quarta-feira, 19 de agosto de 2015

O Estadão diz que não existe oposição e o PSDB anda a reboque de manchetes

Nassif e FHC

"Como diz Fernando Henrique Cardoso, a melhor maneira de consertar o rumo é, primeiro, admitir o erro. Foi o que o Estadão começou fazer admitindo, em editorial, que faltam rumos e propostas à oposição", escreve o jornalista Luis Nassif; trecho do texto do jornal diz que "na prática, a oposição ainda não apresentou ao País o que pretende construir no lugar das ruínas lulopetistas – e não o fez pela simples razão de que não sabe o que quer"

Como diz Fernando Henrique Cardoso, a melhor maneira de consertar o rumo é, primeiro, admitir o erro.

Foi o que o Estadão começou fazer admitindo, em editorial, que faltam rumos e propostas à oposição.

A trombada com a realidade se deu depois de um artigo de Sérgio Fausto, cientista social lotado no Instituto Fernando Henrique Cardoso.

Assim como seu pai, Boris, Sérgio Fausto é incapaz de um gesto populista. Não abandonou o rigor acadêmico e a honestidade intelectual, mesmo em um mundo midiático assolado pela demanda por rancor e ódio.

Poderia ser a cara do PSDB. É reformista, defensor das boas políticas sociais, contra o estatismo desvairado. Mas o PSDB preferiu ter a cara de Marco Antonio Villa, aquele que chama os adversários de "cachaceiros". Cada partido tem a cara que escolhe.

Diz o Estadão:
"Na prática, a oposição ainda não apresentou ao País o que pretende construir no lugar das ruínas lulopetistas – e não o fez pela simples razão de que não sabe o que quer. (...) O PSDB é hoje provavelmente o principal beneficiário da crise do PT, mas carece de unidade e, portanto, de propostas concretas para o "dia seguinte" ao fim da era petista. Sua única liderança capaz de lhe dar rumo é Fernando Henrique, mas este não tem mais capital eleitoral. Resta-lhe o papel de conselheiro, em meio a um cipoal de interesses divergentes entre os caciques tucanos".

Não para aí:
"Em razão de disputas internas e de sua inaptidão para definir o rumo que pretende tomar, o PSDB parece navegar ao sabor dos acontecimentos. Em razão disso, o partido optou, em alguns casos, pela pura e simples irresponsabilidade, ao ajudar a aprovar no Congresso medidas que sabotam o ajuste fiscal. Dizem os adeptos dessa estratégia que, para minar o governo, vale tudo – inclusive renegar conquistas importantes do governo de Fernando Henrique, como o fator previdenciário.

É graças a atitudes como essas que, como diz Fausto, os tucanos "hoje têm um déficit de credibilidade, inclusive com seu eleitorado", razão pela qual "a crise do PT não se traduz automaticamente num novo ciclo vitorioso do PSDB".

Não é pouco, tratando-se do jornal que, até agora, mais se alinhava com o PSDB.

Em parte, deve-se à tentativa dos grupos paulistas de emplacar José Serra. Mas a parcela maior é pela óbvia questão de que o PSDB tornou-se um partido a reboque de manchetes, não de pensamentos e obras.

Os Fausto têm uma admiração genuína por FHC. Não fosse por isso, concordariam que o próprio Fernando Henrique nunca entendeu o projeto de país que ele próprio conduziu.

Em todo seu governo, FHC guiou-se pela inércia. Aceitou o jogo de interesses por trás do financismo desvariado de seus economistas e deu-lhes carta branca para a desregulamentação total do mercado financeiro. Mais que isso, permitiu a montagem de grandes tacadas, como foi a política cambial do início do Real e as jogadas em Foz de Iguaçu com as contas CC5, na era Gustavo Franco.

Nos outros setores da economia, limitou-se a se deixar levar pelas ondas do neoliberalismo acrítico trazidas para o país pelo governo Collor, que ele aplicou sem um mínimo de criatividade. Foi incapaz de assimilar qualquer valor do período, gestão, inovação, mercado de capitais popular, políticas sociais liberais (como o Bolsa Família, por exemplo).

O simples fato de parar a inflação trouxe para o nível do consumo milhões de brasileiros. Não foi necessária nenhuma política pública. Tinha um vasto ativo na mão - o novo mercado de consumo que emergiu com o fim da inflação -, um movimento tectônico das multinacionais realocando suas fábricas ao redor do mundo e encantadas com a China e o Brasil; um setor técnico com um turbilhão de novas ideias e conceitos. Matou tudo com a política cambial e os juros implementados pela equipe econômica, e pela absoluta falta de vontade política, na qual pontificava o deslumbramento com as prerrogativas do poder, mas nenhuma vontade transformadora.

Nada fez, porque nunca teve a capacidade de entender as ideias-chaves, de chutar em gol.

No Summit do Etanol, que a Única promoveu em 2003, fui convidado para comentar as palestras de uma mesa variada.

O primeiro palestrante foi Felipe Gonzales, ex-primeiro MInistro da Espanha. Em 15 minutos ele traçou com maestria o que seria uma civilização do etanol na América Latina. O segundo foi George Soros, que me lembrou em muito Walther Moreira Salles - cuja frase preferida era "eu sei usar bem as poucas coisas que aprendi". Em 15 minutos detalhou riscos e oportunidades do continente, incluindo os efeitos sobre a apreciação cambial e a necessidade dos investimentos em tecnologia.

Chegou a vez de FHC. Uma longa palestra para tentar provar que Celso Furtado estava errado, quando prenunciou que sempre haveria desequilíbrio nos preços relativos entre produtos primários dos emergentes e os industrializados dos países avançados.

Era uma conversa velhíssima que remontava os anos 60, entre Rosentesin-Rodan e Celso Furtado e que ressurgiu na primeira crise do petróleo. Detalhe: a fonte de FHC era um artigo de Ilan Godfajn publicado naquele dia no Estadão.

Em muito FHC lembra Dom Pedro 2o no famoso episódio em que o Barão de Mauá tenta induzi-lo a empurrar um carrinho de pedreiro - para uma foto simbólica em favor do trabalho - e ganhou a repulsa do imperador.

No poder, o cientista social FHC nunca passou de um literato apreciador de obras alheias.

Hoje em dia, tem-se um PT arrebentado de um lado, sem diretrizes, sem comando e sem bandeiras. Mas com o Instituto Perseu Abramo fervilhando de ideias e propostas que, plantadas em solo fértil, poderiam um dia voltar a florescer.

Na outra ponta, o PSDB loteando o Instituto Teotônio Vilella e o IFHC produzindo ideias apenas para deleite pessoal do imperador.

Do GGN

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Jornalão dos Frias reconhece que os protestos de ontem não derrubam Dilma

 Octavio Frias Filho e a presidente Dilma Rousseff
Conforme o jornal de Otavio Frias, manifestações do 16 de agosto não parecem destinadas a provocar mudanças no atual ritmo da crise política: “Se mantêm Dilma nas cordas, não a nocauteiam – pelo menos não por enquanto”; publicação destaca a importância da política fiscal de Joaquim Levy e o reforço da base de Dilma; “As solicitações de apoio e o novo fôlego que o PMDB parece disposto a oferecer devem ter como contraparte um plano de reformas.”

Diz a ‘Folha de S. Paulo’, que as manifestações do 16 de agosto não parecem destinadas a provocar mudanças no atual ritmo da crise política: “Se mantêm Dilma nas cordas, não a nocauteiam –pelo menos não por enquanto”.

O jornal destaca a importância da política fiscal de Joaquim Levy e o reforço da base de Dilma, para o governo reagir.

Apesar de mudanças recentes no comportamento de políticos e empresários, Dilma continua pressionada pelos protestos nas ruas.

Centenas de milhares de pessoas voltaram às ruas neste domingo (16) para protestar contra o governo Dilma Rousseff (PT).

Criticando a administração federal, condenando a corrupção, execrando Lula e o PT ou pedindo o afastamento da presidente, os manifestantes se reuniram em pelo menos 120 cidades.

Não eram tantos quanto no dia 15 de março, quando o maior ato, na avenida Paulista (São Paulo), atraiu 210 mil pessoas, de acordo com medição do Datafolha.

Mas os 135 mil que, segundo o instituto, se aglomeraram desta vez no mesmo local constituem, ainda assim, multidão bastante expressiva sob qualquer perspectiva –basta lembrar, por exemplo, que no dia 12 de abril se contaram 100 mil manifestantes.

Sem que tenham sido os maiores, mas sem que tenham perdido força, os protestos deste 16 de agosto não parecem destinados a provocar mudanças no atual ritmo da crise política. Se mantêm Dilma nas cordas, não a nocauteiam –pelo menos não por enquanto.

Ainda muito pressionada e tendo três anos e três meses de governo adiante, a presidente mais impopular da nossa história começou nos últimos dias um atabalhoado diálogo com variados setores da sociedade.

Ao país não interessa que essas conversas resultem em conchavos ou acordões por baixo dos panos –e a cobrança das ruas sem dúvida inibirá movimentações nessa vergonhosa direção.

Interessa, contudo, que se apresentem soluções para a crise brasileira, que não se resume a uma recessão na economia e a um desarranjo na coalizão parlamentar.

O que há de relevante no governo Dilma são as providências econômicas propostas, negociadas e implementadas parcialmente pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Trabalhos, porém, que também se limitam à administração de emergência dos imensos problemas gestados de 2011 a 2014.

As solicitações de apoio e o novo fôlego que o PMDB parece disposto a oferecer devem ter como contraparte um plano de reformas.

Trata-se de um novo pacto, um reconhecimento de que é preciso reorganizar o governo em outros termos, pois as ações do primeiro mandato de Dilma, seu programa eleitoral e a base política que mal e mal o sustentavam se esfarelaram.

Não se trata de dizer apenas que a presidente precisa reconhecer seus erros ou fazer um "mea culpa" público –isso não basta.

Dilma Rousseff precisa governar com a nova coalizão que procura formar e em resposta a uma realidade econômica dramática. Suas palavras não podem ser oportunistas ou vazias.

Do Brasil 347.

domingo, 16 de agosto de 2015

Dono da Globo faz meia culpa no golpe e atua como bombeiro para salvar cofre

João Roberto marinho e outros


O um dos donos do maior grupo de mídia do Brasil, o vice-presidente do Grupo Globo, João Roberto Marinho, procurou nas últimas semanas líderes das principais forças políticas do país: "Em todos os encontros, ele demonstrou preocupação com a situação econômica, mencionando a queda acentuada do faturamento dos grupos de mídia".

O vice-presidente do Grupo Globo, João Roberto Marinho, procurou nas últimas semanas líderes das principais forças políticas do país e integrantes do governo para expressar preocupação com o agravamento da crise e pedir moderação para evitar que ela se aprofunde ainda mais; ele esteve com o presidente do PSDB, senador Aécio Neves e falou com o governador Geraldo Alckmin, e o senador José Serra; Marinho também se reuniu com os ministros Aloizio Mercadante, Edinho Silva e Henrique Alves, e com o vice-presidente Michel Temer (PMDB), além do presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB) e com a bancada do PT na Casa.

Em todos os encontros, Marinho demonstrou preocupação com a queda acentuada do faturamento dos grupos de mídia; desde então, houve uma mudança na forma como a TV e o jornal de propriedade de Marinho passaram a tratar o governo; neste sábado (15), na edição do Jornal Nacional, não foi feita qualquer menção aos protestos que ocorrerão neste domingo (16), atitude bem diferente das edições da véspera das manifestações do primeiro semestre.

O vice-presidente do Grupo Globo, João Roberto Marinho, procurou nas últimas semanas líderes das principais forças políticas do país e integrantes do governo para expressar preocupação com o agravamento da crise e pedir moderação para evitar que ela se aprofunde ainda mais. Ele esteve com o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), na reunião com a bancada do PSDB no Senado, e falou com outros dois líderes de prestígio na sigla, o governador paulista, Geraldo Alckmin, e o senador José Serra (SP). 

Há dois meses, Marinho já manifestava preocupação com o cenário econômico e o risco de descontrole no ambiente político, quando recebeu o governador Geraldo Alckmin na sede da Globo, no Rio. Tal preocupação aumentou a decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de romper com o governo e patrocinar projetos que ameaçam o equilíbrio das finanças públicas.

Um dos proprietários da TV Globo, João Roberto também esteve reunido com três ministros do governo Dilma Rousseff (Aloizio Mercadante, Edinho Silva e Henrique Alves) e com o vice-presidente Michel Temer (PMDB) na semana passada, além de também se reunir com o presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB) e com a bancada do PT na Casa. No encontro com os petistas, ele afirmou que Dilma vai cumprir o mandato até 2018 (aqui).

Na conversa com Temer, que ocorreu na última terça (11), Marinho pediu uma avaliação das chances de o Planalto conseguir recompor sua base no Congresso e questionou o vice sobre os caminhos que o PMDB vê para o país. Em todos os encontros, ele demonstrou preocupação com a situação econômica, mencionando a queda acentuada do faturamento dos grupos de mídia e de outros setores da economia.

Desde que iniciou essas conversas, houve uma mudança na forma como a TV e o jornal de propriedade de Marinho passaram a tratar o governo. Em editoriais, o jornal O Globo passou a condenar a possibilidade de golpe e endureceu o discurso contra Cunha (aqui).

Na TV, os espaços para os discursos de Dilma tiveram sensível aumento. E neste sábado (15), na edição do Jornal Nacional, não foi feita qualquer menção aos protestos que ocorrerão neste domingo (16), atitude bem diferente das edições da véspera das manifestações do primeiro semestre.

Brasil 247

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Ricardo Murad tem R$ 17 milhões bloqueados pela Justiça Federal no MA

Rosena Sarney e o cunhado Ricardo Murad, seu ex-secretário de saúde

Ricardo Murad é alvo de investigação por suposto desvio de R$ 8 milhões de verbas para construção de unidades de saúde durante o governo da peemedebista no Maranhão.  

O juiz federal José Carlos do Vale Madeira determinou nesta quinta-feira, 13, a quebra dos sigilos fiscal e bancário e o bloqueio de R$ 17, 5 milhões em bens do ex-secretário de Saúde do Maranhão Ricardo Murad, cunhado da ex-governadora Roseana Sarney (PMDB), além de outras 11 pessoas e uma empresa suspeitas de desviar mais de R$ 8 milhões em verbas para a construção de unidades de saúde durante o governo da peemedebista.

Em ação de improbidade administrativa, o Ministério Público Federal atribui a Murad e aos outros investigados irregularidades como o pagamento para elaboração de projetos já existentes e a execução e pagamento por serviços antes mesmo da abertura de licitação.

Roseana Sarney e Ricardo Murad

“Verifica-se a ocorrência do seguinte fato: a licitação para elaboração dos projetos básicos para a construção de 64 unidades hospitalares (concorrência nº 007/2009-CPL/SES, de 28/12/2009, cujo objeto envolvia outros serviços de engenharia e outras unidades) foi posterior à licitação para a execução da construção das mesmas unidades hospitalares (concorrência nº 001/2009-CPL/SES, de 10/08/2009, cujo objeto é precisamente este). Isto posto, conclui-se logicamente que a concorrência nº 007/2009-CPL/SES incluiu nos serviços previstos em seu objeto a elaboração de projetos básicos já existentes pois o ANEXO I do edital da Concorrência nº 001/2009-CPL/SES apresenta o projeto básico padrão para as mesmas 64 unidades hospitalares de 20 leitos”, diz o pedido de liminar feito pelo MPF.


Segundo a ação, os projetos eram feitos por Renato Ferreira Cestoni, sócio da Proenge, empreiteira que depois realizaria as obras.

Segundo levantamento feito no início do ano pelo governo, hoje sob o comando de Flavio Dino (PC do B), mais de 20 destas unidades foram abandonadas ou tiveram as obras paralisadas. O BNDES, que financiava parte do projeto, suspendeu os repasses diante das irregularidades.

O ex-secretário creditou a decisão da Justiça a uma perseguição política movida pelo atual governador. “Murad disse ter absoluta convicção que assim que se manifestar, a justiça terá conhecimento dos fatos verdadeiros e revogará as medidas tomadas hoje. Ricardo Murad reforça ainda o ato de perseguição articulado pelo atual governador Flávio Dino, através de uma ação proposta pelo Estado, baseada em uma auditoria falsa e produzida pela Secretaria de Transparência, criada única e exclusivamente para perseguir seus adversários políticos”, diz nota divulgada nesta quinta-feira à noite pelo cunhado de Roseana.

A Proenge foi procurada mas ninguém atendeu os telefonemas na sede da empresa.

O juiz Vale Madeira é o mesmo que autorizou a ação da Polícia Federal na sede da empresa Lunus, pertencente a Jorge Murad, marido de Roseana e irmão do ex-secretário, em 2002. Na ação a PF encontrou R$ 1,3 milhão em dinheiro vivo no cofre da empresa. A revelação acabou com os planos de Roseana de concorrer à Presidência da República naquelas eleições.

Estadão

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Eduardo Cunha tem que sair da presidência da Câmara, diz Nassif

Eduardo Cunha
São visíveis os sinais de descontrole de Eduardo Cunha, por enquanto presidente da Câmara Federal.

Não se avalie apenas pelo olhar alucinado, que não consegue se fixar em nenhum ponto, pela fala descontrolada, pelos tiros que dispara a esmo, contra qualquer alvo que o descontente. Ele está clara e ostensivamente desequilibrado.

Fosse um piloto de avião, seria interditado. Se policial, tirariam suas armas até se submeter a um teste psicotécnico. Estivesse internado, seria confinado em uma área reservada a pacientes de alto risco.

Esse descontrole não recomenda que seja mantido à frente da Câmara, principalmente depois que for denunciado pelo Procurador Geral da República.

No cargo, ele pode armar barganhas, inclusive atropelando o regimento, como se observou no caso da votação da Lei da Maioridade Penal. Além disso,  possui poder de retaliação e já demonstrou pretender utilizar as instituições públicas para livrar-se da denúncia.

Testemunhas apontam-no como um sujeito perigoso – daí a importância de ser apeado do cargo, inclusive para que a Polícia Federal possa monitorá-lo, impedindo  ações de retaliação contra testemunhas.

Não se trata de um parlamentar comum, mas de uma ameaça pública – e ameaça individual aos seus adversários.

Do GGN

domingo, 9 de agosto de 2015

Os poderosos da república brasileira que aviltam e destroçam o país de hoje, leia

Imagem de ilustração

O momento delicado pelo qual atravessa a nação brasileira, definitivamente não é uma situação simplória, pelo contrário, merece análises mais aprofundadas, a princípio identifica-se uma profunda indiferença, algo que beira a irresponsabilidade, porque não dizer omissão de parte dos poderes que institucionalmente fundaram a República brasileira (Executivo, Legislativo e Judiciário).

Não desprezível também é o estrago causado, diuturnamente, pelo bastardo intitulado de quarto poder, a mídia, enfeixada em mãos inescrupulosas, fabrica, envenena e dissemina um bombardeio de informações por todo o Brasil, isto acontece desde as eleições de 2014. Com um tiroteio incessante destes não há economia, nem política e nem boa governança que resista, na maior parte das vezes levianas, como o caso do senador Romário (1). E prossegue ofertando ainda, vida as lamúrias de Aécio Neves que não se conforma com a derrota das urnas. Continua a forçar um terceiro turno.

O Legislativo na pessoa de seu presidente Eduardo Cunha e sua turba celerada estão sempre a postos, a pautar votações “bombas” impactantes na já frágil economia brasileira, deixando a Republica ingovernável (2). Fazem isto em nome de uma certa independência da casa legislativa ou mesmo por se declararem de oposição, ou por picuinhas menores contra a presidente Dilma, ou ainda para se protegerem de denúncias do Ministério Público Federal - MPF, que têm como seu principal desafeto Rodrigo Janot, que para tais quer vê-los fora de combate. Isto ocorre num gesto irresponsável, antipatriótico e desumano de Cunha que se elegeu no guarda-chuva largo do governo.

O Executivo com o ministro José Eduardo Cardozo, muito bem falante, mas que não chefia seus subordinados, permitindo por sua vez que agentes da Polícia Federal – PF, identificados com partidos de oposição ao governo faça escolhas idênticas nas investigações, preferencialmente a personagens ligadas ao governo, oferecendo munição letal a oposição, em que, delegados realizam monitoramento de presos sem autorização judicial, como tem sido amplamente divulgado pela imprensa, a exemplo do que ocorrera com o delator Yussef (3 e 4), entre outras questões.

O MPF tendo a frente Rodrigo Janot exercendo pouca liderança entre seus quadros permitindo desarmonia e dissenso (5), tem pouca noção de nacionalismo à medida em que faz parceria com organismos estrangeiros para investigar o patrimônio nacional empresarial, deixando nocauteada, destroçada a iniciativa privada brasileira, ante a concorrência do capital megalomaníaco internacional, quiçá o americano, recém saído de uma grave crise, sedento de novas oportunidades (6).

O Judiciário detentor de um Supremo Tribunal Federal – STF, apático, permitindo o juiz Mouro rasgar a Constituição Federal, ao tempo em que decreta prisão de suspeitos como forma de tortura psicológica para obter confissão (delação premiada). Condenando-os mesmo antes de serem julgados, detonando o princípio da Presunção de Inocência, uma importante garantia constitucional. Magistrado que se dar o luxo de impedir advogados de visitar seus patrocinados. Permite vazamentos selecionados de informações e investigados. Concede entrevistas valorativas sobre o caso em que ora atua sem o menor pudor (7).

E por fim os conglomerados de mídia, escrita, digital e televisada, com ênfase nos grupos Globo, Folha, Estadão, Veja, Época etc., com raros lampejos de cidadania de alguns jornalistas mais coerentes. Estes veículos de comunicação citados fazem juras de terra arrasada, torcem de manhã, à tarde e à noite pelo pior. Um bom exemplo disto estão nos links a seguir (8 e 9).

Estas facções de mídia despejam a cada segundo do noticiário nacional uma montanha de maledicências contra o Executivo, contra a economia (porque ela se retrai e dificulta o crédito) e contra os nacionais (porque são os mais prejudicados), principalmente contra o povo mais humilde que não tem como filtrar este bombardeio de lixo, ruminado por uma imprensa revanchista e com tendência a influenciar golpes de estados, ditaduras e o que lhe mais aprouver.

Ao assistir o Jornal Nacional da Rede Globo veiculado no chamado horário nobre, causa espécie, ao telespectador esclarecido, ver-se claramente que o âncora da principal televisão do país se compraz e parece se deliciar ao anunciar com muita ênfase o pacote de maldades, ou seja, as notícias ruins das últimas 24 (vinte e quatro) horas, principalmente as que dizem respeito ao governo, à política e a economia. Isto é deprimente, desnacionalizante e com uma carga semântica pesada de antibrasilidade.

Veja-se que este é só um exemplo, horrível para um governo que quer acertar, mas é quase impossível com um obstáculo desta envergadura para remover segundo a segundo do caminho. Tudo isso vindo de setores poderosos que deveriam vestir o manto da responsabilidade e compartilha-los com os demais poderes republicanos, ajudando o país buscar a estabilidade econômica, seguindo nos trilhos democráticos e não conspirando pelo quanto pior melhor.

Links das notas:


domingo, 19 de julho de 2015

O precoce fim da vergonhosa era Cunha

Imagem de divulgação

O fim da saga de Eduardo Cunha coloca um ponto final em um dos mais constrangedores episódios políticos da história da República, desde a redemocratização.

O vácuo político produzido pelos erros da presidente Dilma Rousseff promoveram uma abertura inédita da porteira e abriram espaço para oportunistas da pior espécie.

A crise colocou Cunha no papel de touro conduzindo o estouro da boiada. E, atrás dele, a malta do congresso, o universo dos pequenos políticos sem expressão, o chamado baixo clero, cuja atuação, em outros tempos, era moderada por lideranças de maior fôlego.

A cada eleição, os grandes políticos - à esquerda e à direita - foram se afastando do Congresso, permitindo que políticos de grande habilidade e nenhum escrúpulo - como Cunha - assumissem a liderança, bancados por contribuições milionárias de campanha garantidas pelo negocismo amplo que se implantou no Congresso.
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A queda de Cunha era questão de tempo. Figuras como ele são eficientes para agir nas sombras, não na linha de frente. Ainda mais com a megalomania que sempre o acompanhou, acima de qualquer limite de prudência.

Em ambiente democrático, não há espaço para os superpoderosos. Tanto assim, que um dos truques históricos da mídia, quando quer marcar um inimigo, é superestimar seus poderes. O sujeito entra na marca de tiro, torna-se alvo não só de jornais como de outros poderes.
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No início adulado pela mídia, Cunha não precisou de nenhum empurrão para expor sua falta de limites. As demonstrações inúteis e abusivas de músculos incumbiram-se de quebrar a blindagem e transformá-lo em uma ameaça às instituições, ainda mais liderando um exército de parlamentares que parecia emergia das profundezas do preconceito.
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Com o fim de Cunha, o PMDB volta às mãos de figuras moderadas e responsáveis, como o vice presidente Michel Temer, e de figuras polêmicas mas cautelosas, como Renan Calheiros, até que seja colhido pela Lava Jato. Pacifica-se, assim, uma das frentes que impedia a volta à normalidade política.

No plano Jurídico, com a parte mais relevante da Lava Jato sendo assumida pelo STF (Supremo Tribunal Federal), e com os conflitos internos na Polícia Federal, haverá menos espaço para o show midiático.
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Na outra ponta, caiu a ficha do PSDB quanto à irresponsabilidade política de Aécio e a loucura que seria o impeachment da presidente. Não interessa nem a José Serra nem a Geraldo Alckmin, em suas pretensões presidenciais, nem a quem tem um mínimo de vislumbre do caos que se instalaria no país, caso o golpe fosse bem sucedido.
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Para retomar a normalidade, falta Dilma começar a governar.
Nos últimos dias, a Fazenda passou a desovar projetos mais consistentes, de simplificação tributária. Há boas iniciativas na Agricultura e no MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior). Ainda há o risco de um Banco Central descontrolado, praticando uma taxa de juros que poderá criar uma dinâmica insustentável na dívida pública. E Dilma, que ainda não pegou a batuta de maestrina para articular um plano de ação integrado do segundo governo.

Por Luis Nassif dp GGN

domingo, 5 de julho de 2015

O juiz Moro e os processos de Moscou


Os Processos de Moscou, o Juiz (?) Moro e a mídia brasileira: traços totalitários de uma empreitada golpista.
Por Ignacio Godinho Delgado

A leitura recente de O homem que amava os cachorros, magnífico romance do cubano Leonardo Padura, trouxe-me de volta à mente as farsas judiciais montadas por Stalin na antiga URSS. Através do isolamento, chantagens, torturas físicas e psicológicas, dirigentes comunistas, militares, chefes de polícia, cientistas…, todos que representassem obstáculos ao processo de concentração do poder nas mãos de Stalin, confessavam crimes espetaculares e delatavam antigos companheiros por atividades anti-soviéticas. Antes e depois, o opróbio, a execração pública, por via de orquestrada campanha na imprensa e nos meios de comunicação.

Naturalmente que não vivemos estes tempos, embora certa direita, por ignorância ou má fé, pretenda ver riscos de comunização e bolivarianismo (seja lá o que isso for) em governos que, desde 2003, a par de promoverem medidas singelas, mas efetivas, de inclusão social, colocaram sempre em posições chave do Executivo representantes do agronegócio, do empresariado urbano e do capital financeiro, além de conduzirem uma política macroeconômica rigorosamente conservadora.

 Os elementos totalitários da situação brasileira não estão do lado do espectro político que tem o PT como principal expressão. Delações derivadas de isolamento e chantagem, antecipadas e seguidas de espetacular campanha para execração pública das pessoas supostamente atingidas (desde que ligadas ao PT e aos governos que lidera), partem sabidamente da articulação que reúne segmentos golpistas da oposição e a nossa velha mídia, sob controle das mesmas famílias que cumpriram triste papel em episódios cruciais da história brasileira, a exemplo de 1954, com a ação contra Vargas, e em 1964, com o apoio ao golpe. 

Moro não é Stalin, nem Youssef, Roberto Costa e Ricardo Pessoa têm qualquer semelhança com Bukharin, Kamenev e Yagoda, para nomear alguns delatores nas duas situações apontadas acima.

Stalin era o dirigente máximo de um regime totalitário. Moro é um apenas um peão no jogo da oposição. Seus métodos, contudo, obviamente em escala e intensidade infinitamente menor, são os mesmos, para propósitos diversos. Para Stálin, a preservação, a ferro e a fogo, de uma situação tirânica.

Para Moro, o desgaste de um governo eleito legitimamente. Nos dois casos, contudo, procedimentos insustentáveis para qualquer abordagem jurídica civilizada, como o atesta o insuspeito Marco Aurélio Melo. Nos dois casos, a instrumentalização do Estado (para usar uma expressão cara à oposição), com organismos de investigação e personagens do Ministério Público (no Brasil alguns jovens e intocáveis procuradores, que não se constrangem de revelar simpatias oposicionistas), cumprindo um papel descaradamente político.  

Os elementos totalitários da situação brasileira complementam-se com a identificação do inimigo do povo, que reuniria em si a capacidade de produzir todo o mal existente na sociedade. É o petista. Ele é o trotskista da URSS stalinista; o comunista, o judeu, o cigano, da Alemanha nazi. A corrupção é apontada como inerente à condição petista e só pode ser extirpada se seu hospedeiro também o for.

Não importa que nos últimos anos tenha sido criado o Portal da Transparência, a Controladoria Geral da União, reequipada a Polícia Federal e acentuada sua autonomia e a do Ministério Público. Não importa que os delatores assinalem que alguns esquemas investigados tenham nascido antes da ascensão do PT ao governo federal (quando finalmente começam a ser investigados) e que um empresário tucano, relatando suas desventuras em licitações desde a ditadura militar, alerte que nunca se roubou tão pouco no Brasil, porque finalmente a corrupção está sendo investigada e punida (http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/11/1551226-ricardo-semler-nunca-se-roubou-tao-pouco.shtml). Não interessa debater as raízes institucionais da corrupção e fazer as reformas que possam debelá-las. Importa é execrar, submeter o petista ao opróbio, ensejando as manifestações fascistas que têm atingido diversos personagens ligados ao partido. Quando virá a primeira morte? 

A direita brasileira sempre se valeu das denúncias de corrupção para atacar seus adversários trabalhistas, do PTB ao PT, dada a dificuldade de obter êxito eleitoral com suas propostas reais. Imaculados Aloysio Nunes, Aécio Neves, Ronaldo Caiado… Apenas com FHC, por conta do êxito do Plano Real na contenção da hiperinflação, as forças políticas cuja linhagem remonta à velha UDN venceram diretamente as eleições presidenciais. Jânio e Collor eram outsiders e nuclearam seu discurso eleitoral na abordagem moralista do tema da corrupção.

Nenhum dos três enfatizou as disposições de acentuação da subordinação externa da economia brasileira e de dissolução do legado trabalhista, centrais à visão de mundo udenista e peessedebista. Nos últimos tempos, após três derrotas seguidas, tais forças têm dado vezo a atitudes intolerantes, o ovo da serpente do totalitarismo, estimuladas por uma mídia, cujos elos com o capital financeiro foram desvendados por estudo seminal de Francisco Fonseca (2005), e que, hoje, precisa mais que nunca do golpe, para salvar-se da insolvência anunciada, através de contratos polpudos com o governo, a exemplo do que ocorre em São Paulo (http://www.viomundo.com.br/denuncias/namarianews-governo-paulista-desova-mais-de-r-155-mi-na-abril-folha-estadao-istoe-epoca-e-panini.html).

O acirramento da última campanha eleitoral, o atropelo na condução da política de ajuste fiscal e a tragédia que é a comunicação do governo Dilma favoreceram o cenário de intolerância que hoje vivemos. Todavia, nos próximos meses não há coisa mais importante a fazer do que resistir ao golpe. Vitorioso, vai-se o Pré-Sal, o que nos resta de soberania nacional e parecerão suaves as dificuldades que hoje atingem o mundo do trabalho.  

FONSECA, F. (2005) O Consenso Forjado – a grande imprensa e a formação da agenda ultraliberal no Brasil. São Paulo: Hucitec

Ignacio Godinho Delgado é professor de História e Ciência Política na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia-Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (INCT-PPED). Doutorou-se em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 1999, e foi Visiting Senior Fellow na London School of Economics and Political Science (LSE), entre 2011 e 2012.

Do GGN

domingo, 21 de junho de 2015

Desafios da regularização das rádios comunitárias e a aplicação jurídica

Estudo de caso (Logo da Rádio Coité FM)

No Brasil, as rádios comunitárias desempenham um papel essencial na promoção e construção de informação diversificada voltadas para as comunidades em que atuam. Estas, normalmente, estão localizadas em regiões distantes dos grandes centros urbanos -- e muitas vezes marginalizadas: comunidades rurais, indígenas, caiçaras e favelas, onde aparecem como um espaço que possibilita a participação e interação social a partir de experiências locais. Além da restrição legal para funcionar com potência limitada -- máximo de 25 Watts -- que alcança apenas pequenas comunidades ao redor e outras limitações que afetam o seu funcionamento, as rádios comunitárias sofrem ainda com restrições que passam pela face mais dura do Estado: o direito penal.

Este é o caso da Rádio Comunitária Coité FM, localizada na cidade de Conceição de Coité, no interior da Bahia. No último dia 8 de março, Zacarias de Almeida, mais conhecido como Piter Junior, radialista e ex-diretor da Associação Rádio Comunitária Coité Livre FM, foi condenado pela juíza Karin Almeida Weh de Medeiros, da Justiça Federal da Bahia, à pena de dois anos de detenção (convertida em serviços comunitários) e a pagar uma multa por ter mantido a rádio no ar sem autorização do Ministério das Comunicações.

Na sentença, a juíza não considerou que a Rádio Coité busca se regularizar há mais de 15 anos junto ao Ministério das Comunicações e o fato de que o funcionamento da rádio não causava nenhum dano ou interferência a outros sinais de radiodifusão. A condenação de Piter é mais um exemplo do tratamento desproporcional que muitos radiodifusores comunitários sofrem por exercer o direito à liberdade de expressão.

A criminalização das rádios comunitárias, contudo, representa grave violação à liberdade de expressão e contraria os padrões internacionais que tratam sobre o tema.

Sabe-se que a liberdade de expressão e informação são elementos essenciais dos sistemas democráticos e por isso faz-se tão importante preservá-los e sempre impulsioná-los para que os sistemas democráticos, muitas vezes frágeis, não retrocedam a regimes autoritários.

Por esse motivo, a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em seu relatório anual de 2014, reforçou que o uso do direito penal para sancionar violações ao regime de radiodifusão é problemático ante a Convenção Americana de Direitos Humanos. Sancionar criminalmente o exercício de radiodifusão, seja comunitária ou comercial, é uma reação desproporcional do Estado, ressalta a Relatoria[1].

Os mecanismos internacionais apontam que devem ser utilizadas medidas menos gravosas à liberdade de expressão para responsabilizar eventual ilícito na prática de radiodifusão, tais como sanções administrativas ou civis. A própria Comissão Interamericana de Direitos Humanos já declarou que muitas vezes a proteção por vias penais de certos direitos em detrimento da liberdade de expressão são medidas desnecessárias e desproporcionais, tendo em vista que o uso do processo penal tem o forte e inibidor efeito de silenciar vozes essenciais ao debate sobre assuntos de interesse social e público.

Segundo o consagrado teste das três partes do artigo 19.3 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, promulgado pelo Brasil em 1992, o exercício da liberdade de expressão só pode ser sujeito a restrições expressamente previstas em lei e que sejam necessárias em um Estado democrático para proteção dos direitos e da reputação de outros, da segurança nacional, da ordem, da saúde ou da moral pública.

O rol limitado de exceções em que se considera legítimo restringir a liberdade de expressão se justifica pois sem a possibilidade de emitir opiniões, receber informações e se expressar livremente é impossível o exercício da cidadania. Assim, para proteger o direito à liberdade de expressão os principais instrumentos internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil são a Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo 19), o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (artigo 19) e a Convenção Americana de Direitos Humanos (artigo13).

O uso do Direito Penal como forma de restringir de forma ilegítima a liberdade de expressão das rádios comunitárias, entretanto, tem sido a regra adotada pelo Estado Brasileiro. Com o objetivo de compreender como se dá a judicialização das questões ligadas às rádios comunitárias no Brasil, a ARTIGO 19 realizou em 2011 uma pesquisa nos Tribunais Regionais Federais (TRF's) das 5 regiões. Foram analisados 328 acórdãos julgados entre 01 de janeiro de 2009 e 31 de dezembro de 2010 [4].

A pesquisa evidenciou uma predominância de processos de natureza criminal contra as rádios comunitárias e viu-se pouquíssimos debates em torno da função essencial à liberdade de expressão que tais rádios representam. Dos 328 acórdãos, 152 eram de natureza penal, enquanto que 98 eram de natureza civil, 32 de natureza administrativa e o restante discutia aspectos tanto cíveis, como administrativos e constitucionais.

Constatou-se também que há nos TRFs divergências quanto à legislação penal a ser aplicada aos radiodifusores comunitários. Isto porque existem dois dispositivos penais semelhantes que determinam penas diferentes para o exercício clandestino de telecomunicação: o artigo 70 da  Lei 4.117 de 1962, que institui o Código Brasileiro de Telecomunicações, e que estabelece pena de 1 a 2 anos, aumentada da metade se houver dano à terceiro, e o artigo 183 da Lei 9.427/97-  a Lei Geral de Telecomunicações (LGT), que estabelece pena de 2 a 4 anos, aumentada da metade se houve dano a terceiro.

Em alguns TRFs o artigo 183 da LGT é aplicado pois há o entendimento de que, por ser mais recente, ele revogou o dispositivo anterior. Foi com base neste  artigo que Piter Júnior, da Rádio Coité, foi denunciado pelo Ministério Público e condenado pela Justiça Federal da Bahia. Em outros TRFs o entendimento é o de que se deve ser aplicar o artigo 70 do Código Brasileiro de Telecomunicações por disciplinar sanção mais amena aos radiodifusores que estiverem operando rádio comunitária sem as devidas autorizações.

Uma corrente minoritária, no entanto, entende que as rádios comunitárias não devem ser regidas por leis penais visto que configura somente ilícito administrativo, não se aplicando nenhum dos dispositivos citados anteriormente, já que desde 1998 existe regulamentação específica que determina o exercício das rádios comunitárias no Brasil (Lei 9.612 de 1998), trazendo apenas sanções administrativas em caso de ilícito. Dessa forma entendem que somente irão aplicar-se sanções penais nos casos de rádios clandestinas (rádios comerciais sem outorga) e não rádios comunitárias, que são aquelas que se caracterizam pela baixa potência do rádio transmissor, pelos seus fins sociais e não lucrativos.

Entendimento similar foi encontrado em decisão do Supremo Tribunal Federal que defendeu a sub-rogação das leis penais contra as rádios comunitárias tendo em vista a adesão do Brasil ao Pacto dos Direitos Civis e Políticos. Tal fato implicaria na necessidade de proteger a liberdade de expressão quando em conflito com outros direitos (RE 556817 AgR, Relator(a): Ministro Eros Grau, 2ª Turma, julgado em 28/04/2009, DJe-099 DIVULG 28-05-2009 PUBLIC 29-05-2009 EMENT VOL-02362-08 PP-01517).

Decisões favoráveis às rádios comunitárias, no entanto, não são a regra nos tribunais inferiores, prevalecendo ainda a aplicação dos dispositivos penais, o que contraria inclusive posicionamentos recentes do STF, que tem aplicado em diversas ocasiões o princípio da insignificância. O entendimento é o de que não  há ofensividade na conduta ou mesmo remota possibilidade destas rádios de baixa potência causarem prejuízos para outros meios de comunicação [5].

Apesar do princípio da insignificância estar sendo cada vez mais adotado pelos ministros do STF, os TRFs e juízes de primeira instância continuam desconsiderado a baixa ofensividade da conduta para julgar ações penais contra rádios comunitárias.

No caso da rádio Coité, a própria Anatel em seu laudo técnico reconhecia que a rádio não causava nenhuma interferência prejudicial e nem risco à operação de qualquer outra atividade. Mesmo assim, a juíza condenou Piter criminalmente por entender que “a ausência de concreta potencialidade lesiva dos equipamentos utilizados na atividade de radiodifusão não serve à descaracterização do crime”, uma vez que seria um crime que independe de qualquer resultado naturalístico (crime de perigo abstrato ou crime formal), na contramão do entendimento da cúpula do Judiciário [6].

Além disso, nas decisões analisadas na pesquisa, verifica-se que pouco se ventila a respeito da função social que as rádio comunitárias exercem, de levar informações de utilidade pública para as comunidades em que se inserem (como campanhas de vacinação, por exemplo), ou sobre a sua importância para a liberdade de expressão e participação social. A maioria das decisões é padronizada e pouco analisam sobre a realidade das rádios e de suas comunidades.

Isto demonstra o viés criminalizador que o poder público trata estas rádios e a não observância aos padrões internacionais que garantem a liberdade de expressão.

Excessiva demora
A fim de promover o exercício do direito à liberdade de expressão por meio das rádios comunitárias, as Relatorias Especiais da ONU, OEA, AU, e OSCE já enfatizaram que "a radiodifusão comunitária deve estar expressamente reconhecida na lei como uma forma diferenciada de meios de comunicação, deve beneficiar-se de procedimentos equitativos e simples para a obtenção de licenças, não deve ter que cumprir com requisitos tecnológicos ou de outra índole severos para a obtenção de licenças, deve beneficiar-se de tarifas de concessionária de licença e deve ter acesso a publicidade" [3].

Contudo, um dos maiores problemas que as rádios comunitárias enfrentam para regularizar a sua situação e evitar os processos criminais é a excessiva demora e burocracia por parte do Ministério das Comunicações em analisar os pedidos de outorga feito por elas. Isto explica, em parte, porque muitas dessas rádios iniciam suas atividades antes da análise dos pedidos, que chegam a ultrapassar uma década.

A Rádio Coité possui um histórico especialmente emblemático nesse aspecto, pois busca a sua regularização há quase 20 anos. O primeiro pedido de outorga feito pela rádio em 1999 foi somente analisado pelo Ministério das Comunicações(MiniCom) em 2009, quando foi informada que novo pedido deveria ser encaminhado por suposto erro nas coordenadas geográficas.

Após o arquivamento, mais dois pedidos de outorga foram feitos para regularizar a situação da rádio. O último, feito em 2013, teve o seu arquivamento anunciado no início desse ano sob a justificativa de que a rádio já estava no ar enquanto aguardava a autorização. A Rádio Coité recorreu dessa decisão alegando que passou a funcionar devido à omissão do Ministério em analisar o pedido de outorga e aguarda até o momento resposta.

Neste aspecto, a pesquisa realizada pela ARTIGO 19 revela que há entendimento comum em todos os TRFs quanto à impossibilidade do Judiciário intervir diretamente na concessão de outorga às rádios comunitárias diante da demora e omissão do Executivo, uma vez, que caso interviesse, haveria invasão da competência do MiniCom por parte do Judiciário. Os TRFs entendem, no entanto, que o  Judiciário poderia fixar um prazo para que os pedidos fossem analisados.

Esse foi o pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça que evidenciou a configuração de abuso de direito em hipótese de demora injustificada do MiniCom na análise do pedido de outorga: “é fato que a análise dos requisitos para a outorga da autorização de funcionamento de rádio comunitária não pode perdurar por tempo indeterminado, situação que configuraria verdadeira deferência ao abuso de direito, devendo ser fixado prazo para a completa análise do pedido formulado administrativamente”[7].

Este quadro apresentado demonstra que urge ao Estado brasileiro modificar sua forma de tratamento às rádios comunitárias, a fim de concretizar os compromissos internacionalmente firmados para a garantia da liberdade de expressão. Para isso, deve de um lado, facilitar e responder em um prazo razoável aos pedidos de outorga, criar políticas públicas de fomento e incentivo às rádios comunitárias; e de outro, não se utilizar do direito penal para criminalizar as rádios comunitárias que aguardam indefinidamente o resultado de seus pedidos.

 Por Pedro Teixeira Siqueira, Camila Marques e Karina Quintanilha - GGN

Referências:
[1] Informe Anual de 2014 Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos disponível em:http://www.oas.org/es/cidh/expresion/docs/informes/anuales/Informe%20Anu...
[2] Corte I.D.H., A Colegiación Obligatoria de Periodistas, Opinião Consultiva OC-5/85 de 13 de novembro de 1985. Serie A No. 5, par. 31.
[3] Relatorias para Liberdade de Expressão da ONU, OEA, AU e OSCE -  2007 . Disponível em:http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=719&lID=2
[4] Resultados da pesquisa completa disponível no site:http://artigo19.org/jurisprudencia/analisegeral/    
[5] Neste sentido o HC 104.530, Rel. Min.Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em 28.09.2010, o HC 111.250 MC, Rel. Min. Ayres Britto, julgado em 23.11.2011, o HC 115.729, Rel. Min. Ricardo Lewandoski, Segunda Turma, julgado em 18.12.2012 e o RHC 119.123, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 13.03.2014.
[6] Sentença disponível em: http://artigo19.org/centro/casos/detail/15
[7] AgRg no Recuro Especial Nº 1.043.779 - SC (2008/0066876-6)
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Pedro Teixeira Siqueira é advogado associado ao escritório Bichara Advogados
Camila Marques é advogada e atua no Centro de Referência Legal em Liberdade de Expressão da Artigo 19.
Karina Quintanilha é advogada e integrante da organização Artigo 19