Peça 1 – Odebrecht e o
fruto da árvore envenenada
O laudo técnico da Polícia Federal sobre o Drousy liquida com
as provas apresentadas nas delações da Odebrecht, a ponto de comprometer todas
as denúncias e condenações tendo por base os arquivos.
Em direito, existe a figura do fruto da árvore envenenada.
São transgressões legais que anulam inquéritos inteiros. Na Operação
Satiagraha, Daniel Dantas conseguiu anular as provas contidas nos HDs
encontrados em sua casa com o argumento de que a autorização de busca era
restrita a determinado andar e os equipamentos estavam em outro.
A Operação Castelo de Areia foi alvo de uma anulação mais
escandalosa. Alegou-se que as investigações começaram a partir de denúncias
anônimas, por isso deveriam ser anuladas. Quem conhece o inquérito sustenta que
não tinha nenhuma inconsistência. Hoje em dia são de domínio público os
verdadeiros motivos da anulação, mas o caso permanece insolúvel no âmbito do
Judiciário.
No caso da delação da Odebrecht, é mais do que o fruto da
árvore envenenada. A perícia da PF constatou que o banco de dados foi alterado
em dois momentos:
Pouco antes da entrega para as autoridades suíças e também
no período em que esteve de posse do Ministério Público
Federal (MPF).
No relatório, há duas alterações ocorridas no período em que
o sistema já estava de posse do MPF.
Arquivos apagados
Arquivos copiados
Como se recorda, as manipulações de extratos do Meinl Bank
tinham o mesmo formato das planilhas utilizadas pelo Departamento de Operações
Estruturadas da Odebrecht, inclusive com as datas em português.
O laudo tem a preocupação em preservar os arquivos “Beluga”,
que se referem à suposta compra de terreno para a instalação do Instituto Lula.
A tentativa de compartimentalizar as provas, criando a versão
de que uma parte é boa e a outra não, é inútil. A prova tornou-se imprestável
em termos técnicos. Foram periciados 800, de um total de um milhão de
arquivos. Como afirmar que, nos arquivos não periciados, não apareça outro
capaz de contradizer o “Beluga”?
Os desdobramentos são imprevisíveis. Em circunstâncias
normais, o laudo da PF anula toda a delação da Odebrecht. Quantas pessoas foram
presas e condenadas com base nessas provas? Bastará um réu condenado pela STF
(Supremo Tribunal Federal) questionar as provas para se ter o efeito-dominó.
Peça 2 – as trapalhadas
da Lava Jato
A Lava Jato sabia há meses que a perícia da Polícia Federal
iria comprovar a manipulação do banco de dados da Odebrecht, confirmando as
denúncias do advogado Tacla Duran.
O banco de dados foi apreendido por autoridades suíças e
submetidas a uma empresa, especializada em analisar dispositivos eletrônicas,
a Forensic Risk Alliance - FRA
O material suíço e o analisado pela FRA foram enviados para a
Procuradoria Geral da República (PGR). De imediato, constatou-se que houve
manipulação de arquivos pela Odebrecht, antes mesmo da entrega para as
autoridades suíças.
Antes mesmo de conferir a consistência dos arquivos, a Lava
Jato aceitou o acordo estapafúrdio da delação de mais de 70 executivos da
Odebrecht, típico de quem quer produzir manchetes no dia, à custa do
comprometimento do futuro. O feito foi saudado pela Reuters como “o
maior acordo de delação do mundo”.
Operações dessa natureza, de pagamento de propinas, envolvem
poucas pessoas-chave, os chamados prestadores de serviços, que controlam e
conhecem o sistema. Os Executivos que recorrem aos seus serviços são chamados
de clientes, e pouco têm a contribuir para uma investigação.
Ao incluir todos na história, como delatores, a Lava Jato
conseguiu complicar as investigações, incriminar inocentes, diluir a
responsabilidade dos culpados – os responsáveis pelo Meinl Bank, que lavou
bilhões de dólares, foram soltos mediante multas irrisórias - dispersar
energias e dar armas ao “inimigo”, na medida em que seria muito mais fácil para
os acusados identificar contradições.
Mas o método de investigação fordista da Lava Fato não admite
análises mais sofisticadas ou mais profissionais.
Consiste no seguinte:
O sujeito faz a delação, que tem que que conter, em algum
trecho, a frase “Lula sabia disso”.
Depois, apresenta uma prova qualquer para reforçar a delação.
E corre-se para o meio do campo para comemorar mais um
recorde mundial.
Peça 3 – a Lava Jato e
a falsificação das provas
Quando se deu conta da enrascada em que se metera, a Lava
Jato foi à Suíça tentar recuperar os servidores, já que recebera apenas cópias
dos bancos de dados. Em vão! A própria perícia da PF constatou que as
autoridades suíças – e a FRA – entregaram os arquivos como receberam, já
fraudados.
Não há dúvida que os procuradores foram cúmplices da fraude.
Apenas não se sabe até que nível, se participando da confecção das planilhas
falsificadas ou se, descobrindo a manipulação e tratando de ocultá-las. É mais
provável a segunda hipótese.
A questão da fraude só veio à tona a partir das denúncias do
advogado Tacla Duran.
Peça 4 – a estratégia
de despiste
Para tentar contornar o desastre, foram planejadas várias
ações.
No
dia 19/01/2018, a Lava Jato diz que será impossível abrir os dados do MyWebDay,
porque as chaves de criptografia foram perdidas. A constatação deu-se 945 dias
depois da prisão de Marcelo Odebrecht.
Já se sabia, desde fins do ano passado, que a perícia da
Polícia Federal descobriria as irregularidades nos arquivos.
Para tentar reduzir o impacto das revelações da perícia, os
preparativos começaram antes,
No
dia 18/12/2017 o Ministério Público Federal exigiu de Marcelo Odebrecht a
entrega de mais documentos, para ter direito à prisão domiciliar (clique
aqui). A exigência foi feita 913 dias após a prisão de Marcelo.
No dia 12/02/2018, 56 dias após a intimação, Marcelo entrega
notas fiscais supostamente referentes ao financiamento do filme sobre Lula. E?
No dia 21/02/2018, Marcelo Odebrecht entrega supostos e-mails
que estavam guardados no seu computador pessoal, sobre a compra do terreno para
o Instituto Lula. A Lava Jato, que foi até a Suíça buscar os servidores da
Odebrecht, supostamente não havia periciado o computador pessoal de Marcelo.
Paralelamente, a Lava Jato do Rio de Janeiro deflagra uma
operação contra o presidente da Fecomercio-RJ, que estava sendo investigado
desde o ano passado.
Faz-se um alarde sobre 6 funcionários contratados pela
Fecomércio-RJ supostamente a pedido do ex-governador Sérgio Cabral,
caracterizando o fato como lavagem de dinheiro de propina. Mas os alvos da
coletiva foram os advogados de Lula – que também advogam para a Fecomércio-RJ.
Na coletiva, procurador insistiu em lançar suspeitas sobre os
honorários recebidos, insinuando que poderiam ser disfarce para lavagem de
propinas; ao mesmo tempo em que enfatizava que a operação não tratava dos
honorários e do próprio juiz admitir que havia comprovação dos serviços
realizados. Então, qual a razão para disseminar suspeitas sobre os contratos?
Evidentemente, contrabalançar o impacto das revelações da pericia da PF.
Na tentativa de criminalizar advogados, invadiram um
escritório em São Paulo, de respeitado advogado, exclusivamente para obter
documentos comprovando a prestação de serviços à Fecomércio-RJ. O que poderia
ter sido obtido meramente solicitando ao escritório.
Na tentativa de criminalizar escritórios de advocacia, a Lava
Jato Rio divulgou também pagamentos de R$ 12 milhões ao escritório Basílio
Advogados, para atuar junto ao Tribunal de Justiça do Rio, ao STJ e à Justiça
Federal. Tardiamente, descobriu que a banca pertence a Ana Basília,
esposa do desembargador André Fontes, presidente do Tribunal Federal da 2ª
Região e grande apoiador da própria Lava Jato. Depois do estrago feito,
correram para corrigir informando que “o desembargador
federal André Fontes, no exercício da Presidência do TRF2, vem apoiando
administrativamente, de maneira significativa, os trabalhos desenvolvidos no
âmbito da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro“.
Enquanto isto, Sérgio Moro rejeitava novo pedido de prisão
para Tacla Duran, ao mesmo tempo em que solicitava nova perícia da PF para
extrair dos bancos de dados da Odebrecht, informações sobre os gastos com o
sítio de Atibaia.
Peça 5 – o final
imprevisível
Todo esse jogo de cena visou contrabalançar as descobertas da
PF e, ao mesmo tempo, pressionar o STF (Supremo Tribunal Federal), que está
para analisar a questão da prisão após condenação em 2ª instância. E isso em um
momento em que a organização Michel Temer consegue desviar o foco da mídia da
corrupção para o combate ao crime desorganizado.
Os próximos dias serão prenhes de factoides e
arbitrariedades. E por sobre as ações, pairam as sombras das suspeitas lançadas
por Tacla Duran.
GGN