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quarta-feira, 2 de maio de 2018

OS DIAS DECISIVOS DO GOVERNO DILMA, por Luis Nassif

2012 marcou o fim das grandes apostas de Dilma Roussef. Como efeito da estratégia de superação da crise, no período 2008-2010, os bancos públicos assumiram  protagonismo inédito. Numa ponta, o Banco Central conduzia  a redução da Selic; na outra, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, e BNDES forçavam a uma queda inédita no spread bancário.
Teve início um movimento de migração da renda fixa para a renda variável. Só na Funcef, a queda na Selic liberou R$ 50 bilhões que, à falta de títulos para serem rolados, iriam necessariamente para os novos fundos de infraestrutura.
Em 2013, as pressões já tinham dobrado a candidata a dama de ferro. Pouco antes, houve uma reversão no processo de queda da Selic, pegando no contrapé os que tinham acreditado na promessa anterior, de taxas de juros internacionais. A Fazenda havia identificado pressão de demanda em alguns eletrodomésticos e as cotações globais pressionaram preços de alimentos. Em junho aconteceram as grandes passeatas refletindo o clima de mal-estar na economia.
Entrou-se em 2014  com dados objetivos de que as desonerações de folha, distribuídas com evidente exagero a dezenas de setores, não haviam produzido aumento de investimento pretendido. Não foi dinheiro jogado fora. Permitiu alguma redução da enorme alavancagem das empresas não financeiras, no período anterior, e a manutenção dos níveis de emprego. De qualquer modo, Dilma estava perdendo o grande álibi que lhe garantiu uma folga política nos dois primeiros anos de mandato, que era uma economia em crescimento.
A perda de fôlego da economia deixou a presidente com uma hipersensibilidade para as críticas. Duas, em particular, produziram respostas rápidas, e nem sempre adequadas.
A primeira, as críticas contra contra a expansão dos bancos públicos, obrigando os bancos privados a reduzir os spreads.
Em janeiro de 2014 Dilma Roussef foi a Davos tentando tranquilizar o chamado mercado. Sua mensagem foi: fiquem tranquilos que bancos púbicos não vão concorrer com vocês. Foi um momento apenas para superar a crise. O discurso foi bem recebido e Dilma tratada como estrela do encontro, ofuscando até o recém-eleito presidente do México, Enrique Peña Nieto.
Foi seu último momento de brilho.
A guerra contra os bancos públicos já era enorme, e, no Palácio, sentiu-se o aumento da pressão quando o Banco Itaú passou a se valer de Marina no discurso público.
A segunda crítica foi do presidente da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Paulo Skaf, contra os preços da energia, nas vésperas da renovação de algumas outorgas relevantes.
Dilma decidiu da sua grande tacada no setor elétrico. Montou um modelo pelo qual as concessões seriam relicenciadas sem a chamada outorga onerosa, isto é, sem pagar pela nova outorga. As usinas já estavam depreciadas e não havia a necessidade de fundos de reversão – destinados a ressarcir os investimentos iniciais – e outras contas que encareciam as tarifas. Estas passariam a refletir apenas os custos operacionais.
Ao mesmo tempo, tentou antecipar outorgas relevantes, em mãos de companhias estaduais, especialmente da Cemig, de Minas, da CESP, de São Paulo, e da Copel, do Paraná. Esbarrou em uma disputa pesada, em parte por motivos políticos (os três estados dominados pela oposição); em parte pelo valor oferecido.
E, aí, criou-se a tempestade perfeita, com uma série de eventos totalmente fora de controle do governo.
O primeiro deles foi a seca do nordeste, a maior em décadas, que arrebentou com a tentativa de reduzir as tarifas de energia elétrica.
O mercado é composto por energia contratada e mercado livre. A energia contratada é fornecida pelos geradores às distribuidoras em contratos de longo prazo. Quando ocorre algum problema na oferta, as distribuidoras são obrigadas a buscar o que faltou no mercado à vista.
A seca derrubou a oferta de energia. Com o impasse com o governo federal, as três concessionárias saíram do mercado de energia contratada. Houve uma notável redução na oferta de energia contratada, obrigando as distribuidoras a irem para o mercado livre – cujas cotações explodiram.
Ao mesmo tempo, a queda no nível de água dos reservatórios obrigou a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) a acionar todas as eletrotérmicas, mesmo aquelas de baixíssima eficiência, aumentando a conta do setor. Repassar os custos para as tarifas de energia significaria aumentar o custo de produção e tirar a comida da mesa do mais pobre. E o Tesouro foi bancando esses subsídios. Criou-se uma conta pesada no setor elétrico, ao mesmo tempo em que a seca obrigou a desembolsos de R$ 5 a R$ 6 bilhões para enfrentar as questões sociais.
Os problemas ganharam uma nova dinâmica em meados de 2014, com os primeiros sinais do fim do grande ciclo de commodities que ajudou a sustentar a economia na década anterior.
O ano abriu com petróleo a US$ 110,00 o barril; bateu nos US$ 140,00. Mas, em agosto, havia despencado para US$ 45,00. O mesmo ocorreu com as cotações de commodities, afetando setores chaves para o crescimento.
Todos esses elementos, seca e commodities, estavam fora do controle do governo federal.
No final de agosto, estava claro para Dilma e Mercadante que, passadas as eleições, seria inevitável um choque de arrumação.
Em 2011 tinha havido um ajuste fiscal rigoroso, mas com todas as variáveis sob controle. Agora, era um jogo sem controle de todas as variáveis.
Foram dois meses de debates internos pesadíssimos, sobre como sair da armadilha com o mínimo possível de perdas. Foi o período em que, terminadas as eleições, Dilma enfurnou. Nessas discussões, definiram-se as peças chaves, intocáveis, como Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida e outras prioridades.
Para completar a tempestade perfeita, entrou o fator Petrobras. O pré-sal já andava a pleno vapor. O país fechou 2014 com a produção do pré-sal respondendo por 25% da produção nacional. Em 2013 e 2014 ela havia sido fundamental para garantir os investimentos internos, trazendo consigo a cadeia do petróleo-gás-estaleiros. Quando despencaram os preços do petróleo, a Petrobras precisou desacelerar o ritmo de investimento.
As discussões maiores eram sobre quem receberia a incumbência de promover o ajuste rigoroso. Acabaram se fixando no nome de Joaquim Levy. Sua ideia inicial era um pacote ainda mais recessivo do que o que foi anunciado. Levy levou propostas pesadas de corte nos investimentos públicos.
Dilma reagiu:
— Estamos no meio de um choque monetário e você quer um choque fiscal? Assim vamos parar o Brasil.
Antes de terminar o ano, houve a estreia de Levy, um desastre inicial como prenúncio dos desastres posteriores. Mesmo com pleno emprego havia o crescimento do seguro desemprego. Sem conhecimento maior da economia real, Levy supôs que estivesse ocorrendo uma fraude gigantesca.
Na verdade, tratava-se da rotatividade normal na economia brasileira, especialmente na construção civil, que vinha comandando o crescimento. Os especialistas avisaram, depois, que a construção civil abria o ano com um estoque de trabalhadores e terminava com outro contingente, mostrando rotatividade total.
Em dezembro, entre Natal e Ano Novo, Levy anunciou a revisão do seguro desemprego. Foi o cartão de visita da nova gestão, provocando o primeiro grande impacto negativo.
Até então, Dilma achava que, passado o terceiro turno, do julgamento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) conduzido por Gilmar Mendes, o Judiciário daria uma folga.
Mas quando declarou que não havia nenhuma possibilidade de apoiar Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, abriu a caixa de Pandora. O então vice-presidente Michel Temer chegou a propor a Dilma ficar neutra. Mas ela e Mercadante decidiram partir para o confronto.
Não tinham noção de que Cunha já comandava uma bancada de 200 deputados do baixo clero, cuja campanha ele ajudara a financiar.
O embate final se deu quando Dilma ousou apresentar uma nova lei dos portos.
Foram mais de 20 reuniões para o marco portuário. No Congresso, Cunha havia apresentado uma emenda que abria caminho para a lambança. Embora todo mundo soubesse das ligações históricas do PMDB, especialmente de Temer, com o porto de Santos, não tinham ideia da sua dimensão. Temer não largava do pé de Luiz Adams, chefe da Advocacia Geral da União (AGU), buscando uma portaria que permitisse ao grupo Libra se candidatar à renovação da concessão sem quitar seus débitos fiscais.
Mas o lance final, que precipitou o golpe, foi quando Aécio e o PSDB aderiram a Cunha. Este pretendia manter o governo sob rédea curta; os tucanos  apostavam no golpe, acreditando que Temer se apoiaria neles para a nova gestão.
Nos meses seguintes, o Congresso foi paralisado com as pautas-bombas do PMDB. A Globo se pôs a campo, conclamando a população para as grandes passeatas, e  o STF piscou.
A partir daí, o caminho estava aberto para a tomada do poder pela mais deletéria organização criminosa gerada pela política brasileira. Com a luxuosa contribuição da Lava Jato.
Do GGN