Doutor
em Ciência Política e professor de Direito da Universidade Federal Fluminense,
Rogério Dultra disse em entrevista ao GGN, na tarde desta quarta (17), que
"qualquer pessoa com bom senso olha a sentença [do caso triplex] e não
acredita que algum desembargador sério, correto, vá chancelar uma condenação
tão fraca, mal feita e desprovida de qualidade jurídica."
"Alguém
sério aprovar um negócio desse, aliás, é a prova de que não é sério",
disparou.
Apesar
de ter tido acesso à íntegra da sentença e analisar que o correto seria o
Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) anular a condenação imposta a
Lula por Sergio Moro, Dultra avaliou que "o mais provável é que a decisão
seja chancelada porque a Justiça, neste caso, está funcionando de maneira
política."
"Não
tenho dúvidas de que é um processo político, eivado de ilegalidades e deve ser
anulado. Mas acho que isso não vai ocorrer, porque essa faixa do Judiciário não
está operando sobre critérios jurídicos, mas políticos."
O GGN publicou
hoje uma reportagem resumindo em 4 tópicos os principais problemas na sentença
de Sergio Moro que deveriam ser enfrentados pelo TRF-4, no próximo dia 24, e
que vão além da discussão sobre Lula não ser, no papel, o proprietário do
triplex.
Dultra
opinou que o primeiro dos tópicos abordados - o fato de que Lula foi denunciado
por um suposto crime A, narrado pelo Ministério Público, e acabou condenado por
um suposto crime B, definido por Moro - é uma afronta ao Código de Processo
Penal.
JUIZ ACUSADOR
"Não
cabe ao juiz iniciar um processo de ofício e ele também não pode inventar o
crime ou ser o sujeito ativo a determinar a acusação, porque o nosso processo
penal separa a figura do juiz e do acusador. Quando ele [Moro] amplia o escopo
da denúncia do Ministério Público para falar dos R$ 16 milhões, ele deixa de
atuar como um juiz e passa a atuar como um acusador."
Os
procuradores da Lava Jato denunciaram Lula por ter recebido vantagem indevida a
partir de 3 contratos entra a OAS e a Petrobras, que teriam gerado R$ 87
milhões me propina. Parte dos recursos teriam bancado o armazenamento do acervo
presidencial do petista e a reforma no apartamento que a empreiteira construiu
no Guajurá.
Porém,
na sentença, Moro alterou a denúncia e condenou Lula com base em uma delação
premiada de um executivo da OAS que afirmou que a empresa tinha um "caixa
virtual" com o PT, com R$ 16 milhões. Segundo a tese do juiz, a OAS
custeou a reforma para Lula e abateu a despesa desse suposto fundo para o PT. O
resto do dinheiro, disse Moro, a Lava Jato não achou porque possivelmente
abasteceu campanhas do partido.
"Isso
[de dizer que a falta de prova é a prova do crime] não existe. Ele tem que
provar que há culpa. Isto foi feito ao arrepio do Código Penal", disse
Dultra, para quem o papel do Ministério Público era justamente o de encontrar
alguma evidência, qualquer rastro de que esse caixa existiu e financiou o PT e
Lula.
POSSE
Quanto
ao fato de que o triplex está em nome da OAS e, inclusive, foi penhorado para
pagar dívida da empreiteira junto a fornecedores, Dultra afirmou que "o
direito civil brasileiro é muito tradicional, não tem nenhuma inovação. Para
que um imóvel seja dado como propriedade de um sujeito, ele tem que ter o
documento em seu nome, registrado em cartório, e provar uso, dormir lá. Não foi
o caso."
"Há
a evidente incapacidade técnica do Ministério Público e do Juízo em produzir
provas consistentes."
Dultra
ainda apontou que a força-tarefa não fez uma investigação correta e ainda pecou
pelo uso exclusivo de delações problemáticas, feitas por réus e outros
investigadores que estavam submetidos ao controle do Ministério Público.
Caso
de Léo Pinheiro (que estava desesperado por um acordo de delação), Delcidio do
Amaral (que não entregou provas de nada do que disso, segundo o próprio
Ministério Público Federal, em Brasília) e Pedro Corrêa (que, àquela altura,
não teve o acordo homologado pela Justiça).
A JUSTIÇA POLÍTICA
Para
Dultra, a Lava Jato não é nenhum "ponto fora da curva" quando o
assunto é produto de um Judiciário politizado. Ele apontou que, no Brasil, a
tradição é o Ministério Público levar à cadeia, sem provas, os réus sem
condições de pagar uma boa defesa. É daí que nasce o problema nacional de
superlotação em presídios.
Quanto
à turma de Curitiba, especificamente, ele lembrou que na trajetória acadêmica
do Sergio Moro fica claro que ele tem uma interpretação muito subjetiva do que
é Justiça. "(...)
ele
sempre afirmou que a interpretação do juiz prevalece sobre o que está escrito
nas leis."
"A
concepção dele de democracia também é complicada. Democracia para ele não é
todo poder de decisão ao povo, é o que a opinião pública, expressa nos meios de
massa, que são manipuladores, determina."
A
faceta política do próprio TRF-4 também é motivo de lamentação, disse.
Para
o professor, a nota em que o TRF-4 antecipa que Lula, se condenado, não
será preso imediatamente, e a declaração do presidente Thompson Flores que
acabou acelerando o processo, são pequenos "avisos" aos demais
tribunais sobre a preocupação com o calendário eleitoral.
"É
triste um juiz [Thompson Flores] que não cumpre o princípio básico da
magistratura, que é falar exclusivamente nos autos. É lamentável de
assistir."
GGN