O criminalista e professor da USP David Teixeira de Azevedo detonou o
modus operandi da Lava Jato de Curitiba, de usar a prisão preventiva e ameaça a
familiares para obrigar os investigados a delatar, e chamou de
"farsa" as estatísticas propagadas por Sergio Moro para afirmar que
suas decisões são majoritariamente confirmadas pela instância superior.
Ao lado da constitucionalista Eloísa Machado, professora de
Direito da FGV-SP, David explicou que o motivo da manipulação feita por Moro é
muito simples: não há o que o tribunal revisar e rejeitar se os próprios
delatores são obrigados, por força do acordo feito com os procuradores de
Curitiba, a abrir mão dos recursos.
"Moro diz que as decisões deles foram confirmadas. Os acordos
da delação, quando foram fechados, implicavam na desistência de recursos. Ou
seja, não eram revistas as decisões dele pelas instâncias superiores. Quer
dizer: essa estatística que o Moro faz é uma estatística falsa."
A declaração foi feita por David após Eloísa dizer que é inegável
que a Lava Jato usou de medidas cautelares desenfreadamente, para gerar pânico
nos investigados e coagí-los a delatar. Ela disse que não é possível dizer que
todos os acordos foram feitos dessa maneira, mas seria necessário investigar
caso a caso, algo que não tem sido feito.
"Seria muito difícil analisar caso a caso, mas que muita
delação de gente em liberdade foi fechada em razão de conversas (e posso citar
nomes) com o Ministério Público, que ameçava [o investigado] com o envolvimento
criminal da esposa, filhos, pessoas da mesma empresa, mesmo sabendo que não
havia envolvimento... isso ocorreu e muito", exclamou o criminalista.
Um dos casos conhecidos é o do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto
Costa, que fez um acordo de delação premiada que concedeu imunidade a
familiares. Nestor Cerveró é outro modelo.
O segundo processo de Lula nas mãos de Moro, sobre suposta propina
da Odebrecht, também guarda mistérios sobre as colaborações dos corréus.
Glaucos da Costamarques, por exemplo, tem ajudado o Ministério Público,
inclusive mudando seu depoimento para atenuar as acusações. Um relatório da
Receita Federal sugere que seus filhos poderiam ter entrado na mira da Lava
Jato, por causa de repasses milionários concedido ao engenheiro, por anos
seguidos.
A FRAUDE NAS DELAÇÕES
Os dois professores também lançaram dúvidas sobre a lisura das
delações e dos processos criados com a ajuda de vazamentos seletivos à
imprensa. Caso do grampo em Dilma e Lula, citado por Eloísa. Para ela, atitudes
como esta deveriam colocar todo o processo em risco.
David, por sua vez, disse que a delação de Paulo Roberto Costa e
Alberto Youssef não foram consideradas adequadas em Portugal.
"Quanto à lisura das delações, dois constitucionalistas
portugueses (José Canotilho e Nuno Brandão), a pedido do governo português,
deram um parecer sobre a admissibilidade da delação de Paulo Roberto Costa e
Alberto Youssef perante o ordenamento jurídico portugues. A conclusão dos
parecer desses dois acadêmicos insuspeitos foi que as delações premiadas de
ambos ferem o ordenamento jurídico brasileiro, o ordenamento juridico portugês
e a ordem pública portguesa, porque nesses acordos existe absoluta ilegalidade:
o Ministério Público no acordo, e o magistrado homologando, criaram legislação
própria para a delação, e isso é ilegal."
VALE TUDO
Após tantas críticas sobre as violações da Lava Jato, a jornalista
Mônica Waldvogel, apresentadora do programa na GloboNews, sugeriu em sua
questão final que os fins justificariam os meios.
"Três anos e meio de uma operação capaz de atingir pessoas tao
poderosas e setores empresariais tão enraizados na economia e cultura
brasileiro, certamente teria atropelos no processo. O que interessa para nós
agora é saber se valeu a pena atropelar o processo legal em função dos
resultados? Valeu a pena tudo isso que foi inventado, inovado com a Lava
Jato?", indagou.
Eloisa Machado respondeu: "Nada com violação ao devio processo vale
a pena."
David Teixeira acrescentou: "'Para acabar com os carrapatos, vamos
matar as vacas'. Lava Jato é uma coisa parecida. Para acabar com a corrupção,
sacrifiquemos os direitos e garantias fundamentais. (...) Não hesitemos em
condenar com penas altíssimas e assustadoras, descompassadas com a culpa do
homem, para, a partir dessas penas, estimular outros a delatar, restringindo
qualquer possibilidade de defesa."
GGN