segunda-feira, 10 de novembro de 2025

A VULNERABILIDADE DA REPRESENTAÇÃO PARLAMENTAR

Ilustração: protesto

Todo mandato – contratual ou eletivo -, pressupõe uma representação. Na esfera privada, o mandatário pratica atos em nome daquele que lhe outorga uma procuração, sem a qual não se conhecem os limites de poderes conferidos. É dentro desses limites que as relações jurídicas se estabelecem em torno de um determinado objeto. Uma compra e venda, uma permuta de bens, uma locação de casa, por exemplo, criam uma relação jurídica contratual, na qual uma das partes pode ser representada por mandatário que, munido de uma procuração, figura como procurador. É natural que essa relação jurídica pode ser desfeita, através da revogação manifestada pelo outorgante do mandato, sobretudo quando o mandatário ultrapassa os limites dos poderes. Isso é comum na vida privada.

Assim também deveria ser nos mandatos eletivos – para o exercício de qualquer cargo disputado em eleições supervisionados pela Justiça Eleitoral, nas quais os eleitores são os mandantes e os eleitos, passam a ser os mandatários. Cada voto depositado em urnas, de forma direta e secreta, corresponde a uma simbólica procuração, mas os poderes conferidos são definidos no ordenamento jurídico, a partir da Constituição Federal.  Diz-se, então, que esse ordenamento jurídico constitui o estado democrático do direito, que, substancialmente, se traduz na Democracia. De qualquer forma, opera-se uma manifestação de vontade expressa no ato de votar. A relação entre o eleitor e o eleito emerge da votação.  Em certa medida, sobreleva um compromisso, não apenas com a diplomação e posse do eleito, mas também na atuação do eleito.

Não se pode perder de vista que a compreensão de que as diferenças entre os dois tipos de mandatos - contratual e eletivo -, se caracterizam pela representação, que constitui a sua essência. Contudo, se, no mandato contratual, a representação pode ser revogada, quando o mandatário se excede no exercício dos poderes conferidos, nos mandatos eletivos isso não acontece, porque o sistema jurídico adota outros mecanismos, cuja burocracia desestimula iniciativas dos prejudicados. Se os meios dificultam os fins, não é por isso que se escuse o combate aos desvios hostis de mandatários que excedem os poderes de representação.

Essa introdução – teórica, em certa medida -, explica-se e justifica-se, na medida em que também se evidencia uma relação jurídica entre o eleitor e o eleito, chancelada pela Justiça Eleitoral e, por isso, não se desfaz facilmente; ao contrário, subsiste no exercício do cargo ocupado. Ao eleito e empossado cabe honrar a confiança, enquanto os eleitores não podem abrir mão do seu papel de vigilância permanente, sobretudo contra os desvios hostis protagonizados pelos seus representantes. Contudo, o universo crítico não deve se limitar ao campo do ativismo político-partidário, mas também deve compreender todos os segmentos sociais conscientizados, na busca do fortalecimento da Democracia, porque somente esta garante a liberdade para contrapontos e vozes dissonantes.

Na atual quadra da história brasileira, estamos presenciando distorções marcantes na atuação de parlamentares, que reclamam o brado retumbante de todos quantos se indignam com atuações vergonhosas no exercício de mandatos eletivos, em dimensão alarmante, ao ponto de comprometer a credibilidade das instituições democráticas. 

Ainda bem que a imprensa livre e a velocidade com que os meios de comunicação noticiam os fatos, minuto a minuto, têm revelado escandalosas práticas políticas, em todos os níveis da federação, até mesmo em Câmaras de Vereadores dos mais longínquos municípios do interior do País, nas quais se constroem maiorias episódicas, quase sempre distanciadas do interesse coletivo. Não sem credibilidade, a mídia aponta situações bizarras em que a infidelidade partidária é acompanhada da renúncia da coerência em posturas pretéritas. Isso também configura distorção do sistema político e revela vulnerabilidade da representação parlamentar, na medida em que os protagonistas não conseguem resistir aos assédios tentadores, ainda que se destruam biografias sedimentadas.

É nesse cenário de horrores corriqueiros, que se estabelecem as distorções repugnantes, sobretudo nos parlamentos brasileiros, nos quais o interesse de categorias econômicas – de há muito beneficiadas com isenções tributárias -, se sobrepõem ao implemento de políticas públicas em favor das classes menos favorecidas.

O que aconteceu no dia 8 de outubro de 2025, na Câmara dos Deputados, é o exemplo mais recente. Ouviram-se “gritos histéricos” de deputados, como se tivessem   ganhado um jogo de cartas sebosas de um baralho velho. Na verdade, a votação expôs a vulnerabilidade de representantes de interesses econômicos distanciados dos anseios populares. Prevaleceram os acenos de “campanhas financiadas” de 2026, nas quais, uma vez mais, os eleitores serão mandantes, sem poderes revocatórios, a não ser que a conscientização política lhe chegue a tempo. Este artigo não esconde esse propósito.

Por Prof. Benedito Ferreira Marques.

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