O
procurador da República Ivan Cláudio Marx, tendo em mãos uma das denúncias mais
esdrúxulas apresentadas contra Lula no âmbito da Lava Jato, tinha duas opções:
pedir a absolvição do ex-presidente por carência de provas na delação de
Delcídio do Amaral ou reciclar a fórmula dos curitibanos e requerer a
condenação em cima de teses
mais esdrúxulas ainda.
Ivan
Marx - um dos primeiros procuradores a atuar na justiça de transição, membro da
Comissão Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos - escolheu corresponder ao que
se espera de um membro do Ministério Público Federal: investigar e apresentar a
verdade dos fatos.
Ao
sugerir ao juiz da 10ª Vara Federal, Vallisney Oliveira, que Lula seja
absolvido do crime de obstrução de Justiça, Ivan Marx deu algumas lições aos
colegas liderados por Deltan Dallagnol.
A
mais simbólica delas é resumida na seguinte frase: "(...) a
crença forte prova apenas a sua força, não a verdade daquilo em que se
crê."
1- O ônus da prova é de quem acusa
Nas
alegações finais do MPF, endereçadas ao juiz da 10ª Vara Federal de Brasília,
Ivan Cláudio Marx afirmou que buscou de várias formas comprovar a delação de
Delcídio contra Lula durante o julgamento, mas falhou.
Contudo,
ao invés de argumentar que as provas não foram encontradas porque organizações
criminosas são especialistas em não deixar rastros dos ilícitos praticados,
Ivan Marx apenas admitiu que o ônus da prova é de quem acusa.
"(...)
a culpa pela impossibilidade de provar as afirmações da testemunha – que fazem
prova crucial para a defesa de Lula - recai sobre o órgão acusador, que é uno e
indivisível para tais fins", escreveu.
2 - Delação sem prova não condena
(exceto numa "cruzada acusatória")
Ao
contrário da turma de Curitiba, Ivan Marx não supervaloriza delações sem
provas. Ao contrário, reproduziu o que diz a lei que regulamenta o instituto
mais explorado na Lava Jato: "nenhuma sentença condenatória será
proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador."
"(...)
Ignorar isso, em prol de uma cruzada acusatória, seria desconsiderar a já
referida máxima nietzschiana no sentido de que ‘a crença forte prova apenas a
sua força, não a verdade daquilo em que se crê'", completou Ivan Marx.
3 - Convicção não substitui provas
Rechear
a denúncia apresentada à Justiça com ilações encorpadas por algumas teses de
ciência política para colocar Lula como o "grande chefe do esquema
criminoso investigado na Lava Jato" não adianta nada se essa investigação
cabe à Procuradoria Geral da República, em inquérito que tramita no Supremo
Tribunal Federal, disse Ivan Marx, contrariando outro expediente usado pelos
curitibanos nos processos sob a jurisdição de Sergio Moro.
"Como
esse chefe ainda não foi apontado, não nos cabe, na presente ação penal, tomar
ilações ou convicções pessoais como verdade suficiente para uma
condenação", disse Ivan Marx.
4 - Se não há provas, a "melhor
hipótese" não é a que prejudica o réu
Sem
provas de que Lula foi o mentor do plano para comprar o silêncio de Nestor
Cerveró, Ivan Marx poderia usar o explanacionismo defendido por Deltan
Dallagnol e criar uma hipótese "acima da dúvida razoável" na
tentativa de explicar como ocorreram os crimes denunciados pelo Ministério
Público.
Mas
a melhor hipótese, na visão do procurador do DF, não pode prejudicar o réu se
ela está recheada de lacunas. Afinal, "in dubio pro
reu", lembrou.
Na
página 55 das alegações finais, Ivan Marx ainda empresta a tese usada em
Curitiba para defender Lula em Brasília.
5 - É preciso admitir que o MP errou
Ivan
Marx ainda avaliou que "Delcídio dificilmente teria recebido os
mesmos benefícios angariados com a implicação de Lula no caso."
Foi
ofertando a cabeça de Lula que Delcídio, "com sua boa retórica, levou
o MPF a erro, criando uma situação realmente esdrúxula: o chefe do esquema
sagrou-se livre entregando fumaça."
Ao
menos o procurador do DF admite que Delcídio goza de liberdade em função do
acordo de colaboração firmado com o critério de se chegar a Lula.
Os
procuradores de Curitiba nada disseram sobre os acordos de delação que levaram
Sergio Moro a condenar João Vaccari Neto, absolvido em segunda instância por
falta de provas. Todos os 5 delatores do ex-tesoureiro do PT foram poupados
por Moro na sentença.
GGN