quinta-feira, 13 de novembro de 2025

PREFEITURA DE BURITI PAGA SALÁRIO DE FOME EM CONTRASTE AOS RENDIMETOS DE MARAJÁ

Prefeitura Municipal de Buriti-MA
         Enquanto 456 trabalhadores recebem R$ 869,00 na Prefeitura de Buriti (MA), determinado médico tem vencimento de R$ 49.400,00. Tal prática configura flagrante violação à Constituição Federal e aos princípios elementares da dignidade da pessoa humana e da moralidade administrativa.

Em Buriti de Inácia Vaz, o que deveria ser política de valorização do servidor transformou-se em manchete de indignação pública. Conforme dados da própria folha de pagamento do mês de agosto de 2025, a Prefeitura remunera 456 trabalhadores com carga horária de 44, 40 e 20 horas semanais por apenas R$ 869,00 mensais — pouco mais da metade do salário mínimo nacional. Por outro lado, paga a um único médico psiquiatra, com 20 horas de expediente semanal, um salário de R$ 49,4 mil. Um verdadeiro salário de marajá diante da miséria institucionalizada (clic aqui e pesquise pela especialidade).

Não se trata de mera irregularidade contábil, mas de violação direta à Constituição Federal, que, em seu artigo 7º, inciso IV, assegura ao trabalhador o direito a um salário mínimo capaz de atender às necessidades básicas da vida. Pagar menos do que isso é ilegal, imoral e fere a dignidade humana, princípio consagrado no art. 1º, inciso III, da Carta Magna. A prática também afronta outras normas do ordenamento jurídico. A Lei do Estágio (11.788/2008), a Lei do Voluntariado (9.608/1998) e as regras sobre bolsas e programas de incentivo não autorizam que se disfarce um vínculo de trabalho formal com outro nome, tampouco permitem remuneração inferior ao salário mínimo.

No caso específico da Lei do Voluntariado, vale esclarecer: o trabalho voluntário é, por definição, não remunerado, exercido por pessoa física em atividades sem vínculo empregatício e sem contraprestação financeira, nos termos do art. 1º da referida lei. Trata-se de ato espontâneo e solidário, jamais podendo ser utilizado como mecanismo de substituição de mão de obra assalariada ou como forma de burlar a legislação trabalhista.

Portanto, não há amparo legal algum para que a Prefeitura utilize o instituto do voluntariado para justificar o pagamento de valores ínfimos a trabalhadores que exercem funções contínuas, subordinadas e essenciais à administração pública. Essa tentativa de “travestir” relações de emprego sob o rótulo de voluntariado fere frontalmente o espírito da lei, que nasceu para estimular a cidadania e o serviço comunitário, e não para institucionalizar o subemprego. Se há subordinação, jornada, habitualidade e pessoalidade, trata-se de relação de emprego, ainda que mascarada sob outra denominação. E, nessas condições, a Prefeitura não pode pagar menos que o piso nacional.

O salário mínimo é o limite legal e moral do Estado para garantir o mínimo de sobrevivência. Quando o próprio poder público o descumpre, nega o direito mais básico do trabalhador e fragiliza toda a estrutura de proteção social construída desde 1988. E nesse mesmo sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é inequívoca: qualquer pagamento inferior ao salário mínimo é nulo de pleno direito. Mais do que uma afronta individual, é uma lesão coletiva, que compromete a credibilidade da administração pública e o princípio da isono- mia, previsto no art. 37, caput, da Constituição, impondo ao gestor o dever de tratar os cidadãos com igualdade, legalidade e moralidade.

Enquanto centenas de buritienses sobrevivem com menos de um salário mínimo pago pelo próprio município, um médico psiquiatra contratado com carga horária de 20 horas semanais recebeu, em agosto, R$ 49.400,00. A discrepância entre o trabalhador que ganha R$ 869,00 e aquele que recebe R$ 49 mil revela um abismo ético e social na condução da folha de pagamento pública. Um só salário de luxo equivale a quase sessenta vencimentos de miséria. Em termos de gestão pública, tal descompasso viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, consagrados pela doutrina e pela Lei do Processo Administrativo (9.784/1999), aplicável por analogia à esfera municipal. Essa desigualdade gritante fere o interesse público, que deve orientar cada ato do gestor.

Diante desse cenário, é legítimo perguntar: onde estão os órgãos de controle? A Câmara Municipal, que representa o povo, tem o dever constitucional de fiscalizar o Executivo e exigir explicações. O Ministério Público Estadual, defensor da ordem jurídica, deve instaurar procedimento investigatório para apurar possível improbidade administrativa —especialmente porque pagar abaixo do salário mínimo e manter vínculos precários são atos lesivos à moralidade administrativa, nos termos do art. 11 da Lei nº 14.230/2021.

O Tribunal de Contas do Estado (TCE-MA) deve auditar a folha de pagamentos, identificar irregularidades e determinar sua correção imediata. A sociedade civil organizada, sindicatos, associações e cidadãos também podem agir, com base na Lei de Acesso à Informação (12.527/2011), exigindo prudência nos gastos públicos e denunciando abusos e violações legais.

Ao pagar valores inferiores ao mínimo, o gestor afronta a Constituição, incorre em ato de improbidade administrativa e pode responder civil, administrativa e penalmente. As consequências vão desde cassação de mandato, multa e ressarcimento ao erário, até ação penal por peculato (art. 312 do Código Penal) e prevaricação (art. 319 do mesmo diploma).

Mais grave, contudo, é o impacto humano: centenas de famílias, muitas em situação de vulnerabilidade, trabalham sem o mínimo necessário para viver com dignidade. É a precarização institucionalizada do trabalho — e, em última instância, a negação do pacto social que sustenta o Estado Democrático de Direito.

Buriti de Inácia Vaz não pode aceitar calada a exploração de seus trabalhadores. O servidor público, mesmo contratado de forma temporária, merece respeito, legalidade e justa remuneração. A Constituição não é um enfeite — é a garantia de que o poder público existe para servir o povo, e não para explorá-lo.

Que os fatos sejam apurados com rigor. Que os responsáveis sejam punidos com justiça. E que o trabalhador buritiense, que move a cidade e sustenta a administração, deixe de ser tratado como número na planilha e volte a ser reconhecido como cidadão de direitos.


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segunda-feira, 10 de novembro de 2025

A VULNERABILIDADE DA REPRESENTAÇÃO PARLAMENTAR

Ilustração: protesto

Todo mandato – contratual ou eletivo -, pressupõe uma representação. Na esfera privada, o mandatário pratica atos em nome daquele que lhe outorga uma procuração, sem a qual não se conhecem os limites de poderes conferidos. É dentro desses limites que as relações jurídicas se estabelecem em torno de um determinado objeto. Uma compra e venda, uma permuta de bens, uma locação de casa, por exemplo, criam uma relação jurídica contratual, na qual uma das partes pode ser representada por mandatário que, munido de uma procuração, figura como procurador. É natural que essa relação jurídica pode ser desfeita, através da revogação manifestada pelo outorgante do mandato, sobretudo quando o mandatário ultrapassa os limites dos poderes. Isso é comum na vida privada.

Assim também deveria ser nos mandatos eletivos – para o exercício de qualquer cargo disputado em eleições supervisionados pela Justiça Eleitoral, nas quais os eleitores são os mandantes e os eleitos, passam a ser os mandatários. Cada voto depositado em urnas, de forma direta e secreta, corresponde a uma simbólica procuração, mas os poderes conferidos são definidos no ordenamento jurídico, a partir da Constituição Federal.  Diz-se, então, que esse ordenamento jurídico constitui o estado democrático do direito, que, substancialmente, se traduz na Democracia. De qualquer forma, opera-se uma manifestação de vontade expressa no ato de votar. A relação entre o eleitor e o eleito emerge da votação.  Em certa medida, sobreleva um compromisso, não apenas com a diplomação e posse do eleito, mas também na atuação do eleito.

Não se pode perder de vista que a compreensão de que as diferenças entre os dois tipos de mandatos - contratual e eletivo -, se caracterizam pela representação, que constitui a sua essência. Contudo, se, no mandato contratual, a representação pode ser revogada, quando o mandatário se excede no exercício dos poderes conferidos, nos mandatos eletivos isso não acontece, porque o sistema jurídico adota outros mecanismos, cuja burocracia desestimula iniciativas dos prejudicados. Se os meios dificultam os fins, não é por isso que se escuse o combate aos desvios hostis de mandatários que excedem os poderes de representação.

Essa introdução – teórica, em certa medida -, explica-se e justifica-se, na medida em que também se evidencia uma relação jurídica entre o eleitor e o eleito, chancelada pela Justiça Eleitoral e, por isso, não se desfaz facilmente; ao contrário, subsiste no exercício do cargo ocupado. Ao eleito e empossado cabe honrar a confiança, enquanto os eleitores não podem abrir mão do seu papel de vigilância permanente, sobretudo contra os desvios hostis protagonizados pelos seus representantes. Contudo, o universo crítico não deve se limitar ao campo do ativismo político-partidário, mas também deve compreender todos os segmentos sociais conscientizados, na busca do fortalecimento da Democracia, porque somente esta garante a liberdade para contrapontos e vozes dissonantes.

Na atual quadra da história brasileira, estamos presenciando distorções marcantes na atuação de parlamentares, que reclamam o brado retumbante de todos quantos se indignam com atuações vergonhosas no exercício de mandatos eletivos, em dimensão alarmante, ao ponto de comprometer a credibilidade das instituições democráticas. 

Ainda bem que a imprensa livre e a velocidade com que os meios de comunicação noticiam os fatos, minuto a minuto, têm revelado escandalosas práticas políticas, em todos os níveis da federação, até mesmo em Câmaras de Vereadores dos mais longínquos municípios do interior do País, nas quais se constroem maiorias episódicas, quase sempre distanciadas do interesse coletivo. Não sem credibilidade, a mídia aponta situações bizarras em que a infidelidade partidária é acompanhada da renúncia da coerência em posturas pretéritas. Isso também configura distorção do sistema político e revela vulnerabilidade da representação parlamentar, na medida em que os protagonistas não conseguem resistir aos assédios tentadores, ainda que se destruam biografias sedimentadas.

É nesse cenário de horrores corriqueiros, que se estabelecem as distorções repugnantes, sobretudo nos parlamentos brasileiros, nos quais o interesse de categorias econômicas – de há muito beneficiadas com isenções tributárias -, se sobrepõem ao implemento de políticas públicas em favor das classes menos favorecidas.

O que aconteceu no dia 8 de outubro de 2025, na Câmara dos Deputados, é o exemplo mais recente. Ouviram-se “gritos histéricos” de deputados, como se tivessem   ganhado um jogo de cartas sebosas de um baralho velho. Na verdade, a votação expôs a vulnerabilidade de representantes de interesses econômicos distanciados dos anseios populares. Prevaleceram os acenos de “campanhas financiadas” de 2026, nas quais, uma vez mais, os eleitores serão mandantes, sem poderes revocatórios, a não ser que a conscientização política lhe chegue a tempo. Este artigo não esconde esse propósito.

Por Prof. Benedito Ferreira Marques.

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sábado, 8 de novembro de 2025

O MASSACRE DO RIO E A COP-30 EM PAUTA

Foto: Wagner Meier/Getty Images - Foto: pavilhão da Cop-30/sede

       O Brasil inteiro, por seus variados meios de comunicação, discute os problemas de segurança pública, instigado pelos acontecimentos ocorridos no Rio de Janeiro, nos últimos dias do mês de outubro de 2025. Não é para menos, pois a operação desencadeada pelo governo daquele Estado, à guisa de combater o chamado “crime organizado”, ceifou mais de uma centena de vidas, ainda em processo de identificação das vítimas. O tema de segurança pública é um dos mais angustiantes problemas para todos os entes federados: União, Estados e Municípios, cuja solução exige reunião de esforços de cada um e da sociedade em geral. As equações até aqui desenhadas envolvem especialistas de todas as áreas de conhecimento, justamente porque o problema é complexo e reclama juízos com diferentes nuances, que vão desde a ressignificação do Sistema Prisional brasileiro, à implementação de políticas públicas preventivas de curto, médio e longo prazos; a revisão do arcabouço legal sobre os licenciamentos de portes de armas e aquisição de munições; o reexame do sistema normativo sobre aplicação de penas; enfim, todas as sugestões que têm sido apresentadas exigem contribuições científicas de todos os matizes. Todas, porém, passam pelo sistema de normas, consubstanciado em leis e observância de princípios arraigados.  Propostas de leis que aumentam penas mais severas, mediante a reclassificação de tipos penais, têm sido concebidas como medidas mais urgentes, mas essas dependem de ações, também mais aceleradas, do Congresso Nacional, que, à sua vez, se tem comportado de acordo com os impactos de estatísticas de letalidade e reclamos da imprensa. Essas providências, contudo, passam pela aferição dos efeitos da aplicação rígida do aparato legal, porque o princípio da dignidade da pessoa humana substancia a teoria dos Direitos Humanos, que não é bem assimilada por segmentos conservadores notórios, que chegam a defender até a pena capital, claramente vedada na ordem jurídica constitucional. Pena de morte só em caso de guerra, mas há quem considere essa luta contra o “crime organizado” uma guerra declarada. Será?

   De qualquer forma, o problema da segurança pública é pauta permanente, não apenas para os governantes, mas também para toda a sociedade. Cada cidadão tem responsabilidade e deve dar o seu contributo. O que não se pode é tolerar é a indiferença consciente e o comodismo de apenas criticar e reclamar, esperando que a PAZ seja dada pelo Estado, como se este não existisse em sua função. Não é assim que funciona.     

     Enquanto as tormentosas questões de segurança se agudizam no Rio de Janeiro - na verdade, em todos os Estados brasileiros -, líderes e cientistas de mais de uma centena de países se preparam para a tão esperada COP-30, em Belém (PA), a partir do dia 10 de novembro, para discutirem a questão climática do planeta Terra. Trata-se, evidentemente, de um acontecimento da mais alta relevância para todos os povos, principalmente porque aponta para horizontes sombrios para a humanidade.

  O aguardado encontro, todavia, não deve limitar o debate à questão climática, porque o chamado aquecimento global se explica nas ações humanas, na exploração desordenada dos recursos naturais – principalmente do solo, das florestas e das águas. O desmatamento e os incêndios; a exploração clandestina de minérios por garimpeiros desautorizados; a pesca predatória; o acintoso banimento dos povos indígenas; e a ocupação descontrolada de terras pelos mais diferentes mecanismos – entre os quais, a “grilagem” -, tudo isso também constitui um desafiador problema, cuja solução passa, necessariamente, pelo processo de educação ambiental e agrária, simetricamente ajustadas, para que se promova o desejado desenvolvimento sustentável. É certo que a proteção do meio ambiente não pode se constituir empecilho às atividades agrárias, mas também é certo que estas não podem significar a destruição dos recursos naturais. O equilíbrio é o meio virtuoso!

      Não se pode tangenciar, noutra vertente, a teimosa existência de conflitos agrários pela disputa da terra, minimizando-se o valor da posse – que potencializa o cumprimento da função social -, e valorizando-se os títulos (escrituras) registrados, ainda que os seus detentores não desenvolvam atividades agrárias, fazendo desses documentos instrumentos de especulação rendosa.   Esse também é um problema a enfrentar e discutir na COP-30

   Trazer à mesa do debate o tema segurança pública e as questões ambientais explicam-se e justificam-se porque são faces da mesma moeda, e reclamam atenção do Estado e da Sociedade, na busca de soluções urgentes e pragmáticas, não porque a imprensa se ocupa das duas temáticas, produzindo repercussões e gerando inquietações, mas porque a solução de tais questões não dispensa a conscientização de todos, e esta  não se constrói sem debate e participação.

    Este periódico tem essa preocupação como pauta permanente. Essa é a razão de ser desta abordagem em forma de editorial de capa, porque os editores responsáveis estão imbuídos   dos propósitos que animam a manutenção deste pequeno jornal mensal, na linha independente de opinar e ajudar a formar consciências políticas sadias, na defesa intransigente da cidadania plena.

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