, um dos principais operadores de
Temer, que, mesmo assim, teve o atrevimento de levá-lo para dentro do governo.
4. Os negócios
com o grupo Libra. Aliás, basta a PGR consultar a AGU (Advocacia Geral da
União) sobre as pressões pessoais de Temer, para validar um acordo
administrativo que livrasse a Libra de uma multa bilionária. Ou então as
matérias mostrando as jogadas de Wagner Rossi (outro operador de Temer), quando
presidente da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) com Temer
(leis os comentários do post https://goo.gl/7txeZh).
Em nenhum momento a Lava Jato se interessou em agregar esses inquéritos em suas
investigações.
As provas da JBS
É
ingenuidade supor que o PGR Rodrigo Janot e o Ministro Luiz Edson Fachin
investiriam contra Aécio Neves e Temer baseados apenas nas delações. É evidente
que estão ancorados em quilos de documentos.
Além disso,
houve busca e apreensão de documentos e equipamentos em locais críticos para
Temer, como os escritórios da Argeplan.
Momento 3 – a guerra da mídia
A perícia técnica na gravação
Nenhum
jornalista minimamente experiente bancaria o laudo do tal perito-corretor de
imóveis. É um documento tecnicamente vergonhoso. Tem o mesmo valor do
laudo de Francisco Molina sobre a bolinha de papel no cocoruto do José Serra.
Um laudo imprestável em que o perito usa o programa Audacity, meramente indica
pontos de defeito na gravação, e termina taxativo dizendo que a prova é
inservível.
O Audacity é
tão amador que até eu tenho no meu computador para digitalizar LPs.
O apoio volátil dos jornais
O apoio da
Folha e do Estadão a Temer durará o tempo justo para que um próximo governo de
coalizão garanta a manutenção do pacote publicitário montado pelo ínclito
Eliseu Padilha.
Aliás,
bastará um deputado ou senador requisitar à Secom, Petrobras e Caixa Econômica
Federal os mapas de mídia e de patrocínio para minar o apoio.
O álibi da estabilidade econômica
Otávio Frias
Filho, da Folha, abriu mão da prudência e saiu a campo defendendo Temer com um
discurso sem nexo (https://goo.gl/UinykA):
Temer seria um novo Campos Salles que estaria se sacrificando, preparando o
terreno econômico para que o seu sucessor possa brilhar.
Um teto de
despesas não-factível, reformas radicais enfiadas goela abaixo da população,
com 90% de desaprovação, cortes radicais em programas sociais ao mesmo tempo em
que amplia os limites das emendas parlamentares, aparelhamento geral do Estado,
inclusive em áreas antes preservadas, como a Eletronuclear, comprometimento de
40% do orçamento com juros, tudo isso e uma expectativa de crescimento de menos
de um ponto, depois de 8 pontos de queda, é uma preparação de terreno para o
caos, não para o paraíso.
Além disso,
se um dos elementos da estabilização é a previsibilidade, como pensar em
estabilidade econômica, com um presidente que pode, a qualquer momento, ser
denunciado, processado, condenado, apeado do poder e preso?
O único
ganho da Folha foi trocar a coluna semanal de Aécio por Marcos Augusto
Gonçalves, que nos brindou com um artigo-lava-alma (https://goo.gl/3M6TzO).
Mais
prudente foi o Estadão, jogando na conta do repórter ] matérias como esta (https://goo.gl/IU8hHw), na qual o aquário
manda o título e o lide e o pobre repórter é obrigado a correr atrás do
recheio. Sai isso, só generalidades.
Movimento 4 – o estado policial da
Globo e do MPF
Com a aposta
na queda de Temer, a Globo e o MPF (agora, através do Procurador Geral da
República) atravessam definitivamente o Rubicão. Para o seu público, não há
mais o álibi do antipetismo e nem o falso salvacionismo econômico que embasou a
campanha do impeachment de Dilma. Trata-se exclusivamente de uma disputa de
poder, incompatível com qualquer quadro de normalidade democrática.
Ontem à
noite, um evento juntou mais de 200 advogados de todas as linhas políticas –
incluindo a OAB-SP – contra o arbítrio. Parte relevante integrava até outro dia
o clube de aliados incondicionais da Globo e dos defensores do impeachment.
Enquanto
isto, o programa Fantástico de ontem abusava do massacre. Transformou em
escândalo até o fato de um funcionário do BNDES ser membro do Conselho
Deliberativo da JBS (https://goo.gl/jna8Oc). Meu Deus! Qualquer
repórter minimamente bem-intencionado e informado saberia que grandes
acionistas de empresas – como é o caso do BNDES com a JBS – tem assentos no
Conselho Deliberativo. Como criminalizar assim uma pessoa, para dezenas de milhões
de espectadores, com base apenas nesse fato?
O maior
exemplo da perda de rumo da Globo é o comportamento de seus jornalistas.
Comportam-se como caubóis bêbados em saloons de filmes de faroeste, atirando a
esmo, em qualquer vulto que se mova, típico de um exército obedecendo a ordens
genéricas, sem uma estratégia sequer.
Movimento 5 – diretas-já
Diretas-já
ainda é uma proposta em andamento. Não há elementos para afirmar que será
vitoriosa. Dependerá de uma desarrumação ainda maior no jogo político do golpe.
Mas, de
qualquer modo, há sinais de tentativas de, finalmente, discutir um pacto
nacional. Até Fernando Henrique Cardoso, escorregadio como um bagre ensaboado,
começa a se dar conta da loucura da campanha delenda PT.
O pacto
político terá enormes desafios pela frente.
Desafio 1 – livrar o país da bancada
da JBS e Odebrecht
Não é
desafio trivial, mas é urgente. Teria que haver eleições gerais com mudanças na
legislação eleitoral. Derrubado Temer, há o risco de Rodrigo Maia assumir.
Desafio 2 – coibir os superpoderes da
Globo
Os episódios
Dilma e Temer comprovam que é impossível a um país democrático conviver com o
poder concentrado em uma organização jornalística como a Globo. É tarefa de
todas as forças democráticas, assim que for eleito um novo presidente.
Desafio 3 – mudanças estruturais no
MPF e no Judiciário
Graças aos
seus penalistas, o MPF se tornou um poder ameaçador, em que pese a enorme
contribuição ao país da parte dos direitos humanos e difusos. Os abusos de
poder de procuradores e juízes de primeira instância arrostam princípios
mínimos de direitos individuais.
O novo
presidente terá que alterar as formas de escolha do Procurador Geral e de
indicação do próprio Conselho Superior do Ministério Público. E empreender uma
enorme discussão política, para trazer o Conselho Nacional de Justiça ao seu
leito constitucional, de fiscal do Judiciário.
Há dois caminhos pela frente:
A eleição
indireta, visando preparar o país para as eleições de 2018.
Nesse caso,
dos nomes aventados, o ex-Ministro Nelson Jobim é o favorito, por sua
familiaridade com o PSDB e com o STF, com o militares e com Lula.
Eleições diretas.
Haverá dos
grupos em disputa: os lulistas e os antilulistas. A governabilidade só será
assegurada se, antes, houver esse pacto para o fortalecimento do centro
político.