Os ratos
Comparar
frações é uma das coisas mais complicadas de se fazer sem uma metodologia
própria. O que é menor 7/8 ou 6/9? 7/12 avos ou 3/5? Fica sempre muito difícil
sem um parâmetro, uma metodologia que nos possa servir para tornar as coisas
“comparáveis”. Michel Temer é uma fração de presidente, Rodrigo Maia outra
fração, como presidente da Câmara. Qual o menor?
Temer, da
última vez que concorreu como candidato às proporcionais (em 2006), recebeu
99.046 votos para deputado por São Paulo. Ficou em 54º lugar naquelas eleições.
Só conseguiu entrar pelo famoso “quociente eleitoral”. Seu recorde foram
252.229 votos na eleição de 2002, quando ficou em sexto mais votado por São
Paulo.
Rodrigo Maia
é um dos tantos “herdeiros políticos” que estão no nosso parlamento. O filho do
ex-prefeito do Rio de Janeiro César Maia, começou sua carreira na Câmara em
1998 recebendo 96.385 votos. Depois, em 2002 teve 117.229, em 2006 198.770, e
em 2010 caiu para 86.162 votos apenas. Nas eleições de 2014, afundou mais ainda
com apenas 53.167 votos. Ficando apenas em 29º lugar entre os eleitos do RJ.
Elegeu-se, também, pelo famoso quociente eleitoral.
Enquanto o
PMDB de Temer é oriundo da “oposição ao regime militar”, Maia é do antigo PFL
(Partido da Frente Liberal) que teve sua sigla tão desgastada por escândalos de
corrupção e pela defesa do neoliberalismo que precisou mudar de nome. O PFL é
uma das ramificações da ARENA (Aliança Renovadora Nacional), o partido apoiador
da ditadura civil-militar. A verdade é que enquanto a ARENA, na ditadura, era
um bloco monolítico de apoio aos governos ditatoriais, o PMDB juntou gente de
todos os matizes políticos em seu bojo (desde os partidos comunistas até o
antigo Partido Social Democrático que representava as elites latifundiárias que
apoiavam Getúlio Vargas). O PMDB sempre foi, portanto, uma “colcha de retalhos”,
oferecia apoio por cargos. A História diz que, durante a ditadura, o PMDB era o
partido do “Sim” e a ARENA do “Sim, senhor!”.
Michel Temer
tem 76 anos. Nenhuma aspiração política que envolva eleições. Da presidência
partirá ao esquecimento, se antes não der uma passada na Papuda. Como acaba sua
carreira política, nada teme de fato. Não deve obediência a eleitores (que de
fato não tem), nem tem qualquer preocupação com as “próximas eleições”. Rodrigo
Maia, tem 47 anos, e teria ainda – em tese – uma carreira política. Sob este
aspecto, penso que Maia pode ser mais responsivo às ruas, já que tem
efetivamente preocupação com as próximas eleições. O problema é que o espectro
político que vota nele tem pouco apreço pela democracia. Especialmente uma
democracia com povo. O DEM é sempre muito refratário a qualquer ampliação de
participação política. Penso que Maia não é exceção.
Temer está
envolvido, até o fundo, na corrupção crônica brasileira. Toda sua curruela mais
próxima também. Claramente seu governo é uma quitanda para quem lhe puder
oferecer apoio político que lhe salve a pele. Temer não tem vergonha de leiloar
cargos, leis, medidas e tudo o mais que ele puder fazer de valor no Brasil,
para barrar as investigações sobre corrupção. As reformas nunca foram um
“programa de governo” seu. Foram a moeda de troca que ele usou para blindar seu
grupo. O “Botafogo” (com o perdão dos alvinegros cariocas), como Maia é chamado
nas planilhas da Odebrecht, também é investigado pela PF por corrupção em
diversos inquéritos. Os valores são muito menores do que Temer ou Cunha, Maia
sempre foi “baixo clero”. Nunca teve qualquer projeto de Brasil, e assumiria a
presidência como um boneco de ventríloquo. Não sabemos que lhe manipula as
cordas. Uns apostam no financismo, mas eu creio que nem para isto Maia teria
capacidade.
De fato, a
troca de Temer por Maia significa mais alguns minutos de oxigênio que os
perpetradores do golpe tentam para aprovar as reformas e, ao mesmo tempo,
saciar o apetite da Globo. Temer se mostra muito ralo e sem condições mínimas
de levar o país a qualquer lugar. Suas malfadadas peripécias internacionais,
combinadas com seus atos-falhos deixam ainda mais patente a posição de pária
político. Nem as manipulações do PIB, nem a senhora “Bela, recatada e do lar”
foram capazes de promover qualquer mudança na aceitação de Temer.
Rodrigo Maia
tem também sua vaidade. É preciso considerar que em uma democracia verdadeira
ele jamais teria condições de se eleger para qualquer cargo executivo, que dirá
Presidente da República. Tanto Temer quanto Maia são exemplos gritantes do
fracasso de nossa democracia, de nossos sistemas representativos. Mas se Maia
seguir seu normal político e golpear Temer, ambos ficarão com suas fotografias
como “Presidentes do Brasil”. Como historiador me sinto chocado em escrever
isto. Em que mundo Temer e Maia poderiam se ombrear – sob qualquer aspecto –
com Lula, FHC, Getúlio Vargas e Kubistchek, por exemplo? É o “déficit de
representação”, de que falam os cientistas políticos, dando um tapa com a “mão
invisível” na nossa cara. Duas vezes.
Enquanto a
aliança que sustenta Temer está em direção à cadeia, a de Maia dirige-se ao
“lixo da história”. Quaisquer políticos que venham a compor este arremedo de
“frente nacional” ficarão marcados por terem feito parte de um momento tão
baixo e mesquinho da história brasileira. O problema é que o nível do “baixo e
mesquinho” é, talvez, bastante alto e aceitável para o tipo de gente que apoiar
Maia. E Maia terá a foto na galeria onde figuram os governantes do Brasil. Se
pudermos travar as reformas, a troca é seis por meia dúzia com o benefício de
deixar Temer na condição de ser preso, e Maia evidenciando o atoleiro em que
nos metemos. Se não pudermos barrar as reformas, não faz diferença quem será
abandonado pelo capital, logo em seguida, se Temer ou Maia. Penso que Maia tem mais
a perder e quase nada – além de sua vaidade – a ganhar. Mas ele me parece
estúpido o suficiente para fazer a escolha errada.
Maia e
Temer, se somados os votos das últimas vezes em que se elegeram, teriam 152.213
pessoas que lhes hipotecaram apoio. Isto representa 0,28% dos 54.501.118 que
Dilma recebeu. Quem quiser entender o recado, que entenda. E mande para o STF,
por favor.
GGN