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quinta-feira, 29 de novembro de 2018

AVANÇA A CRIMINALIZAÇÃO DA ATIVIDADE POLÍTICA E O ESTADO EXCEÇÃO, POR DANIEL SAMAM

A prisão do governador do Estado do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (MDB), a 30 dias do fim do seu mandato, é mais um capítulo do ativismo político do Poder Judiciário. 
Baseada numa delação de 8 meses atrás que, como de praxe, não foi confirmada por qualquer tipo de prova, acusando o governador de um crime da época em que este era vice-governador. O delator, Carlos Miranda, depois de dizer aquilo que o Judiciário queria ouvir, está em prisão domiciliar. 
Que fique claro, tais acusações não passam de mero pretexto pra pirotecnia do ato da prisão cumprir o propósito de criminalizar a atividade política. 
Essa ação de hoje (29) tem como consequência o fortalecimento da narrativa para a sociedade chancelar uma solução de recorte autoritário que hoje no Estado do Rio tem nome e sobrenome: Wilson Witzel. 
Pra quem ainda tergiversa com o estado de exceção promovido pelos ativistas do Judiciário que se concentram na Operação Lava Jato, cuidado. Lembrem-se que depois do A, vem o B, o C, o D e assim por diante. O próximo pode ser você. 
Daniel Samam é músico e educador. É membro do Instituto Casa Grande e do Coletivo Nacional de Cultura do Partido dos Trabalhadores. 
GGN

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Caso Lula e Caso Dreyfus: qual a reação ao arbítrio?, por Jeferson Miola

Lula não está sendo julgado; ele está sendo condenado sem provas, num processo enviesado e carente de fundamentos jurídicos.
​A condenação arbitrária do ex-presidente no TRF4 são favas contadas. O regime de exceção perpetrará esta violência jurídica mesmo que a falsa acusação, forjada pela Lava Jato para condená-lo – a suposta propriedade de um apartamento triplex – tenha sido totalmente desmanchada em decisão recente da juíza Luciana Corrêa Tôrres de Oliveira, da 2ª Vara de Execução de Títulos Extrajudiciais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.
A juíza determinou a penhora do imóvel para a empresa Macife S/A, credora da OAS que ajuizou a empreiteira para cobrar dívidas. A penhora comprova cabalmente que o apartamento pertence, de fato e de direito, à empreiteira OAS – e não ao Lula. Este fato soterra a acusação fraudulenta, e, portanto, o processo contra Lula deveria ir para a lixeira.
O Brasil e o mundo assistem não a um julgamento justo e legal do maior líder popular do país, mas sim a um processo kafkiano, no qual a condenação foi concebida de antemão, num quadro de guerra jurídica permanente [lawfare], perseguição midiática e emprego do direito penal do inimigo.
A narrativa da Rede Globo e da mídia hegemônica, que reverbera as vozes fascistas da Lava Jato e da oligarquia golpista, cinicamente busca confundir o direito do Lula a um julgamento justo e honesto com a defesa da sua impunidade.
Defender o direito de todo cidadão a um julgamento justo e legal – desde que existam, de fato, razões materiais para qualquer pessoa ser processada judicialmente – é o mínimo que se deve fazer para proteger a democracia e o devido processo legal.
Lula não está nem acima nem abaixo das leis e da Constituição do Brasil. Com este julgamento de exceção, porém, a classe dominante coloca Lula à margem das leis e da Constituição; subtrai dele o direito inerente a todo ser humano, de não ser condenado sem provas.
A farsa jurídica montada para condenar Lula é um passo em direção ao totalitarismo. Nos estudos sobre a gênese do nazismo, do anti-semitismo e dos processos totalitários, Hannah Arendt analisou o Caso Dreyfus, ocorrido no final do século 19 – que guarda semelhanças com o Caso Lula.
Alfred Dreyfus foi perseguido por ser o único oficial do exército francês de origem judaica, e foi acusado de alta traição por supostamente colaborar com os alemães durante a guerra franco-prussiana na disputa pelas terras da Alsásia-Lorena, ricas em carvão.
Num processo baseado em documentos falsos e provas forjadas, como ocorre com Lula, Dreyfus foi condenado, por unanimidade, à prisão perpétua. Para o autor William Shirer, a condenação de Dreyfus "convencera grande parte da população de que os judeus [no regime de exceção, Lula e os petistas são os estigmatizados]eram responsáveis não só pela chocante corrupção nos altos círculos políticos e financeiros, como também por traírem segredos militares em favor dos odiados alemães, solapando com isso a segurança da nação, que ainda sofria com a recuperação após a derrota que lhe fora infligida pela Prússia em 1870" [A Queda da França: o colapso da Terceira República].
No livro As origens do totalitarismo, Hannah Arendt disserta que, "como eram judeus, tornava-se possível transformá-los em bodes expiatórios quando fosse mister aplacar a indignação do público. Os antissemitas podiam imediatamente apontar para os parasitas judeus de uma sociedade corrupta para 'provar' que todos os judeus de toda parte não passavam de uma espécie de cupim que infestava o corpo do povo".
20 anos mais tarde, depois de verdadeiro e honesto julgamento, Dreyfus foi finalmente inocentado. Com Lula não será diferente. Em breve tempo esta farsa monstruosa, montada para impedir seu retorno à presidência do Brasil, também será escancarada.
Exigir o direito de um julgamento justo para o ex-presidente Lula não é sinônimo de privilégio e de impunidade; é uma dever para a defesa do Estado de Direito e da democracia.
Lula será vítima do arbítrio e de uma violência jurídica monumental. É preciso, por isso, se perguntar: qual a reação democrática e popular diante deste arbítrio anunciado de antemão?
Uma realidade é inescapável: as instituições, o judiciário e o congresso estão totalmente dominados pelas lógicas fascistas e golpistas.
A soberania popular, a desobediência civil e o direito à insurgência contra toda tirania e arbítrio são dispositivos democráticos do Estado de Direito que precisa ser urgentemente restaurado no Brasil.
GGN

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Do padrão Moro a tragédia do reitor e a de todos nós, por Reginaldo Moraes

Não nos iludamos, esse não é um confronto judicial, é um confronto político. Como se pode cortar as asas desses torturadores de novo tipo, esse Doi-Codi da ‘democracia’? Uma outra ‘redemocratização’ é necessária (Foto Charles Guerra/RBS)
Em meados de 2013, um ano antes do deslanche da Lava Jato, o assim chamado juiz Moro julgou outro processo, ou melhor, um outro evento político mal-travestido de judicial, a operação Agro-Fantasma. Sob alegação de irregularidades no Programa de Aquisição Alimentar, um grande numero de agricultores familiares foram presos. Mas foram declarados inocentes agora, em 2017. Fez-se a justiça, dirão alguns. Será? Afinal, com esses 4 anos de martírio, o processo mambembe destruiu a vida deles e sabotou o próprio programa.
É um padrão, não é um caso isolado. As ações do Sr. Moro não são feitas para durar – elas são como o amor do Vinícius, infinitas enquanto duram. Ou seja, são feitas para destruir algo. Se depois isso é revisto pela justiça, tanto faz, o estrago programado já foi feito.
Nada de novo, porque é esse, rigorosamente, o modo operante da Lava Jato. Para destruir o inimigo político vale tudo: prender até obter a “delação adequada”, divulgar informação falsa ou vazar seletivamente para manchar reputações e provocar julgamentos midiáticos- imediatos, o que for necessário para abater o inimigo e prestar contas aos mandantes.
A tragédia do reitor da Universidade Federal de Santa Catarina parece ser mais um desses episódios. Todos sabem o que ocorreu. Tosco, brutal, chocante. Uma delegada midiática e deslumbrada, deslocada da Lava Jato para chefiar outra operação, pede a uma juíza a prisão do reitor e professores, sob alegação, genérica e vaga, de que eles poderiam (sim, poderiam!) obstruir a justiça. Sempre se encontra um juiz que decida com base em vontades dessa natureza. Os professores foram presos – mesmo antes de qualquer diligência, antes de ouvi-los etc. A operação da delegada tem o nome engraçadinho (mais um) de “Ouvidos Moucos”. O que diremos dos ouvidos dela?
O reitor e os demais professores não foram apenas detidos ou chamados a alguma “condução coercitiva”. Bem mais do que isso, houve algo bem mais grave. Com base nessa vaga alusão, eles foram conduzidos ao xadrez, despidos e humilhados. No dia seguinte, uma juíza releu o processo e mandou soltá-los, pela simples razão de que não havia nenhum motivo comprovado para ter feito a prisão. A prisão sequer deveria ter ocorrido. Não importa, a prisão já tinha provocado o efeito que a delegada parecia desejar: jogara na mídia e na lama os detidos, independentemente de qualquer prova ou mesmo indício.
Requintes de falsidade – da delegada e da mídia, aparentemente. Falou-se em um desvio de “até 80 milhões” ou algo assim. Depois se noticia, com menos alarde, que esse era aproximadamente o valor total do programa supostamente fraudado. Um orçamento de uns dez anos! A diferença encontrada na contabilidade (desvio?) foi algo como 0,5% disso. É isso??? Bom, então estamos falando de uns 40 mil reais por ano – menos do que o salário mensal (acima do teto legal) que recebe o famoso juizinho de Curitiba. Fico me perguntando em qual obra pública ou privada (ou até numa simples administração de condomínio) um percentual desses não aparece? Fácil.
Todos esses episódios, muita gente já viu, compõem um quadro muito mais grave. Um policialismo não apenas “moralista” ou “rigorista”. Uma atribuição de poderes absolutos e absolutamente injustificados a gente que não demonstra o menor equilíbrio para julgar sequer seus filhos adolescentes. Delegados, procuradores, juízes, um sem numero de agentes públicos que passam por cima de qualquer lei ou mesmo qualquer regra de bom senso quando lhes dá na telha.
Pouco importa que nada disso se sustente do ponto de vista legal e que, lá pelas calendas gregas, isto desabe como um castelo de cartas. Nem processo se constitua, tantos os vícios. Pouco importa, porque no prazo imediato os efeitos já se fizeram sentir. E no longo prazo, diz a frase célebre de Keynes, no longo prazo estamos mortos. Neste caso, a frase soa macabra. Porque o longo prazo chegou de imediato, num shopping center.
O mínimo que deveria ocorrer, em tais circunstâncias, é um inquérito sobre delegada, juízes, procuradores que promoveram esse circo. Mas… quem fará tal coisa? E quem irá cobrar, dessa imprensa marrom, a destruição que já fez e que faz todo dia?
Não, não é um problema legal, não se resolverá em tribunais, nem em qualquer “conselho” que “supervisione” o judiciário. Ou de um “puxador de orelhas” para a polícia federal, que aliás, quer ser “independente”, sem responder a superiores! Um poder soberano dentro do Estado.
Não nos iludamos, esse não é um confronto judicial, é um confronto político. E se resolve na política, o espaço em que se combinam a persuasão e a força, necessariamente as duas. Como se pode cortar as asas desses torturadores de novo tipo, esse Doi-Codi da “democracia”? Uma outra “redemocratização” é necessária, porque a anterior, transada e regateada, deu no que deu, uma tutela que muda de farda, mas segue ativa.
Reginaldo Moraes - É professor da Unicamp, pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-Ineu) e colaborador da Fundação Perseu Abramo. É colunista do Brasil Debate.

GGN

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Xadrez das caçadas do rinoceronte por Sérgio Moro, Nassif

Cena 1 – as caçadas de Pedrinho e de Sérgio Moro
A história é de Monteiro Lobato no seu clássico “As Caçadas de Pedrinho”.

O rinoceronte foge do circo e se embrenha no mato. Cria-se um pânico geral e é montada uma força tarefa para caçar o rinoceronte. Em pouco tempo, a força tem centenas de homens nas mais variadas funções. Instala centrais telefônicas, de telégrafo para seus membros de comunicarem.

Por fim, descobrem o rinoceronte vivendo placidamente no sítio do Pica Pau Amarelo. Toca então negociar com a dona do sítio, dona Benta, com a intermediação da boneca Emília.

Decidem deixar o bicho por lá, mas com a condição de se manter o caso sob sigilo. Se soubessem que o rinoceronte estava em paz, o governo teria que desmontar toda a força tarefa criada.

De certo modo, a história reflete a saga de Sérgio Moro e seus companheiros da Lava Jato. Por lei, nem deveriam ser companheiros, mas cada qual na sua, a Polícia federal investigando, o Ministério Público denunciando ou não, e o juiz julgando. Todos se uniram irmãmente na mesma empreitada de caçar o rinoceronte, as provas definitivas contra Lula.

Gastaram energia, manchetes, recursos. Pressionaram testemunhas para delatar, transformaram as delações em manchetes definitivas e, agora, descobrem que o rinoceronte não existe. Não existe a bala de prata, a delação definitiva, a prova irrefutável. O rinoceronte é uma miragem.

E agora? Como fazer com as dezenas de anúncios dizendo que a caça ao rinoceronte estava prestes a se completar, que ele seria encontrado, preso e enjaulado? Foram três anos de caçadas de Moro, de celebrações antecipadas de vitória, de retratos tirados ao lado do rinoceronte morto, na forma de Power Point. E chega-se à conclusão de que o rinoceronte não existe.

Depois de tanto carnaval, não dá simplesmente para chegar ao distinto público e admitir que “foi engano”. Em vez de filé de rinoceronte, iriam exigir ensopado de Moro com molho de fígado de Dallagnol.

Esse é o dilema da Lava Jato, agora que sua hora começa a passar, sem que haja o mínimo sinal de rinoceronte à vista.

Cena 2 – o procurador que viu o rei nu
Ontem, viu-se o primeiro efeito regenerador do Ministério Público Federal (MPF), já sob os eflúvios da nova direção.

Lá atrás, o procurador Ivan Cláudio Marx desmascarou as denúncias de pedaladas contra Dilma Rousseff. Foi massacrado. Na oportunidade seguinte, analisando procedeimentos abertos por conta da delação do ex-senador Delcídio do Amaral, taxou Lula de “chefe de quadrilha”, denotando os efeitos da enorme pressão sofrida com a decisão anterior.

Agora,  solicitou o arquivamento de procedimento investigatório contra Lula, aberto em cima da delação do ex-senador Delcídio do Amaral, Para Ivan Marx, "não se pode olvidar o interesse do delator em encontrar fatos que o permitissem delatar terceiros, e dentre esses especialmente o ex-presidente Lula, como forma de aumentar seu poder de   barganha ante a Procuradoria-Geral da República no seu acordo de delação."

Ivan Marx disse o óbvio. Seguiu estritamente o que manda a lei. Como o menino da fábula, enxergou o rei nu e teve coragem de externar sua opinião. Por que agora, e não lá atrás? Porque o clima mudou. A fada do bom senso começa a baixar sobre o MPF e a corporação se dá conta de que o novo normal instituído pela Lava Jato, era insubsistente, ilegal, atentatórios aos princípios basilares de direito.

Enquanto isto, no Paraná, os procuradores questionam os benefícios concedidos por Sérgio Moro a Renato Duque. Segundo os próprios procuradores, a unica contribuição de Duque foi afirmar que "Lula sabia de tudo", comprovando, agora em casa, a ideia fixa e falta de discernimento jurídico da operação (https://goo.gl/NGuQwQ).

Enfim,  há um vento forte varrendo os dejetos que se acumularam no MPF, no período em que foi presidido por um Procurador Geral pusilânime.

Cena 3 – a lógica dos acordos de leniência
À medida em que vai se retirando as coberturas de vento colocadas pelos jovens deslumbrados da Lava Jato, é possível entender melhor a consistência, os conceitos centrais que fundamentam os institutos dos acordos de leniência e da delação premiada.

Não se pense que Deltan Dallagnol e seus companheiros sejam capazes de alguma sofisticação analítica. O máximo que conseguem extrair das novas doutrinas são gambiarras capazes de se encaixar nas suas narrativas e o uso despudorado do tribunal da mídia para suprir a falta de investigações.

A melhor explicação veio de um advogado, Caio Farah Rodriguez, em artigo para o caderno Ilustríssima, da Folha.

A lógica dos acordos de leniência – firmado com as empresas – é torna-las “cães de guarda” da ética empresarial. A punição pela reincidência é tão grave que, a partir do acordo, a empresa terá que zelar pelo estrito cumprimento da lei internamente, estendendo à toda a rede de fornecedores e clientes. Ela se torna um cão de guarda da legalidade.

Diz Rodriguez:
“Sob esse ângulo, o exemplo mais fecundo para reflexão sobre a Lava Jato não seria tanto a operação Mãos Limpas, na Itália, mas o processo Brown versus Board of Education (Brown contra Junta de Educação), decidido em 1954 pela Suprema Corte dos Estados Unidos. Trata-se do caso mais importante da jurisprudência constitucional americana no século 20”.

Era um caso de segregação e exclusão social. Havia hábitos arraigados de segregação – assim como há hábitos arraigados de corrupção nas relações empreiteiras-poder público.

“Ao reconhecer a uma menina negra o direito de se matricular em um colégio localizado em distrito escolar no qual habitavam apenas brancos, a Suprema Corte considerou não ser suficiente declarar o direito. Orientou cortes inferiores a tomar medidas necessárias para efetivar a promessa constitucional de igualdade na educação, o que incluiu —por intermédio das chamadas ordens judiciais de dessegregação— realocar linhas de ônibus entre distritos escolares, capacitar professores para ensinar em ambiente de maior diversidade, rever bibliotecas etc.

Ou seja, tratou de criar as condições para mudar radicalmente o ambiente que permitia a permanência da segregação.

(...) A partir dessa situação, criou-se uma prática judicial nos EUA (chamada de execução complexa), para além da aplicação típica da lei  a controvérsias específicas. Seu emprego, que contou muitas vezes com o apoio do Poder Executivo, estendeu-se de escolas a hospitais públicos e prisões.

O Direito serviu mais para desestabilizar costumes arraigados do que para refleti-los”.

Por aqui, transformou-se esses instrumentos em um parangolé jurídico, com procuradores unicamente empenhados em instrumentalizar as ferramentas para propósitos político-partidários e de autopromoção.

Cena 4 – o fim do golpe
O golpe do impeachment acabou. Não significa que não haverá ainda consequências. A própria aprovação da nova lei trabalhista é prova disso.

O método e o conteúdo foram tão primários quanto o discurso de ódio que levou multidões às ruas, colocando de joelhos Ministros do Supremo.

Nenhuma multinacional vai investir no país com base nessas reformas.

É evidente que havia necessidade de reformas na legislação trabalhista. Há mudanças enormes no universo do trabalho, novas formas de trabalho, novas organizações.

Mas o caminho seria uma discussão ampla que permitisse um entendimento sobre o trabalho nesses novos tempos, a identificação clara dos pontos vulneráveis nas relações de trabalho e, a partir daí, uma nova legislação erigida em torno de conceitos bem definidos.

Por exemplo, hoje em dia há duas partes fracas na Justiça trabalhista: os empregados de alguns grandes setores e as pequenas e microempresas.

Há um universo regulado nas grandes metrópoles, entre empresas modernas e respectivos sindicatos. Fora dos grandes centros, abusos intermináveis, como é o caso das centenas de denúncias contra a JBS no campo. Nos grandes centros, uma indústria de ações trabalhistas vitimando especialmente pequenos empresários. E, por cima de tudo, novas formas de relações de trabalho, como é o próprio caso da Uber e seus motoristas.

Segundo especialistas, a nova legislação foi montada a golpes de machado.

 Juntou-se um grupo de empresários em uma sala e se perguntava o que incomodava na legislação trabalhista. Alguém apontava um item qualquer que imediatamente era decepado.

O caminho correto seria chamar especialistas para destrinchar as novas formas de trabalho e definir um aparato conceitual que permitisse identificar os pontos de precarização tanto do trabalho como da segurança dos pequenos empresários.

Uma reforma séria deveria obrigar que parte do dinheiro do Sistema S (que é dinheiro de impostos) fosse alocado em programas de defesa e de aprimoramento do trabalho nas pequenas empresas. Grandes empresas nas grandes cidades dificilmente são alvos de ações trabalhistas, porque sabem se locomover no cipoal regulatório. Nada mais justo que as federações empresariais usassem o dinheiro dos impostos que recebem para defender e modernizar as pequenas e micro empresas.

Em vez disso, o que se viu foi a manipulação escandalosa de estatísticas até por Ministros do Supremo, e a transformação do que deveria ser fruto de um novo pacto social, em uma vitória absoluta sobre a outra parte.

Nenhuma multinacional racional irá aportar por aqui por conta das mudanças na legislação trabalhista. Ainda há uma Justiça do Trabalho a zelar por pontos centrais. Qualquer forma de precarização do trabalho, por si, abre espaço para novas demandas trabalhistas, independentemente do que reza a lei.

Em vez de um pacto social, o que a nova legislação promoverá será um boom nas ações trabalhistas por todo o país. A reconquista dos direitos perdidos trará de volta as grandes batalhas campais dos primórdios do capitalismo.

GGN