A entrevista de Fernando Haddad à bancada da Globonews é
reveladora de um dos vícios mais entranhados no jornalismo brasileiro: a
incapacidade dos entrevistadores de analisar realidades complexas.
Eles fazem um tipo de pergunta padrão e esperam uma resposta
padrão para a qual já tem engatilhada uma tréplica padrão. Quando o
entrevistado sofistica um pouco a análise e inclui outros elementos na resposta,
provoca um curto-circuito nas cabeças dos entrevistadores. E eles não sossegam
enquanto não receber a resposta padrão, para poderem rebater com a tréplica
padrão.
Foram inúmeros os
casos.
O mais insistente foi a história da autocrítica dos erros
econômicos de Dilma Rousseff. Haddad admitiu os erros, enumerou-os e procurou
situá-los no tempo. Analisou o período PT como um todo, para depois chegar aos
erros. Ou seja, admitiu os erros. Mas alegou que só os erros, por si, não
explicariam a queda do PIB, que houve um componente político relevante, no
boicote conduzido por Aécio Neves e Eduardo Cunha. Ora, seria o gancho para uma
belíssima discussão, muito mais rica, muito mais complexa. Mas os entrevistados
não aceitavam.
- Quer dizer que o PT não admite os erros? A culpa sempre é
dos outros? Como vamos acreditar que agora será diferente?
E não adiantava Haddad explicar os acertos dos dois governos
Lula e dos dois primeiros anos do governo Dilma, e os erros posteriores de
Dilma, para demonstrar que o erro não é componente intrínseco da política
econômica do partido.
A mesma coisa quando confrontado com as propostas da campanha
de Lula – coordenadas por ele -, com os entrevistadores pretendendo
enquadrá-las na tal matriz econômica do último período Dilma. Ou quando
tentaram levantar o fantasma do tal mercado contra as ideias de Haddad, que
rebateu com uma reportagem da Reuters, publicada no The New York Times, com
CEOs de grandes empresas elogiando suas propostas.
Haddad levantou, em sua defesa, o tratamento das contas da
prefeitura de São Paulo, que, no seu mandato, obteve o grau de investimento.
- Estamos discutindo política econômica, rebateu o
entrevistador de uma resposta só.
Haddad teve que explicar que grau de investimento e contas
fiscais são política econômica. E elas falam mais por ele do que qualquer carta
aos brasileiros.
Todos os bordões foram levantados, inclusive a criminalização
da política de campeões nacionais, ou os aportes de recursos ao BNDES. Em vez
da discussão conceitual sobre a oportunidade ou não de se ter campeões
nacionais, em vez de levar em conta a resposta de Haddad, de que os
investimentos em campeões nacionais ajudaram a gerar empregos e melhorar o
perfil das exportações brasileiras, limitavam-se ao branco-e-preto que
difundiram nos últimos anos: toda política industrial é criminosa, e tudo o que
o BNDES faz é criminoso.
Em nenhum momento questionaram as afirmações de Haddad de que
a matriz econômica, defendida pela Globonews e implementada pela equipe de
Temer, não entregou o prometido. Quando chegava nesse ponto, mudava-se o tema.
Nem rebaterem sua afirmação de que os principais delatores da
Lava Jato estão soltos e gozando a vida em liberdade. Limitavam-se aos grandes
agregados – Lula foi condenado por um juiz de 1a instância, um colegiado em 2ª
instância e prisão mantida por um colegiado do STF, que não analisou o mérito
das acusações.
Fosse menos diplomático, Haddad poderia lembrar que todos
eles foram estimulados pelo clamor das ruas, do qual o principal combustível é
a cobertura enviesada da Globo.
GGN