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segunda-feira, 2 de julho de 2018

A ANARQUIA JUDICIAL(STF) E O BRASIL NA NOITE TREVOSA, por Aldo Fornazieri

O golpe promoveu a mais profunda desorganização institucional que o país já experimentou nos breves períodos de sua frágil vida democrática. A corrosão da legitimidade institucional levou o Executivo e o Legislativo à irrelevância, à infuncionalidade e ao desgoverno. Esses poderes, simplesmente faliram, não funcionam, a não ser num único aspecto: o de fazer o mal ao povo e ao Brasil. Com a falência do governo e do Congresso, sobrou o poder Judiciário, que se tornou o centro das decisões políticas do país, usurpando competências e violando a Constituição. Se, por algum tempo após o golpe, o Judiciário, comandado pelo STF, dava a aparência de ser um poder unitário com as naturais divergências, aos poucos foi revelando ser um poder anárquico e promotor da anarquia judicial, da ilegalidade e da recorrente violação da Constituição.
O Judiciário como um todo, na verdade, sempre foi um poder tirânico contra os pobres, perseguindo-os, adotando uma justiça enviesada para proteger a propriedade contra os direitos civis e sociais das pessoas simples do povo, enchendo as cadeias por pessoas que cometeram pequenos delitos de baixo poder ofensivo. O Estado de Direito nunca existiu para 60% a 70% da população. No Brasil só existe democracia para cerca de 30% das pessoas. A violência jurídica é uma das formas mais cruéis da violência do Estado a serviço de uma elite perversa contra os pobres. Com o golpe, o Estado de Exceção, a violência judicial, o seu arbítrio e a sua parcialidade atingiram também setores da classe política, principalmente políticos petistas, notadamente o presidente Lula.
A anarquia judicial se acentuou após a criminosa omissão do STF em não barrar o impeachment sem crime de responsabilidade, permitindo que a Constituição fosse violada. Ali ficou claro que amplos setores do Judiciário integravam o golpe parlamentar-judicial. Igualmente criminosa foi a conivência do STF com os arbítrios de violação da Constituição cometidos pelo juiz Moro, a exemplo das conduções coercitivas, da transformação das prisões como instrumentos coativos para arrancar delações premiadas mentirosas e orientadas e da gravação ilegal da presidente Dilma e a divulgação do conteúdo. Em qualquer Estado democrático sério, Moro estaria preso por ter conspirado contra a segurança do Estado.
Outro atentado grave ao ordenamento jurídico do país consistiu no fato de o juiz Moro ter julgado o caso do triplex, pois, não tendo este caso nenhuma relação com a Petrobras, Moro não era o juiz natural para julgá-lo. Assim, ficou evidente que a 13ª Vara Federal de Curitiba foi sendo transformada em tribunal de exceção e Moro em juiz de exceção. Agora Edson Fachin viola o mesmo princípio do juiz natural ao remeter recursos da defesa de Lula para o plenário do STF, quando o procedimento correto seria que eles fossem julgados pela segunda turma.
A anarquia judicial se define exatamente por isto: para cada caso e para casos semelhantes são aplicadas regras jurídicas diferentes, ao sabor do arbítrio do juiz e segundo seu interesse político ou segundo quem é a pessoa do réu. Lula tem seus direitos e garantias fundamentais violados de forma despudorada, criminosa e explícita. A anarquia judicial quebra a uniformidade procedimental, desorganiza a jurisprudência, agride a Constituição e as leis e gera uma imensa insegurança jurídica e um vácuo constitucional. Ao agir de forma anárquica, o Judiciário e o STF agridem a cultura jurídica e constitucional que, às duras penas, tenta se firmar.
O caso da prisão em após condenação em segunda instância, sem que a sentença tenha transitado em julgado, como determina a Constituição, é a mais violenta transgressão das garantias e direitos individuais fundamentais. A concessão de poderes judiciais ao Senado para salvar Aécio Neves foi o ápice escandaloso dos exemplos de parcialidade política e partidária de uma Corte Constitucional, só comparável ao arbítrio de tribunais que servem ditaduras. Como juízes de primeiro grau e de tribunais superiores vêm recorrentemente cometendo crimes contra a Constituição e a ordem jurídica do país é preciso lutar para que sejam julgados e punidos. Chega a ser estranho que nem a OAB e nem os grandes juristas tenham proposto isto.
Após as eleições será preciso organizar um movimento Constituinte do povo, que faça emergir uma nova Constituição a partir do poder popular. Uma Constituição fundante da soberania do povo quanto a sua origem popular e quando ao seu resultado. Isto significa que a Constituição terá que ser submetida a um referendum popular, sem o qual não há soberania do povo. No Brasil, o povo nunca foi soberano, pois nenhuma Constituição foi referendada por ele. Uma Constituinte soberana e exclusiva deveria destituir o atual STF e os colegiados de outros tribunais superiores, julgar os magistrados que cometeram crimes contra a Constituição e reorganizar de forma democrática um novo Judiciário, limitando os mandatos dos ministros dos tribunais superiores e encontrando outras formas de suas escolhas. Este é um aspecto fundamental para que o Brasil tenha uma democracia efetiva.
O impedimento de Lula e a noite trevosa
Ao manter Lula preso sem crime e sem prova, sem prova porque sem crime, e ao tentar impedi-lo de concorrer às eleições, juízes, desembargadores e ministros dos tribunais superiores estão cometendo um grave crime político, não só contra Lula, mas contra o povo e contra a nação. O povo quer Lula presidente, pois, em sua maioria, o povo o reconhece como o único líder capaz de tirar o país da grave crise, do caos e da desesperança.
O Judiciário será responsável por mergulhar o Brasil numa noite trevosa, de tormentas e de tormentos, mais grave da que já se encontra. O dilaceramento social, econômico, político e moral do país requer um presidente que seja um líder forte, capaz de unificar o povo sob a sua liderança e seu governo. Por mais qualidades e virtudes que tenham alguns dos atuais candidatos, nenhum deles tem a alargada liderança que Lula exerce junto ao povo.  Um governo democraticamente forte só se constitui se tiver ampla legitimidade popular, conferida pelas urnas. Lula é o único capaz de alcançar esta condição. Se o Brasil for impedido de se reencontrar politicamente pela via da legitimidade democrática poderá mergulhar num caos ainda mais profundo ou poderá se tornar prisioneiro de poder da força e do arbítrio.
O povo chegou no limite da suportabilidade das injúrias, dos agravos e da humilhação que sofre por parte das elites e de um Estado que é seu inimigo. Isto precisa servir também de advertência às lideranças progressistas e de esquerda e a muitos deputados que nada representam a não ser esquemas ossificados de poder. Será preciso trabalhar para que surjam novas lideranças, autênticas, dos setores explorados e oprimidos. Será preciso varrer esses deputados acomodados, os burocratas e esses líderes fracos e sem virtudes para os cantos da vida política,  pois fracassaram.
A representação branca, de classe média, universitária, faliu. Pouco ou nada tem a dizer aos pobres, aos negros, às mulheres, aos jovens e ao povo das periferias. Pouco fez para esses abandonados e sem destino. Esses setores precisam se auto-representarem. Estão surgindo novas lideranças e novos candidatos no seio do povo sofrido. Mais dia menos dia forçarão as portas dos esquemas constituídos de poder e arrebentarão as fechaduras trancadas pelos esquemas burocráticos e acomodados do status quo. Se, neste momento, Lula é a única Estrela Polar a indicar o caminho de chegada, essas novas lideranças, devem ser o novo Sal da Terra das novas lutas e de uma nova forma de fazer política. Devem ser a luz a espargir esperanças alicerçadas em movimentos sociais e políticos organizados e fortes, capazes de conter e derrotar as investidas das elites cruéis que querem perpetuar a tragédia do povo brasileiro.  
Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP).
Do GGN

sexta-feira, 22 de junho de 2018

LULA É LIDER EM DATAFOLHA SOBRE QUEM É O MELHOR CANDIDATO PARA A ECONOMIA

O Datafolha foi às ruas perguntar aos brasileiros qual é o melhor candidato a presidente para resgatar o crescimento da economia e Lula acabou como o favorito, com o apoio de 30% dos entrevistados. O petista tem o dobro da pontuação de Jair Bolsonaro, apontado por 15%. 
Marina Silva apareceu na pesquisa com 8% da preferência quando o assunto é economia. Geraldo Alckmin e Ciro Gomes empatam com 7%. Os demais postulantes testados (Henrique Meirelles, Alvaro Dias, Fernando Haddad, Fernando Collor, Rodrigo Maia e Flávio Rocha) estão abaixo dos 3%. 
Folha fez questão de destacar que Lula tem desempenho melhor no eleitorado mais pobre e menos escolarizado. Bolsonaro, por outro lado, tem seu melhor desempenho entre quem tem grau superior e renda acima de 10 salários mínimos. 
Embora o jornal insista em frisar que Lula está "inelegível" por causa da Lei da Ficha Limpa, que barra condenados em segunda instância, o Datafolha aferiu que cresceu o número de brasileiros que acham que o petista será candidato. 
"(...) a maioria da população acredita que o ex-presidente não será candidato, mas o número registrou queda na última pesquisa. Passou de 62% em abril para 55% no início de junho.  
Já os que avaliam que ele participará da disputa passaram de 34% para 40%." 
Quando a pergunta é se Lula deveria ser impedido de concorrer por causa da condenação na Lava Jato, o eleitorado entrevistado está dividido: para 48%, o ex-presidente deveria ser impedido, enquanto 49% a favor da candidatura.
Do GGn

domingo, 3 de junho de 2018

FHC, O DEMIURGO DE ALMA PEQUENA, por Luis Nassif

Desde seus tempos iniciais em política, Henrique Cardoso se perdeu pela falta de coragem e excesso de oportunismo. De certa forma ele lembra CFOs de uma empresa, que se preocupam exclusivamente com o próximo balanço trimestral e em preparar as desculpas para a assembleia de acionistas.
Não cometeria a indelicadeza de compará-lo ao ex-Ministro Cristovam Buarque, que é um FHC sem nenhuma sutileza intelectual.Também não gosto de reduzir os grandes conflitos públicos aos fatores pessoais, aos pequenos sentimentos de inveja, arrogância, prepotência, tão ao gosto dos diagnósticos de redes sociais.
Mas, em FHC, há algumas características de caráter nítidas como prego em vinil, essenciais para entender suas atitudes.
A primeira é a abulia, a falta de vontade absoluta em intervir na realidade social ou política. Sua única lógica é abrir a economia para os grandes capitais e esperar como resultante a geração expontânea de uma corte renascentista. É típica de um certo tipo de intelectual que, ascendendo a uma posição política, ganha um gramofone de tal potência, que o transforma em demiurgo das frases feitas. O intelectual precisa de pensamento. Ao demiurgo, basta apenas os bordões e a fé. Em graus distintos, são da mesma natureza FHC, Carmen Lúcia, Ayres Brito, Luís Roberto Barroso e seu guru Flávio Rocha, Cristovam Buarque.
A segunda é a inveja, na sua expressão mais comezinha. Na campanha de 2002, José Serra, candidato do PSDB, acusava FHC de boicotá-lo com receio de sua sua gestão ofuscasse a dele e sabendo que, com Lula, o desastre seria tal que o povo o chamaria de volta. Quem passou a conhecer Serra – e FHC conhecia-o como a um filho – sabia que sua desconfiança era infundada. Mas Serra conhecia profundamente a alma do parceiro-padrinho para identificar os sentimentos preponderantes.
O artigo de FHC no Estadão de hoje, “Decifra-me ou te devoro” é uma reedição do velho FHC. Traz um diagnóstico óbvio - a necessidade de um pacto que organize o centro -, em cima de um sentimento óbvio – o cansaço de parte da opinião pública com a radicalização e a falta de um candidato competitivo em seu campo.
Quando o sentimento óbvio da turba era a de massacrar os adversários, lá vinha FHC acendendo a pira. Quando era o de cantar o Hino Nacional, lá surgia ele abraçado a Aécio Neves e José Serra, berrando a plenos pulmões. Quando Lula foi preso, lá foi ele avalizar a prisão, logo ele que, mal saído da cadeira de presidente adquiriu um apartamento por um terço do valor de mercado..
Agora, a prisão de Lula alçou-o à condição de preso político, conferindo-lhe uma dimensão de martírio similar ao de outros grandes pacificadores do século 20. É óbvio ululante que qualquer pacto nacional teria que passar pela libertação de Lula e pelo fim da perseguição política a que está submetido.
Mas FHC jamais conseguiu atender ao último desejo do amigo Sérgio Motta, que lhe implorava: não se apequene. Um ego gigantesco em uma alma pequena.
Do GGN

sexta-feira, 1 de junho de 2018

O FIM DA AVENTURA PÓS-SOVIÉTICA DE PEDRO PARENTE, por Luis Nassif

Encontrei pela ultima vez Pedro Parente meses atrás, em uma padaria dos Jardins. Aparentava ar cansado e estava a caminho do hospital. Nos cumprimentamos formalmente.
Conheci-o, e bem, no governo Fernando Henrique Cardoso, substituindo Clóvis Carvalho na Casa Civil. Era, de longe, o técnico mais preparado. É injusto taxá-lo de “pai do apagão”. Na verdade, coube a ele coordenar a Câmara que tentou resolver o imbróglioinfernal criado por FHC, com a desregulamentação do setor elétrico, que promoveu um choque tarifário similar ao que Parente tentou reeditar com o petróleo agora.
Historicamente, grandes funcionários públicos se tornaram executivos de grandes grupos econômicos. Nenhum mal nisso. Durante muito tempo, Banco do Brasil e Itamarati tiveram os melhores quadros técnicos da República. Muitos deles passaram a servir o setor privado sem perder a perspectiva de país.
Não foi o caso de Parente.
Sua atuação na Petrobras teve um mérito inegável: serviu para expor as vísceras de um modelo de corrupção público-privado que, nos tempos modernos, só encontra paralelo no que aconteceu na ex-União Soviética – e, antes disso, com o setor elétrico brasileiro.
Por aqui, a descontratação da energia das hidrelétricas significou uma explosão nas tarifas, tirando completamente a competitividade de setores relevantes da economia. Depois, a privatização para um bando de aventureiros internacionais, que abriam empresas em paraísos fiscais e tomavam financiamentos amplos do BNDES, dando como única garantia as ações das empresas privatizadas. Aliás, esse saque consumou-se no caso CEMAR - Centrais Elétricas do Maranhão, adquirido pela Equatorial - do grupo Lehman – já no governo Lula. O resultado foi a crise de 1999, obrigando o país, como um todo, a pagar pela corrupção instalada no governo FHC.
Na Petrobras, a ação de Parente foi mais escandalosa. Elevou os preços dos derivados para viabilizar a importação e criar uma capacidade ociosa nas refinarias, de maneira a comprometer seus resultados e facilitar a venda da.
Para uma empresa sem problemas de crédito no mercado, passou a queimar ativos usando o falso argumento de que a Petrobras estaria quebrada. Teve participação ativa na mudança da legislação do petróleo, ajudando a enterrar todos os investimentos feitos na indústria naval.
A estratégia de desmonte da Petrobras, no entanto, mostrou suas limitações. Era o gerentão, capaz e fazer andar um projeto desde que o CEO lhe desse as referências. Quando coube a ele montar a estratégia, o resultado foi o desastre, que não apenas desmascarou a corrupção soviética instalada no país, como acabou de vez com a farsa de Michel Temer.
E ainda deixou rastros que, em algum momento, deflagrarão investigações do Ministério Público. E sem poder recorrer à vara de Curitiba, de seu amigo Sérgio Moro.
Do GGN

terça-feira, 10 de abril de 2018

Chegou a hora de acabar com essa indesejável relativização do Direito, por Ricardo Lewandowski

*Artigo originalmente publicado na edição desta terça-feira (10/4) do jornalFolha de S.Paulo, com o título "Direito como tópica"
A crescente imprevisibilidade das decisões proferidas por juízes e tribunais vem alimentando uma visível descrença no Poder Judiciário.
Esse fato traz de volta uma velha questão: o Direito, afinal, é uma ciência ou simples técnica retórica? A resposta a essa pergunta tem suscitado acaloradas discussões ao longo de várias gerações de juristas.
Tal debate não se colocava ao tempo dos antigos romanos. O Direito, para eles, tinha cunho objetivo e eminentemente prático, empregado como instrumento para consolidar a paz social, inclusive nos vastos territórios que conquistaram.
Após a queda do Império Romano, a jurisprudência latina incorporou os usos e costumes dos chamados "povos bárbaros", dando origem a um sistema híbrido, que mesclava leis escritas e práticas ancestrais, o qual perdurou por toda a Idade Média.
Com a prevalência dos ideais iluministas, surgiram as primeiras Constituições, concebidas para enquadrar o poder político, e também as grandes codificações, destinadas a racionalizar a intrincada legislação que sobreviveu à época medieval. Na crença de que esses novos textos esgotavam todo o Direito, exigiu-se dos juízes que fossem aplicados literalmente, sendo-lhes vedada qualquer interpretação.
O aprofundamento da Revolução Industrial fez com que as sociedades se tornassem mais complexas e dinâmicas, ficando logo evidente que os diplomas legais recém-editados não logravam abarcar a totalidade do Direito. Como era de esperar, passaram a apresentar inúmeras lacunas, que tiveram de ser preenchidas mediante o emprego da analogia e de outros expedientes.
Várias escolas de hermenêutica, então, se sucederam. Algumas tentaram resgatar a imperatividade das leis escritas, a exemplo da positivista, cujo maior expoente foi o austríaco Hans Kelsen (1881-1973).
Outras, de índole relativista, ao contrário, buscaram ampliar a criatividade dos juristas, como aquela chefiada pelo alemão Theodor Viehweg (1907-1988).
Viehweg repudiava o tradicional método interpretativo, consistente em subsumir fatos a normas previamente selecionadas, segundo um raciocínio lógico-formal. É que ele concebia o Direito como uma tópica, cujo significado somente poderia ser desvendado caso a caso, por meio de uma argumentação pontual. Críticos não tardaram a concluir que tal concepção, levada a extremos, geraria enorme insegurança.
Parece que hoje alguns magistrados, sobretudo os da área penal, voltaram a considerar o Direito uma mera tópica, da qual é possível extrair qualquer resultado. E o fazem pela adoção desabrida de teorias estrangeiras, em especial germânicas e anglo-saxônicas, quase sempre incompatíveis com nossa tradição pretoriana, que extrai o Direito essencialmente de fontes formais.
Chegou a hora de colocarmos um paradeiro nessa indesejável relativização do Direito, a qual tem levado a uma crescente aleatoriedade dos pronunciamentos judiciais, retornando-se a um positivismo jurídico moderado, a começar pelo estrito respeito às garantias constitucionais, em especial da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Ricardo Lewandowski é ministro do Supremo Tribunal Federal e professor titular de Teoria do Estado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Do Conjur

quarta-feira, 4 de abril de 2018

O tuíte do General Villas Boas e a defesa da democracia, por Eugênio Aragão

Mais do que o tuíte do Comandante do Exército em si, a publicidade que a Rede Globo lhe deu no Jornal Nacional é que constitui nova criminosa tentativa de exercer pressão sobre o STF, para que atenda ao “clamor da sociedade”, dessa parte envenenada da sociedade que sucumbiu à guerra psicológica midiática destinada a cultivar entre nós o anti-petismo. O objetivo é só um: tirar do páreo o candidato a presidente que não agrada à “famiglia” Marinho, ainda que, segundo todas as pesquisas eleitorais até aqui, seja o com maior popularidade e com maiores chances de vencer.
Dane-se a sociedade, danem-se os eleitores! O sistema Marinho está, em verdade, pouco se lixando por que ela pensa ou por quais suas aspirações. O plano é incutir-lhe por todos os meios, lícitos e ilícitos, sua visão de perniciosidade do candidato que escolheu ser seu inimigo. E ainda faz isso com uso de um serviço público concedido, na cara limpa, como se pertencesse à “famiglia”. Se isso não for corrupção e improbidade, o que será?
O General Villas Boas disse apenas o óbvio, diante do quadro de criminosos ataques da direita fascista aos direitos constitucionais, à democracia. Também nós, os democratas, exigimos a responsabilização criminal daqueles que jogaram o Estado brasileiro na sua mais profunda crise do período republicano, a começar pelos que, feito Judas,  se venderam por dinheiro para derrubar fraudulentamente uma presidenta honesta, eleita por mais de 54 milhões de brasileiras e brasileiros. Também nós rejeitamos a impunidade daqueles que covardemente atacaram a caravana pacífica do Presidente Lula. Exigimos apuração séria da autoria dos tiros deflagrados contra o ônibus da comitiva.
Também nós conclamamos para os valores democráticos e para a preservação da ordem pública. Por onde a caravana passou, a equipe precursora dialogou com as autoridades da segurança pública para evitar tumultos. Quando a multidão que demonstrava pacificamente seu apoio ao Presidente Lula se indignou com os ataques, a organização dos eventos sempre tratou de acalmá-la e de pedir que não respondesse às provocações.
Quem tem insistido em colocar em risco a ordem pública são os que destilam ódio anti-petista, que têm, em redes sociais, instigado à violência, sugerindo, até, ação letal contra Lula e militantes progressistas. Espalham o mesmo veneno que levou à morte trágica do Professor Cancellier e ao brutal assassinato de Marielle Franco. Não têm escrúpulos, porque nada têm a perder: odeiam a democracia, odeiam o direito à livre manifestação, odeiam as garantias fundamentais da Constituição e não têm nenhuma lealdade, nenhuma fidelidade a está. A abolição do Estado democrático de Direito é seu objetivo maior, de preferência num processo sanguinário que cause muita dor e perda de vidas humanas. Para eles, quanto pior, melhor é.
Queremos, os democratas, que as Forças Armadas exerçam seu papel. Nenhum governo na recente história do País mais as prestigiou que os governos do PT. Aprimorou sua formação, ensinando-lhes profissionalismo e respeito a padrões humanitários internacionais; deu-lhes visibilidade na política global, fazendo-as exercer um papel fundamental na pacificação de regiões conflagradas do planeta; reequipou-as para poderem cumprir com sua missão de defesa dos interesses nacionais.
O General Villas Boas é um espécime dessa boa cepa das Forças Armadas, preocupada com o destino do País. E essa preocupação é mais do que compreensível, principalmente num contexto em que ativos estratégicos do Brasil estão sendo alienados por uma bagatela por um governo ilegítimo que não tem compromisso com nosso futuro, mas foi instalado para atender a ganância espúria de potências estrangeiras. Um grito de alerta todos nós, democratas, esperamos e saudamos.
O que democratas não podem fazer é atender às provocações com segundas intenções da “famiglia” Marinho et caterva, que querem indispor as forças progressistas do País com os militares. É importante lembrar que não há substancial diferenças entre nossos sonhos, das Forças Armadas e dos verdadeiros democratas, defensores da Constituição Cidadã, num futuro melhor para nossos filhos, numa nação independente, altiva e reconhecida pelo mundo por sua vocação de trabalho e de respeito à alteridade, à diferença e aos valores da democracia e dos direitos humanos. E juntos vamos derrotar as forças do ódio, da intolerância e do caos.
 GGN

terça-feira, 6 de março de 2018

História do Golpe: Como se descontroem governos, um raio X da crise, por Luis Nassif

Os futuros historiadores têm, no momento atual, um laboratório completo para prospectar como ocorre a desmontagem de governos democraticamente eleitos.
Presidentes são muito mais fortes que a imprensa. Quando caem é por sua incapacidade de se valer das armas políticas e institucionais de que dispõem.
​A primeira arma do presidente é o projeto de país que ele pretende.
Dilma Rousseff começou de forma esplêndida seu primeiro governo. Tinha claro que, ao período de forte inclusão, deveria ser seguida uma era de consolidação da competitividade da economia e do aprofundamento das políticas sociais.
Definiu claramente três vetores: foco na economia real, com ênfase em financiamento, concessões e inovação, e aprofundamento das políticas sociais. E lançou um conjunto de programas expressivos nas três áreas entre os quais o regime de partilha do pré-sal, a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, o Plano Brasil Maior, o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), Fies, a Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial).
Na macroeconomia, Dilma deu início a uma desvalorização gradativa do real, redução da taxa Selic e do spread bancário.
Durante um curto espaço de tempo, o país experimentou o sabor inesquecível de uma economia normal, O enorme capital financeiro acumulado em décadas de taxas de juros descomunais começou a se mover em direção à renda variável (http://migre.me/qEaRS).
O grande momento foi em outubro de 2012, quando o Banco Central ganhou a briga de braços com o mercado e baixou a Selic para 7,14%. Antes disso, quando conseguiu mudar as regras da poupança, para jogar o piso dos juros para patamares inferiores.
Durou até abril de 2013.
Antes disso, quando a inflação ameaçou retomar e o crescimento a cair, houve um curto circuito no governo Dilma e afloraram as vulnerabilidades deixadas pelo governo Lula e pelo PT, no período de bonança.
Ausencia de estratégia de poder
Em todo país democrático, as bases do poder do presidente repousam em alianças com o Congresso, Judiciário, grupos de mídia.
São os segmentos que pertencem ao establishment, ao mercado de opinião já estabelecido. Nos grandes processos de inclusão, o mercado estabelecido se incomoda. Esse incômodo passa pelo mundo político – a oposição que perdeu o bonde -, e por estamentos públicos.
Especialmente em relação às corporações com poder de Estado – Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal -, seguindo o modelo norte-americano, a Constituição definiu claramente formas de subordinação ao poder popular – expresso no Presidente da República, eleito pelo voto do povo.
Essa subordinação se dá na definição da política de atuação da PF (não confundir com interferência em processos), na nomeação de juízes dos tribunais superiores, do Procurador Geral da República e do delegado geral da PF.
Os legisladores entenderam que o dar autonomia às corporações criaria poderes dentro do Estado, colocando em risco a governabilidade (leia, a propósito, artigo do jurista Luiz Moreira em http://migre.me/qF9aj).
A visão política de Lula era de que as ameaças à governabilidade estavam na mídia e Forças Armadas. Mas a mídia só ganhava força em momentos de instabilidade no mercado financeiro.
Julgava que agindo dentro do mais amplo republicanismo esvaziaria por si a campanha midiática, sobre pretensões bolivarianas, chavistas, castristas. E a governabilidade seria garantida pela popularidade do presidente e pela revolução econômica dos incluídos.
No Judiciário e sistema policial, cometeu uma série infindável de erros:
Erro 1 – as indicações para o STF.
Erro 2 – a falta de interlocução com o Procurador Geral da República.
Erro 3 – a perda de controle sobre a Polícia Federal, especialmente após a descentralização  da inteligência
Erro 4 –falta de estratégia na comunicação pública e falta de sensibilidade para entender o fenômeno das redes sociais.
Erro 5 – o Mensalão. A decisão inédita de tornar público o julgamento acabou fornecendo uma munição inédita e fatal.
O resultado final foi a terra arrasada no PT, com a prisão das suas principais lideranças e a marca indelével da corrupção pregada na testa do partido.
Os erros de Dilma
Em algum momento de 2013, Dilma perdeu o eixo. Queda do nível de crescimento, pressão da inflação e, depois de junho, a popularidade despencando. Por cima de tudo, o fenômeno das redes sociais acelerando drasticamente as demandas sociais, inclusive dos recém-incluídos.
Tornou-se um trem desgovernado, agindo de impulso, isolando-se, atropelando regras básicas de política, economia e sociabilidade.
Fechamento - foi gradativamente se afastando dos melhores conselheiros, Lula, Delfim, Belluzzo e dos amigos que ousavam apontar para os erros que estavam sendo cometidos.
Obstrução dos canais de participação – Conselhão, os conselhos empresariais da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), os conselhos sociais do Gilberto Carvalho, contatos com associações e sindicatos.
Desmonte da política fiscal – as desonerações não levaram à recuperação da economia, mas temia-se que não as renovando aprofundaria a crise.
Desatenção com os sinais de junho – teriam sido providenciais, se bem compreendidos e gerando mudanças no comportamento da presidente. Mas não captou os sinais.
Paralisação de políticas estruturantes – O Conselho de Gestão foi abandonado assim como os trabalho da EPL (Empresa de Planejamento e Logística), os programas do MCTI (Ministério de Ciências, tecnologia e Inovação). Até alguns bens elaborados programas do MEC, da gestão Haddad perderam-se por falta de cuidados na implementação, como aconteceu com o Fies.
Queda de braço nas concessões – tentou-se reduzir a Taxa Interna de Retorno das concessões, como meio de diminuir o Custo Brasil. Deu errado. Assim como deu errado o modelo de redução da conta de luz, muito devido a problemas climáticos.
Erros de comunicação na Copa - houve um trabalho exemplar de organização, mas que só ficou claro em plena Copa, quando foram tirados os tapumes dos aeroportos e estádios.
Mesmo assim, Dilma logrou vencer as eleições e encaminhar-se para o segundo mandato.
Aí cometeu uma sucessão adicional e inédita de erros.
Demora em começar o governo - Em vez de se repensar o segundo governo, mergulhou em dois meses de retiro onde a única preocupação foi montar uma base política própria para as eleições na Câmara, desdenhando as lições de Lula. E promover uma reforma ortodoxa na economia, sem o cuidado de comunicar aos diletos eleitores.
Erros com a Petrobras – criou o falso escândalo da refinaria de Pasadena, dando vida a uma denúncia morta por uma questão não resolvida com o antigo presidente José Sérgio Gabrielli. Quando estourou a Lava Jato, manteve a diretoria por meses, ao custo da saúde da presidente Graça Foster. A Petrobras ficou sangrando por 8 meses.
Erros com a Lava Jatos – deixou a Lava Jato correr solta, julgando que o fato de nada dever significaria que nada deveria temer. Não cuidou de defesas mínimas legais, como o de impedir vazamentos e manipulações de depoimentos, enquadrar os faltosos.
Erros na Câmara – a tentativa de eleger um presidente da Câmara produziu um desastre que entregou o poder de bandeja para Eduardo Cunha.
Quadro atual
A história do Procurador Geral da República Rodrigo Janot e do delegado geral da Polícia Federal de que ambos os poderes vão atrás de fatos, não de pessoas, e que a impessoalidade domina as investigações é boa para o eleitorado, não para quem domina as entranhas do poder.
Ministério Público, Polícia Federal, Judiciário em geral, buscam sempre ampliar seus espaços e subordinam-se a quem detem de fato o poder. Se esse alguém é externo ao Executivo, aderem.
Quando alcançam seus objetivos não é por nenhuma conspiração, mas pela lógica nayural, intrínseca ao exercício do poder por estamentos burocráticos, que dá certo quando os governos falham.
A partir de determinado momento, a inação do governo Dilma e a pro atividade da mídia – e de seu aliado preferencial, o PSDB – deixaram claro onde estava o centro de poder. E decididamente não era no Palácio do Planalto.
É isso o que explica o fato de Rodrigo Janot não ter aceito a denúncia contra Aécio Neves, apesar da profusão de detalhes sobre propinas na delação de Alberto Yousseff. Ou ainda manter na gaveta inquérito que desde 2010 tramita na PGR sobre contas de Aécio em paraísos fiscais. É o que explica também a não tomada de medidas contra vazamentos. Ou o fato do MPF e a PF não terem investigado as relações da Abril com Carlinhos Cachoeira e dificilmente aprofundarão as ligações da Globo com a CBF. Nem sequer prestado esclarecimentos sobre as investigações da cocaína encontrada no helicóptero de um senador mineiro.
Estratégias
A frente que quer derrubar Dilma é bastante heterogenea, de Eduardo Cunha a Aécio Neves, do conservadorismo evangélico ao preconceito mais abjeto, tudo devidamente estimulado pela mídia – muitos dos grupos dependem da entrada de um presidente acessível para sobreviver.
Por outro lado, essa heterogeneidade levará fatalmente a uma disputa intestina.
Enquanto Eduardo Cunha serviu ao propósito de derrubar Dilma, foi poupado. À medida que a queda de Dilma deixa de ser uma possibilidade distante, passa a ser bombardeado pelos jornais.
A Globo tem nos evangélicos a maior ameaça ao seu predomínio. Se Dilma cair, o protagonismo será do PMDB, não do PSDB. Logo, em breve voltarão os ataques a Renan.
Por outro lado, os principais programas implantados no primeiro governo Dilma sobrevivem, esquecidos, andando de lado, mas sobrevivem.
A presidente ainda teria espaço para reagrupar ideias e trabalhar com a única arma que lhe resta: um programa de governo.
GGN

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Xadrez do general Sérgio Etchgoyen, o comandante de fato do governo Temer, por Luis Nassif do Jornal GGN

Peça 1 – a volta previsível do poder militar
A saída pela via militar estava prevista desde o início do impeachment. E a peça central sempre foi o general Sérgio Etchgoyen, nomeado para Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
(...) Com o vale-tudo corporativo instituído, começam a aparecer os planos de devolver algum protagonismo político às Forças Armadas, a exemplo do ativismo atual do MPF, do TCU e das demais corporações de estado. Com a diferença que se trata de uma corporação armada.
(...) Consumado o golpe, Michel Temer assumiria a presidência em um quadro de ampla instabilidade política, agravado pela perda de seu mais eficiente operador, Eduardo Cunha.
Não haverá como se apresentar à opinião pública com um ministério de notáveis. Por outro lado, para dar conta dos compromissos firmados com o mercado, terá que recorrer a medidas fiscais drásticas, ampliando a reação dos movimentos sociais e o mal-estar geral. E não terá recursos para manter os programas de renovação das Forças Armadas.
É aí que se junta a Peça 3 com a Peça 2: identificação de um novo inimigo interno e externo que justificasse a volta do protagonismo político.
(...) Quem está à frente dessas articulações é o general Sérgio Etchegoyen, chefe do Estado Maior do Exercito Brasileiro e de uma família que faz parte da própria história do Exército.
O meio campo com o governo Temer está sendo articulado pelo filósofo Denis Rosenfield, articulista do Estadão e colaborador do Instituto Milenium. Denis é amigo de Etchegoyen, provavelmente devido à mesma origem gaúcha, foi indicado assessor de Temer e há indícios de que mantem contatos com governos estrangeiros.
No dia 22 de abril, por exemplo, encontrou-se com Etchegoyen no Centro Brasil 21, em Brasília. Dois dias antes, a pedido de Etchegoyen, agendou jantar na residência do general com os comandantes da Marinha e da Aeronáutica. A intenção era montar uma frente que forçasse Temer a assumir compromisso de nomear um militar para o Ministério da Defesa. O indicado seria o general Joaquim Silva e Luna, Secretário Geral do Ministério do Exército.
Além disso, se tentaria arrancar de Temer o compromisso de assegurar a permanência dos comandantes em seus postos, recriar o Gabinete de Segurança Nacional, sob a chefia do general Etchegoyen, e colocar Denis na Secretaria de Comunicação da Presidência. Para o lugar de Etchegoyen iria o General Mourão, de pensamento similar.
O decreto no. 8.793, de 29 de junho passado, que fixa a Política Nacional de Inteligência é o passo mais ousado nessa direção (http://migre.me/ufH0w).
Assinado pelo interino Michel Temer e pelo Chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Sergio Westphalen Etchegoyen, o decreto visa criar uma política para armar o país contra ameaças trazidas por esses tempos cibernéticos e de terrorismo.
Contempla a proteção de forças de conhecimento nacional, medidas contraespionagem cibernética, contraterrorismo etc. Mas confere poderes e atribuições que podem facilmente resvalar para o autoritarismo e para o desrespeito aos direitos humanos. E isso, em uma etapa da vida nacional de radicalização e de instrumentalização política dos instrumentos de investigação.
Confere ao GSI e à Política Nacional de Inteligência o poder de monitorar movimentos, manifestações, cooptar funcionários públicos para a função de segurança e até monitorar cientistas brasileiros no exterior.
(...) Nas Olimpíadas, Temer nomeou o GSI responsável pela segurança, atropelando os responsáveis naturais, Ministro da Defesa ou da Justiça. O Chefe do Estado Maior conjunto sequer foi convidado para a abertura das Olimpíadas.
A segurança foi organizada pela burocracia das Forças Armadas – acantonada em Brasília – não pelas tropas de combate.
(...) A criação de Unidades Militares de Combate, seja na Amazônia, Haiti ou África, deixa claro o verdadeiro papel das Forças Armadas e os malefícios advindos de sua transformação em polícia. Há levantamentos internacionais mostrando que, nos países em que se tornaram polícia, foram sucateadas, com os equipamentos tecnológicos de ponta – para a defesa nacional – substituídos por investimentos em tanques, brucutus, algemas, granadas e revólveres.
A diluição desse modelo começou com as UPPs (Unidades de Policias Pacificadoras). No início, pareceu dar certo no Rio, devido ao fato do Secretário de Segurança José Mariano Beltrame ser da PF e respeitado por ela. Ainda no governo Dilma, houve financiamento do governo federal e a parceria com o Exército.
O Exército burocrático gostou, porque dá visibilidade, nome e prestígio à força. O Exército de combatentes – inteligência, ciência e tecnologia – sabia que seria o início do sucateamento, com a burocracia voltando a tomar conta.
Os fatos apontam para uma tendência cada vez maior de intervenção dos militares na vida nacional e, ao mesmo tempo, um desprestígio cada vez maior do poder civil.
Sinais recentes:
·      A entrega do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) a um militar da ativa, que passa a frequentar o coração do governo.
·      A tentativa do Ministro da Justiça de criar a figura do inimigo interno nas manifestações e em factoides sobre o Islã e colocar as FFAAs na repressão interna.
·      O convite da presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Carmen Lúcia, para que as Forças Armadas ampliem sua participação na segurança nacional.
·      A criação e utilização da Força Nacional de Segurança para outros propósitos.
(...) Por tudo isso, as perspectivas atuais são as seguintes:
1.     Permanece o risco da prisão de Lula, visando promover agitações populares que justifiquem o endurecimento do regime.
2.     Continua baixa a probabilidade de recuperação da economia, ainda mais com a combinação de ajuste fiscal rigoroso e ritmo lento de queda dos juros.
3.     Há uma probabilidade não desprezível de Temer ser despojado do cargo por conta dos julgamentos do TSE e pela desmoralização contínua de seu governo.
4.     Persistirá a tendência de ampliação da presença dos militares no governo, ao mesmo tempo em que se aprofunda a desmoralização do poder civil.
5.     Mesmo assim, qualquer ampliação da intervenção militar viria como retaguarda para um governo civil.
Peça 2 – o pacto com as Forças Armadas
Passado o impacto inicial com o anúncio da intervenção no Rio, começaram questionamentos fortes por toda parte. Não há um especialista sério, em matérias de segurança, capaz de endossar essa aventura.
Nem as pessoas de bom senso nas Forças Armadas, conforme se conferiu no depoimento ao Senador do General Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, comandante das Forças Armadas, sobre a ocupação da Maré pelo Exército.
Além das cenas chocantes, que ele afirmou ter testemunhado, de soldados armados circulando entre crianças e senhoras, Vilas Boas enfatizou a falta de eficácia dessas ocupações. Foi só o Exército abandonar o local, para tudo voltar ao quadro anterior em poucos dias.
Por tudo isso, o que está em jogo provavelmente é o seguinte.
As Forças Armadas entraram como álibi nessa história. Houve uma intervenção civil, que o governo Temer revestiu de militar no próprio decreto de criação. Além de nomear um general para comandá-la.
Houve um acordo formal com as Forças Armadas, para não as envolver no policiamento de rua, ocupação de territórios ou combate frontal aos criminosos.
 O papel das FFAAs será o de ajudar a fortalecer a ideia das ameaças internas e externas, permitindo ao governo avançar cada vez mais nas medidas arbitrárias.
Em troca, haverá reforço em seu orçamento.
Peça 3 – as medidas de exceção injustificáveis
O jogo tornou-se totalmente claro com o anúncio de que o Ministro da Defesa – um mero coadjuvante de Sérgio Echtgoyen – iria requerer mandados coletivos de busca e apreensão no Rio, um claro ensaio à decretação do estado de sítio.
Mal saiu a notícia de que Michel Temer pretendia aplicar mandados coletivos de busca e apreensão no Rio de Janeiro, pelo Twitter procuradores – em geral críticos contra os “garantistas” – levantaram três pontos relevantes:
A ineficácia dessa estratégia de segurança;
Os riscos para os direitos humanos;
A existência de uma série de dispositivos na Constituição e no Código Penal, que poderiam ser utilizados pela segurança, sem a radicalização dos tais mandados coletivos.
De Luiz Lessa, procurador da República no Rio:
Intervenção militar não é licença de extermínio, se tal licença, por mais absurda que seja essa hipótese, fosse possível, a PMRJ já tinha acabado com a criminalidade do Rio, era só autorizar a matança, entregar a munição, a gasolina e os coletes à prova de bala.
De Vladimir Aras, responsável pela cooperação internacional da Procuradoria Geral da República:
Constituição, art. 5º, inciso XI: "a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, SALVO EM CASO DE FLAGRANTE DELITO ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;"
A intervenção federal não suspende garantias individuais. Entre essas garantias está o direito à inviolabilidade domiciliar. Se houvesse sido declarado o estado de sítio, seria possível fazer buscas coletivas, inclusive sem mandado judicial, como autoriza o art. 139, V, da Const.
Na jurisprudência, há casos de mandados individualizados contra Fulano, Beltrano ou Sicrano que foram invalidados por tribunais superiores por não terem especificado precisamente o local alvo da diligência, lembra @WSarai
Não apenas isso. Conforme explicava Aras,
Criminosos que ataquem as Forças Armadas ou que estejam na iminência de fazê-lo podem ser reprimidos com força letal, se preciso. Isto não depende de leis especiais nem decorre da intervenção federal. São mantos legais previstos no Código Penal e no CP Militar, como legítima defesa.
Por outro lado, se as Forças Armadas e a Polícia tiverem dados de inteligência de que em certo local (casa, igreja, escola, empresa etc) há armas, criminosos foragidos ou drogas (um crime em curso), não é necessário mandado judicial para entrada e busca, para prisão ou apreensão.
O que o STF (Supremo Tribunal Federal) fará em relação às medidas anunciadas?
Valendo a regra atual, nada.
A estratégia de Sérgio Etchgoyen será essa: à medida que se avance a tal operação, ousar mais medidas de arbítrio, testando a resistência das instituições nacionais.
Se não houver resistência, meterá a bota na jaca da Constituição. E não venham esses débeis civis do Supremo, da PGR e do Congresso reclamarem mais tarde.
GGN

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Jornalista Igor Gielow da Folha de São Paulo diz que Moro se enrolou com denúncia contra "amigo"

O jornalista Igor Gielow, repórter especial da Folha, publicou artigo nesta quinta (31) criticando a reação de Sergio Moro à denúncia de Rodrigo Tacla Duran contra o amigo pessoal do juiz, o advogado Carlos Zucolotto. "Para todos os efeitos, Moro piscou", disparou. 

No último final de semana, Folha divulgou que Tacla Duran acusa Zucolotto de intermediar um acordo de delação premiada com os procuradores de Curitiba, que acabou fracassado. Duran é réu por lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa e afirma que o amigo de Moro cobrou um terço dos honorários "por fora", para repassar o dinheiro às pessoas que ajudaram nos bastidores da negociação. 

Contrariado, Moro entrou em contato com Zucolotto e respondeu à Folha que a notícia era falsa. Ele também usou um despacho em um dos processos de Lula para se defender, alegando que não era contra a eventual apuração da denúncia de Duran.

"Sua reação à acusação de que um advogado amigo negociava acordos por fora na Lava Jato chamou mais atenção do que a insinuação em si. Moro tratou de desqualificar o acusador, chamando-o de 'delator foragido'. Há nuances óbvias, até porque o delator em questão não chegou a ter a delação aceita, mas é impossível ignorar a ironia de ver o juiz que tanto valorizou o instituto da delação partir para essa linha", escreveu Gielow. 

O jornalista também não poupou Moro por seu exibicionismo na pré-estreia do filme da Lava Jato. Lauro Jardim, em O Globo, escreveu que o juiz fez questão de furar um esquema de segurança para chegar ao cinema em meio ao público do shopping, causando alvoroço. 

"Nada contra vida pessoal de magistrados, mas um pouco de recato seria desejável. Moro pisou na bola algumas vezes no curso da Lava Jato, mas seu trabalho é de importância ímpar na história recente do país", disse Gielow. "Cabe aos juízes moderação", acrescentou. 

Por fim, o jornalista ainda projetou que Moro pode ter a intenção de se tornar político com o fim da Lava Jato, assim como procuradores de Curitiba. A operação Mãos Limpas, da Itália, pode ser uma inspiração para além do Direito. 

"A Lava Jato já é marcada por estrelismo e voluntarismo de caráter messiânico por parte de alguns de seus integrantes da ponta, voltando ao questionamento do início desse texto. Na Itália da sua inspiração, a Operação Mãos Limpas, investigadores e magistrados entraram na política após disputas semelhantes e a efetiva reação congressual para esvaziá-la. Como lamentou em entrevista o historiador Giovanni Orsina, os protagonistas viraram agentes políticos, a começar pelo magistrado-símbolo da operação, Antonio di Pietro."

Do GGN

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Bandeira de Mello: Moro não está habilitado para ser juiz

O jurista Celso Antônio Bandeira de Mello disse, em vídeo publicado no Youtube, que Sergio Moro não está habilitado para ser juiz, pois adotou uma postura parcial e partidária na Lava Jato, chegando a atuar como um "acusador".

"Esse juiz Moro é um homem, a meu ver, muito pouco habilitado para exercer a função de magistrado. A magistratura exige serenidade e sobretudo imparcialidade. Não pode ser uma conduta apaixonada. Mesmo que ele assuma um ar sereno, e assume, o comportamento dele não é de magistrado. O comportamento dele é de acusador."

Bandeira de Mello ainda disse que usar prisões preventivas para obter delações é digno de torturadores e avaliou o caso triplex como uma "perseguição" a Lula, para evitar que o ex-presidente tente disputar o Planalto em 2018. Confira o vídeo abaixo:

GGN

terça-feira, 11 de julho de 2017

Entre sair ou ficar do governo, Tucanos escolhem o muro

Foto: Agência Brasil

É destaque no Painel da Folha desta terça (11) mais uma informação qu confirma que o tucanato decidiu subir no muro em relação ao governo Michel Temer. Enquanto uma ala ameaça com debandada há semanas e reforça esse discurso nos últimos dias, sinalizando apoio a Rodrigo Maia, Fernando Henrique Cardoso decidiu ligar para Temer e prometer que o PSDB não deixaria a base aliada. Pelo menos por enquanto.

Ontem, os tucanos se reuniram em Brasília, mas não selaram a saída do governo mesmo diante da derrota inicial de Temer na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. "Fernando Henrique Cardoso garantiu a Temer, por telefone, que a reunião do PSDB desta segunda (10) não selaria o desembarque dos tucanos do governo", publicou o Painel.

Prova disso teria sido a mudança feita pelo PSDB na CCJ para garantir que o relatório de Sergio Zveiter orientando voto favorável ao processo de Temer no Supremo Tribunal Federal será rejeitado.

"Durante a leitura do parecer de Zveiter, os deputados Baleia Rossi (PMDB-SP), Pauderney Avelino (DEM-AM) e Beto Mansur (PRB-SP) repassavam os votos pró-Temer na CCJ. Contaram 39 a favor do presidente. Optaram por colocar os sete tucanos da comissão como contrários", afirmou o Painel.

O GGN mostrou nesta terça (11) que o PSDB só vai desembarcar de vez do governo quando as reformas impopulares forem aprovadas. Hoje, o Senado deve concluir a votação da trabalhista.

GGN

terça-feira, 4 de julho de 2017

Cogita-se que Moro usará "domínio do fato" para condenar Lula, dizem interlocutores do juiz

Foto: Lula Marques

Menos de uma semana após ter a condenação imposta ao ex-tesoureiro João Vaccari Neto derrubada por juízes de segunda instância, Sergio Moro aparece em reportagem do Estadão, divulgada nesta segunda (3), como um magistrado "meticuloso" que vai redobrar os cuidados com a sentença de Lula no caso triplex.

Mas para condenar Lula sem que a Lava Jato tenha fornecido provas cabais da posse do triplex, Moro vai ter de recorrer à saída inaugurada e muito criticada à época do Mensalão: usar a teoria do domínio do fato.
Segundo o Estadão, "fontes próximas a Moro" disseram que essa alternativa é cogitada porque a absolvição de Vaccari "dificulta uma decisão contrária a Lula". "Elas avaliam que, para condenar o petista, o juiz teria de aplicar a teoria do domínio do fato, alegando que Lula tinha controle sobre tudo o que acontecia."

No caso triplex, Lula é acusado de receber propina da OAS por conta de 3 contratos com a Petrobras. Mas a defesa do petista entregou, nas alegações finais, prova de que o apartamento jamais poderia ser liberado para uso do ex-presidente sem que a empresa ou o próprio petista tivessem depositado o valor correspondente ao imóvel e às reformas em uma conta da Caixa Econômica Federal.

Para justificar a transferência do triplex, a Lava Jato disse que Lula era o chefe do petrolão. Seu papel era fundamental ao esquema de favorecimento a empreiteiras porque era o presidente quem avalizava os nomes indicados para diretorias da Petrobras. Sem provas dessa acusação, a turma de Deltan Dallagnol apelou para a teoria da abdução das provas. (Saiba mais aqui).

Ainda segundo o Estadão, além de apelar para o domínio do fato, Moro pode fazer com que Marisa Letícia seja a responsável pelas tratativas em torno do triplex. A ex-primeira-dama, morta em fevereiro em decorrência de um aneurisma cerebral, foi "quem decidiu comprar uma cota da Bancoop no prédio do Guarujá e quem mais vezes esteve no imóvel", publicou o jornal. Porém, em função da morte, Marisa não deve mais constar entre os réus.

GGN