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segunda-feira, 3 de agosto de 2020

XADREZ DA LAVA JATO COMO BODE EXPIATÓRIO DA HIPOCRISIA NACIONAL, POR LUIS NASSIF

A Justiça de Transição que o país necessita não é a a execração pública de pessoas, não é ajoelhar no milho nem se vergastar em público. É uma desafio institucional, um pacto entre poderes, especialmente aqueles que mais responsáveis pelo macarthismo do período anterior, assumindo as culpas institucionais.
PEÇA 1 – A JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO
Justiça de Transição é o sistema de julgamentos que sucede a cada período ditatorial. Consiste, de um lado, no levantamento da memória do período, de expor as chagas dos crimes cometidos, dentro do lema “para que não se esqueça, não se repita”. Depois, na reparação dos crimes cometidos. No caso das famílias de desaparecidos, em indenização financeira e pedidos oficiais de desculpas em nome do Estado que acobertou ou comandou os crimes. Depois, no financiamento de iniciativas que ajudem a lembrar os crimes – como, por exemplo, restauração de locais onde se praticava a tortura, construção de museus de memórias etc.
A lógica da Justiça de Transição é deixar claro para o país – e, especialmente, para quem praticou ou foi omisso em relação aos crimes – que tais crimes não podem passar impunes e não podem se repetir. No mínimo, há que se ter uma condenação moral e pública para constranger os que tentarem, no futuro, repeti-los.
No caso da ditadura brasileira, não houve a justiça de transição. Na Constituinte, alguns juristas   negociaram o esquecimento com as Forças Armadas, com o entendimento de que a Lei da Anistia absolvia todos os crimes, mesmo aqueles considerados crimes contra a humanidade.
Foi um acordo tão hipócrita que foram englobados nesse pacto até crimes cometidos após a promulgação da lei – como o atentado do Rio Centro e o assassinato da secretária da Ordem dos Advogados no Rio de Janeiro, assim como os atentados a bancas de revistas e tentativas de jogar bombas no centro do Rio.
Os responsáveis por esse pacto foram basicamente Sepulveda Pertence e Nelson Jobim que, mais tarde, tornaram-se Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Nas Forças Amadas, o pacto resultou em um processo de afastamento dos homens dos porões – os militares que estiveram na linha de frente da guerra suja, matando, torturando. Houve recompensas, para que pudessem iniciar a vida civil. Alguns ganharam garimpos, como foi o caso do Major Curió. Outros tornaram-se seguranças de bicheiros. Muitos criaram esquadrões da morte em vários estados. Grande parte ajudou a criar as milícias, que passaram a ocupar territórios inteiros em alguns estados.
A falta da Justiça de Transição permitiu, finalmente, que as milícias e os subterrâneos ganhassem o poder, através da eleição de Jair Bolsonaro.
A revisão da Lei da Anistia repousa há anos na gaveta do Ministro Luiz Fux, do STF, dentro da obscuridade que marca os pedidos de vista da casa.
PEÇA 2 – A DITADURA CIVIL INSTALADA
Há enormes semelhanças entre a ditadura atual e o período pós 64, e entre os porões da ditadura e a Lava Jato.
Digo ditadura atual porque, desde que começou a campanha pelo impeachment, os direitos foram suprimidos no país – bem antes da chegada de Bolsonaro e preparando o terreno para ele. No período pós 2013, o discurso de ódio foi mais radicalizado ainda na mídia. Os Tribunais, especialmente de primeira instância, se envolveram no jogo político e toda forma de arbitrariedades foi cometida.
O Ministério Público Federal, em função da irresponsabilidade e exibicionismo dos procuradores da Lava Jato Curitiba e do Distrito Federal, tornou-se o bode expiatório responsável pelo estado de exceção. Mas o clima de exceção perpassou todos os poderes.
Algumas exemplos desse estado de exceção:
1. A humilhação dos funcionários do BNDES, submetidos em bloco a conduções coercitivas com acompanhamento de toda a mídia, por denúncia do Ministério Público Federal do Distrito Federal.
2. Julgamentos midiáticos em cima de denúncias falsas, como as acusações contra o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e operações contra o ex-governador de Minas Gerais Fernando Pimentel, posteriormente arquivadas, mas que alimentaram as manchetes durante meses.
3. Procurador entrando em presídios e humilhando políticos presos, no episódio envolvendo o ex-governador Sérgio Cabral Filho. Condução de Cabral algemado nas mãos e nos pés pelo delegado federal Igor de Paula.
4. Juíza intimando o cientista Elisando Carlini, por ter participado de um evento para discutir as propriedades medicinais da maconha.
5. Invasão da Escola Florestan Fernandes, com policiais civis paulistas arrombando janelas e intimidando idosos e alunos da escola.
6. O caso Rafael Braga, o catador de recicláveis preso em 2013 durante ato público do qual sequer participava, com suspeita de flagrante forjado. Contraiu tuberculose na prisão.
7. Jovens presos em uma operação em que houve espionagem por parte de um militar. Indiciados em um caso claro de flagrante forjado. Procuradores da República correram ao local, para impedir abusos contra a moçada. Foram denunciados ao Conselho Nacional do Ministério Público por colegas do MP de São Paulo, por se intrometer no trabalho dos colegas paulistas – que não compareceram ao local.
8. Juiz de Brasilia que quase matou José Genoino, ao proibir que recebesse atendimento fora da prisão, mesmo depois de ter sido submetido a uma cirurgia cardíaca de alta complexidade.
9. Prisão de lideranças da Frente de Luta pela Moradia em São Paulo, com falso flagrante imputando a elas práticas cometidas pelo tráfico.
10. Manipulação da sentença contra Lula pelo TRF4, com os três desembargadores majorando a sentença na mesma proporção, para impedir qualquer recurso, depois de constatado que a sentença inicial de Sérgio Moro, por engano, permitiria colocar Lula em liberdade.
11. Busca e apreensão na casa de um dos filhos do Lula pela Policia Civil paulista, tendo como justificativa um telefonema anônimo.
12. Grampo no Palácio do Planalto, a pretexto de controlar os celulares da Papuda.
13. Operação Carne Fraca, que comprometeu a carne brasileira nos mercados mundiais, transformando um problema de corrupção de fiscais sanitários em uma crise do setor.
14. Proibição para que diversas universidades ministrassem cursos sobre o golpe militar de 1964.
15. Ação concatenada de Tribunais Regionais Eleitorais, autorizando invasão de diversos campus universitários pela Polícia na véspera das eleições de 2014.
16. Ação coordenada da Polícia Federal e da Controladoria Geral da União permitindo invasão de campus universitários e humilhação de professores, levando ao suicídio o reitor Cancellier, da Universidade Federal de Santa Catarina.
17. O jornalista mineiro premiado, jogado na cadeia pela polícia civil de Minas Gerais, por críticas a Aécio Neves.
Nenhum desses abusos foi denunciado como tal pela mídia na época. Sequer provocou um respiro de indignação democrática. Nenhum dos responsáveis respondeu a qualquer processo por crime de abuso de autoridade e sequer a uma condenação pela mídia. Convalidou-se o Estado de Exceção com a mídia praticando o jornalismo de guerra e os tribunais aplicando o direito penal do inimigo.
Agora, depois que o furacão Bolsonaro mostrou um perigo concreto, há um aggiornamento rápido e oportunista dos principais agentes do período de trevas, na mídia e nos tribunais superiores, assumindo a função de arautos da democracia e dos direitos. Pode-se criticar a Lava Jato sem risco.
Os crimes contra a democracia foram esquecidos e, como tal, estão sujeitos a serem repetidos.
PEÇA 3 – O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Assim como a mídia, desde o mensalão o STF avalizou as arbitrariedades e ilegalidades da Lava Jato e convalidou aquelas politicamente mais relevantes, todas – repito TODAS – as que tinham implicações diretas em favor do impeachment e da prisão de Lula.
1. A votação da prisão após 2a instância, que poderia abrir espaço para a libertação de Lula antes das eleições. A Ministra Rosa Weber, originalmente contra a prisão em 2a instância, mudou seu voto em nome da “colegialidade” – isto é, para não ficar contra a maioria. Seu voto, por ser de desempate, definiria a maioria. Ou seja, antes de ser proferido, não havia maioria e, portanto, nenhuma razão para a tal colegialidade. Seu voto foi recheado de citações de juristas internacionais. Um repórter da Folha, na época, consultou a jurisprudência do STF e constatou que a maioria dos juristas citados constavam de votos do Ministro Luiz Edson Fachin, jamais de Rosa Weber.
2. Os algoritmos do Supremo e do Tribunal Superior Eleitoral, com os sorteios dos casos mais sensíveis sempre caindo com Ministros dos quais já se sabia de antemão a posição  – os de Lula e Dilma com Ministros anti-PT; os de Aécio Neves e José Serra com Ministros pró-PSDB, em ambos os casos os mesmos.
3. A autorização para a prisão de um senador da República, com base em uma grampo induzindo a uma informação falsa – a de que Lula e André Esteves, do BTG Pactual, teriam proposto uma fuga a um dos delatores da Petrobras. Notícia falsa, mas que permitiu novas prisões preventivas.
4. Impedimento de Lula assumir a Casa Civil de Dilma com base em um grampo triplamente falso: fora do prazo permitido; envolvendo conversa com a presidente da República, portanto fora da alçada da 1a instância; por não dizer respeito aos fatos investigados, não poderia ter sido divulgado. Mesmo assim, foi acatado pelo STF.
É canhestra a tentativa de atribuir os recuos do STF a um mero Twitter do general Villas Boas. Ou mencionar algumas discordâncias do STF em relação à Lava Jato, em episódios de menor relevância, como álibi para apagar a história do período. A opinião militar ganhou peso porque, antes disso, o jornalismo de guerra convalidou o vale-tudo contra os adversários políticos, transformados em inimigos.
Desde o mensalão, o fuzilamento moral pela mídia impôs o discurso de ódio, o primado de que os fins justificam os meios, promovendo  escrachos em aeroportos contra qualquer Ministro que ousasse conceder o reconhecimento dos direitos dos réus, por mais inexpressivos que fossem seus gestos – meramente acatando um embargo de declaração, por exemplo.
PEÇA 4 – O NOVO PACTO DA ANISTIA
Assim como no fim da ditadura, esboça-se atualmente um novo pacto de anistia.  É relevante por duas coisas: por explicitar a ansiedade dos pactuadores em superar rapidamente o clima irrespirável do momento; mas por se saber claramente, hoje em dia, os resultados de sair dos períodos de exceção sem uma justiça de transição, sem punição – ainda que meramente moral -, uma autocrítica, um pedido público de desculpas pelo mal que causaram, abrindo espaço para a ascensão das bestas do Apocalipse na condução do país.
A falta de punição permite a instrumentalização dos princípios e a reiteração dos abusos. O sujeito, jornalista, político, homem público, Ministro, pula de um barco para outro e pode voltar para o barco inicial sem risco de ser exposto e podendo retornar daqui a pouco ao barco do golpismo.
A força desses homens-bambus (que acompanham o movimento dos ventos) reside em sua exposição pública. A imagem pública de alguém deveria ser a síntese dos atos que pratica. E um dos atributos é a coerência em torno de princípios claros. Bolsonaro é coerente, no alinhamento com a barbárie. Mas os novos campeões da democracia, não são. Nós sabemos o que eles fizeram nos últimos verões.
Não se trata de revanchismo, de criminalizar pessoas, mesmo porque o grande pacto nacional tem que se dar em torno de um amplo processo de pacificação. Mas se trata de expor e condenar as práticas nas quais incorreram.
Juristas progressistas, que avalizaram o impeachment, precisam admitir que transformar um problema contábil em crime de responsabilidade é uma violência contra a democracia. Ministros do STF que aceitaram o estupro da Constituição, sob o argumento de que a presidente tinha perdido condições de governabilidade, tem que assumir que seu papel é defender a Constituição. Imprensa que praticou, e ainda pratica, o jornalismo de guerra, tem que buzinar aos quatro cantos que os princípios legitimadores do jornalismo são a defesa dos direitos e a diversidade de opiniões. O PT tem que admitir que o excesso de pragmatismo político comprometeu todo um projeto popular e expôs aos inimigos a Petrobras.
Sem essa purgação dos pecados, tudo será como antes. Ou seja, se os fins procurados exigem garantismo, tornam-se garantistas; se os fins exigem punitivismo, punitivistas se tornam, sem a menor preocupação com a coerência. Voam da intolerância mais abjeta para o legalismo mais defensável sem serem cobrados. Qual a garantia de que, passado o fantasma Bolsonaro, não retomem o discurso de ódio do período anterior, sabendo que a memória publicada e televisada tem prazo de validade, não quer saber os pecados que foram cometidos.
É esse país de hipócritas que se deseja legar para as próximas gerações?
Há um pacto em andamento, similar ao pacto da anistia, que consiste dos seguintes passos:
* Atribuam-se todos os abusos do período à Lava Jato Curitiba, ao brilho inexcedível de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, que conseguiram ludibriar mídia, Supremo, tribunais superiores.
* Considerem-se todos os escorregões do STF como fruto da ação incomparavelmente maliciosa de Moro explorando a boa fé de Ministros ingênuos (levante alguns casos irrelevantes, em que decisões de Moro foram reformadas, para defender a ação isenta do Supremo no período).
* Atribua a adesão incondicional da mídia à Lava Jato como reflexo legítimo da indignação com a corrupção, mesmo que tenha feito a divisão entre os corruptos do lado de lá e os do lado de cá, e poupado os amigos.
* Esqueça que todos os abusos da Lava Jato foram testemunhados por repórteres setoristas, alocados em tempo integral da operação e que esconderam as torturas inflingidas a presos, as retaliações contra delegados que reagiram contra as ilegalidades. Diga que foi a astúcia incomparável de Moro que permitiu levar a mídia no bico e todos se beneficiaram profissionalmente da parceria por idealismo desprendido.
PEÇA 5 – MORO E A LAVA JATO
A figura pública de Sérgio Moro foi exposta pela primeira vez como Ministro da Justiça. Na Lava Jato era apenas o juiz monossilábico que se manifestava através de sentenças mas que, nas audiências, mostrava uma timidez surpreendente para o personagem criado pela mídia.
Conhecendo, agora, ele, Deltan Dallagnol e seus colegas, dá para apostar na narrativa dos seres cerebrais, que manipularam STF, mídia, tribunais superiores? É evidente que não. Foram apenas instrumentos de um jogo muito maior. Aliás, ambos, juiz e procuradores, foram a parte mais viciada da aliança nacional pelo impeachment, pelo excesso de pequenas ambições, pelo discurso salvacionista e pelo deslumbramento tipicamente provinciano.
Na Vazajato, juiz e procuradores, que se tornaram a principal peça para derrubar uma presidente da República, se encantavam com o mercado de palestras, com os convites para salões grã-finos, com os cachês recebidos, em fazer bonito para a sua Igreja e para seu banco de investimento de predileção, ou em exibir fotografias de viagens internacionais em seus perfis, em uma demonstração típica de agentes políticos microscópicos, que agiam apenas como bactérias oportunistas sobre o tecido social e político do país.
Transformá-los em bodes expiatórios não melhorará em nada a democracia brasileira. Apenas mudará a guarda para as próximas aventuras antidemocráticas, para as quais serão convocados novos personagens dos porões.
PEÇA 6 – O NOVO ARREGLO DA ANISTIA 
A Justiça de Transição que o país necessita não é a a execração pública de pessoas, não é ajoelhar no milho nem se vergastar em público. É uma desafio institucional, um pacto entre poderes, especialmente aqueles mais responsáveis pelo macarthismo do período anterior, assumindo as culpas institucionais.
Um primeiro ensaio de autocrítica seria a defesa intransigente de um aprofundamento da democracia e não apenas da perna penal da Lava Jato. Por exemplo, cobrar do Procurador Geral da República Augusto Aras a recomposição da área de direitos humanos que tem em cargo chave, hoje em dia, um procurador terraplanista de ultra-direita. As áreas de direitos humanos têm sido desmontadas no âmbito da Procuradoria Geral da República, sem um centésimo da repercussão dos temas da Lava Jato. Apoiar o PGR sem exigir a contrapartida da recuperação da defesa dos direitos difusos e das minorias, é hipocrisia.
Um segundo ensaio seriam manifestações de Ministros do Supremo – especialmente os que mais se lambuzaram com o clima da Lava Jato – de afirmação dos princípios constitucionais e o fim da manipulação das eleições com suas decisões. E uma defesa firme dos direitos daqueles que eram e continuam sendo tratados como “inimigos’.
Um terceiro ensaio seria a mídia ir além das meras manifestações de fé na democracia e assumir a defesa intransigente das vítimas do outro lado – lideranças rurais e indígenas assassinadas, jornalistas independentes massacrados por ondas de processos, o genocídio na periferia etc.
Principalmente, o reconhecimento que foi essa guerra política irresponsável, essa exploração do ódio, do direito penal do inimigo que levou o Brasil ao ponto mais baixo da degradação moral, com a eleição e, mais do que isso, a contemporização com a presidência de Jair Bolsonaro.
Do GGN

terça-feira, 28 de abril de 2020

XADREZ DE COMO O NOVO DELEGADO-GERAL DA PF ATUAVA EM FAVOR DOS BOLSONARO, POR LUIS NASSIF

Ramagem continuou atuando sem ser incomodado. Provavelmente porque se descobriu que Ramagem não estava operando a favor do PT, mas de seu amigo Eduardo Bolsonaro.
Com base nas conversas do Telegram da Lava Jato, The Intercept identificou conversas entre os procuradores, suspeitando de que o delegado da Polícia Federal, Alexandre Ramagem, “era corrupto e ligado ao PT”.
Pelo material divulgado, não se sabe os desdobramentos dessa suspeita. Ramagem continuou atuando sem ser incomodado. Provavelmente porque se descobriu que Ramagem não estava operando a favor do PT, mas de seu amigo Eduardo Bolsonaro.
Vamos aos fatos e às suspeitas.
PEÇA 1 – A OPERAÇÃO FURNA DA ONÇA
A Operação Furna da Onça, do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, visou esquemas de corrupção envolvendo políticos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) e os governos Sérgio Cabral e Pezão, a partir das denúncias de dois doleiros.
Para subsidiar a operação, a pedido do MPF o COAF produziu um relatório sobre movimentações financeiras de deputados e servidores da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
O relatório levantou a movimentação de um número razoável de pessoas. O MPF se incumbiu das investigações que envolviam Jorge Picciani. As movimentações atípicas em gabinetes de deputados, que não tivessem envolvimento direto, seriam encaminhadas para o MPE-RJ.
Ainda em janeiro de 2018, o COAF encaminhou o relatório ao MPE-RJ, para análise preliminar de outros casos que não estivessem diretamente ligados a Picciani. Era um cartapácio de 400 páginas, uma pedra bruta que precisou ser lapidada.
Na véspera das eleições, o então juiz Sérgio Moro – que já tinha acertado sua nomeação para Ministro da Justiça de Bolsonaro – divulgava o vídeo de Antônio Palocci, com a intenção nítida de influenciar as votações. Na outra ponta, o nome de Fabrício Queiroz, o faz-tudo dos Bolsonaro, estava no relatório do COAF, podendo implicar Flávio Bolsonaro. Mas passou despercebido até as eleições.
O que aconteceu nesse período?
PEÇA 2 – A CRONOLOGIA DOS FATOS.
Uma série de movimentações sugeriam que Bolsonaro já tinha acesso a informações privilegiadas da operação Furna da Onça e dos preparativos do MPE-RJ. Tanto que sua primeira atitude, depois de eleito, foi trabalhar para abafar o caso, antes que viesse a público.
Confira a cronologia:
28.10.2018 – Segundo turno das eleições.
06.11.2018 – Queiroz e sua filha Natalia foram exoneradas dos gabinetes de Flávio e Jair Bolsonaro.
12.11.2018 – o desembargador Abel Ferreira, do TRF2, divulga a representação do MPF sobre a Operação.
Alguns trechos do relatório, comprovando que já havia vazamentos para os suspeitos:
Esse contexto aponta com verossimilhança a existência de pessoa de prontidão para repassar informações aos investigados, valendo destacar que parte dos fatos descritos pelo MPF envolve exatamente a ingerência que os agentes políticos teriam na indicação e ocupação de cargos dentro das mais variadas estruturas estatais, que encontrou, para vários deles, corroboração nas medidas de busca e apreensão.
06.12.2018 – E, aqui, o divisor de águas, que muda o curso das investigações: Relatório do COAF mencionando Queiroz é vazado para o Estadão.  E aparecem pela primeira vez nomes ligados a Bolsonaro.
11.12.2018 – Depois do vazamento o MPF encaminhou ao MPE-RJ o seu inquérito.
Porque, então, Queiroz ficou de fora da Operação Furna da Onça?
Na foto dos detidos, faltou um nome: Flávio Bolsonaro
PEÇA 3 – O RELATÓRIO DO COAF
As manobras ocultando Flávio Bolsonaro – e desmontadas pelo vazamento do relatório do COAF – começaram a ficar mais nítidas a partir de 21.02.2019, quando o grupo Auditores-Fiscais Pela Democracia (AfpD) divulgou a Nota Técnica no 02.
Um dos filtros essenciais para a seleção de suspeitos é o volume de dinheiro movimentado em cada operação, explicavam eles. No caso da Operação Furna da Onça, foram levantadas as movimentações financeiras dos suspeitos no período 2014 a 2017.
Seis dias após o vazamento do relatório, Bolsonaro se manifestou sobre o tema, comprovando que o agente detonador das investigações contra Queiroz fora mesmo o vazamento. Segundo O Globo, declarou, em transmissão pelo Facebook:
“O Queiroz não estava sendo investigado, foi um vazamento que houve ali, não sou contra vazamento, tem que vazar tudo mesmo, nem devia ter nada reservado, botar tudo para fora e chegar a uma conclusão. Dói no coração da gente? Dói, porque o que nós temos de mais firme é o combate à corrupção e aconteça o que acontecer, enquanto eu for o presidente, nós vamos combater a corrupção usando todas as armas do governo, inclusive o próprio Coaf”.
Uma semana após a publicação do vazamento, o MPE-RJ pediu um relatório ampliado ao COAF pedindo o detalhamento das operações de Queiroz. Os alvos passaram a ser, então, Flávio Bolsonaro, Queiroz, Nathalia Queiroz, Evelyn Queiroz (ambas filhas do ex-assessor), Márcia de Oliveira Aguiar (mulher de Queiroz) e outros investigados.
Em janeiro de 2019, O Globo divulgou outro relatório do COAF, sobre as movimentações de Queiroz de 2014 e 2015. O valor foi de R$ 5,8 milhões, totalizando R$ 7 milhões nos quatro anos.
Ali as fumaças se transformaram em suspeita. O valor das operações é um critério técnico para a seleção de pessoas a serem investigadas.  No relatório do COAF, no entanto, levantaram-se as movimentações de todos os investigados no período 2014-2017. Apenas a de Queiroz ficou restrita a 2016. Com isso, o valor movimentado caiu para R$ 1,2 milhão, irrisório perto dos R$ 40 milhões movimentados pelo gabinete de Jorge Picciani, deixando Queiroz na 20ª posição dos que mais movimentaram recursos.
Possivelmente foi essa redução que permitiu a Queiroz – e Flávio Bolsonaro – passarem incólumes pelo crivo da Lava Jato do Rio de Janeiro – que, ao contrário de Curitiba, tem um trabalho mais consequente, apesar do vergonhoso envolvimento do juiz Marcelo Bretas com o bolsonarismo.
Foi a primeira fumaça estranha, captada por quem conhecia a maneira de elaboração dos relatórios do COAF. Por que os levantamentos sobre as movimentações de Queiroz foram picotados?
Como analisam os auditores:
* O período de investigação dos alvos da operação Furna da Onça, centrada nos funcionários dos gabinetes dos deputados estaduais do RJ, era de quatro anos. Queiroz foi excluído do rol dos alvos da operação, provavelmente porque o valor movimentado no ano 2016, único ano que fizeram constar no relatório COAF, ficou abaixo da linha de corte da operação;
* se o mesmo critério dos alvos da operação Furna da Onça (período investigado de quatro anos) tivesse sido aplicado aos funcionários do gabinete do deputado estadual Flávio Bolsonaro, certamente este deputado também estaria entre os alvos da operação, uma vez que o valor de R$ 7 milhões figura entre os maiores em relação ao que foi movimentado pelos funcionários da Assembleia Legislativa do RJ;
* a inclusão das movimentações suspeitas de Queiroz dos anos de 2014 e 2015 nos autos da operação Furna da Onça e a inclusão de Flávio Bolsonaro como alvo da referida operação, se tivesse ocorrido como está a sugerir a matemática dos números, e ainda a possibilidade real dessa informação vazar antes das eleições de outubro de 2018, teria tido um impacto negativo nada desprezível, tanto para Flávio (senador) quanto para Jair Bolsonaro, uma vez que o então deputado federal Jair abrigava em seu gabinete a filha de Queiroz, Natália, que repassava quase integralmente o valor do salário para seu pai, conforme relatório COAF.
Concluía a nota da AfpD:
“No caso Queiroz, há razoáveis indícios de que pode ter havido sim intervenção humana, pois o relatório foi fatiado. É preciso transparência, para que a sociedade tenha a garantia de que informações sigilosas sob guarda dos órgãos de controle não sejam usadas para perseguir adversários nem para blindar os amigos do governo de plantão”.
PEÇA 4 – RETOMANDO A CRONOLOGIA
Como lembrou a AfpD, os arranjos posteriores, aparentemente, visaram esconder as pistas dessa operação. E a rapidez com que Bolsonaro agiu, dias após sua eleição, mostra indícios de vazamentos das informações.
* Sérgio Moro é indicado para o Ministério da Justiça.
* Poucos dias após as eleições, Bolsonaro fecha com Moro a entrega do COAF ao Ministério da Justiça. Foi o seu primeiro anúncio. Não teria anunciado essa transferência, se não tivesse fechado um acordo com Moro.
* Moro leva para a presidência o auditor Roberto Leonel, que era quem vazava as informações sigilosas para a Lava Jato.
Até então, o COAF era um órgão acima de qualquer suspeita.
Nas análises dos diálogos do Telegram, anteriormente divulgados, foram identificadas as relações informais – e, portanto, ilegais – dos procuradores com o COAF . A criação das chamadas Salas de Situação – em que sentavam todas as pontas envolvidas em uma operação – foi um improviso ilegal. Nela, servidores do COAF trabalhavam ombro a ombro com os investigadores, abrindo sigilo fiscal e selecionado os alvos que a Lava Jato definia.
Membros da Lava Jato recorriam reiteradamente a Roberto Leonel, presidente do COAF, como, por exemplo, para obter informações fiscais de uma nora de Lula, do caseiro do sítio, de antigos donos e da esposa de Lula, Marisa Letícia.
Chegou-se ao requinte de se recorrer ao COAF para verificar se seguranças de Lula teriam adquirido fogão e geladeira em 2014, para definir alguma correlação com a história do triplex.
A Lava Jato já tinha arrombado todas as instituições estatais, como ficou demonstrado pela Vaza Jato, como por exemplo no intercâmbio de informações sigilosas da Receita Federal.
No COAF era o mesmo padrão: os relatórios eram produzidos de acordo com os objetivos predefinidos pela Lava Jato.  Havia, portanto, uma relação de confiança que ultrapassava os limites da formalidade, o que torna a Lava Jato cúmplice da manobra tirou Flávio Bolsonaro da Operação Furna da Onça.
Provavelmente a missão mais urgente e importante de Leonel, quando indicado para presidir o COAF, tenha sido a de manter em segredo o que aconteceu na manipulação dos relatórios em benefício de Queiroz.
PEÇA 5 – A INFILTRAÇÃO DO BOLSONARISMO NAS INSTITUIÇÕES
Dias antes do vazamento, em 30 de novembro de 2018, Flávio Bolsonaro se reuniu com Caio Carlos de Souza, promotor do MPE/RJ, para quem foi distribuída a investigação sobre a movimentação suspeita de Queiroz, depois do STF ter negado foro privilegiado a Flávio Bolsonaro.
No dia 4 de fevereiro de 2019, internautas descobriram tuites de Caio Carlos minimizando as denúncias contra Queiroz.
E retuítes dele em mensagens de Carlos Bolsonaro
Foi o que levou o promotor a se declarar suspeito e abrir mão de presidir a investigação.
Ali, apareciam os indícios do primeiro envolvimento de alguns promotores estaduais com os Bolsonaro. O segundo indício foi na operação abafa, da falsa perícia dos equipamentos de telefonia do condomínio, visando desqualificar as acusações do porteiro. Também ali, revelações sobre as tendências bolsonaristas da promotora chefe da operação obrigaram ao seu pedido de demissão. Mesmo assim, há um conjunto de promotores sérios, garantindo a integridade do MPE-RJ, conforme o depoimento isento do deputado Marcelo Freixo.
E aí se entra no papel do delegado federal Alexandre Ramagem, indicado como delegado geral da Polícia Federal.
Pelas notícias de jornais, havia duas frente
Pelos diálogos divulgados por The Intercept, a Lava Jato desconfiava da existência de um sabotador no Rio de Janeiro. E as suspeitas eram justamente contra o delegado Ramagem, visto como agente do PT. Ou seja, sabia-se de movimentações estranhas de Ramagem, mas se julgava, inicialmente, que fosse a favor do PT.
Agora, com o aparecimento do nome de Ramagem nos diálogos da Lava Jato, fica a suspeita de que ele agia, de fato, como sabotador, mas do lado dos Bolsonaro. E, por isso mesmo tenha sido deixado de lado pela Lava Jato Curitiba.
A Operação foi em novembro de 2018.  Ramagem já aparece ao lado de Carlos Bolsonaro no réveillon de 2018. Antes disso, foi coordenador de segurança da campanha de Bolsonaro, o que demonstra que, já em 2018, tinha bastante influência na Polícia Federal.
No dia 26 passado, a CNN divulgou vídeo de 14 de novembro de 2017, no qual Bolsonaro, ainda deputado federal, acompanha a Policia Federal levando para depor o deputado Jorge Picciani, no bojo da Operação Cadeia Velha, que precedeu a Operação Furna da Onça. O delegado era Ramagem. Picciani seria preso dias depois, abrindo caminho para a operação seguinte, que centraria fogo em outros deputados estaduais.
Nos meses seguintes, Bolsonaro trouxe para sua segurança pessoal na campanha, justamente Ramagem, o delegado que comandava as investigações sobre os malfeitos na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Agora, Bolsonaro tem, finalmente, a possibilidade concreta de controlar a Polícia Federal e, com isso, poder direcionar seu poder de fogo para blindar amigos e perseguir adversários.
Entra-se, portanto, na fase final do embate entre ditadura vs bolsonarismo. Caberá ao STF definir de que lado está.
Para saber quem manipulou o relatório do COAF é simples. Qualquer pessoa, para acessar o relatório, tem que se identificar. Basta conferir o histórico.
Do GGN

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

JANOT E O VAZAMENTO DA CAPA DE VEJA NA VÉSPERA DAS ELEIÇÕES, POR LUIS NASSIF


Pelo livro fica-se sabendo que Janot sabia o que a torcida do Flamengo inteiro sabia, que o vazamento foi providenciado pela Lava Jato, exclusivamente pelo impacto político.
No livro “Nada Menos Que Tudo”, o ex-Procurador Geral da República Rodrigo Janot admite que a capa da Veja na véspera das eleições de 2014, com a suposta delação de Alberto Yousseff, dizendo que “Lula e Dilma sabiam de tudo”, expôs o viés político da Lava Jato.
É curioso! No jantar de posse de Dilma Rousseff, compartilhei uma mesa com Janot. Na ocasião, depois de algumas pinicadas recíprocas, provoquei-o em relação a dois temas.
Um deles, o vazamento com a tal delação de Yousseff, que quase decide as eleições. Ele disse que nada podia fazer porque fora feito por advogados do réu. Insisti: se vazamentos são ilegais, você não vai fazer nada?
Pelo livro fica-se sabendo que Janot sabia o que a torcida do Flamengo inteiro sabia, que o vazamento foi providenciado pela Lava Jato, exclusivamente pelo impacto político. Como Janot admite no livro, “eram destituída de qualquer valor jurídico”, por Yousseff sequer compartilhava da intimidade do Palácio do Planalto e não tinha provas do que dizia.
No momento oportuno, Janot calou-se, como deve ter se calado em vários episódios nos quais, de acordo com sua versão, teria explodido, reagido, gritado.
O segundo fato foi um inquérito sobre Aécio Neves que mofa desde 2010 na gaveta do PGR, referente à Operação Norbert, que identificou contas de Aécio no exterior, em nome de offshores abertas em paraísos fiscais.
É por aí que não se aceitam as explicações dele, sobre as razões de não ter incluído Aécio na primeira lista de Janot. Na ocasião, uma fonte com contato direto com o filho de Teori Zavaski, relatou sua surpresa de Janot ter indiciado Lindbergh e poupado Aécio, segundo que os indícios contra Aécio eram muito mais evidentes – versavam sobre as mesadas de Furnas.
A alegação de Janot foi que duas testemunhas do caso já tinham morrido. Ora, não consta que, com sua morte, sumiu a contabilidade ou os registros bancários da empresa. Além disso, se a PGR já possuía um inquérito com indicações das contas de Aécio na Suiça, o quadro ficava muito mais completo do que meras delações ao vento.
Do GGN

terça-feira, 27 de agosto de 2019

É UM GRANDE VEXAME E PARTICIPAMOS DISSO. SOMOS CÚMPLICES, DIZ GILMAR SOBRE LAVA JATO

Foto: Agência Brasil
"Homologamos delação. É altamente constrangedor. Todos nós que participamos disso temos que dizer ‘nós falhamos", disparou o ministro.
Durante a sessão da segunda turma do Supremo Tribunal Federal que anulou condenação imposta pela Lava Jato a Ademir Bendine, o ministro Gilmar Mendes reconheceu que a Corte foi cúmplice dos desvios da operação comandada a partir de Curitiba.
“É um grande vexame e participamos disso. Somos cúmplices dessa gente. Homologamos delação. É altamente constrangedor. Todos nós que participamos disso temos que dizer ‘nós falhamos’, disparou o ministro.
Segundo informações do portal Jota, Gilmar citou reportagem da Vaza Jato desta terça (27), em que procuradores de Curitiba ironizam, debocham, fazem ilações sobre as circunstância da morte da ex-primeira-dama Marisa Letícia, denotando ódio em relação a Lula.
Para Gilmar, “a República de Curitiba nada tem de republicana, era uma ditadura completa. (…) Assumiram papel de imperadores absolutos. Gente com uma mente muito obscura. (…) Que gente ordinária, se achavam soberanos.”
Os procuradores são corruptos, “gente sem nenhuma maturidade. Corrupta na expressão do termo. Não é só vender função por dinheiro. Violaram o Código Processo Penal”.
GGN

domingo, 11 de agosto de 2019

SUPREMO É PRESSIONADO A SOLTAR LULA POR JURISTAS E EX-MINISTROS DE 8 PAÍSES

Por causa das práticas ilegais e imorais da Lava Jato, diz a carta,a Justiça brasileira vive atualmente uma grave crise de credibilidade dentro da comunidade jurídica internacional.
Foto: Ricardo Stuckert
O Supremo Tribunal Federal é o alvo de uma carta assinada por 17 juristas, advogados, ex-ministros da Justiça e ex-magistrados de cortes superiores de 8 países, que pedem a libertação de Lula e criticam seu processo.
Eles afirmam, no texto, que as mensagens trocadas entre os procuradores de Curitiba e o ex-juiz Sergio Moro, detonando conluio na Lava Jato, “estarreceram todos os profissionais do direito.”
“Hoje, está claro que Lula não teve direito a um julgamento imparcial”, avaliaram. “Não foi julgado, foi vítima de uma perseguição política.”
“Num país onde a Justiça é a mesma para todos, um juiz não pode ser simultaneamente juiz e parte num processo”, defenderam.
“Ficamos chocados ao ver como as regras fundamentais do devido processo legal brasileiro foram violadas sem qualquer pudor”, afirmaram.
“Por causa dessas práticas ilegais e imorais, a Justiça brasileira vive atualmente uma grave crise de credibilidade dentro da comunidade jurídica internacional”, dispararam.
Os juristas que assinam o manifesto são de países como França, Espanha, Itália, Portugal, Bélgica, México, EUA e Colômbia.
“Entre os signatários está Susan Rose-Ackerman, professora de jurisprudência da Universidade de Yale, nos EUA. Ela é considerada uma das maiores especialistas do mundo em combate à corrupção.”
Dallagnol já recomendou leituras da professora. O marido dela, Bruce Ackerman, foi professor do ministro do STF Luis Roberto Barroso, em Yale.
“Outros nomes de peso que assinam a carta são o professor italiano Luigi Ferrajoli, referência do garantismo jurídico no mundo, o ex-juiz espanhol Baltasar Garzón, que condenou o ex-ditador chileno Augusto Pinochet por crimes contra a humanidade, Alberto Costa, ex-ministro da Justiça de Portugal, e Herta Daubler-Gmelin, ex-ministra da Justiça da Alemanha.”
As informações são da jornalista Monica Bergamo, na Folha deste domingo (11).
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Do GGN

sábado, 20 de julho de 2019

PEQUENA HISTÓRIA ILUSTRADA SOBRE O FIM DA LAVA JATO, POR LUIS NASSIF

Peça 0 – a título de introdução: com PGR, com Supremo, com tudo
O adesismo faz parte do comportamento histórico na vida nacional. Talvez a maior marca do subdesenvolvimento seja a ausência de caráter público, o conjunto de valores que deveriam nortear as ações públicas, operando como freio aos espíritos mais oportunistas.
Exemplos significativos dessa carência são os Ministros Luis Roberto Barroso e Edson Fachin, progressistas quando os ventos sopravam para os direitos; impiedosos quando os ventos enfunaram as velas das galés punitivistas; perdidos quando há ventos em várias direções.
O mesmo ocorreu com Procuradores Gerais que eram adesistas, como Geraldo Brindeiro, oportunistas ocupando vácuos de poder (que o PT chamava de republicanismo) – como Antonio Fernando de Souza e Rodrigo Janot – ou subservientes, quando o Poder exigiu subserviência, como Raquel Dodge.
Salve Cláudio Fontelles, ave rara nessa criação de corvos.
Peça 1 – o fenômeno Lava Jato
Já apresentei este mapa esquemático no YouTube para explicar o fenômeno Lava Jato. É simples.
Poderes tradicionais – Executivo, Legislativo, Judiciário, mais duas corporações de Estado, as Forças Armadas e a Procuradoria Geral da República. O 4º poder, a mídia, articulando uma opinião pública que influenciava os demais.
A conspiração –juntando STF, PGR, Congresso, PSDB-PMDB e mídia visando derrubar a presidente da República. A espoleta inicial é a campanha diuturna de mídia burilando o discurso de ódio em torno do mote histórico de sempre – denúncias de corrupção – esperando instrumentalizar a ultradireita adormecida.
Lava Jato – se valendo de vazamentos e delações para alimentar a campanha da mídia e, através dela, obter adesão popular.
Milícias digitais –Com o fenômeno das redes sociais, e com boa tecnologia externa, surgem as milícias digitais, as redes de WhatsApp, conferindo autonomia à ultradireita, que ganhar vida própria e leva os Bolsonaro ao poder.
Milícias reais –  o país passa a ser comandado, então, por um oficial da reserva, ligado aos porões da ditadura, e com estreitas ligações com as milícias reais.
Como ficarão os demais agentes do Poder? Aí entra a síndrome do adesismo que marca os centros secundários de poder no país.
Peça 2- o Mapa do Poder
O Mapa do Poder fica assim, com vários protagonistas enfeixados na caracterização genérica de Sistema, Oposição, Direita, Ultra Direita, Crime Organizado e influência de Donald Trump.
Ao mesmo tempo, com a prisão de Lula e a derrota do PT, dilui-se o tema unificador do golpe e aparecem os pontos de dissenso e novos pontos de confluência:
Base x cúpula
Democracia x ditadura
Pauta de costumes
Luta de classes
Peça 3 – os dissensos e a conformação de forças
O que marca o momento atual é o predomínio de dois dissensos principais que operam como agentes aglutinadores de uma das divisões.
Cúpula x base
Explica a recente decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), José Dias Toffoli, proibindo que o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) repasse dados para a Polícia Federal e para os procuradores sem prévia autorização de um juiz.
A medida atendeu ao interesse imediato da família Bolsonaro, mas não apenas dela. Foi uma reação contra um fenômeno grave que emergiu da Lava Jato, a parceria entre órgãos de controle, como CGU (Controladoria Geral da União), TCU (Tribunal de Contas da União), procuradores e policiais federais, responsável por grandes tragédias recentes, como as invasões de Universidades, humilhação de reitores e professores, além de ter provocado o chamado apagão das canetas, o receio de funcionários públicos de assinar qualquer documento, dado a truculência e falta de discernimento dessa frente. Ganhou o apoio dos tribunais superiores, dos advogados, da oposição.
Após o aplauso da família Bolsonaro, a primeira corporação a se enquadrar foi a Polícia Federal de Sérgio Moro. A falta de de solidariedade de Moro à Lava Jato comprova a subserviência total a Bolsonaro e o clima do salve-se quem puder, permitindo adotar o vaticínio de Romero Jucá, “com Supremo, com Raquel, com Moro e com tudo”.
Luta de Classes
O segundo ponto a mover as alianças é a chamada Luta de Classes, que juntou empresários, mercado, o clube dos bilionários, Congresso, mídia, Ministros do Supremo, o silêncio da PGR, setores da alta burocracia pública em torno das reformas, do desmonte das redes de proteção social, da privatização selvagem.
É a grande âncora atual do governo Bolsonaro. Cessará de ser quando cair a ficha de que são falsas as promessas de pote de ouro no final do arco-íris das reformas.
Peça 4 – a permanência dos dissensos
Os embates atuais não fazem submergir os demais dissensos.
De um lado, Bolsonaro segue o receituário da direita, de Trump a Macri, de criar factoides diários como estratégia de mobilização das bases, de aprofundamento do desmanche do Estado e de disfarce da baixa capacidade operacional do seu governo.
Não são apenas factoides, mas decisões que afetam interesses setoriais e nacionais e ameaças explícitas à democracia. Como a história de proibir a Petrobras de abastecer navio iraniano que veio ao Brasil comprar milho. Ou a sequência inédita de bizarrices no Twitter ou nas coletivas.
De qualquer modo, o fisiologismo das corporações brasileiras tornou elástica a naturalização dos absurdos e a suspensão das investigações sobre as relações dos Bolsonaro com o crime organizado.
A oposição a Bolsonaro terá que ganhar mais massa crítica, até que as nuvens da fisiologia se voltem contra ele. E está ganhando corpo a cada dia que passa de reiteração de absurdos e de não entrega do combinado: melhoria da situação econômica.
 Do GGN