quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Perseguição, discriminação e autoritarismo no caso Barroso x Pizzolato

Depois demorar 1 ano para conceder a Pizzolato o direito de migrar do regime fechado para o semi-aberto, ministro do Supremo Tribunal Federal criou para o réu do Mensalão uma regra que ele próprio não exige de outros condenados. Em mensagens obtidas pelo GGN, Pizzolato denuncia outros abusos do Judiciário.
Condenado a 12 anos e 7 meses de prisão na Ação Penal 470 (Mensalão), Henrique Pizzolato já cumpriu o prazo exigido por lei para ter direito ao regime aberto. Mas o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, não tem acatado o que diz a lei e tampouco seguido decisões que ele próprio tomou no passado, denotando uma tendência a tratar Pizzolato de maneira diferenciada. É o que diz o ex-diretor do Banco do Brasil em mensagens onde denuncia uma série de "abusos” envolvendo o Judiciário.
Barroso, há não muito, protagonizou um bate-boca com Gilmar Mendes que teve como pano de fundo justamente o julgamento do Mensalão, além de Lava Jato e dos debates acalorados sobre execução penal a partir de condenação em segunda instância. Barroso parecia não querer ser visto como um ministro “leniente” com qualquer figura que tenha protagonizado - ou sido arrastada - para escândalos de corrupção.
Barroso também atacou Gilmar por criar jurisprudência de acordo com a cara do réu. Ironicamente, é disso que se trata a queixa de Pizzolato.
A demora de quase 1 ano de Barroso para autorizar a progressão de regime a Pizzolato pautou uma carta da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados à embaixada da Itália no Brasil, com um pedido para que o Ministério da Justiça da península tome conhecimento da morosidade do Judiciário brasileiro e interceda.
A carta explica exatamente o que aconteceu.
Em 7 de junho de 2016, Pizzolato, que está preso desde outubro de 2015, deveria ter começado o regime semiaberto. Mas esse direito só lhe foi concedido por Barroso um ano depois, em maio de 2017. Na prática, a progressão só ocorreu três meses após a autorização: em agosto de 2017.
A demora foi tanta que deu tempo de Pizzolato cumprir as exigências do regime aberto em julho de 2017. Na mesma data, Barroso recebeu um pedido para fazer a transição.
Ocorre que o ministro decidiu negar o pedido sob o argumento de que "embora tivesse cumprido 1/6 da pena em 7/6/2016, o sentenciado somente foi autorizado a progredir para o regime semiaberto no dia 30/05/2017. Data em que acolhida a proposta de parcelamento da pena de multa, requisito exigido pelo plenário do Supremo para a progressão do regime."
O parcelamento de multa foi um acordo no qual Pizzolato se comprometeu a pagar uma multa de R$ 2 milhões em parcelas de poucos mais de R$ 2 mil mensalmente.
Na prática, Barroso criou uma nova data para Pizzolato progredir de regime novamente, fazendo com que ele passe mais tempo em um regime que não lhe compete mais.
REGRAS DE ACORDO COM O RÉU
A Comissão de Direitos Humanos disse que a decisão de Barroso "surpreendente" porque o ministro, no caso de outra condenada no mensalão, decidiu de "forma diversa". Ele usou como data base para conceder a progressão para o regime aberto não o dia em que a decisão foi tomada, mas o dia em que a condenada, de fato, completou 1/6 da pena.
 Os parlamentares avaliaram que Barroso está "exigindo o cumprimento de uma pena superior àquela a qual [Pizzolato] foi condenado, em claro desrespeito a seus direitos legais", (...) constituindo-se em constrangimento ilegal a não observância da data em que o apenado efetivamente cumpriu o tempo da pena para a progressão de regime"
A Comissão ainda assinalou que o ministro deu "tratamento desigual e injustificado e em prejuízo de Pizzolato, fato que preocupa sobremaneira, por caracterizar-se em ato discriminatório, persecutório, e que não deverá prevalecer."
Pizzolato, por sua vez, escreveu recentemente uma mensagem, a qual o GGN teve acesso, onde afirma que a decisão de Barroso afronta o acordo Brasil x Itália e soma-se a vários outros abusos cometidos pelo Judiciário.
Em julho, a Comissão também enviou a Rodrigo Janot, antecessor de Raquel Dodge na Procuradoria-Geral da República, um ofício narrando uma série de arbitrariedades que ocorreram com Pizzolato na prisão. 
Por conta de uma regra interna da qual ele não tinha conhecimento, Pizzolato perdeu o status de preso vulnerável e foi transferido para uma cela compartilhada com mais uma dezena de presos que precisam se revezar para dormir no chão. Também sem explicações, tiram-lhe o direito à remissão da pena a partir da leitura de livros. Por um período de tempo, e igualmente sem justificativa, ele foi proibido de trabalhar. Tudo isso com aval da juíza da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal Leila Cury, diz o documento.
LIVRAMENTO CONDICIONAL
Em outra mensagem, Pizzolato diz que já cumpriu um total de ⅓ da condenação há mais de 2 meses e poderia desfrutar do “livramento condicional”, mas continua no regime semiaberto sem perspectivas de mudanças. “Como as leis, no Brasil, não servem para nada, continuo refém e sendo, ainda, torturado. A tortura é deliberadamente assumida e consiste em usar de subterfúgios para lentamente matar o refém”, disparou.
A tortura a qual Pizzolato faz referência é um procedimento misterioso que tramita entre a Procuradoria-Geral da República e o ministro Barroso. 
Pizzolato desconfia que o magistrado solicitou um posicionamento de Raquel Dodge sobre o pedido de progressão para o regime aberto ou sobre o livramento condicional, embora sejam demandas distintas. 
O livramento condicional é um benefício que o réu pode solicitar quando tem bom comportamento, foi condenado a mais de 2 anos de prisão e já cumpriu ⅓ da pena. As condições em que o livramento poderá se dar depende dos critérios estabelecidos pelo juiz da execução penal.
Ocorre que, segundo relatos da esposa de Henrique Pizzolato, Andrea Haas, a PGR e Barroso não estão preocupados em discutir a progressão do regime ou os abusos que acontecem na detenção, mas sim “(des)cumprimento, pela Juíza Leila Cury, de um pedido dirigido a ela pelo ministro Barroso”, que não se sabe qual foi.
“O absurdo é Henrique – que já cumpriu TODOS os requisitos estabelecidos por lei (e mesmo aqueles, que não estão na lei, criados pelo ministro Barroso), seja para o regime aberto, seja para o livramento condicional – esperar, há muito tempo, em situação prisional irregular, que a Procuradora Raquel Dodge, a Juíza Leila Cury e o Ministro Barroso decidam por respeitar a lei”, escreveu a Andrea.  
GGN

terça-feira, 7 de novembro de 2017

Com a Carta de Ipojuca, o MPF assume de vez sua função sindical, por Luis Nassif do Jornal GGN

O encontro anual da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), o sindicato de fato dos procuradores da República, gerou uma “Carta de Ipojuca”, em torno do tema “O Ministério Público Federal na defesa da ordem econômica”.
É uma demonstração cabal que não se deve julgar o MPF por seus luminares, os grandes procuradores envolvidos nas grandes causas civilizatórias, porque não representam o pensamento majoritário do setor.
Trata-se de um setor eminentemente sindicalista, sem nenhuma visão de interesse nacional, com visão de mundo superficial e corporativista, como pode se conferir na “Carta de Ipojuca”, documento oficial na última reunião associativa do MPF.​
O primeiro CONSIDERANDO é o que se segue:
CONSIDERANDO que a ordem econômica, nos termos da Constituição da República, tem por finalidade assegurar a todos existência ​digna ​e ​justiça ​social;
CONSIDERANDO que a atuação do Ministério Público Federal na defesa da ordem econômica, seja na proteção à livre concorrência, aos consumidores, ao meio ambiente ou à busca do pleno emprego, é essencial para que se concretizem direitos fundamentais, ​reduzindo-se ​as ​desigualdades ​regionais ​e ​sociais;
Observação – o “à busca do pleno emprego” é uma maneira da ANPR mostrar que procurador também tem coração. Não há nenhuma decisão, no âmbito do Ministério Público Federal (MPF), que tenha relação com o pleno emprego. Para atuar, teria que questionar a política econômica em vigor, mas aí seria ir muito além das chinelas curtas, que a ANPR determinou para o MPF.
CONSIDERANDO que o MPF tem enfrentado os maiores casos de corrupção da história do País, os quais envolvem empresas relevantes ​e ​dominantes ​em ​diversos ​mercados;
Observação – o MPF destruiu cadeias produtivas inteiras, sem a menor preocupação com emprego e nível de atividade.
(...)
E, como não poderia deixar de ser, vindo de um órgão eminentemente sindical:
CONSIDERANDO que as magistraturas são as únicas carreiras federais às quais vem se negando recomposição salarial, ainda que parcial, tornando-as, em prejuízo do interesse público e da isonomia, defasadas em termos remuneratórios e em condições de trabalho, e crescentemente pouco atrativas, em afronta ao princípio ​constitucional ​da ​irredutibilidade ​de ​vencimentos;
CONCLUEM que:
1. A atuação do MPF na defesa da ordem econômica contribui para a segurança jurídica, para um ambiente saudável de negócios, com o combate à corrupção, e para o desenvolvimento econômico sustentável de longo prazo, na medida em que enfrenta os ​vícios ​estruturais ​do ​sistema;
Observação -  o governo Temer, colocado no poder com ajuda inestimável do MPF, está leiloando o país, montando um balcão de negócios só ocorrido, antes, em países africanos. Trata-se do efeito mais visível da Lava Jato e da atuação política do MPF. Leiloar estatais na bacia das almas, abrir reservas indígenas para exploração comercial, leiloar áreas da Amazônia legal, para a brava ANPR, não comprometem em nada o “ambiente saudável de negócios”.
2. A responsabilização das pessoas físicas e jurídicas envolvidas em atos de corrupção é dever inafastável dos membros do Ministério Público e essencial para que haja desenvolvimento social e econômico, sendo que, quanto às empresas corruptoras, essa responsabilização é imprescindível para que se garantam os parâmetros da concorrência adequada e justa, da existência do livre mercado ​e ​da ​livre ​iniciativa;
Observação -  Como já demonstrado na série “A indústria das delações premiadas”, a Lava Jato livrou todas as grandes multinacionais envolvidas em corrupção com a Petrobras. O “desenvolvimento social e econômico” será alcançado como? Destruindo a engenharia nacional.
(...) 5. Dada a concomitante atribuição cível e criminal, é o Ministério Público o órgão melhor posicionado para coordenar os esforços de celebração de acordos de leniência, garantindo o interesse ​público ​e ​a ​necessária ​segurança ​jurídica;
Observação – quando se tentava avançar em acordos de leniência, no início da Lava Jato, medida que preservaria centenas de milhares de empregos, um mero procurador regional deu o berro contra – para não perder poder – e o próprio Procurador Geral da República recuou. Uma organização assim, sem coluna vertebral, estaria apta a ser a avalista final dos acordos de leniência?
6. No âmbito interno do MPF, os acordos de leniência da Lei Anticorrupção devem contar com a colaboração entre os diversos membros legitimados e a Câmara de Combate à Corrupção, ​respeitando-se ​sempre ​o ​promotor ​natural;
Observação – o princípio do promotor natural foi amplamente desrespeitado pelo MPF na Operação Lava Jato. Com que autoridade volta a defender o princípio?
7. É fundamental a atuação da Câmara de Combate à Corrupção do MPF na homologação e na expedição de orientações para os procedimentos e parâmetros da elaboração de acordos de leniência, indicando diretrizes que deem maior segurança jurídica aos ​membros, ​aos ​investigados ​e ​à ​sociedade;
Observação – Ufa! Robalinho teve um assomo de anti-corporativismo. Deve ter ficado com medo de perder votos nas próximas eleições.
8. A obrigação da criação de sistemas de compliance em empresas que firmem acordo de leniência é fundamental para garantir que as empresas possam balizar suas práticas com base na ética ​e ​na ​legalidade;
Observação -  Defesa do mercado de trabalho futuro, para os procuradores que se aposentarem, conforme já alardeado por integrantes da Lava Jato.
9. O combate eficiente e efetivo ao crime pressupõe a manutenção integral das garantias constitucionais de inamovibilidade, irredutibilidade de subsídios e autonomia, atribuídas ​às ​magistraturas ​judicial ​e ​ministerial;
Observação – nenhuma menção ao Estado de Direito, ao respeito aos direitos individuais.
10. É necessário o contínuo e intenso engajamento da classe, da Instituição e da sociedade em defesa das prerrogativas institucionais ​do ​Ministério ​Público ​e ​da ​magistratura ​judicial;
Observação – Obviamente, ajudando a garantir a recomposição salarial.
Seguem-se vários parágrafos sobre o papel do MPF e da Polícia federal.
17. É imprescindível e urgente a reposição das perdas inflacionárias que corroem os subsídios das magistraturas federais, únicas carreiras de estado da União que não têm reajustes desde 2015 (e que repuseram parcialmente a inflação apenas de 2013 e anteriores). A defasagem absoluta e relativa dos subsídios põe em risco a preservação do próprio status constitucional da Instituição, e é particularmente injusta aos aposentados, que não têm acesso a verbas ​remuneratórias ​e ​indenizatórias ​recebidas ​na ​ativa;
18. Para que se recupere a existência efetiva de uma carreira nas magistraturas e se reponha a paridade entre ativos e inativos, é urgente, e deve continuar a ser prioridade da carreira e da instituição a retomada e aprovação da PEC nº 63/2013, que institui o adicional ​de ​Valorização ​de ​Tempo ​de ​Magistratura;
Observação – nenhuma linha a respeito da PEC do Teto, que está sendo alvo de análises e ações da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), da própria PGR. O que mostra que a massa dos procuradores têm exclusivamente visão sindical de defesa dos próprios interesses.
(...)20. O Ministério Público Federal e o CNMP devem manter diálogo permanente para o fortalecimento das prerrogativas institucionais e para que a atuação do colegiado não afete e não interfira na atividade finalística desempenhada pelos órgãos ministeriais;
Observação – ah, bom! Achei que a visão institucional do item 7 tivesse se sobreposto ao corporativismo dos que consideram cada procurador uma ilha de poder.
23. O respeito à lista tríplice para escolha de Procurador-Geral da República se mostrou, uma vez mais, salutar para o País. Reforça-se a necessidade de os membros do MPF continuarem envidando esforços para a institucionalização da lista tríplice, bem como da sua inclusão formal na Constituição da República, consagrando a escolha democrática e republicana de representante ​máximo ​da ​Instituição;
Observação – um órgão com poder de Estado, sem ter voto nem mandato, pretendendo ser dono absoluto do seu próprio poder. Uma notável falta de senso sindical.
(...) 25. Os membros do Ministério Público Federal devem reforçar o apoio à sociedade civil organizada para atuação na fiscalização e controle da gestão pública, visto que a sociedade civil é ​fiscal ​e ​parceira ​fundamental ​do ​MPF ​no ​combate ​à ​corrupção.
Observação -  o primeiro passo é abrir as informações e submeter a indústria da delação premiada a um controle externo. O poder absoluto de fixar pena, de bloquear e liberar dinheiro, com base na avaliação subjetiva de um procurador e um juiz colide com qualquer forma de transparência pública.
 GGN

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Os golpistas não podem ser perdoados, por Aldo Fornazieri

Por mais respeito e admiração que Lula possa suscitar, ele também erra e nisso ele não é isento do crivo crítico de quem participa do debate público. Lula errou ao anunciar o perdão aos golpistas no final da nova fase das caravanas, agora em Minas Gerais. O gesto de Lula não deve ser entendido como uma manifestação pessoal de bondade cristã. Não se trata disso. O perdão foi um ato eminentemente político. É no aspecto e no conteúdo político que o seu gesto se constituiu num erro. Em primeiro lugar, a declaração de perdão foi absolutamente desnecessária. Até porque os golpistas não pediram perdão nem a Lula, nem a Dilma e nem ao povo brasileiro. Assim, nem se sabe se estão arrependidos e não merecem um perdão unilateral e espontâneo de quem quer que seja.
O perdão de Lula pode ser discutido a partir de dois ângulos diferentes: 1) sob o ponto de vista do significado em si da manifestação de perdão, o gesto enquanto tal, seja ele emanado de um sentimento cristão ou de um sentido laico; 2) sob o ponto de vista tático, tal como argumentam alguns petistas, visando dar início a um processo de alianças com partidos ou setores que se posicionaram em favor da derrubada de Dilma.
Analise-se o primeiro ponto de vista, o ato de perdoar em si, seja do ponto de vista cristão, seja do ponto de vista laico, o que, na essência, é a mesma coisa. Foi a pensadora Hannah Arendt quem discutiu esse problema de forma mais aprofundada. Ela parte da tese correta de que as ações humanas, incluindo a política, agregam duas características irredutíveis: a irreversibilidade e a imprevisibilidade. O que importa aqui é a irreversibilidade: as ações humanas, depois de levadas a cabo, não podem ser desfeitas. Não é possível desfazer o que se fez. Por exemplo: não é possível desfazer o golpe contra a Dilma. Aqueles atos foram feitos e não podem ser desfeitos. O que se pode fazer, é estabelecer um novo começo: anular o golpe, prender os golpistas, derrotá-los ou perdoá-los. Anular o golpe, no STF, não desfaz a ação dos golpistas.
Se o remédio para a imprevisibilidade da política e das ações humanas consiste em prometer e comprometer-se com as promessas, no caso da irreversibilidade das ações, o remédio consistiria no perdão. O pressuposto de Arendt, quanto à faculdade de perdoar, evidentemente é o de que, quando se erra, deve-se pedir perdão. O perdão seria o contrário da vingança e permitiria estabelecer um novo começo, buscando superar os erros do passado e estabelecendo uma nova promessa, uma nova aliança.
Arendt, contudo, faz uma ressalva nesse exercício da faculdade de perdoar: é uma ação válida quando não se trata de crime e do mal voluntário. Seria um perdão relativo àquele conjunto de atividades ordinárias que implicam, geralmente, em ofensas não intencionais, segundo aquele ditame de Jesus Cristo do perdão aos homens "porque eles não sabem o que fazem".
Neste contexto, é difícil supor que entre os que votaram a favor do impeachment existisse alguém que não soubesse o que estava fazendo. Temer e a camarilha do PMDB eram figuras conhecidas. O golpismo de Cunha e de Aécio, dentre outros, era conhecido. O programa do PMDB, antinacional antidireitos, era conhecido. A ausência de crime de responsabilidade e a motivação puramente política contra Dilma eram coisas sabidas.
Ademais, quando se trata de política e de poder, é sempre preciso recorrer aos ensinamentos de Maquiavel, alguns dos quais reforçados por Max Weber. Maquiavel nota que os preceitos morais cristãos aplicados à política, notadamente a piedade, a resignação, o perdão, fizeram com que o próprio cristianismo contribuísse de forma decisiva para que o mundo fosse dominado pelos malvados. Não por acaso, Maquiavel foi o descobridor da moral própria da política - a virtú - que é diferente da moral cristã e da moral do senso comum. Em política, às vezes, é preciso agir mal do ponto de vista da moral cristã e do senso comum, para produzir o bem dos governados. Em outras, quando o governante age segundo as virtudes cristãs e do senso comum para produzir o bem, poderá acabar produzindo o mal para o povo.
Weber retoma essa discussão mostrando os paradoxos entre a ética  da convicção, própria das religiões e dos grupos radicais, e a ética da responsabilidade, inerente ás ações políticas adequadas. Mostra que para a ética da responsabilidade não faz sentido oferecer a face esquerda quando alguém te bate na direita, doar todos os teus bens para alcançar o reino dos céus ou, ainda, jogar fora as armas durante uma guerra em nome da paz.
A impressão que dá é que, em alguns casos, o comando petista perdeu a dimensão desses paradoxos da política e da moral. Não é concebível que ministros da Dilma deixaram ou governo três dias antes da votação do impeachment para voltar à Câmara votar contra a presidente. De duas uma: ou foi confiança em demasia ou foi perda de noção de como se trava a luta pelo poder.
Desta forma, perdoar genericamente não é pedagógico, principalmente para os jovens lutadores que compreenderam a natureza desse golpe e lutam contra as desgraças que ele significa. A democracia requer compromissos inquebrantáveis, que não podem ser escamoteados por movimentos táticos de interesses partidários.
Lula e as alianças                                           
Por outro lado, é preciso perceber que o comprometimento com o golpe não foi no mesmo grau entre aqueles que apoiaram o impeachment. Um grupo de políticos praticou a conspiração, a traição e o golpismo de forma deliberada: quase toda a cúpula do PMDB, boa parte da cúpula do PSDB, lideranças dos partidos do centrão etc.. Trata-se de inimigos da democracia, de pessoas que sabiam que estavam violando a Constituição e, portanto, praticando o crime e o mal voluntário. Mesmo que essa gente peça perdão, não é possível perdoá-los. Afinal de contas, a política não trata da salvação de almas. Se quiserem remediar o mal que fizeram, que estabeleçam um novo começo que seja capaz de mostrar a sinceridade de seu arrependimento de forma prática.
A outra questão que a concessão do perdão de Lula suscitou é quanto ao seu sentido tático - a busca de alianças com partidos ou setores que se posicionaram em favor do golpe. Mesmo que a intenção tenha sido essa, o gesto do perdão é desnecessário. Lula e o PT precisam jogar às claras. A questão é: é factível, razoável e legítimo buscar alianças com setores que votaram pró impeachment?
Parece ser razoável considerar que alguns setores partidários que votaram em favor do golpe sejam democráticos e progressistas, mas que comentaram um grave erro de   avaliação e de ação. Também não se trata de perdoá-los, mas de estabelecer um novo começo, com base em um programa e em compromissos com a democracia, com a igualdade, com a justiça e com o desenvolvimento nacional.
Tanto nas guerras quanto nas estratégias políticas, o uso de táticas para enfraquecer o lado inimigo sempre foi praticado. Mas, evidentemente. é preciso saber que há um limite nisso, que é preciso estabelecer uma relação adequada entre os fins e os meios para que os fins não resultem anulados pelos meios.
O que está em jogo é que, se é legítimo e pertinente que Lula e o PT busquem atrair setores que ontem votaram no impeachment, a frente que vai se formar em torno da candidatura petista precisa ter uma fisionomia diferente das frentes de conciliação ampla que se formaram nas experiências petistas pré-golpe. Trata-se agora de formar uma aliança democrática e progressista e de propor um programa que expresse este conteúdo a partir de compromissos claros e abertos em um processo igualmente claro e aberto.
Reeditar a velha conciliação, pura e simples, significa reeditar uma experiência que não deu certo e que custou muito à democracia, ao povo, aos pobres e aos trabalhadores. Lula e o PT precisam abrir mão de seu hegemonismo, construindo de forma colaborativa, um novo processo com os progressistas e com as esquerdas. Se não for assim, Lula e o PT correm o risco de agregar pouco no seu flanco direito e de perder muito no seu flanco esquerdo.

Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP). 
GGN

domingo, 5 de novembro de 2017

Decreto 9188 de Temer é o derradeiro tiro na dignidade do Brasil, diz o ex-ministro Eugênio Aragão

O que estamos esperando?
A publicação do Decreto nº 9188 no meio do feriadão enforcado pela ministra Carmen Lúcia põe a nu a desfaçatez do governo golpista e a pasmaceira que domina nossa sociedade. O Sr. Michel Temer, que conseguiu se manter na presidência usurpada graças a um leilão de ativos públicos a deputados, promove, agora, o leilão de todas as sociedades de economia mista numa penada só. Banco do Brasil, Eletrobrás, Petrobrás… a prata da casa pelas usuais misérias do mercado que “precifica” a ganância de governos corruptos. Foi assim na privatização de FHC, que rendeu míseros recursos não vistos por brasileiras e brasileiros, supostamente usados, em parte, para garantir a reeleição. Agora, com o caixa vazio, sem perspectiva de poder distribuir prebendas para parlamentares que aderem, desde que bem pagos, à liquidação de direitos, a venda das estatais é o derradeiro tiro na dignidade do Brasil.
Que a mídia comercial nada diga, é natural. O decreto teve que ser “prospectado” por assíduos leitores de diários oficiais. Mas o pior é que a sociedade não se move. Aceitou sem reclamar a derrubada da presidenta eleita por um legislativo ganancioso, vem aceitando arroubos malcriados de juízes e até ministros do STF fora dos autos, aceita a instalação de uma base americana na Amazônia, aceita a venda da estação de lançamento de foguetes de Alcântara aos mesmos americanos, aceita a entrega do pré-sal por preço de banana a multinacionais estrangeiras, aceita mudança na lei de diretrizes e bases por medida provisória, aceita a elevação da contribuição previdenciária de servidores públicos sem qualquer debate sério, aceita o perdão de dívidas a sonegadores endinheirados e bancos, aceita a reforma trabalhista que acaba com qualquer perspectiva de dignidade no emprego, aceita o perdão a trabalho indigno equiparado a escravo, aceita o aumento em mais de 50% do gás de cozinha, aceita provocações e mais provocações de um bando que se intitula governo sem qualquer legitimidade. Sem reagir. Como se fôssemos todos feitos de goma elástica, sem espinha dorsal.
Batemos palmas a um discurso idiota e mal elaborado de “combate à corrupção”, que só tem logrado destruir o parque industrial estratégico do país e tirar o emprego de centenas de milhares de cidadãs e cidadãos. E deixamos estar tudo como está: o usurpador do executivo vendendo o que é nosso para se safar da justiça, ao mesmo tempo em que ricos delatores são, depois de confessados seus crimes e inculpados os alvos políticos da investigação, deixados em paz, a curtirem seu whisky de 30 anos no novembro tão azul quanto o rótulo da garrafa da ilustre bebida.
E così la nave và…
No Chile, em que o liberalismo chicaguiano venceu a esperança, foi preciso um sangrento golpe militar para a tarefa de que aqui se desincumbem com a tranquilidade do ladrão de cofre residencial que sabe a família de férias. Nada de gritos, choros ou ranger de dentes. E ainda fazem dancinha de bunda gorda na nossa cara, que nem o líder daquilo que ousam chamar de governo na Câmara dos Deputados.
Cadê nossa altivez, nossa honra, nossa autoestima? Será que valeu a pena sacar uma presidenta honesta por isso? Por essa pinguela para a barbárie? Será que não pensamos nas nossas filhas e nos nossos filhos, sem futuro, territorializados numa economia globalizada? Sem ativos nacionais, nosso País está perdido. Está condenado a ser um ator de terceira divisão nesse mundo de cão que se nos desenha para as próximas décadas.
O que falta fazer para tirar o traseiro do sofá, para tirar os dedos do smartphone e reagir? Quando nos atentarmos para o estrago, será tarde demais e o Sr. Temer nada pagará, porque estará descansando em paz com seu bilau televisado. Mas nós teremos saudades do tempo em que poderíamos ter dado um rumo diferente a nosso destino e não demos.
É melhor reagirmos. Antes tarde do que nunca.
GGN

sábado, 4 de novembro de 2017

É preciso leva a sério a autodefesa antifascista, por Luís Felipe Miguel

Outro dia, cometi o desatino de entrar na página de um dos líderes da campanha para proibir Judith Butler de falar no Brasil - um olavete de poucas luzes e muitos milhares de seguidores, que divide suas postagens entre ataques à filósofa estadunidense, protestos de fidelidade canina ao guru de Richmond e a defesa da ideia de que é preciso anular a Reforma protestante.
A mistura de má fé, desinformação deliberada e ignorância não causa espanto, pois é o feijão com arroz desse pessoal. O espantalho da "ideologia de gênero" é mobilizado generosamente. Uma observação de Butler - de que suas contribuições à discussão sobre gênero são antigas e hoje o foco de sua reflexão é outro - é apresentada como evidência de que ela estaria amarelando diante da campanha contra sua presença no Brasil. Argumenta-se que não há tentativa de censura, pois o abaixo-assinado para calá-la tem mais de 200 mil apoios, uma falácia lógica tão bizarra que não pode ter passado desapercebida a quem a cometeu.
O que é grave é a recusa explícita à noção de que se deve "combater ideias, e não pessoas". Ao contrário, diz o cruzado anti-Butler, são as pessoas que devem ser combatidas. Os exemplos são chocantes: "Tivesse a pobre Igreja combatido heresias, sem advertir, convocar e, então, excomungar hereges, não estaríamos aqui" (no lugar de "excomungar" é fácil colocar "queimar"). Ou, então, numa aproximação talvez inesperada: "Stálin se fixou no poder matando Trotsky, e não combatendo seus ideais internacionalistas apenas".
É um chamamento à violência e mesmo ao assassinato político. E não vem de um maluco isolado qualquer; ele apenas verbaliza de forma mais aberta e mais extremada o que já é o modus operandi da direita bolsonariana e mebelística, que aposta na intimidação física e no cerceamento pela força da expressão de vozes dissidentes.
Com a ruptura da democracia, o jogo político está mudando, infelizmente para pior, para muito pior. Cabe à esquerda entender isso. Nós queremos o livre debate de ideias, porque nele, não tenho dúvidas, nós ganhamos de lavada. Mas não podemos assistir passivamente ao fechamento de nossos espaços, muito menos confiar num aparato policial e judiciário que se posiciona sem disfarces ao lado de nossos adversários.
Mesmo o reverendo Martin Luther King sabia que uma marcha não-violenta pelos direitos civis às vezes dependia do apoio de grupos de autodefesa negra, como os Deacons for Defense and Justice. Já passou da hora da esquerda brasileira levar a sério a necessidade da autodefesa antifascista.

 GGN

Com a Cyrella, a mais atrevida tacada de Doria, por Luis Nassif

João Doria Jr é um bem sucedido homem de negócios. Por tal, não se entenda o empreendedor convencional, ou o gestor. Toda a carreira empresarial de Doria foi feita no campo dos patrocínios, permutas e lobbies, colocando empresários em contato com autoridades através dos múltiplos fóruns da LIDE[1]. A missão da LIDE é montar eventos que permitam a empresários e autoridades estreitar relacionamentos, a exemplo da Cyrella.[2]
As autoridades vão porque querem um público de empresários e CEOS. E estes vão porque querem contato direto com as autoridades.
Simples assim. Em cima dessa fórmula, Doria montou inúmeros filhotes da LIDE, tanto setoriais – LIDE do agronegócios, da exportação etc – quanto regional, com filiais inclusive na América Latina.
Agora, está completando a inovação tornando a Prefeitura uma filial da LIDE. E aí entra em um terreno pantanoso, principalmente se os Ministérios Públicos fizerem a ligação entre os eventos da LIDE e as ações de Doria na prefeitura.
É como se ele acenasse para os membros da LIDE: o coroamento do investimento de vocês é que, a partir de agora, não será mais necessário investir em relacionamento: vocês serão as autoridades.
É o que aconteceu com essa nomeação escandalosa de Claudio Carvalho de Lima, vice-presidente executivo da Cyrella para a Secretaria das Subprefeituras.
A Prefeitura é a agência reguladora do setor de construções e incorporações de edifícios de São Paulo. Tudo passa pela Prefeitura, do inicio ao fim da obra, o relacionamento com a Prefeitura é essencial para uma grande incorporadora, do alvará ao HABITE-SE, da mão de transito a permissão de estacionamento e Zona Azul, do ISS na construção, zona de alta arbitragem à altura de prédio.
Cabe à Prefeitura defender a lógica do zoneamento, para impedir abusos e distorções.
A Cyrella é a maior empresa do setor.  E as subprefeituras são a principal moeda de troca com vereadores. Agora entrega-se essa moeda de troca a um executivo da Cyrella, que tem enormes interesses que dependem da Câmara Municipal, a começar pelo caso do Parque Augusta. Mesmos os piores prefeitos que passaram pela cidade não ousaram uma esbórnia tão ampla, assim, entre interesses públicos e privados.
É uma audácia sem desconfiômetro, típico da ambição sem limites de Doria, para suas investidas políticos-financeiras.
Através da Câmara, e usando as Subprefeituras como moeda de troca, será possível alterar zoneamentos fixados pelo Plano Diretor, permitindo às incorporadoras a jogada óbvia: comprar terrenos em Zona 1, vedadas a construção de edifícios e, em seguida, alterar as condições da região.
GGN


[1] Empresa de consultoria de propriedade de Dória prefeito de São Paulo, que reúne empresários e gestores públicos para negociarem.
[2] Uma das maiores empresas paulista do ramo imobiliário (incorpora, projeta, constrói, vende, aluga etc.). 

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Tacla Durán diz que procuradores da lava jato ameaçaram sua família para forçar delação, por Joaquim de Carvalho

Na quarta matéria da séria sobre a indústria da delação premiada da Lava Jato, feita em conjunto pelo Jornal GGN e o DCM, destacamos os principais trechos do áudio do encontro dos deputados Paulo Pimenta e Wadih Damous com o advogado Rodrigo Tacla Durán. As anteriores estão aqui.
Os deputados Paulo Pimenta e Wadih Damous, integrantes da CPI da JBS, viajaram por conta própria a Madri, na Espanha, e ouviram o advogado Rodrigo Tacla Durán, processado pela Lava Jato por lavagem de dinheiro.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Quatro redes de TV detêm mais de 70% da audiência no Brasil

Repórteres Sem Fronteiras lista donos das 50 maiores empresas do país, pertencentes a 26 grupos econômicos. ONG denuncia que políticos são proprietários de veículos de comunicação, apesar de Constituição proibir.
Mídia no Brasil ainda é controlada por poucos, diz estudo
Repórteres Sem Fronteiras lista donos das 50 maiores empresas do país, pertencentes a 26 grupos econômicos. ONG denuncia que políticos são proprietários de veículos de comunicação, apesar de Constituição proibir.
Em pleno século 21, o mercado de mídia no Brasil é dominado por "dinastias familiares”, que concentram poder político e econômico e detêm uma ampla rede de poder, cuja malha se estende por todo o território brasileiro. Essa é a conclusão de um relatório divulgado nesta terça-feira (31/10) pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras (RSF).
"Nem a tecnologia digital nem o crescimento da internet ou esforços regulatórios ocasionais limitaram a formação desses oligopólios”, ressaltam os autores do levantamento, realizado pela RSF em parceria com a ONG brasileira Intervozes.
O Monitoramento da Propriedade da Mídia no Brasil – ou, em inglês, Media Ownership Monitor (MOM) – compara a concentração de mídia às propriedades de terra no país. 
"Assim como os ruralistas, antes chamados de latifundiários, os proprietários dos meios de comunicação possuem um vasto território nas ondas das TVs e das rádios, combinando interesses econômicos e políticos com o controle rigoroso da opinião pública”, acrescenta o texto.
Pior dos 11 países pesquisados
A pesquisa, financiada peloMinistério de Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha,revela o nível de concentração da mídia brasileira, mostrando quem são seus proprietários e sua atuação no setor da economia. A investigação, realizada durante quatro meses, abrange os 50 veículos de comunicação com maior audiência no Brasil e os 26 grupos econômicos que os controlam.
O Brasil ocupa a pior colocação dos 11 países já analisados pela RSF – Colômbia, Peru, Camboja, Filipinas, Gana, Ucrânia, Peru, Sérvia, Tunísia e Mongólia também foram alvo da pesquisa.
O país recebeu a pior nota em quase todos os indicadores, nos quais o estudo se baseia para medir os riscos para a pluralidade da mídia, avaliando itens que vão desde concentração de propriedades e de audiência, passando por regulamentação sobre propriedade de mídias, até o nível de transparência sobre o controle das empresas. Apenas um dos indicadores brasileiros não foi considerado como "de alto risco para a pluralidade da mídia”.
A falta de transparência no Brasil sobre o controle acionário das principais empresas de comunicação chamou a atenção. "Até agora, o Brasil foi o primeiro país pesquisado em que nenhuma das empresas respondeu a nossas perguntas sobre quem são os seus proprietários”, relata Olaf Steenfadt, diretor do projeto MOM e integrante da Repórteres Sem Fronteiras Alemanha, em entrevista à DW. "Isso, nunca tínhamos visto antes”, acrescenta.
A pouca transparência sobre a propriedade dos grupos de comunicação, segundo o levantamento, se deve também à falta de uma obrigatoriedade legal para divulgação da estrutura acionária, além da inexistência de um monitoramento pelo poder público. Alguns grupos de mídia se negaram a responder, alegando razões "estratégicas" ou relacionadas à concorrência.
Grandes redes de TV pertencem a grupos que também controlam emissoras de rádio, portais de internet, revistas e jornais.
Concentração
"Falta no Brasil um quadro regulador", diz Steenfadt. "As poucas leis que existem não são implementadas. E as empresas não veem motivo para se abrirem de alguma forma, para serem transparentes”, lamenta. "A mídia não é como qualquer outro setor econômico. É importante saber quem a controla", opina o especialista. "Os cidadãos têm direito de conhecer os interesses por trás dos meios de comunicação que consomem."
O MOM-Brasil disponibiliza esses dados em uma página de internet, em português e inglês. O site contém um banco de dados com os nomes dos proprietários dos veículos de mídia, revelando também as ligações deles com grupos econômicos e empresas em outros setores, sistematizando as informações e as tornando acessíveis não só a pesquisadores, como também ao público em geral.
O levantamento mostra haver concentração dos centros de poder da mídia nas regiões Sul e Sudeste do país. A sede de três em cada quatro desses grupos fica na maior cidade do país, São Paulo.
No segmento de televisão, mais de 70% da audiência nacional é concentrada em quatro grandes redes, das quais uma detém mais da metade da audiência: a Rede Globo. Essas grandes redes nacionais ampliam ainda mais seu poder sobre a informação, destaca o MOM, através do domínio adicional de múltiplos segmentos. Grandes redes nacionais de TV aberta pertencem a grupos que também controlam emissoras de rádio, portais de internet, revistas e jornais impressos, segundo o estudo.
"Coronelismo eletrônico”
A pesquisa constata que, embora a Constituição brasileira proíba que políticos controlem empresas de mídia, 32 deputados federais e oito senadores possuem meios de comunicação, ainda que não sejam seus proprietários formais.
"Outras famílias proprietárias, como os Câmara, Faria e Mesquita, também têm membros em cargos políticos”, diz comunicado divulgado pelo MOM-Brasil. "A família Macedo, que controla o grupo Record e a Igreja Universal do Reino de Deus, também domina um partido político, o Partido Republicano Brasileiro (PRB), que conta com um ministro no governo federal, um senador, 24 deputados federais, 37 deputados estaduais, 106 prefeitos e 1.619 vereadores”, contabiliza o levantamento.
O estudo chama a concentração de poder na mídia brasileira de "coronelismo eletrônico”. Os autores da pesquisa afirmam que em vários estados as afiliadas das grandes redes de televisão e rádio são controladas por empresas de políticos ou de famílias com tradição política.
"Um exemplo disso é o grupo do qual fazem parte a TV Bahia (afiliada da Rede Globo) e o jornal Correio da Bahia, controlado pela família Magalhães, do atual prefeito de Salvador, Antônio Carlos Magalhães Neto, e do ex-governador da Bahia, senador e ministro das Comunicações Antônio Carlos Magalhães”, ressaltam os editores do levantamento.
GGN

O duro acerto de contas da mídia com ela mesma, por Luis Nassif do Jornal GGN

Fala-se muito na ausência de Estadistas nos diversos poderes da República e nos diversos partidos políticos. Por tal, definem-se aquelas pessoas com visão clara sobre um futuro incerto, que se propõem a construir as bases para a nova era, desviando-se das armadilhas do curto prazo.
Faltou Estadista na mídia.
Ontem, dois diretores de redação procederam a uma autocrítica tardia dos abusos cometidos na Lava Jato. Admitiram que foram a reboque dos vazamentos, que assassinaram reputações de inocentes e que não cumpriram o papel de filtros da informação.
Lembro-me do longínquo 1999, na CPI dos Precatórios. Embora de modo mesmo intenso, havia um vazamento escancarado de informações, de todos os lados, sem que houvesse uma estratégia de cobertura, com cada veículo querendo dar seu furo e comendo nas mãos das fontes.
O principal responsável pelo golpe, ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf, conseguia passar incólume pelo noticiário. Desenvolvi uma narrativa à parte da cobertura, juntei peças que estavam soltas e, remontado o quadro, aparecia nitidamente o papel de Maluf.
A não ser o caso do jornalista Fernando Rodrigues, que saiu nitidamente em defesa do ex-prefeito, tentando desqualificar as evidências que apontavam para ele, o restante da blindagem era fruto exclusivo da falta de preparo da cobertura. Narro essa guerra jornalística no meu “O jornalismo dos anos 90”.
Instado por Otávio Frias Filho, apresentei internamente sugestões para coberturas desse tipo.
O primeiro passo seria criar uma Sala de Situação, com jornalistas experientes, na redação, fora do calor das batalhas diárias, juntando as informações e planejando a cobertura. O grande desafio seria montar uma narrativa inicial, plausível, uma espécie de fio de Ariadne que ajudasse a cobertura a se localizar nos labirintos da notícia.
Depois, ir juntando informações em torno da hipótese inicial, com suficiente discernimento e flexibilidade para mudá-la, caso os fatos levassem a isso.  Se fugiria da armadilha de procuradores que se tornam prisioneiros da narrativa inicial e passam a enfiar provas a marteladas para manterem a coerência com o errado.
No caso da Lava Jato houve mais do que essa falta de competência da cobertura da mídia. Havia o propósito político claro de usar as informações como armas de guerra. Não apenas na Lava Jato, mas em toda cobertura jornalística desde 2005. Era óbvio que, no mar de notícias fake que se seguiu à ampliação das redes sociais, a grande estratégia do jornalismo seria o filtro. Preferiam ser os alavancadores das falsas notícias.
Em qualquer grande país, há um grande jornal de centro-esquerda, outro de centro-direita, mas ambos respeitando integralmente a notícia. O respeito à notícia faz parte das qualidades intrínsecas do jornalismo, como gelar é função da geladeira, cozinhar do fogão. A geladeira pode ter mil badulaques. Mas sua qualidade intrínseca é de gelar. Os veículos podem ter linhas políticas distintas. Mas sua qualidade intrínseca é bem informar.
Tudo isso foi deixado de lado. Agora se tem esse desafio inglório de divulgar pesquisas para tentar explicar ao leitor que o jornalismo pátrio é o remédio contra as fakenews.
Que jornalismo? O que anunciou a invasão das FARCS no Brasil, os dólares de Cuba remetidos em garrafas de rum, a ficha falsa de Dilma, o respeitado assessor que não passava de um pequeno estelionatário, o esgoto diário e semanal despejado sobre o país durante tanto tempo?
Por trás do macartismo enlouquecido, praticou-se toda sorte de jogadas. E, como não existe Estadista na mídia, permitiu-se, nesse período, a consolidação final do poderio da Globo.
Enquanto jornais transformavam blogs em seus adversários preferenciais, a Globo abocanhava parcelas cada vez maiores da publicidade das estatais.
Hoje se tem essa situação humilhante, dos jornais equilibristas. Na reportagem, denúncias contra Michel Temer, para impedir a desmoralização final dos veículos. Nos editoriais, apoio, para impedir o corte de publicidade.
Ainda vai levar algum tempo para perceberem que os maiores defensores do jornalismo foram os jornalistas que denunciaram essas distorções monumentais, que acabaram por liquidar com a credibilidade do jornalismo pátrio. Mas que só conseguiram externá-las longe dos jornais. O pluralismo dos anos 90 tinha se transformado em muralha intransponível.
GGN

“Odebrecht deu extratos falsos em delação”, Tacla Duran

Os deputados Paulo Pimenta e Wadih Damous  fizeram o que o Sérgio Moro se recusa a fazer.
Os divulgaram ontem à noite a gravação da entrevista que fizeram com o ex-advogado da Odebrecht, Rodrigo Tacla Durán. Nela, ele confirma e detalha a afirmação de que parte dos documentos entregues pela Odebrecht em seu acordo de delação premiada é falsa.
Tacla Durán diz que os impressos fogem ao padrão do banco, o Melon Bank, que seria gerido, inclusive, por funcionários e operadores da empreiteira.
É, talvez, um indício da razão da teimosia da 13a Vara Criminal em negar às defesas dos seus réus o acesso ao tal Sistema Drousys, que reteria a contabilidade do Departamento de Operações Estruturadas da empresa, canal por onde escorria o dinheiro de propinas.
Seja como for, a procuradora Raquel Dodge tem autonomia para mandar que o novo grupo que ela criou para os casos da chamada “Lava Jato” tome o depoimento, de forma oficial, e Tacla Durán, porque foi em Brasília que as deleções da Odebrecht foram tratadas e lá, por Luís Edson Fachin, homologadas.
Se a Odebrecht forneceu documentos falsos, como ele sustenta, não há razão para que seus delatores sejam tratados de forma diferente da que é feita com os delatores da JBS, ou até com mais gravidade, porque a estes não é imputada falsidade documental.
Acompanhe você mesmo as respostas de Durán e Paulo Pimenta e Wadih Damous. Confira o Vídeo:
DCM

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Mídia faz juiz do DF processar Lula sem provas

A defesa do ex-presidente Lula da Silva está perplexa diante da aceitação de denúncia contra ele pela Operação Zelotes. A petição dos seus advogados questiona quais são as provas do Ministério Público Federal e onde o petista cometeu como corrupção passiva.
“O Defendente [Lula] não consegue identificar com clareza de quais fatos teria que se defender, quais as contraprovas a produzir, em suma, o que esclarecer à Justiça… Digno de Franz Kafka!”, afirma a defesa.
Na denúncia acolhida pelo juiz Vallisney Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, o Ministério Público Federal acusa Lula e o ex-ministro Gilberto Carvalho de beneficiar montadoras de veículos por meio da edição de medidas provisórias.
De acordo com a denúncia, as empresas automobilísticas teriam prometido R$ 6 milhões a Lula e Carvalho em troca de benefícios para o setor.
O MPF se baseia em duas cartas encontradas na casa de um réu e destinadas a Lula que INSINUAM que ele recebeu propina, mas os advogados apontam que não há nenhum indício de que elas foram de fato enviadas ou chegaram às mãos do ex-presidente.
A aposta principal dos acusadores de Lula, porém,  é o rascunho encontrado na casa de um empresário e apresentado pelo MPF. Nele aparecem escritos “Pres.” e “Ok”. Para os procuradores, o papel seria prova de que Lula recebeu propina.
Rascunho apresentado como prova. Reprodução
Esse processo não estava andando por ser ridiculamente fraco, mas o juiz Vallisney Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, apavorou-se com reportagem da Folha de São Paulo publicada em 13 outubro último e que acusa a Justiça do Distrito Federal de “demorar” para abrir processo contra o ex-presidente.
A Folha comparou, na matéria, a velocidade com que a 13ª Vara de Curitiba age contra Lula e a velocidade “mais lenta” da 10ª Vara de Brasília contra o mesmo alvo.
O mais engraçado é que, dois meses antes, a mesma Folha de São Paulo publicou matéria que apontava que o juiz Sergio Moro julga processos contra Lula com rapidez “recorde”, jamais vista em outros processos no país…
O que espanta e indigna é uma pessoa ser processada sem que existam os mínimos elementos para abertura de tal ação judicial. Nesse aspecto, a manifestação da defesa do ex-presidente exprime toda indignação diante de tal absurdo.
Confira, abaixo, o comentário em vídeo:

Blog da Cidadania