Queimada!
Não sei por que, lembrei de Sérgio Moro e da TV Globo, por Armando Coelho Neto
Pregar a
revolução nas colônias de Portugal e Espanha foi a missão dada pela Inglaterra para
Sir William Walker. Ele deveria encontrar um escravo corajoso capaz de liderar
e convencer outros a lutar contra os portugueses. Esse grupo de revolucionários
receberia todo apoio, inclusive financeiro. Dirigido pelo engajado Gillo
Pontecorvo, eis parte do enredo de Queimada (1969), filme estrelado por Marlon
Brando. Num misto de ficção e realidade, ambientado numa fictícia ilha
caribenha, o longa metragem é inspirado na história do Haiti. Na prática, a
obra é um manual de tramas, manhas e artimanhas do submundo capital e, ao mesmo
tempo, se revela um manual de doutrinação política.
Traições,
corrupção, delações, “ganha, mas não leva”, além de jogo sujo fazem parte da
trama, entre outros ingredientes. Entretanto, um dos pontos mais interessantes
é quando o desempenho do líder nativo (consentido), José Dolores, vai além dos
interesses do “poder obscuro”. Nesse ponto, entra em debate - o que fazer com
ele? O que seria melhor? Prender, matar ou deixar vivo, mas desmoralizado? E se
ele se transformar em mito e sua história inspirar mais povos igualmente
explorados? O que aconteceria com as outras ilhas do Caribe?. Sem saída
aparente, optam pela prisão e destruição da imagem daquele líder. A ilha de
Queimada é atrasada e partir daí começa uma “campanha” para convencer o povo de
que a fome, os mortos e os feridos, além da queima do canavial (principal fonte
de renda da ilha) é culpa de Dolores. Isso reporta o leitor a algum fato?
“Queimada” é atual, sobretudo quando comparado
aos financiamentos e armamento de grupos rebeldes em várias partes do mundo. A
título de “ajuda”, financiadores incentivam rebeliões nativistas, quando na
verdade estão a serviço de grandes potências (John Perkins no Youtube ilustra
bem). Com esse perfil, tem razão quem compara a obra aos bons vinhos. Quanto
mais tempo passa, mais encorpa e ganha conotação presente. A reflexão sobre o
Brasil atual é inevitável. Sobretudo quando no curso do filme, um interlocutor
reclama: nos prometeram uma ilha e estão entregando uma terra destruída, arrasada.
A resposta foi inequívoca: os portugueses fizeram isso e a dominaram por três
séculos. Encontrar semelhança com a destruição proposital e calhorda da
economia brasileira é inevitável.
Não, leitor.
Fazer resenha de cinema não é intenção e, propositadamente, diálogos
importantes e algumas referências são omitidos, inclusive o final. A ideia é
lembrar Karl Marx, pois está clara a repetição como farsa de uma tragédia
ocorrida nos tempos coloniais. O enredo do filme permite, aqui ali, a
identificação de personagens centrais da Farsa Jato, cujo propósito até hoje
não foi revelado, ainda que haja fortes indicadores de que emissários vieram ao
Brasil para patrocinar o golpe de estado que estrangula o país. Os delegados da
Polícia Federal sabem bem disso, pois muito antes do golpe, já discutiam nos
grupos internos da categoria que a solução, leia-se, o “Fora Dilma e leve PT
junto” viria com apoio dos Estados Unidos.
A ficção
cinematográfica abre espaço para divagações concretas, quando o observador
envolvido pela trama começa a fazer associações. Um mesmo personagem pode ser
interpretado ou comparado com outros. No filme, há um líder fabricado,
incentivado a defender os interesses de seu povo, e, para tanto, recebe
indicadores, recursos e estratégias. Na realidade Brasil não há um líder
naquela condição, mas sim um “ídolo” fabricado, um “encantador de burros”, que
na vida real encarna o papel de o papel de Sir William Walker. É ele quem está
a serviço de interesses internacionais, mas estimula o discurso nacionalista
que infla os patos da Av. Paulista e Copacabana. O líder de Queimada não sabe
que é usado, já o “ídolo” do Brasil Terra Arrasada sabe bem o seu papel e o
exerce com crueldade.
No Brasil do
golpe há uma liderança real, apontada até por pesquisas – Luís Inácio Lula da
Silva, grande o alvo do Sir William Walker tupiniquim, que não lhe dá sossego.
Sir, a serviço da Inglaterra, ou melhor, Estados Unidos, se encarregou destruir
a imagem de Lula a qualquer preço. E não está nem aí com a queda do preço do açúcar,
digo, do petróleo – grande referência do patrimônio nacional. Lula vive sob
bombardeio e campanha de descrédito, de forma que para o Sir caboclo surge a
mesma indagação – o que seria melhor? Prender, matar ou deixar vivo, mas
desmoralizado? Diante da indagação, não há delírio do espectador, se fizer a
mesma comparação com José Dolores da ficção.
Há mais
coisas a serem confrontadas entre a ficção e a realidade. A culpa pela
devastação ocorrida na ilha de Queimada é atribuída a José Dolores e o mesmo acontece
com o Brasil Terra Arrasada de hoje. A legítima Presidenta Dilma Rousseff foi
responsabilizada até por buraco de rua. Sim, não se pode excluir,
evidentemente, o seu papel e do Partido dos Trabalhadores no que possa ter
concorrido para a crise econômica. Mas, também é fato que a potencialização da
crise por intermédio dos meios de comunicações fazia parte da estratégia do
golpe. Afinal, a ilha de Queimada já estava prometida aos ingleses, ou melhor,
o Brasil já estava empenhado pelos golpistas aos interesses
internacionais.
Eis que,
após revisitar o filme Queimada!, não sei por que me lembrei de Sérgio Moro e
da TV Globo...
Do GGN