O tribunal é
muito valente para cassar prefeitos de interior, por exemplo, mas é muito
reticente em relação às disputas nas capitais. O TSE é muito corajoso às vezes
para cassar um governador da Paraíba, mas não quer se intrometer na disputa em
São Paulo, ou no Rio de Janeiro, ou mesmo em Minas Gerais. Há uma assimetria e
talvez tenha uma razão… Cassamos governadores de Rondônia, Roraima, Maranhão,
mas somos cautelosos em relação sobretudo à Presidência da República. Mas a
questão tem gravidade que precisa ser pelo menos examinada, e é isso que estou
colocando neste momento. Gilmar Mendes, quando se examinava ação aberta
por seu parceiro Aécio Neves contra Dilma Rousseff.
O próprio
Aécio Neves, senador afastado, ex-presidente do PSDB e candidato derrotado ao
Planalto em 2014, admitiu em conversa com o delator Joesley Batista que só
pretendia “encher o saco” do PT quando ingressou com ação no TSE para cassar a
chapa Dilma-Temer.
Na mesma
conversa, Aécio afirmou que Michel Temer pediu que ele retirasse a ação, mas
que não tinha como fazê-lo, já que o Ministério Público daria continuidade ao
processo.
À época, a
ministra Maria Thereza de Assis Moura negou monocraticamente o pedido de
Aécio. Mas o caso foi ao plenário do TSE e, muito por conta do voto de Gilmar
Mendes, o processo teve andamento.
O relator do
caso decidido nesta sexta-feira, Herman Benjamin, referiu-se ao menos uma vez
ao voto de Gilmar então como “uma Bíblia”, como forma de ressaltar a diferença
entre o que Gilmar pensava ANTES e o que pensa AGORA.
Em 13 de
agosto de 2015, ao informar sobre o voto de Gilmar no TSE, o
colunista Reinaldo Azevedo, em seu blog na revista Veja, fez questão
de destacar: “TSE tem de evitar a continuidade de um projeto no qual
ladrões de sindicato transformaram o país num sindicato de ladrões”.
No texto,
depois de reproduzir trechos do voto de Gilmar, acrescentou:
Ladrões
Nas
intervenções que fez, fora de seu voto escrito, comentou o ministro: “Um
colunista importante me disse, esses dias: ‘ladrões de sindicatos transformaram
o país em sindicato de ladrões’. É grande a responsabilidade desse tribunal”. E
emendou que, caso se demonstre ser assim, “a obrigação do TSE é evitar a
continuidade desse projeto, por meio do qual ladrões de sindicato transformaram
o país num sindicato de ladrões”.
Quem seria o
colunista? O próprio Reinaldo Azevedo?
No voto
desta noite, em que decidiu por 4 a 3 contra a pretensão de Aécio Neves de
cassar Temer, Gilmar Mendes demonstrou uma grande preocupação em preservar a
soberania do voto popular, o que nunca fez, ainda que em simples entrevista,
antes da cassação de Dilma Rousseff pelo Congresso.
Quando o
Senado cassou Dilma Rousseff mas manteve os direitos políticos dela, sob a
presidência de seu colega Ricardo Lewandowski, em 2016, Gilmar afirmou:
“Considero
essa decisão constrangedora, é verdadeiramente vergonhosa. Um presidente do
Supremo não deveria participar de manobras ou de conciliábulos.
Portanto não
é uma decisão dele. Cada um faz com sua biografia o que quiser, mas não deveria
envolver o Supremo nesse tipo de prática. O que se fez lá foi um DVS, não em
relação à proposição que estava sendo votada. Se fez um DVS (destaque para
votação em separado) em relação à Constituição, o que é, no mínimo, para ser
bastante delicado, bizarro. (…) Vejam vocês como isso é ilógico: se as penas
são autônomas, o Senado poderia ter aplicado à ex-presidente Dilma Rousseff a
pena de inabilitação, mantendo-a no cargo. Essa é a tese. Então, veja, não
passa na prova dos nove do jardim de infância do direito constitucional”.
Esta noite,
Gilmar poderia ter cassado os direitos políticos de Dilma por oito anos, mas
isso exigiria a cassação da chapa — e de seu aliado, Michel Temer.
Em seu voto,
ele não apenas espalhou suspeição sobre todos os indicados por Lula e Dilma ao
STF, mas citou favoravelmente Fernando Henrique Cardoso, aquele que o indicou
para a vaga no tribunal.
Gilmar
afirmou que questões políticas deveriam ser decididas por políticos, sem
lembrar que foi flagrado atendendo pedido do senador Aécio Neves para fazer
lobby junto ao senador tucano Flexa Ribeiro pelo voto favorável à lei do abuso
de autoridade.
Gilmar
enfatizou que o TSE não deveria cassar mandatos com leveza, quando
anteriormente havia afirmado que faltava coragem ao TSE para cassar mandatos em
estados importantes ou mesmo o presidente da República!
Independentemente
do mérito do que foi decidido — há petistas vibrando com a absolvição de Dilma
e outros celebrando o ímpeto de Gilmar contra a Lava Jato, que pode beneficiar
Lula — é importante frisar que as contradições de Gilmar apontadas acima são
apenas migalhas diante do que uma análise completa do voto dele poderia
revelar.
Gilmar
enfatizou que a Justiça não pode ser feita de maneira fortuita, de acordo com
as circunstâncias do momento, mas foi justamente o que fez ao livrar Michel
Temer.
A seguir o link do
voto de Gilmar que ajudou a abrir a ação contra a chapa Dilma-Temer no TSE, pretendida
por Aécio Neves: Tse 761votovistaministrogm de Luiz Carlos Azenha
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