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quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

O tecido político está se rompendo, por Gustavo Conde

O tecido político está se rompendo. Daqui a pouco será cada um por si. Eles conseguiram sabotar a democracia brasileira na sua mais delicada essência pós ditadura: a organização social.
O rescaldo de ódio acumulado que perdura, embora menor que há dois anos, é suficiente para alimentar a fantasia da imprensa e os interesses do PSDB. Termos, portanto, que reunir forças para fazer uma travessia. Será mais uma travessia histórica duríssima que a elite brasileira nos deixa com herança.​
O julgamento de Lula mudou a realidade dos fatos. A força política da esquerda que ia se recompondo aceleradamente sofreu o seu mais duro golpe da história. Foi quase uma decapitação.
Aqui, vale um alerta e uma análise expressa. Muita gente pode estranhar a suposta e aparente "guinada" da minha posição. Na verdade, não há guinada. Quando a realidade muda, muda-se a leitura da realidade. Não tem como escapar disso, se a leitura tem como base dados empíricos e discursivos.
Em momentos assim - de inflexão da realidade sócio-política -, algumas pessoas mobilizam imediatamente seus "argumentos" tímicos: otimismo versus pessimismo. Ah, você é pessimista. Ah, você é otimista.
Se pudéssemos reunir os piores tipos de argumento de uma sociedade, certamente, eu votaria no argumento - que não é um argumento - 'pessimismo versus otimismo'. Talvez, isso seja tão óbvio que eu nem deva tocar no assunto, correndo o risco de parecer ingênuo - o que, a rigor, é outro não-argumento muito popular na praça.
Desfilar adjetivações desta cepa - ingênuo, otimista, pessimista - é um desserviço ao debate público que, se fosse dotado de desejo próprio, certamente gostaria muito de voltar a ter alguma importância estrutural num país como o nosso.
Digressão encerrada, concluo reiterando: o tecido político está se rompendo neste exato momento. Declarações confusas, falta de unidade, desespero, apatia, tensão, medo e derrotas judiciais sistemáticas (por mais infundamentadas que sejam).
Há o imponderável, claro. A questão aqui não é "acertar" uma previsão. Eu não sou vidente, sou linguista. Pode acontecer, portanto, qualquer coisa. Podemos ter uma liderança nova que surpreenda. Podemos ter o filme sobre Dilma Rousseff vencendo o Festival de Cinema de Berlim e se tornando uma denúncia mundial.
Podemos ter a imprensa estrangeira engrossando o coro contra o golpe brasileiro. Podemos ter os intelectuais e artistas americanos encampando em uníssono uma campanha global pela volta da democracia no Brasil (se houvesse um brasileiro minimamente razoável em comunicação internacional, este apoio já estaria em curso - é muito fácil construí-lo, basta algum grau de inteligência e iniciativa).
Enfim, para atender um pouco aqueles que raciocinam com base em otimismos e pessimismos, entoo um alento: tudo pode acontecer.
Mas o tecido político - insisto - foi rompido (está se rompendo). Esse é o dado empírico que pode re-orientar novas ações neste momento. O que seria esse rompimento? Trata-se, pura e simplesmente, da dispersão do discurso.
Todas as declarações de todos os líderes políticos da esquerda nesse momento estão desencontradas. Chega a assustar. Nem entrarei em detalhes, até porque é algo que me entristece.
A explicação, a rigor, é: sem Lula - o único ser político capaz de produzir enunciados dotados de sentido político e histórico - a capacidade de análise, julgamento e mobilização do campo progressista se estilhaça. O poder de Lula tem essa consequência dramática. É um poder tão imenso e onipresente, que sua proscrição do processo político provoca um vácuo assaz traumático.
Resta termos muita atenção. Mesmo a esquerda saindo vencedora destas eleições, o cenário ficará terrivelmente mais pobre sem Lula. Resta saber, também, como se dará essa "proscrição" de Lula. Ela pode nem acontecer, é verdade. Mas tudo indica que o lado 'sombrio' não vai desistir e nem poupar esforços para tal.
Tudo, realmente, pode ser muito rápido. A "iraquização" do Brasil está em curso e é também acelerada, com ministra de tribunal reunindo-se com representantes da Shell para falar mal de Lula. É algo fora do comum.
Devastação, genocídios, explosão de violência, doenças, liquidação de patrimônio público, cancelamento de contratos, tudo isso também se desenrola com extrema rapidez e amplitude avassaladora.
É o preciso e definitivo momento de reinvenção do Brasil. Ou o Brasil se reinventa ou ele deixa de existir tal como um dia foi conhecido. Uma apoteose. Uma quarta-feira de cinzas. Uma despedida em festa, como sói acontecer em nossos carnavais. 
Do GGN