No Novo
Testamento (Atos 9), quando Saulo (depois chamado Paulo) cai de seu
cavalo na estrada para a cidade de Damasco e
recebe a visita do próprio Jesus, se convertendo ao cristianismo.
Assim
como na economia, todo processo politico caótico tem momentos de corte, uma
espécie de fundo do poço, no qual há duas possibilidades subsequentes:
Alternativa
A: todos os grupos majoritários se sentirem perdedores. Aí se começa a abrir o
espaço para o diálogo; ou Alternativa B: novas rodadas radicalizantes, e
movimentos oportunistas ou de esperneio dos grupos que serão expelidos do
poder.
Há
sinais no ar, tênues embora, de que possa se estar entrando na alternativa Alternativa
A. Enfatizo: sinais tênues ainda.
Ainda
se está a quilômetros de distância de um referencial mínimo, que aponte os
novos rumos. Mas o ciclo da subversão constitucional aparentemente começa a se
esgotar.
Nesse
período terrível, aconteceu de tudo, com externalidades negativas em todos os
setores, novos poderosos montando uma caçada ideológica no serviço público,
procuradores desvairados entrando com ações contra escolas e reuniões
políticas, movimentos de ultradireita saindo das profundezas e investindo
contra avanços civilizatórios e a quase consumação do mais execrável pacto
político da história: o que permitiria a uma organização criminosa apossar-se
do Estado brasileiro e livrar-se da Justiça em troca de reformas radicais
enfiadas goela abaixo da opinião pública.
Parecia
que todos os filtros de uma sociedade civilizada haviam sido desativados, até
os básicos, o olhar crítico sobre os puxa-sacos, a desconfiança contra os
exibicionistas, o pudor em tratar com governantes notoriamente corruptos.
A
própria Lava Jato se tornou um centro escandaloso de vaidade e oportunismo, com
procuradores se comportando como blogueiros teens (na expressão feliz de Nina
Lemos), aproveitando a visibilidade dada pelo Ministério Público Federal para
surfar no universo rentável das celebridades.
Figuras
que deveriam estar atrás das grades, como Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima,
Moreira Franco e o próprio Temer, e seus seguidores, como Laerte Rímoli,
Elsinho Mouco, o submundo jornalístico que se manteve à tona graças a Eduardo
Cunha, Aécio Neves, Michel Temer (https://goo.gl/E8Hsf3) comportavam-se como os
conquistadores imbatíveis, como piratas do Caribe em cima dos destroços da
Constituição.
As
delações da JBS foram como uma bomba de nêutron, desmontando toda a armação
política-midiática erigida nos últimos anos, o discurso pseudomoralista que
derrubou uma presidente eleita e caiu a ficha de parte do golpe, da
inviabilidade de um pacto político com uma organização criminosa para promover
o desmonte das redes de proteção social brasileiras.
A
delação da JBS se abateu sobre o Procurador Geral da República Rodrigo Janot
como a luz que derrubou Paulo do cavalo, a caminho de Damasco, e lhe mostrou o
rumo. Em uma tacada só, exibiu o amadorismo exibicionista da Lava Jato e suas
fixações, reassumiu o protagonismo da operação, a ponto de deixar Dallagnoll
com síndrome de abstinência, passando a opinar até sobre o caso JBS para não
perder espaço para o PGR.
Nos
últimos dias, o portal da PGR divulgou o questionamento de leis de municípios
que vetaram material sobre ideologia de gêneros nas escolas, a criação de cotas
para negros nos concursos do MPF, a PFDC (Procuradoria Federal dos Direitos do
Cidadão) encaminha pedido de informações do Alto Comissariado das Nações Unidas
para o Itamaraty, sobre a inconstitucionalidade de leis que proíbem discussões
sobre gênero em escola.
Os
próximos capítulos permitem um pouco de fé nos novos tempos:
Peça 1 – o desembarque do PSDB
Se
não há motivos para manter presa Andrea Neves, existem motivos sólidos para a
prisão de Aécio Neves. Solto, ele ficará articulando com colegas do Senado e
com o Ministro Gilmar Mendes maneiras de impedir as investigações.
Além
disso, a prisão terá um simbolismo especial.
Como
era possível a uma sociedade que se pretendia civilizada conviver com a
exposição pública de Aécio, flanando sobre a Justiça, mandando adversários para
a cadeia – como o episódio do jornalista Jorge Carone -, com investigações
paralisadas sobre aliados, sob suspeita de tráfico de cocaína? Como seria a
democracia brasileira com a falta de limites de Aécio e seus amigos?
Sua
provável prisão finalmente trará o PSDB para a realidade política, constatando
a impossibilidade total de bancar uma organização presidida por Temer. Mais
relevante: quebra o elo da possível parceria com o Judiciário e fecha a porta
para o que parecia ser a saída planejada do impeachment.
Ao
se inviabilizar politicamente, paradoxalmente, o PSDB se habilita para um passo
mais maduro, em busca de entendimento. O duro é localizar no partido alguma
liderança que, mesmo de longe, tenha a dimensão de um Mário Covas ou Franco
Montoro.
De
sobra, interrompe a articulação do chanceler Aloysio Nunes com o governo
Donald Trump, de abrir brechas para a invasão da Venezuela. A ideia fixa de
Aloysio – vergastando Maduro diariamente, como se não houvesse outro tema no
Itamarty - não é apenas falta de imaginação e conhecimento para outros temas
diplomáticos: cumpre o roteiro do guru José Serra. Em vez da tradição
diplomática pacifista brasileira, de buscar uma solução para um país que se
desmancha, o papel de gendarme da volta do grande cacete norte-americano.
Aloysio
e Serra se valem da perda total de substância ideológica do PSDB, da ausência
de estudiosos internos, para montar suas jogadas pessoais com o Grande Irmão. São
os últimos vagidos de políticos que perderam a dimensão de país.
Peça 2 - A denúncia de Michel Temer
Mal
empossado presidente, Michel Temer levou para dentro do governo seus quatro
operadores particulares: José Yunes, Sandro Mabel, José Felipelli e Rodrigo
Loures.
A
maneira como foi bajulado pelos grupos de mídia se constitui em um dos
episódios mais vergonhosos da história do jornalismo, cujo ápice foi o Roda
Viva com ele.
Poucos
imaginavam seu nível de mediocridade e de falta de noção. E aí Deus mostrou,
pelo menos uma vez, que ainda é brasileiro. Criou-se tal desorganização
institucional com o golpe, que um político mais habilidoso e ousado – como o
próprio Aécio - poderia ter conduzido o país ao estado de exceção amplo e se
perpetuado no poder. Felizmente, se entregou a Temer a responsabilidade do
pós-golpe.
A
denúncia próxima da PGR contra Temer repõe nos eixos um mínimo de dignidade na
política. Hoje em dia, é visível em qualquer cidadão, mesmo o menos politizado,
o sentimento de vergonha de ver o país governado por uma pessoa da dimensão e
do caráter de Temer e sua turma.
Para
se acreditar em um país sério só faltaria o MPF investigar os negócios da
FIFA-Globo, do IDP de GIlmar Mendes com o Tribunal de Justiça da Bahia e o
enriquecimento de José Serra.
Peça 3 diretas-já ou Constituinte
A
entrevista de Joesley Batista à revista Época é arrasadora. Com todas as
ressalvas que se possa fazer, expõe de maneira ampla o apodrecimento final do
modelo político.
Com
a saída do PSDB do jogo de apoio a Temer, resta saber qual será o tamanho do
centrão para resistir ao Supremo Tribunal Federal e à denúncia contra Temer e
ao clamor das ruas.
Entra-se,
agora, nos momentos cruciais que definirão a travessia para o novo ciclo
político.
Há
na mesa as seguintes alternativas:
1.
Eleições indiretas com Rodrigo Maia. Será uma tentativa de dar continuidade à
quadrilha de Temer, mas com alguns acenos para setores de oposição. E eleições
em 2018.
2.
Eleições indiretas com Tasso Jereissatti. A delação da JBS destruiu essa ponte.
3.
Eleições diretas-já.
Qual
a resultante das eleições diretas, não se sabe. Entra-se em um daqueles
momentos em que Deus joga dados e tudo pode ocorrer.
Às
forças democráticas resta o desafio de construir uma alternativa política e
econômica viável, os estudiosos trazendo seus diagnósticos, as lideranças
conversando e definindo os contornos de um novo pacto. Ou então, o caos.
Do
GGN