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sábado, 15 de setembro de 2018

PROTAGONISMO FEMININO E DERROTA DO FASCISMO, POR ION DE ANDRADE

As pesquisas eleitorais publicadas pelo Vox Populi, e em seguida pelo XP/Ipespe e Datafolha trouxeram resultados diferentes sobretudo em relação ao primeiro do Instituto Vox Populi.
Não vamos aqui fazer nenhuma análise de validade ou de viés proposital das pesquisas e vamos admitir a priori que as três pesquisas exprimem realmente os números que encontraram e que as diferenças entre elas sejam metodológicas decorrentes da seleção dos municípios, período da pesquisa, do nível de confiança de 95% (que não é e não pode ser 100%) e do erro 2 para mais 2 para menos.
A análise do conjunto desses dados revela que o único candidato que teve uma oscilação positiva e fora da margem de erro no período analisado foi Haddad. Se tomarmos períodos mais longos também Ciro (de 9 para 13 segundo o Datafolha) e Bolsonaro (de 22 para 26 segundo o Datafolha) tiveram crescimento fora da margem de erro, porém o candidato da extrema direita variou em torno de um eixo situado em 24 pontos, e o do PDT em torno de 11 pontos, o que torna o crescimento de ambos discutível, sobretudo porque a conjuntura já não é a mesma de uma semana atrás.
Porém a situação de Ciro não é a mesma de Bolsonaro. Houve dois fatos maiores, que não envolvem a candidatura Ciro Gomes ainda operando nessa conjuntura, que são susceptíveis de beneficiar candidaturas e que não podem deixar de ser considerados: o ataque a faca a Bolsonaro e o apoio de Lula a Haddad.
Entretanto, somente o apoio de Lula a Haddad produziu crescimento eleitoral fora da margem de erro, tanto segundo o Datafolha, de 9 a 13%, quanto segundo o Vox Populi de 12 a 22% em favor de Haddad. O Datafolha não exprimiu o dado dessa forma, "com apoio de Lula", como o fez o Vox Populi e o XP mas a pesquisa foi realizada no período em que o apoio de Lula já estava expresso, permitindo que o o fortalecimento da candidatura Haddad fosse captado.
Porém o mesmo não ocorreu com a candidatura Bolsonaro. O episódio do ataque, contrariamente a todas as previsões, não produziu aumento significativo do eleitorado do candidato.
Porém essa má notícia eleitoral para o candidato do PSL se acompanha de outras que não poderão deixar de se manifestar num futuro breve.
Imagem e Proposta
Como já afirmamos em artigo anterior, o êxito do ataque e a agora patente vulnerabilidade do candidato, sobre quem se erguia um mito de força e invulnerabilidade imprescindíveis ao seu discurso, arruínam de uma vez: (1) a sua imagem eleitoral que se mostra falsa e (2) a alma da sua campanha, a violência para a solução de conflitos que, força cega e indomável que é, o vitimou pessoalmente.
Atentemos para o fato de que, exceto pela hipnose fascista, a maioria do nosso povo rejeita a violência como forma de resolver problemas. Aliás, culturalmente cristãos, muitos a entendem como pecado. O ataque a faca carrega para esses milhões de brasileiros, o reconheçam ou não, um incontornável significado simbólico de castigo.
Com a imagem eleitoral e a proposta profundamente feridas, o discurso da candidatura, como um avião que perde as asas, não é mais sustentável. Acrescenta-se a isso o afastamento do candidato da campanha. 
Dissenções internas
O episódio do ataque a faca pressionou a coligação bolsonarista a uma crise interna. O candidato a vice, de patente militar superior à do candidato a presidente, (general x capitão), se insurgiu na coligação, recorrendo, sem consulta ou autorização dos seus aliados, ao TSE para ter direito de representar Bolsonaro nos debates televisivos. O episódio que exprime para a opinião pública uma crise de confiança interna de implicações imprevisíveis, vamos imaginar o que poderia ocorrer nos contextos de pressão inerentes ao exercício do Poder Executivo, terá, obviamente, implicações eleitorais.
O fator feminino
Como se não bastassem os péssimos resultados da extrema direita entre as mulheres, elas resolveram se organizar. Hoje os grupos de mulheres contra Bolsonaro nas redes sociais já reagrupam mais de 2 milhões. Ora, com cerca de 70 milhões de eleitoras no Brasil, essa cifra vem a significar hoje, a enormidade de uma eleitora a cada 35 mulheres.
Esse movimento suprapartidário, não nos enganemos, é o maior fenômeno político da contemporaneidade no Brasil, depois da criação do PT nos anos 80. Ele revela não apenas um apego inegociável das mulheres à democracia, pois são antifascistas, como demonstra também a necessidade, essa de longo prazo, de um protagonismo feminino de peso nos assuntos que interessam às mulheres e estão para além dos limites ideológicos e partidários.
Ora, ter uma mulher pintada para guerra a cada 35 num movimento que não para de crescer é um pesadelo para forças que já não podem agora declarar-se não machistas.
Esclarecer a opinião pública
Para que a mensagem contida na conjuntura possa surtir os efeitos eleitorais desejados, é imprescindível que as forças democráticas possam decodificá-las para o amplo entendimento dos eleitores.
Portanto:
É preciso manter firme a crítica à violência como forma de resolução de conflitos, em linha com os valores e tradições do nosso povo,
É preciso demonstrar que a confiança interna a uma coligação é elemento crucial para a governança e, mais importante que tudo;
É preciso assumir ostensivamente uma agenda de igualdade de gêneros que possa fazer justiça às mulheres.
Conclusões
Há quatro componentes mesclados nessas eleições de 2018.
O primeiro deles, mais óbvio, é eleitoral no sentido estrito. Temos que escolher um presidente e parlamentares para a governança da máquina pública. A vitória para a democracia nesse item é eleger um candidato democrata comprometido com as aspirações das maiorias.
O segundo elemento emerge do fato de que devemos nos esforçar para que essas eleições exprimam de forma plebiscitária uma rejeição ao golpismo. Portanto, um segundo turno que pudesse ter candidatos que não apoiaram o golpe (Haddad x Ciro) seria a fórmula mais clara de exprimir essa rejeição.
O terceiro elemento é o componente antifascista dessas eleições. A vitória nesse caso é vencer a extrema direita pela via democrática, preferentemente excluindo-a desde já do segundo turno das eleições.
O quarto é a emergência de um incontornável protagonismo feminino que ganhou autonomia política, tem pauta antifascista e em breve terá, para além dos partidos, protagonismo para o atendimento à grande pauta não atendida de interesse das mulheres.
Os dois primeiros elementos são políticos o terceiro e quarto elementos são civilizatórios.
É óbvio, portanto que as candidaturas Haddad e Ciro são complementares se quisermos ter êxito nesses quatro componentes, eleger um democrata, rejeitar o golpe, rejeitar o fascismo e assumir os compromissos necessários com a agenda das mulheres.
Esse quarto elemento, novo na política e que veio para ficar, precisa ser analisado com todo o cuidado pelos democratas.
Segundo o Datafolha, enquanto Haddad e Ciro têm ambos 13% dos votos entre homens e mulheres, igualmente, Bolsonaro tem 35% dos votos dos homens, (cerca de 17 a 18% do eleitorado total), mas apenas 18% dos votos femininos, ou cerca de 9% do eleitorado total.
A organização ativa das mulheres (uma eleitora a cada 35 no front) tende pelo menos a manter esses números onde estão, se é que não o reduzirão.
Isso significa que para ter 50% mais um dos votos, a extrema direita precisaria ter 84% dos votos masculinos. Percebam que com apenas 18% das mulheres, que representam 9% do eleitorado total, Bolsonaro precisaria ter 42% do eleitorado formado por homens, dos cerca de 50% que eles representam (84% dos homens + 18% das mulheres equivale a 42% do eleitorado + 9% do eleitorado = 51%). As mulheres ergueram na frente da "marcha triunfante" extrema direita uma muralha muito difícil de ser transposta.
Reconheçamos todos que se conseguirmos manter o Brasil dentro do mundo civilizado teremos uma dívida nacional impagável para com as mulheres.
Blog do Ion de Andrade

sábado, 20 de maio de 2017

As pedras no Xadrez dos zumbis da política e as diretas

Peça 0 – a lógica do caos

O ponto de partida é entender a lógica do caos. Não há um comando estabelecido, nem um script pré-definido. Existem atores mais ou menos relevantes, respondendo a impulsos, sem que ninguém tenha controle sobre a resultante final.

Os protagonistas principais vão se adaptando as circunstâncias, de maneira a preservar seus interesses, saltando de uma onda para outra, pulando obstáculos de maneira a não perder a liderança.

Desse modo, fatos novos que mudam a atitude de um dos personagens, imediatamente obrigam a um rearranjo dos demais atores.

Peça 1 – o papel de Rodrigo Janot

O novo movimento foi deflagrado pela Procuradoria Geral da República (PGR) Rodrigo Janot, com a delação da JBS.

Há um conjunto de fatores mal explicados. Há tempos a JBS está sob investigação. Marcelo Miller, do grupo da Lava Jato ligado a Rodrigo Janot, anuncia sua saída do Ministério Público Federal (MPF) no dia 6 de março passado (https://goo.gl/uDZZ4h). Era homem da estrita confiança de Janot, trabalhando em sua assessoria pessoal para a área criminal.

O grampo de Joesley Batista em Michel Temer foi no dia 7 de março (https://goo.gl/uDZZ4h). O que significa que a preparação da operação controlada – e a decisão de Miler de deixar o MPF e assessorar a JBS – ocorreu no mesmo período.

Deixemos de lado, por enquanto, a participação de pessoas ligadas à Lava Jato, ou próximas dos principais protagonistas, no milionário mercado dos honorários para assessorar delações. E mesmo a suspeita de que o procurador Ângelo Goulart Villela, preso na operação, tenha sido uma espécie de boi de piranha. Não há nenhuma prova maior a respeito. Fica apenas o registro da suspeita.

O ponto central é que a operação resolvia dois problemas simultaneamente. Do lado da JBS, a possibilidade de limpar a área no Brasil e acertar o acordo de leniência com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, conseguindo se transformar em empresa norte-americana.

Do lado de Janot, a possibilidade de, pela primeira vez, assumir o protagonismo na Lava Jato, em um momento em que, no final de mandato, estava enfraquecido perante a categoria e o Ministério Público Federal (MPF) arriscado a perder a prerrogativa de eleger o PGR.

Peça 2 – o papel da Globo

Dois pontos chamam a atenção no desempenho da Globo.

O primeiro, o sigilo absoluto sobre a operação – e mesmo sobre a própria posição da Globo – provocando uma desorganização ampla no disciplinadíssimo esquadrão de comentaristas da emissora.

Os desempenhos da Mirian Leitão e de Ricardo Noblat foram bastante elucidativos. O primeiro movimento de Mirian foi uma defesa do governo, dando voz ao insuspeito Eliseu  Padilha. Quando O Globo deu a freada de arrumação – o editorial pedindo o impeachment -, imediatamente Mirian soltou uma nota em seu blog dizendo que, à luz dos últimos acontecimentos, o governo Temer estava no chão. Mais ágil que eles foi Luciano Hulk, retirando do Twitter as fotos de amizade eterna com Aécio.

O segundo ponto foi o rapidíssimo alinhamento da Globo com a tese do impeachment. Nenhuma surpresa. Até então, era a principal madrinha da posse de Temer. A divulgação dos malfeitos de Temer e quadrilha tem o condão de ressuscitar a tese das diretas. A estratégia adotada, então, foi cavalgar a onda do impeachment, sair na frente pedindo o impeachment, vender o peixe da isenção jornalística – assim como a Lava Jato do PGR (não confundir com a Lava Jato de Curitiba) – e vender a boia da salvação de um novo governo garantindo as tais reformas. Que, com Temer, mostravam poucos sinais de serem aprovadas.

Peça 3 – o desmanche da frente do golpe

Aí entram em cena dois integrantes fortes do cartel da mídia, a Folha e o Estadão.

Ambos enfrentam crises financeiras agudas e dependem fundamentalmente do pacote de bondades montado por Eliseu Padilha e quadrilha. São doses maciças de publicidade e patrocínios para eventos, da Petrobras e de outras estatais, escondendo o nome dos patrocinadores.

Não vai dar certo. Ambos não têm controle sobre Tribunal de Contas e outros órgãos para passarem isentos por essa extravagância – de patrocínios em off.

Por outro lado, não teriam fôlego para recompor o pacote de publicidade governamental caso a crise da sucessão seja prolongada. E não poderiam correr o risco de uma sucessão que optasse por não reafirmar as juras de amor desinteressado com a quadrilha de Temer.

Peça 4 – os próximos lances

Aqui, se entra no imponderável. A Globo é o único dos veículos que ensaia lances estratégicos. Mas, como bom estrategista brasileiro, só consegue imaginar um lance na frente.

Ao mesmo tempo, o PSDB parece ter se dado conta dos riscos de uma nova aventura do impeachment. Seu único elo com o poder é Temer. Com a destruição das principais lideranças do partido, sem o anteparo dos cargos no governo Temer, haveria uma revoada imediata sabe-se lá para onde.

A aposta em Henrique Meirelles é furada. Desde 2.010 repousa nas gavetas indevassáveis da PGR um inquérito contra Meirelles por crime tributário (https://goo.gl/z5BVWz). Ele faz parte da geração de filhos de Anápolis, que inclui, entre outros, a família Batista e Carlinhos Cachoeira.

Aliás, outra dica de pauta: as imbricações entre o bicho e a expansão inicial da JBS. O comendador Arcanjo – outro dos campeões do bicho de Goiás – foi um dos financiadores dos maiores sojicultores do estado, através de lavagem de dinheiro. Nas conversas de Joesley com Temer, ambos acertam formas de pressionar Meirelles embora, até agora, não haja nenhum indício maior de que as pressões tenham sido bem-sucedidas.

Um outro agente inseguro é o próprio mercado. No tambor do revólver da Lava Jato há a delação de Antônio Palocci que pode pegar grandes bancos, elucidar episódios pouco esclarecidos do CARF e alguns episódios pesados, de como o Pactual comprou o silêncio da imprensa.

Outro, a economia como um todo, exposta mais vez a esses jogos de poder. O estrago que vier pela frente será debitado, agora, ao exercício indiscriminado de poder pela Globo.

Por outro lado, os grampos de Joesley apenas registraram o que está ocorrendo à luz do dia no governo e no Congresso, um assalto despudorado, desesperado, do qual o melhor exemplo é Aécio Neves arrostando perigos para arrancar os derradeiros R$ 2 milhões da JBS.

Como resistir à enxurrada de lama das demais delações? Independentemente da motivação das denúncias, não dá mais para varrer debaixo do tapete o que apareceu.

A sobrevida de Temer dependerá exclusivamente da maior ou menor rapidez dos diversos personagens em reconstruir alianças e definir interesses. E, principalmente, em convergir para um nome, caso emplaquem eleições indiretas.

A recomposição política brasileira passará, em algum ponto do futuro, por um amplo pacto em torno das eleições diretas, a única maneira de reconstruir a coesão social.

Não há saída possível fora de uma reconstrução do centro. Mas, seguramente, a crise ainda não produziu o grau de amadurecimento necessário.

Haverá ainda um bom período de caos, antes de se produzir a nova ordem.

Do GGN