Muitos brasileiros têm motivos fundados para não votar no
candidato do PT. Menos por Fernando Haddad e mais pelo PT. Afinal de contas, o
partido, que foi combativo, vigoroso e defensor da ética na política se omitiu em certos pontos. Se é verdade que os dois mandatos do presidente Lula ficarão
entre os mais exuberantes e exitosos da história do Brasil, também é verdade
que o governo Dilma deixou muito a desejar e, em parte, está na raiz da atual
crise. Mas se tudo isto for colocado nos pratos da balança da história é
possível perceber que há um saldo mais positivo do que negativo em favor dos
governos petistas.
Combate a corrupção
Combate a corrupção
Ademais, na própria questão da corrupção, foi sob os governos
petistas que se criaram os mais poderosos instrumentos de combate à mesma, sem
os quais o Brasil estaria ainda mergulhado no lodaçal que degrada os
governantes e as instituições e desacredita os cidadãos. Foi dada autonomia à
Polícia Federal, foi fortalecido o Ministério Público, foi sancionada a Lei da
Delação Premiada e foi criada a Controladoria Geral da União. Não bastasse
isto, não há nenhuma acusação séria contra a gestão de Haddad pelos quase sete
anos à frente do MEC e sua gestão na Prefeitura de São Paulo foi marcada pelo
desbaratamento da máfia dos fiscais e pela recuperação de milhões de reais
desviados desde os tempos de Maluf.
Defesa da Democracia
Defesa da Democracia
Quiseram os caprichos da história e da Fortuna destinar a
Haddad a tarefa de enfrentar o maior perigo para o frágil processo de
construção da democracia desde o início da redemocratização. Perigo expresso em
tudo o que a candidatura de Bolsonaro representa. Assim, todos os eleitores que
não gostariam de votar no PT e, mesmo, muitos eleitores que votaram em
Bolsonaro, movidos por uma justa raiva e tristeza, estão postos diante de uma
terrível encruzilhada: votar em Bolsonaro e levar o Brasil por caminhos escuros
e escorregadios que o conduzirão aos abismos do ódio entre irmãos, entre
familiares, à violência política e, quiçá, à guerra civil ou votar em Haddad
para que se possa divisar uma luz no fim do túnel, para que se possa disputar
eleições com um convívio pacífico e para que se inicie um novo processo de
construção da democracia, com justiça, liberdade, direitos e igualdade.
Bolsonaro e a Barbárie
Bolsonaro e a Barbárie
Em política, a palavra, as promessas e as ações dos líderes
sacramentam o conteúdo das alianças que eles fazem com o povo, com os
eleitores. A campanha de Bolsonaro tem pregado a violência generalizada, tem
estimulado o estupro, tem pregado mais pregos nas mãos e nas almas dos negros e
negras que carregam uma cruz histórica desde os tempos da escravidão. O
candidato votou contra as empregadas domésticas, contra os direitos dos
deficientes, contra as demandas dos trabalhadores. As suas votações no
Congresso contribuíram para espezinhar os mais fracos, os humildes, aqueles que
mais sofrem. Em quase trinta anos de mandato, ele não produziu nenhuma obra
contra a corrupção e apenas usufruiu das benesses do poder.
Bolsonaro se diz patriota. Mas o que é a pátria? A pátria é o
povo que vive em um lugar e que tem uma cultura, uma língua, uma identidade.
Não se pode ser patriota sem amar o povo, sem defender os seus direitos, a
igualdade e a sociedade justa. Não se pode ser patriota e defender os ricos, as
injustiças, a opressão e a discriminação. Não se pode ser patriota e semear a
violência, a discórdia e a inimizade entre o povo. Ninguém que é injusto,
impiedoso, cruel e desumano é patriota.
Bolsonaro proclama "o Brasil acima de tudo", mas
não diz o que isto significa. O Brasil acima de tudo só pode significar o povo
acima de tudo, um povo com educação, cultura, saúde, moradia, trabalho,
direitos e civilidade. O Brasil estará acima de tudo se suas riquezas forem
postas a serviço do bem estar do seu povo, se o meio ambiente for
preservado, se o desenvolvimento for sustentável se as gerações presentes
deixarem como herança boas condições de vida ambientais e materiais para as
gerações futuras. Bolsonaro afirma que defenderá a família. Mas como defenderá
a família semeando a violência? Como defenderá a família não defendendo os
direitos de igualdade das mulheres, inclusive a igualdade salarial? Como
colocar Deus acima de todos e querer a desigualdade e a injustiça entre os
seres humanos? Todas as religiões dizem que Deus é justo.
Chamamento a razão
Chamamento a razão
Em nenhum outro momento da história, o povo brasileiro foi
chamado a votar com a razão, com a reflexão e com a ponderação como neste
momento. O povo terá que escolher entre a destruição e a possibilidade de um
novo recomeço da democracia. A ira do povo é justa, não há dúvida sobre isto,
pois os governantes tiram muito do povo e devolvem pouco. Mas raiva não pode
deixar o povo surdo e mudo quanto às advertências e os perigos que a
escolha de Bolsonaro representam. A ira do povo não pode atrair o mal sobre o
próprio povo. É preciso restabelecer o diálogo com o povo irado, mostrar-lhe,
sem sectarismo e sem rancor, onde está a verdade, onde está a justiça, onde
está a fé, onde estão os remédios para superar este presente triste e onde está
a esperança por um futuro melhor.
Mais uma vez, os caprichos da história e da Fortuna quiseram
que Haddad representasse esta fé, esta razão e esta esperança porque se há um
sentido de justiça e de bem estar nesta disputa, este sentido está em Haddad.
Votar em Haddad é perdoar os pecados dos outros, perdoar o PT. Mas o PT também
precisa pedir perdão à sociedade. Votar em Haddad é dar uma chance para que o
sistema político brasileiro, com seus partidos, se reconstrua em bases éticas,
em bases orientadas para a justiça, em bases onde as instituições se tornem
mais eficazes na solução dos problemas do povo e do Brasil.
Um povo irado pode querer um líder irado, é compreensível.
Mas um capitão descontrolado pode levar o barco a pique em meio à tempestade.
Bolsonaro pode ser irado, mas a sua ira não é nem santa e nem justa pelo que
prega e pelo que votou no Congresso. A ira santa e justa é aquela que defende
os humildes e os humilhados, os oprimidos e os espezinhados pelas injustiças.
Não há como ter uma ira santa e justa sem defender e colocar-se ao lado dos
pobres, dos negros, das mulheres e dos jovens - essas imensas maiorias que não
conseguem se dar um destino porque as condições materiais e espirituais
injustas o impedem.
Nesse momento de tormenta da vida política brasileira, o
Brasil e o povo precisam de um líder prudente, corajoso, comprometido com a
salvação do país. Para que a ira do povo se transforme na espada luminosa a
guiá-lo rumo a um futuro melhor, rumo à terra prometida, a ira precisa se
transformar em razão, em luz que ilumina as escolhas. A razão clama o voto em
Haddad, pois ele é este líder prudente e sensato em meio aos tormentos do
sofrimento e do medo.
O proselitismo do mal
O proselitismo do mal
Nada de digno, nada de edificante, nada de justo surgirá
sobre a montanha de mentiras, da falta de escrúpulos, da falta de moralidade
erguida pela campanha de Bolsonaro. Trata-se de uma campanha que está semeando
a semente do mal e da violência e disto não poderá frutificar nenhum bem. Todos
os limites do aceitável foram rompidos quando se trata de exigir parâmetros
mínimos de respeito aos critérios democráticos da disputa. O PT ficou 13 anos
no governo e em nenhum momento a democracia foi ameaçada, nenhuma violência foi
cometida contra cidadãos. Em contrapartida, bolsonaristas agridem e matam
pessoas que declaram voto em Haddad, cravam a ponta de faca a suástica nazista
em jovem que discordam deles e picham igrejas com a mesma suástica.
Amanhã agirão para impô-la sobre a bandeira do Brasil.
Não chega a ser estranho que a Justiça Eleitoral e outras
autoridades se calem covardemente ante os atentados que vêm sendo cometidos
contra as regras democráticas. Autoridades que rasgaram a Constituição não se
guiam pelo metro das leis. É vergonhoso que autodenominados democratas se calem
e fiquem neutros ante a ameaça que paira sobre o Brasil e seu povo. A
neutralidade é uma forma de adesão neste momento. A neutralidade é a face covarde
que escolhe essa fúria negativa e obscurantista que erguerá escombros do que
resta desta democracia doente. Repudiando essas condutas é preciso ter uma
resolução firme e escolher a prudência corajosa representada por Haddad. Não
basta escolher, é preciso anunciar a escolha e lutar por ela.
Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e
Política (FESPSP).
GGN