Cá
estamos, pessoas comuns, sentados no alto de nosso isolamento, contemplando um
triste e violento espetáculo. Lá embaixo, na planície, a república arde em
chamas, diante de um público fascinado, perplexo, confuso. A Lava Jato cumpre,
enfim, o seu destino, que é assumir o poder político no país.
A Lava Jato não combateu a corrupção no
Brasil: ela a ampliou a níveis alucinantes. Basta ver os quadros que passaram a
tomar o poder nas estatais e no governo. A gente só conhece os ladrões mais
famosos da elite do governo, mas os escalões inferiores estão sendo
inteiramente ocupados por pessoas indicadas por esses mesmos ladrões.
Os
delatores foram usados como combustível humano. Os representantes da Odebrecht,
em particular, foram tratados com um cuidado muito especial, porque a Lava Jato
cultivou, desde o início, a esperança de que a bala de prata contra Dilma, Lula
e o PT viria do ex-presidente da empresa, Marcelo Odebrecht.
Ao
invés disso, o que vimos foi o espetáculo mais grotesco da história mundial do
direito. Todo o modus operandi da Lava Jato, baseado desde o início no uso indiscriminado
de delações premiadas, culmina com as delações da Odebrecht, transformadas em
armas de destruição em massa para subsidiar mais um brutal ataque à política.
Tornamo-nos
uma república de delatores. Em plena crise econômica, o Brasil não discute
planos para voltar a crescer. A agenda única da mídia é a última fofoca
relatada por um delator.
Uma
delação é pior que uma verdade com provas.
Uma
verdade com provas cabais permite que você assuma uma posição firme, a favor ou
contra.
Uma
delação, ela é a antiverdade por excelência, porque você não sabe se é uma
verdade, uma meia-verdade, ou uma mentira.
Uma
mesma delação pode vir cheia de verdades, mas com capciosas mentiras enfiados
no meio. As verdades seriam usadas para legitimar a mentiras enxertadas.
Uma
mesma delação pode ser quase inteiramente mentirosa ou absurda, mas conter uma
verdade.
Ah,
mas é preciso apontar provas para a delação, dirão alguns.
Desde
quando, pergunto eu?
As
delações estão aparecendo, há mais de dois anos, sem provas. E as provas, além
disso, podem ser facilmente manipuladas, desde que a autoridade e a mídia
estejam mancomunadas.
O
que fazer, todavia, com uma delação que apenas afirma que fulano “sabia” ou
“não sabia”, sem apresentar, igualmente, nenhum tipo de comprovação?
Na
minha opinião, os progressistas e os liberais precisam tomar muito cuidado com
um sistema de repressão que não tem controle social.
A
Lava Jato representou uma revolta dos aparelhos de repressão do Estado contra o
sistema político.
Essa
revolta foi preparada também pelos erros dos governos Lula e Dilma, que se
descuidaram daquilo que deve ser a prioridade número 1 de qualquer força
política: a educação.
E,
em especial, a educação enquanto educação política, que por sua vez apenas pode
se materializar através dos meios de comunicação.
Ah,
mas é muita roubalheira, eles – o aparelho de repressão – tinham que fazer
isso, alegam alguns.
Cuidado
com essas falácias. A Lava Jato não combateu a corrupção no Brasil: ela a
ampliou a níveis alucinantes. Basta ver os quadros que passaram a tomar o poder
nas estatais e no governo. A gente só conhece os ladrões mais famosos da elite
do governo, mas os escalões inferiores estão sendo inteiramente ocupados por
pessoas indicadas por esses mesmos ladrões.
O
patrimônio público está sendo desmontado a toque de caixa.
Quem
está ganhando com tudo isso?
Agora
está mais fácil entender: os grandes bancos e grupos estrangeiros de energia e
construção civil.
O
Brookfield, um dos maiores fundos de investimento do mundo, está comprando a
Odebrecht e a Petrobrás.
A
cotação do petróleo foi reduzida no momento certo. Cai às vésperas da votação
do impeachment, e em seguida volta a crescer.
Se
os EUA fizeram um pacto com Arábia Saudita, conforme acreditam alguns analistas,
para derrubar Rússia, Venezuela e Irã, a principal vítima, até o momento,
parece ter sido o Brasil. O que, inclusive, nos faz pensar se analisamos
corretamente. E se esse dumping dos preços do petróleo tivesse almejado o
Brasil desde o início?
O
modus operandi da Lava Jato, com todas as delações, é monstruoso. Se você
prender todos os empresários, jornalistas, servidores, políticos de um país, e
mantê-los encarcerados, sob ameaça de prisão perpétua, perseguição à família,
fim do patrimônio acumulado ao longo de várias gerações, até que eles delatem
tudo aquilo que fizeram ou viram de errado em suas vidas, qual será o
resultado?
A
delação, obviamente, não visa fazer com que o delator faça um discurso de tudo
de bom que ele e sua empresa fizeram ao Brasil. O acordo implica em confessar
todos os crimes cometidos, ou mesmo não-cometidos, desde que eu escape das
masmorras de Curitiba.
As
delações da Odebrecht confirmam um fenômeno: a Lava Jato há tempos percebeu que
não se trata apenas de uma operação de cunho jurídico. Ela tem uma agenda, a
qual, para ser implementada, precisa controlar a política.
Daí
que a operação, ou pelo menos o espírito e os interesses que a governam,
disseminaram-se por toda a república, dominando tudo.
Legislativo,
MPF, PGR, Judiciário, Executivo, TSE, empresas, mídia, tudo está sob o tacão
pesado da Lava Jato.
Ouse
discordar! Em pouco tempo, aparecerá um delator envolvendo você numa história.
Até
mesmo alguns ingênuos, como Luciana Genro, ex-candidata do PSOL à presidência
da república, que vinha cumprindo o triste papel de fazer campanha em apoio à
Lava Jato, viu-se, que ingratidão, delatada! O delator em questão visava os
deputados da esquerda gaúcha, e sobrou para Genro.
A
defesa de Luciana Genro foi pior que a encomenda. Ela divulgou uns “emails”, em
que o empresário que lhe havia doado pede algum tipo de favor ou intermediação
com seu pai – favor ou intermediação que ela não atendeu. Ou seja, para escapar
de uma delação, ela ainda põe o nome do pai na história!
Do
Cafezinho, por Miguel do Rosário