Veja dá
cavalo de pau e agora acusa lava jato de estado policial
Num
editorial tardio, publicado neste fim de semana, a revista Veja, que foi um dos
principais pilares de sustentação da Operação Lava Jato, e também apoiadora de
primeira hora do golpe parlamentar de 2016, que produziu a tragédia atual, dá
uma guinada radical.
Segundo a
publicação, foram ilegais as divulgações dos grampos da presidente deposta
Dilma Rousseff com o ex-presidente Lula, repassados pelo juiz Sergio Moro ao
Jornal Nacional, da Globo.
Veja também
condenou a publicidade dada a conversas entre a ex-primeira-dama Marisa Letícia
e seus filhos – que a própria revista divulgou, diga-se de passagem (confira
aqui).
Segundo a
Abril, o Brasil mergulhou num Estado Policial, com os abusos que estariam sendo
cometidos.
Detalhe: a
divulgação dos grampos entre Lula e Dilma, pelo juiz Moro, entra na pauta do
Conselho Nacional de Justiça nesta terça-feira 30 (leia mais aqui).
Leia,
abaixo, o editorial de Veja:
Estado Policial
Diz a lei
que uma interceptação telefônica só pode ser feita com autorização judicial, no
tempo em que perdurar a autorização judicial, e seu conteúdo só poderá ser
preservado se for relevante para a investigação em curso. Tais limites são
estabelecidos para que as conversas telefônicas, de qualquer pessoa, inclusive
de suspeitos, não fiquem boiando no éter das tramoias de um Estado bandoleiro.
No curso da mais ampla investigação sobre corrupção na história do país, a lei
tem sido lamentavelmente desrespeitada.
Na noite de
23 de fevereiro do ano passado, a ex-primeira-dama Marisa Letícia falava por
telefone com seu filho Fábio Luís, o Lulinha. Na conversa, Marisa, que morreu
há quatro meses, ironizava, com o uso de um palavrão, as pessoas que haviam
participado de um panelaço contra o PT que acabara de acontecer. Na gravação,
ela não dizia nada que interessasse à investigação da Polícia Federal. No
entanto, a conversa, que deveria ter sido destruída nos termos da lei, foi
preservada e divulgada.
Em 16 de
março de 2016, o país inteiro ouviu um diálogo telefônico entre a então
presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Eram
13h32 de uma quarta-feira, e os dois discutiam sobre o envio de um documento
para a posse de Lula como ministro da Casa Civil. O conteúdo da conversa era do
interesse da investigação, mas a autorização judicial para monitorar o
telefonema acabara às 11h12, duas horas antes. Portanto, depois desse horário a
gravação era ilegal. Pois ela foi feita mesmo assim, seu conteúdo foi divulgado
e a crise política daqueles dias se aprofundou dramaticamente.
Na semana
passada, ocorreu novo episódio de violação da lei das interceptações
telefônicas, quando veio a público o diálogo do jornalista Reinaldo Azevedo,
ex-blogueiro de VEJA e colunista do jornal Folha de S.Paulo, com Andrea Neves,
irmã do senador Aécio Neves. A gravação estava autorizada judicialmente e se
realizou dentro do prazo de validade, mas o conteúdo da conversa entre os dois
nada tinha a ver com as investigações. O material deveria ter sido incinerado.
Também não foi. Configurou-se outra afronta à lei, com uma agravante: a
Constituição prevê a inviolabilidade da comunicação de um jornalista com sua
fonte. Esse é um dos pilares do jornalismo nos países democráticos, dado que,
sem tal garantia, não existe liberdade de imprensa.
É lamentável
que autoridades encarregadas de fazer cumprir a lei — policiais, procuradores,
juízes — acabem se tornando violadoras da lei. A Lava-Jato é um poderoso
desinfetante em um país de corrupção sórdida. Mas esse tipo de agressão — à
lei, à privacidade, à liberdade de imprensa — não é digno de um Estado
democrático de direito. É coisa própria de Estados policiais.
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