O presidente da
Petrobras, Pedro Parente, virou o fio. E não propriamente pela política de
preços com reajuste diário. Sua estratégia de esvaziamento da Petrobras se
tornou muito óbvia, tornando-o vulnerável a qualquer investigação, assim que o
país sair do torpor atual
A lógica:
Passo
1 –
Petrobras é uma empresa sem problemas de crédito, cujas colocações de títulos
no exigente mercado norte-americano tiveram uma demanda várias vezes superior.
Mesmo assim, Parente optou por vender ativos para antecipar pagamento de
dívidas, comprometendo a receita futura da empresa.
Passo
2 -
Praticou uma política de preços para derivados visando viabilizar a
competição dos importados, gerando uma capacidade ociosa de 25% nas refinarias
próprias. Ou seja, entregou mercado de graça (ou não) para a concorrência, ao
mesmo tempo que está colocando refinarias à venda.
Passo
3 –
Fechou um acordo bilionário, de US$ 3 bilhões, com acionistas norte-americanos,
muito superior ao que o próprio mercado esperava.
Passo
4 -
agora, entra-se na fase final, que consiste em inviabilizar o mercado de
títulos para a Petrobras e, com isso, forçar a venda das reservas do pré-sal.
Como fica nosso
quebra-cabeças:
Peça
1 – a jogada da Eletrobras
Pedro Parente segue o
mesmo modelo de atuação da 3G – de Jorge Paulo Lehmann – na Eletrobras. No
artigo “A
3G e o negócio do século com a Eletrobras” detalhei essa estratégia.
Primeiro, fincou
posição na empresa, tendo acesso ao conselho. Depois, divulgou estudos para
justificar um valor contábil ridículo. Uma companhia com ativos avaliados em
400 a 600 bilhões de reais, com dividas de 39 bilhões e passivos ocultos de 64
bilhões, mas que podem ser liquidados por um terço disso, cujo controle poderia
ser comprado por R$15 bilhões.
A 3G é um sócio
minoritário da Eletrobrás. A empresa está sendo preparada para ser vendida aos
chineses. No plano de privatização está embutido a descontratação da energia.
Ou seja, a possibilidade de toda a energia produzida pela empresa ser jogada no
mercado livre – com a previsível explosão das tarifas.
Sem investir um tostão,
os grandes acionistas, como a 3G e o grupo Jabbur, ganharão literalmente
bilhões de dólares com a mera valorização de sua participação.
Peça
2 – a jogada da Petrobras
Parente fez pior ainda.
Sua estratégia é inviabilizar o mercado de crédito internacional para a
Petrobras. E, com isso, tornar inevitável a venda de ativos e a posterior
privatização da empresa por preço vil.
A SEC norte-americana
exige, anualmente, o preenchimento do relatório 20-F, uma espécie de prestação
de contas ao mercado, com perspectivas e riscos das empresas listadas em Bolsa.
Esses relatórios listam
alguns fatores de risco. E, depois, tentam demonstrar como a estratégia adotada
visará criar um ambiente positivo para a empresa. Todo relatório busca
apresentar uma visão positiva da empresa e expectativas favoráveis à
implementação da estratégia adotada.
Parente montou um
relatório tão alarmista, que ficaram nítidas, como as impressões digitais no
guardanapo de um sujeito que se lambuza de ketchup, suas intenções em relação à
empresa.
A colocação desses papéis
depende fundamentalmente da previsibilidade do investimento. O que Parente faz
é apresentar uma série infindável de fatores imprevisíveis, visando fechar o
mercado para a empresa.
1.Dramatiza
problemas trabalhistas
Na página 16, o
relatório diz que os planos da Petrobras incluem a venda de aproximadamente US$
21 bilhões em ativos, para melhorar a liquidez. Essa venda obrigará a
transferir os funcionários para outras áreas da empresa, “o que pode gerar
custos adicionais, inquéritos judiciais relativos a ações trabalhistas, greves
e pode prejudicar nossa reputação”.
2.Lança
dúvidas sobre o Compliance
A Petrobras está
pagando centenas de milhões de dólares a escritórios de advocacia
norte-americanos, para montar seu programa de compliance.
Na página 18, mesmo
após a Lava Jato, Parente diz que “para nós é difícil garantir que todos os
nossos funcionários e contratados, aproximadamente 185.000, seguirão nossos
princípios éticos”. E aí, a dramatização inacreditável. “Qualquer um que
não siga – de fato ou que aparentemente não siga – tais princípios ou que não
cumpra as obrigações de governança ou regulatórias aplicáveis pode prejudicar
nossa reputação, limitar nossa capacidade de obter financiamento ou afetar de
maneira negativa os resultados de nossas operações e condição financeira”.
3.Coloca
em dúvida seus próprios relatórios financeiros
Na página 19, o
relatório lança dúvida sobre todos os relatórios financeiros dos últimos anos,
inclusive o último, de 2017: “Qualquer falha em manter nosso controle interno
sobre relatórios financeiros pode afetar negativamente nossa capacidade de
reportar nossos resultados financeiros em períodos futuros com precisão e em
tempo hábil”.
4.Lança
incertezas sobre as ações do Departamento de Justiça
O relatório revela a
informação reservada, de que a empresa já está sob a lupa do Departamento de
Justiça norte-americano (DoJ), nos mesmos moldes da Embraer. Ou seja, todos as
informações estratégicas da empresa ao alcance do DoJ.
Diz o relatório: “O DoJ
[Departamento de Justiça dos EUA] está realizando uma investigação semelhante
e, tanto a sindicância interna quanto as demais conduzidas pelo governo a
respeito de tais questões, estão em curso. Apesar de nossa total cooperação com
tais investigações, há o risco de que seu alcance seja expandido ou de que as
autoridades decidam realizar uma denúncia formal na esfera civil ou criminal”.
E trata de jogar mais
imprevisibilidade no caldeirão:
“Pode ser exigido de
nós o pagamento de multas ou outras assistências financeiras, além do cumprimento
de medidas liminares, determinações ligadas a condutas futuras ou, ainda, a
imposição de outras multas, que podem surtir efeito material adverso. Também é
possível que informações que prejudiciais à nossa imagem e aos interesses
venham à tona durante as investigações de corrupção deflagradas pelas
autoridades brasileiras”.
5.Lança
incertezas sobre as multas pagas
Diz, à página 20:
“Se, no futuro,
surgirem informações adicionais substanciais demonstrando que, em
retrospectiva, nossos ativos pareçam ter sido consideravelmente subestimados ou
superestimados em nossas demonstrações financeiras, é possível que sua
reformulação seja exigida, o que pode ter um efeito material adverso nos
resultados de nossas operações e condição financeira, além de afetar o valor de
mercado de nossos valores mobiliários”.
6.Incertezas sobre as
concessões públicas
“Caso alegações que
envolvam um valor significativo e para os quais não tenhamos provisões sejam
decididas em nosso desfavor, ou caso as perdas estimadas se revelem significativamente
superiores às provisões disponíveis, o custo agregado de decisões desfavoráveis
pode ter efeito adverso significativo sobre os resultados das nossas operações
e condição financeira. Também podemos estar sujeitos a disputas judiciais e
processos administrativos ligados a nossas concessões e demais autorizações
governamentais, que podem resultar na revogação de tais concessões e
autorizações governamentais. (…)”
7.Incertezas
sobre os passivos fiscais
“No futuro, pode ser
que tenhamos de lidar com situações semelhantes nas quais nossa interpretação
das leis fiscais possa ser diferente da interpretação das autoridades fiscais
ou, ainda, em que as autoridades fiscais contestem nossa interpretação e
possamos ter de assumir provisões e custos não previstos”.
8.Incertezas
sobre desinvestimento e o fluxo futuro
Explicita a estratégia
óbvia de reduzir o fluxo de resultados com a venda de ativos:
“A impossibilidade de
implantar com sucesso nosso programa de desinvestimento pode ter um impacto
negativo em nossa empresa, nos resultados de nossas operações e condição
financeira, inclusive nos deixar com liquidez limitada em curto e médio prazo.
Além disso, a venda de ativos estratégicos sob nosso programa de
desinvestimento resultará na diminuição de nossos fluxos de caixa advindos de
operações, o que pode ter impacto negativo em nossa perspectiva de crescimento
operacional de longo e médio prazo”.
9.Incertezas
sobre as eleições
“As eleições no Brasil
ocorrem a cada quatro anos, e as mudanças nos representantes eleitos podem
levar a uma mudança dos membros de nosso conselho de administração nomeados
pelo acionista controlador, o que pode impactar ainda mais a gestão de nossa
estratégia e diretrizes de negócios.
Além disso, o governo
federal brasileiro pode tentar alcançar alguns de seus objetivos
macroeconômicos e sociais através de nós”.
10. Incertezas
sobre corrupção política
“Nossa condição
financeira e resultado das operações podem ser prejudicados pelos seguintes
fatores e pela reação do governo federal brasileiro a tais fatores: (...)
-alegações de corrupção contra partidos políticos, agentes eleitos
ou outros agentes públicos, incluindo alegações feitas relativas à
investigação da Lava Jato;
11.Incertezas
sobre a economia
“Historicamente o
cenário politico tem influenciado o desempenho da economia brasileira e crises
políticas tem afetado a confiança de investidores e do público em geral, o que
resultou num declínio econômico e aumentou a volatilidade dos títulos emitidos
no exterior por empresas brasileiras. (...) qualquer desdobramento na
investigação da Lava Jato (previsível e imprevisível) poderia prejudicar
relevantemente a economia brasileira assim como nossos resultados operacionais
e condição financeira”.
12.Incertezas
sobre novas denúncias
Assim que assumiu a
Petrobras, Parente contratou a Pinheiro Neto para um pente fino nos e-mails da
empresa – remontando ao começo da década de 2.000. Já foram identificados
e-mails de políticos com solicitações para a empresa. Agora, o escritório tenta
estabelecer relações de causalidade entre os e-mails e obras. Tudo indica que
haverá uma leva de novas denúncias, levantadas agora pela própria gestão
Parente, visando tornar a Petrobras mais vulnerável ainda.
No relatório à SEC, há
indícios:
“Atualmente,
funcionários eleitos e outros funcionários públicos no Brasil estão sendo
investigados por alegações de condutas antiéticas e ilegais identificadas
durante a investigação Lava Jato realizada pela Procuradoria Federal do Brasil.
O resultado potencial dessas investigações é desconhecido (...) Tais alegações
podem levar a mais instabilidade, ou novas alegações contra funcionários do
governo brasileiro e outros podem surgir no futuro, o que poderia ser
relevantemente prejudicial para nós. Não podemos prever o resultado de tais
alegações nem seu impacto na economia brasileira”.
Peça
3 – o desfecho do fechamento do mercado
Velho parceiro do PSDB
na área de energia, no governo Fernando Henrique Cardoso, o deputado
baiano José Carlos Aleluia (DEM) apresentou projeto de lei autorizando a
Petrobras a vender até 70% das áreas não concedidas da camada pré-sal.
“Entre os ativos
passíveis de serem desinvestidos, os campos de petróleo são uma opção
especialmente interessante, porque, além de angariarem recursos para abater a
dívida, agregam parceiros para dividir os investimentos necessários para
colocar esses campos em produção. No caso dos campos contratados no regime de
cessão onerosa, a sua transferência viria para o bem da Petrobras e do Brasil,
pois permitiria a antecipação da extração do petróleo que jaz enterrado nas
profundezas do pré-sal”, justificou.
Peça
4 – o desafio das instituições
STF (Supremo Tribunal
Federal), Procuradoria Geral da República (PGR), TCU (Tribunal de Contas da
União), AGU (Advocacia Geral da União) foram personagens centrais do
impeachment, em nome de uma suposta moralidade.
Agora, estão em
andamento jogadas capazes de transformar a corrupção apurada pela Lava Jato em
troco. Não se trata se contrapor estatismo e liberalismo. O que se tem são
negociatas em andamento, com reflexos perpétuos sobre o país, na forma de
aumento dos cistos de energia, vulnerabilidades na oferta de combustíveis.
Vai ser o grande teste
para se saber se essas autoridades foram apenas conduzidas pelos ventos das
manifestações populares, ou compactuam com esse jogo.
GGN