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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

XADREZ DO GRANDE PACTO NACIONAL CONTRA BOLSONARO, POR LUIS NASSIF

Peça 1 – tem jogo
A pesquisa DataFolha, com a contagem de 58 a 42 para Bolsonaro em relação a Fernando Haddad, mostra que tem jogo.
Motivo 1 – Em outras eleições, com menos volatilidade, houve viradas. A eleição atual é atípica, com mudanças radicais de posição, criação de ondas de tsunami. Por isso mesmo, não há estratificação de votos. Nem mesmo entre aqueles que, no primeiro turno, garantiam votos consolidados.
Motivo 2 – com Bolsonaro se posicionando sobre diversos temas, em cada posição que assume deixa de ser a encarnação irracional da unanimidade antissistema, e passa a ser uma pessoa de carne e osso, sendo desenhada por cada opinião.  Aliás, é curioso que nas duas únicas vezes em que mostrou bom senso – quando disse que a reforma da previdência deveria ser consensual e que o governo não poderia abrir mão do controle sobre a geração de energia – foi alvo de críticas de Carlos Alberto Sardenberg na CBN, filho dessa mistura de liberalismo econômico cego e autoritarismo político míope. Pelo menos a irracionalidade cega do mercado ajuda a dissipar sua adesão irracional a Bolsonaro.
Motivo 3 – a onda de ataques de seus seguidores a adversários por todo o país e a constatação clara de que será um governo de arbítrio, de selvageria, do qual não sairá incólume nenhuma forma de poder, da Justiça à mídia.
O exemplo mais flagrante é o inacreditável ex-juiz Wilson Witzel (PSC), candidato ao governo do Rio de Janeiro, ameaçando prender seu opositor, o ex-prefeito Eduardo Paes e se valendo de um amigo juiz para inabilitar outro candidato, Antony Garotinho. E ainda anunciando que acabará com a Secretaria de Segurança para evitar interferência civil no trabalho da polícia.
Os sinais de fascismo se tornaram tão evidentes que não comportam mais o jogo de cena de fingir que não se vê a guerra. Até o Ricardo Boechat vai se dar conta de que as violências que se espalham por todo país não podem ser comparadas a brigas de torcidas. Entre outros aspectos, pela relevante razão de que nenhuma torcida organizada esteve perto de assumir o poder de Estado.
Já se percebe um movimento nítido da mídia de lançar luzes sobre o bolsonarismo. Nos últimos dois dias, a mídia começa a dar o devido peso a essa onda de violência, sendo oficialmente apresentada a um fenômeno que só existia nas suas fantasias antipetistas: o fascismo em estado bruto.
O sistema Globo é particularmente influente nas grandes metrópoles do sudeste, onde há maior concentração de votos para Bolsonaro. E poderá jogar um pouco de luz nos grupos empresariais, tão primários quanto texanos de fins do século 19.
Resta a outra incógnita da equação: o desafio de reduzir o antipetismo.
O caminho passa pelo grande acordo nacional, que reedite o pacto da Nova República. E, aí, Fernando Haddad poderá ter papel fundamental.
Peça 2 – o fim do ciclo da Nova República
Há vários pontos em comum entre os meses que antecederam a Nova República e o quadro atual.
A Nova República foi um pacto de governabilidade que se seguiu ao fim da ditadura.
Nos últimos anos, o país experimentou um novo tipo de ditadura, o estado de exceção em vigor no país, com perseguição aos inimigos, censura ao livre pensamento, atentados à constituição pelo Supremo Tribunal Federal, abusos de juizes, procuradores e delegados, e a mídia encetando uma campanha de ódio em tudo similar aos anos 60. O resultado foram as explosões de violência, preconceito, intolerância, potencializados pelas redes sociais e de whatsapp.
Agora, se tem a bocarra escancarada da besta, a poucas semanas de engolfar o país. E, ainda que algo tardiamente, vai caindo a ficha de todos os protagonistas políticos, das instituições, mídia, partidos políticos, sobre os riscos de venezuelização do país.
São os gatilhos que dão início a um novo pacto de governabilidade.
Peça 3 – a concertação brasileira
Quando a Espanha estrebuchava no período pós-franquismo, sem conseguir se encontrar, surge a figura de Felipe Gonzales. Primeiro, unificou a esquerda. Depois, fez um movimento importante para o centro, colocando o aprofundamento da democracia como a meta maior. Esvaziou a direita, consolidou a socialdemocracia e acertou um pacto que garantiu a consolidação da democracia espanhola e se manteve por muitos anos.
No Brasil, nenhuma figura pública está mais apta a desempenhar esse papel do que Fernando Haddad. Mas, para tanto, terá que enfrentar um desafio freudiano: matar o pai.
Haddad nutre por Lula o reconhecimento genuíno de um intelectual capaz de entender sua grandeza política. Mas, no novo tempo que se avizinha, terá a missão de enterrar o lulismo. Aliás, o próprio Lula há tempos havia se dado conta da necessidade de superação dessa etapa, quando tentou emplacar Eduardo Campos, quando apostou em Dilma, a gestora, e mesmo agora, quando ensaiou aproximação com Ciro Gomes. Mas, principalmente, quando apostou em Haddad como seu sucessor, por várias razões.
Primeiro, por ter feito carreira no partido que mais se aproximou do desenho social-democrata, o PT. Depois, por sempre ter colocado a negociação, a racionalidade como ponto central de sua atividade como Ministro e como prefeito premiado de São Paulo, abrindo as portas para a contribuição de diversos setores – do MTST a ONGs privadas – sem relação direta com o partido. Finalmente, por uma idoneidade não apenas moral, como intelectual, de jamais ter tergiversado de suas posições políticas, nem cedendo ao populismo, nem aos acenos do mercado.
Ou seja, tem-se as condições políticas para o cargo, um roteiro razoavelmente definido. Resta saber se Haddad e o próprio PT estarão à altura do momento.
Peça 3 – as condições para o pacto
O primeiro ponto é isonomia com essa história da autocrítica.
O PT deve, sim, uma autocrítica por ter enveredado pelas regras do jogo político tradicional. E se a autocrítica é condição para o eleitor ter a garantia de que não repetirá os malfeitos, é de se esperar uma autocrítica da Globo, que não mais estimulará o estado de exceção, como fez de 2013 para cá, processo que resultou na ascensão do bolsonarismo. Haveria necessidade também de autocrítica do STF pela quantidade de vezes que se curvou à pressão da besta das ruas, atropelando a Constituição; da Procuradoria Geral da República, nem se pense em Rodrigo Janot, que não tem dimensão para esses gestos, mas de Raquel Dodge e da cúpula do Ministério Público? Do PSDB por ter abdicado da princípios democráticos e impulsionando o golpe
Para poupar todos esses personagens da profunda irresponsabilidade com que trataram o futuro do país, há uma maneira mais indolor e eficaz de purgar os erros e de mostrar o novo: um grande pacto nacional contra a besta que, desde já, acene para a opinião pública sobre a extensão do pacto, seus compromissos sociais, com o desenvolvimento e com o combate sistemático à violência que está grassando de cabo a rabo no país, no rastro do fenômeno Bolsonaro.
Peça 4 – os personagens
O desenho ideal futuro para o pacto seria um novo partido, da socialdemocracia brasileira, com predomínio do PT – como único partido que se manteve estruturado nesse tsunami, por sua base social e sindical. Mas abrindo as portas para os setores liberais do PSDB, que serão jogados ao mar caso João Dória Jr seja eleito governador. E todos os setores racionais do empresariado, das organizações sociais, do pequeno e micros empresários, da indústria, assim como os legalistas do Poder Judiciário. E, obviamente, da mídia, com ambos os lados tapando suas narinas.
O segundo turno poderá ser a semente dessa movimentação que coloque, em um partido, o Brasil civilizado, institucional, democrático, contra a barbárie.
A Nova República exigiu um novo modelo partidário, desde que o bipartidarismo do regime militar se espatifou. Agora se tem um quadro no qual os dois partidos que garantiram a governabilidade nas últimas décadas, não podem mais caminhar sozinhos: o PSDB morto por inanição; o PT pela constatação de que, sozinho, provavelmente não conseguirá nem a vitória nas eleições, nem a governabilidade.
Esse risco enorme deverá convencer sua executiva a abrir mão do controle absoluto do processo e repartir poderes – dentro da estratégia que vem sendo costurada por Jacques Wagner.
Tem-se, então, o barco com náufrago em um mar coalhado de tubarões. Terão que se acertar.
É nesse clima que poderá emergir a figura de Fernando Haddad. Se bem-sucedido, poderá ser o Felipe Gonzales brasileiro. Malsucedido, afundará junto com a democracia brasileira, a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão, a Constituição e qualquer réstia de civilização.
GGN

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

A BARBÁRIE CHEGOU, POR MARCELO AULER

A 19 dias do segundo turno, portanto, sem qualquer definição do que acontecerá e de quem presidirá o país nos próximos quatro anos, os adeptos da candidatura do capitão já se sentem donos do país. Respaldados apenas no bom resultado do primeiro turno, demonstram a quem ainda não conseguiu enxergar como pretendem comandá-lo. Não é nada agradável. Ao que parece, sentiram-se livre para demonstrar do que são capazes: impor medo e terror.
O quadro ao lado, recebido pelas redes e ampliado, demonstra apenas alguns acontecimentos ocorridos nos últimos dias nos mais diversos cantos do país. São fatos reais, em cidades diversas, sempre com a mesma marca: foram protagonizados por adeptos da candidatura de Jair Bolsonaro e mostram a violência. O desprezo pela vida. O desrespeito ao diferente ou a quem não pensa igual.
Não é demais lembrar que no dia 6 de setembro, o gesto tresloucado de Adélio Bispo de Oliveira, um mineiro com suspeitas de problemas psíquicos, atingiu o presidenciável Jair Bolsonaro em plena campanha, em Juiz de Fora (MG). Mesmo conscientes de estarem em uma disputa eleitoral acirrada, os demais candidatos se solidarizaram ao deputado federal do PSL, condenaram o gesto e até reduziram, na época, os ataques políticos. Manifestaram repúdio à violência com a qual não tinham qualquer envolvimento.
Nos últimos dias, porém, cenas de violência se repetem com uma frequência grande. Em comum o fato de serem protagonizadas por eleitores ou militantes da campanha do capitão do Exército. Muitas delas gravadas em vídeos. A maioria com registros na polícia. Demonstram que os militantes da candidatura militar – que acabam se confundindo com verdadeiros milicianos – diante dos resultados do primeiro turno, sentiram-se autorizados para, à luz do dia, e mesmo na presença de testemunhas, mostrar a violência que defendem e são capazes de realizar.
O mais impressionante é o silêncio obsequioso – autorizador? – de Bolsonaro. Ele próprio ainda se recuperando de um tresloucado ato de violência. Violência que, há muito, defende e propaga.
Se ele não pode responder pelos gestos de seus seguidores, apesar de muitos deles terem sido incentivados pelo discurso de ódio que sempre pregou, pode sim ser cobrado pelo silêncio diante de tamanha violência.
Silêncio que não se resume ao candidato à presidência. É compartilhado também pelo candidato ao governo do Rio de Janeiro, Wilson Witzen. Este, mesmo se vangloriando de ser ex-tenente dos Fuzileiros Navais – “onde aprendemos a hierarquia e a disciplina” – e ex-juiz federal, assiste impassível – e aplaude –  discursos de ódio dos candidatos coligados, como se fosse algo natural.
Tal como ocorreu em Petrópolis, cidade serrana fluminense, dias antes do primeiro turno. Ali, em momento lembrou-se de defender a lei e, principalmente, a civilidade. Tal como deveria ter aprendido ao pertencer às Forças Armadas e à magistratura. Em compensação, no debate político com o adversário, tenta se mostrar forte ao prometer dar-lhe voz de prisão diante de possível crime de injúria.
GGN

terça-feira, 18 de setembro de 2018

XADREZ DO PAPEL DE LULA NO MUNDO, POR LUIS NASSIF

Peça 1 – civilização contra barbárie
Nas últimas semanas, quatro ex-primeiros ministros europeus vieram ao Brasil em consideração a Lula, e para discutir a crise das democracias liberais. Foram eles Martin Schultz, da Alemanha, Dominique de Villepin, da França, Massimo D’Alema, da Itália, e José Luiz Zapatero, da Espanha, além de Pierre Salé, ex-diretor geral da Anistia Internacional.
Em qualquer país civilizado, haveria cobertura maciça, pela oportunidade única de levar para a opinião pública, sem intermediários, as informações e opiniões de figuras-chave da política mundial.
Presente ao encontro, o linguista norte-americano Noam Chomsky já tinha decifrado esse fenômeno da invisibilidade no seu próprio país. Pessoas com acesso a educação de elite, são treinadas para discernir o que não deve ser dito.
Os grupos de mídia ignoraram as seguintes conclusões dos europeus:
1. A grande disputa mundial se dá entre o multilateralismo e a globalização selvagem que trouxe, como contrapartida, a xenofobia e o individualismo extremado, com o avanço dos partidos radicais e a desmoralização da democracia liberal.
2. O futuro da democracia mundial está sendo travado no Brasil. Se vencer o estado de exceção, se o Judiciário se impuser sobre a política, caindo a democracia no Brasil cairá na América Latina, África e outros países.
3. Depois da morte de Mandela, Lula se tornou o símbolo universal da luta civilizatória. Ele está para a democracia assim como Mandela esteve para a discriminação racial.
Peça 2 – os pontos centrais da disputa
Vamos entender um pouco melhor essa guerra mundial, que é o melhor caminho para explicar a irracionalidade que tomou conta do Brasil.
O pós-guerra consagrou uma nova etapa do capitalismo, tratado como a Era de Ouro. Fortaleceram-se os laços de solidariedade mundial, através das novas instituições criadas e de um conjunto de acordos multilaterais, consagrando direitos humanos e sociais, induzindo o desenvolvimento dos estados de bem-estar social e outros avanços que permitiram a fase de maior expansão e inclusão da história do capitalismo.
Nos anos 70, a expansão do capitalismo financeiro provocou a primeira ruptura, com o fim da paridade ouro-dólar conferindo uma liberdade ampla ao capital financeiro, nos mesmos moldes do que ocorreu no final do século 19 e início do século 20, período que preceu a 1a Guerra.
Produziu bolhas sequenciais, das bolhas bancárias do Japão, nos anos 80, às bolhas cambiais dos anos 90, a Nasdaq nos anos 2.000 até explodir na grande crise de 2008. Mas, até então, havia um razoável controle do ultraliberalismo sobre a política, graças à cooptação de intelectuais, basicamente economistas, acenando com a prosperidade geral, em um ponto qualquer do futuro, se houvesse sacrifícios dos trabalhadores/consumidores no presente.
Era o falso iluminismo, supondo que o avanço da tecnologia resolveria todas os problemas mundiais. trazendo a prosperidade eterna.
Foi uma ideologia tão poderosa, que até mesmo a socialdemocracia europeia sucumbiu a esse discurso, abrindo mão de conquistas sociais e aceitando a livre movimentação de capitais.
Quando veio a crise de 2008, o castelo de cartas veio abaixo. Constatou-se, então, a extraordinária concentração de renda no período, entre nações e internamente entre faixas sociais.
Os exageros das medidas em benefício do grande capital, o falso discurso da meritocracia, como justificativa para o desmonte do Estado social, tudo isso levou ao quadro atual em que o próprio capitalismo liberal se vê ameaçado.
Vamos a um pequeno apanhado de sinais de alertas emitidos ontem pelo The Economist, a bíblia do capitalismo:
O LIBERALISMO fez o mundo moderno, mas o mundo moderno está se voltando contra ele. A Europa e a América estão no meio de uma rebelião popular contra as elites liberais, que são vistas como egoístas e incapazes ou incapazes de resolver os problemas das pessoas comuns. (...) Os governos liberais ficaram tão envolvidos em preservar o status quo que esqueceram o que é o radicalismo. Lembre-se de como, em sua campanha para se tornar presidente da América, Hillary Clinton escondeu sua falta de grandes ideias por trás de uma nevasca de pequenas opiniões. (...) A meritocracia liberal de hoje se incomoda com essa definição inclusiva de liberdade. A classe dominante vive em uma bolha. Eles vão para as mesmas faculdades, casam-se, vivem nas mesmas ruas e trabalham nos mesmos escritórios. A maioria das pessoas deve se contentar com a crescente prosperidade material. No entanto, em meio à estagnação da produtividade e à austeridade fiscal que se seguiu à crise financeira de 2008, até mesmo essa promessa foi muitas vezes quebrada. (...) É o momento de uma reinvenção liberal. Os liberais precisam gastar menos tempo rejeitando seus críticos como tolos e fanáticos e consertando o que está errado.
Peça 3 – os ataques ao multilateralismo
Não apenas a globalização financeira promoveu essa esbórnia.
Em sua palestra, o ex-primeiro ministro francês, Dominique de Villepin, sintetizou os demais fatores de instabilidade global.
O primeiro, o desequilíbrio geopolítico, com a maior potência - Estados Unidos - em queda e uma nova potência - a China - em ascensão. Os EUA vem reagindo a essa perda relativa de protagonismo, e o que parece ser a brincadeira de um homem, Donald Trump, na verdade é um jogo muito mais profundo, que vai continuar após Trump. É um combate total, com riscos militares, tecnológicos, tarifas comerciais etc.
Julgavam que a democracia liberal ganharia em toda parte.
Agora, diante do impasse da história, os EUA e a administração Trump estão imaginando que o caos será favorável aos EUA. Por isso atacam a regulação, as instituições, os tratados internacionais, as instituições internacionais que garantiram a paz internacional nas últimas décadas.
O segundo fator é a ideia de grupos sociais podem mandar em outros, dependendo dos recursos financeiros ou da cor da pele, ou de sua institucionalidade, com a judicialização da política.
O terceiro fator de desequilíbrio foram as redes sociais promovendo enorme balbúrdia de opiniões e informações.
Peça 4 – o fator Lula no mundo
Com a crise de 2008, o neoliberalismo morreu, o pensamento tecnocrático fracassou, mas a política não tinha o que colocar no lugar.
Foi nesse contexto que surge o fenômeno Lula. Surfando nas ondas da crise global, Lula atuou em duas frentes. Internamente, comandando a resistência contra os efeitos da crise internacional. Externamente – graças a Celso Amorim – assumindo a liderança das negociações no âmbito do G20 e do BRICs.
O Brasil se tornou um case mundial por várias razões. No plano internacional, por mostrar a viabilidade de novos centros de influência, fora do binômio Estados Unidos-União Europeia.
Em relação às políticas públicas, iluminou a socialdemocracia europeia. Como observou o italiano D’Alema, Lula surgiu trazendo ideias claras sobre os objetivos da política, que é de se aproximar do eleitor comum, colocar o cidadão como centro das políticas.  Isso em um momento em que a socialdemocracia se debatia com a total falta de rumos, ante a multiplicidade de diagnósticos e propostas que se seguiram à grande crise. De outro, mostrando como se poderia inovar nas políticas sociais, nas formas de participação popular e, especialmente, no feito inédito de tirar 40 milhões de pessoas da linha de pobreza.
Volte um pouco no texto e releia o que o The Economist relaciona como pontos centrais da crise do capitalismo liberal.
Lula se tornou o grande símbolo das virtudes do poder político humanizado, contra o poder financeiro, aliado às tecnocracias locais – peste que está assolando a maior parte das democracias.
Peça 5 – a guerra mundial no Brasil
Os desdobramentos da crise internacional, os novos fatores de influência, produziram um rearranjo das forças políticas e econômicas, cujos atores podem ser melhores qualificados analisando-se os pontos centrais da disputa:
1. O desmonte maior ainda dos estados nacionais, através da desregulação selvagem.
2. O combate ao multilateralismo.
3. A xenofobia e o preconceito.
4. A judicialização da política, com o controle da política por corporações públicas não eleitas.
Como deixou bem claro o editorial do The Economist, não se trata de uma disputa capitalismo vs  socialismo, mas de civilização vs barbárie.
São atores diversos que participam dessa frente obscurantista, dos movimentos de ultradireita, aos defensores do estado de exceção, através do cooptação do Judiciário e da judicialização da política.
No Brasil, três tipos de personagens despontam na brigada do obscurantismo.
Do lado da truculência mais tosca, Raul Bolsonaro, MBL e afins. No plano Jurídico, enaltecendo o estado de exceção e desmoralizando os acordos internacionais, o Ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso. Lava Jato e afins são tarefeiros, agentes oportunistas que procuram ocupar vazios de poder. Mas a bênção irresponsável vem do Supremo e, nele, do corneteiro mor, Barroso, profeta maior do obscurantismo. Na frente da mídia, as Organizações Globo.
Analisando-se o cenário internacional, fica mais fácil entender o tiroteio cerrado da Globo contra todos os candidatos a presidente, inclusive os antigos aliados, acentuando a demonização da política e defendendo incondicionalmente os abusos da Lava Jato. Em parte, por suas vulnerabilidades na parte penal, tanto em questões fiscais como nos casos envolvendo a CBF. Mais ainda, por ter tomado partido nessa luta global de instaurar a ditadura das corporações, falsamente legitimada pelo ativismo do Judiciário.
Aliás, foi inesquecível a expressão de Pierre Sané, o ex-diretor geral da Anistia Internacional, comentando a discussão brasileira sobre a obediência ou não aos tratados internacionais, especialmente ao Comitê de Direitos Humanos da ONU que, segundo Barroso, seria um organismo menor, sem representatividade.
Como não teria representatividade? indagou Sané. Seus membros foram indicados pelos países que assinaram o acordo, todos são especialistas internacionais de alta reputação, indicados pelos membros integrantes do acordo. Todos os países-membros se comprometeram a acatar suas decisões. E assinaram os acordos soberanamente, sem nenhuma espécie de imposição. Como dizem, agora, que o acordo não deve ser obedecido?
Mas quem é Sané, perto de um editorial de O Globo, fundado em um voto de Barroso?
“A longa sessão do julgamento também serviu para, pelo voto do ministro-relator, Luís Roberto Barroso, ser detalhada a patranha da tal defesa “da ONU” do reconhecimento da candidatura do ex-presidente.Como ficou registrado no voto de Barroso, não houve qualquer pronunciamento “da ONU”, mas de um órgão administrativo da instituição, chamado Comitê de Direitos Humanos”.
Nem Luiz Edson Fachin ousou colocar em tal situação de risco sua reputação jurídica, explicando tecnicamente a obrigatoriedade da vinculação das decisões internas às decisões do Comitê da ONU.
Peça 6 – a mensagem dos políticos
Na palestra exemplar de Villepin, o chamamento à grande guerra entre a civilização e a barbárie:
“Precisamos de um mundo que volte a se mover por regras (valores). Hoje em dia existem teorias muito eficazes, o ultraliberalismo, que quer transmitir a sensação de que tudo vai se resolver eliminando todas as regulações.
Há a sensação de que a tecnologia irá resolver tudo. Não irá. Quem irá resolver é a política.As regulações sofreram muito. O primeiro golpe foi a subordinação a uma visão tecnológica da regulação. Nossos amigos alemães pensaram que tudo na Europa sairia bem com austeridade para todos. E os gregos pagaram muito caro.A regra da ortodoxia não é suficiente porque por trás das regras há pessoas que têm fome e problemas e não podem ser atendidas como como visão fria das regras.Outro problema é que as ideias vão se proliferando até o ponto de não serem compreendidas. É o caso dos alemães impondo políticas de austeridade de alto custo social.O povo precisa de dois, três objetivos claros para que o caminho seja bem compreendido e os avanços possam ser medidos.No combate entre regimes autoritários e democráticos, a capacidade de convencimento dos autoritários parece maior em muitos países.Daí a relevância de Lula.A vida comum democrática precisa de uma base, e a base é a ordem, e a ordem é a regra compartilhada a serviço de todos. É também necessário um objetivo. É a capacidade de colocar novamente a história em movimento, colocando a política a serviço do povo.Isso pode dar nova esperança ao Brasil. Sou muito otimista de que Brasil possa se levantar de novo com essa esperança.Vocês tiveram nos últimos anos, na missão do presidente Lula, de mudar as coisas neste país. E ele deu uma lição importante para cada um de nós. O que precisamos, como europeus e cidadãos do mundo, por isso obrigado por trabalharem por um futuro que possamos compartilhar todos, uns pelos outros, uma nova esperança compartilhada.
 GGN