Escrevi
aqui, ontem, que o bolsonarismo levaria o terror além das redes.
Infelizmente,
não estava errado.
A psicóloga
Silvia Bellintani narra os episódio acontecidos com dois de seus
pacientes.
Não há o que
eu possa dizer para sublinhar esta monstruosidade, a não ser que ela está à
beira de deixar de ser ameaça e se tornar fato.
Depende de
cada um de nós exorcizar os demônios que nos rondam.
Ou soltar de
vez as matilhas pelas ruas.
Não sejam cúmplices
Silvia Bellintani, no Facdebook
Eu poderia
dizer que estou sem palavras pra descrever o que testemunhei no meu
consultório. Mas tive o dever de encontrá-las pra não deixar que algo assim,
gravíssimo, ficasse sem registro.
Foram duas
situações, ambas na tarde de quarta-feira (3/10). Dois pacientes meus: um
menino e uma menina. Ele, gay, 19 anos. Ela, hetero, feminista, 17.
Começo por
ele, que entra sem dizer uma palavra e logo começa a chorar. Pergunto o que
aconteceu e ele me diz, assustado, que foi abordado por um cara da faculdade
com as seguintes palavras:
— E aí, seu
viadinho de merda, já viu as pesquisas? Vai aproveitando até o dia 28 pra andar
de mãozinha dada, porque quando o mito assumir, acabou essa putaria e você vai
levar porrada até virar homem.
…
E depois a
menina, que já entra chorando e me diz:
— Sil, me
ajuda… não sei o que fazer… você não vai acreditar no que aconteceu comigo
hoje… Eu tava na escola e fui pegar um livro no meu armário… Tinha uma folha de
papel (e aí ela me mostra uma foto no celular, porque entregou a tal folha na
diretoria) com esta mensagem aqui: “achou mesmo que era só sair gritando
#elenão pra parar o bolsomito, feminazi??? perdeu, escrota!! e daqui a pouco
você vai ter motivo pra gritar de verdade!!!”.
…
Perceber o
pavor desses dois adolescentes me virou do avesso e despertou uma indignação
difícil de descrever; escutei os relatos com a visão nublada pela fúria que
senti, seguida por um desejo quase incontrolável de proteger os dois.
O cenário
das eleições sequer foi definido, mas já encoraja o sadismo e promete ser palco
do terror.
Fico
imaginando o que vem pela frente.
A homofobia
e a misoginia presentes nas ameaças sofridas por esses dois adolescentes são
apenas duas amostras dentre tantas outras atrocidades que Bolsonaro, esse
criminoso nazifascista, incentiva e legitima.
E, se você
vota nele, é corresponsável: não apenas por essas, mas por todas as outras
ameaças que ainda estão por vir.
Não há
justificativa para um voto no Bolsonaro.
A menos que
você seja fascista como ele — e aí OK, seu voto é compreensível, uma vez que
você já é digno de abandono como projeto humano.
Agora, se
esse não é o caso e você for apenas liberal ou conservador, tome vergonha nessa
sua cara e escolha outro candidato. Ainda dá tempo de preservar alguma
dignidade. Há várias opções interessantes que prometem a defesa do seu
patrimônio sem contrapartidas humanas.
…
Um garoto de
19 e uma garota de 17.
Assustados,
angustiados, ameaçados em sua integridade física e emocional.
E você,
louvável cidadão de bem, subitamente politizado e que quer ver o Brasil “mudar
de verdade”, será cúmplice do fascismo e de suas históricas atrocidades físicas
e emocionais.
Hoje foram
meus pacientes.
Amanhã
poderão ser seus filhos.
Ou os filhos
de parentes, os filhos de amigos ou amigos de seus filhos.
E tudo
lindamente avalizado por vocês, honrados cidadãos de bem, heroicos defensores
da pátria.
(*) Silvia Bellintani é psicanalista,
psicóloga clínica e jornalista
Tijolaço