Demorei
vários dias para escrever sobre o depoimento do ex-presidente Lula ao juiz
Sergio Moro porque entendi, assim que terminei de assistir as quatro horas de
gravação, que estava diante não apenas de um fato de forte impacto na luta
política presente, mas também de uma situação com potencial de se tornar
símbolo de toda uma era.
Então
eu peguei um clássico autor anarquista, Pedro Kropotkin, para me inspirar um
pouco.
“Abaixo
os juízes!”, assim encerra Kropotkin o seu ensaio Lei e Autoridade, no qual
defende que “o primeiro dever de uma revolução é fazer uma fogueira com todas
as leis que existem e com todos os títulos de propriedade”.
Hoje
em dia não acredito mais no anarquismo, que considero utópico demais para meus
gostos, mas seu ceticismo em relação à lei veio-me em boa hora, porque após
tantos anos lutando contra conspirações judiciais, tornei-me quase um blogueiro
(arg!) jurídico.
Não
abandonemos ainda o Kroptokin. É ele que lembra, no mesmo texto, que as leis
menos ruins são aquelas que servem para abolir leis anteriores, e menciona
algumas leis liberais que tanto entusiasmo trouxeram às classes médias
europeias: eleição de juízes e direito do cidadão processar um funcionário
público. Kropotkin cita esses dois pontos, atribuindo-os a uma invenção do
“liberalismo moderno”, com indisfarçada condescendência, visto que os considera
inúteis, já que ele quer mesmo é a abolição de todas as leis. O autor observa
ainda que essas “modernizações” seriam apenas um esforço da burguesia de
resgatar liberdades de que as cidades medievais gozavam no século XII, antes
dos juristas e juízes assumirem o poder e criarem um regime baseado num Estado
quase terrorista do ponto-de-vista penal, com uso de horrorosos métodos de
tortura e castigo.
E
aí ele descreve a figura do juiz moderno, “despido de todo sentimento que faça
honra à natureza humana, vivendo como um visionário num mundo de ficções
legais, recreando-se em administrar prisões e morte, sem suspeitar, na fria
maldade de sua loucura, do abismo de degradação em que caiu aos olhos daqueles
que hão de sofrer o peso de sua condenação”.
Não
lhes parece uma descrição maravilhosa, vívida, de Sergio Moro?
Eu
também achei sumamente divertidas essas passagens de Kropotkin, porque os
nossos liberais, que viviam falando em reduzir o poder do Estado, agora estão
todos ao lado do Estado judicialesco do Brasil, que é o Estado menos liberal,
mais autoritário, o Estado mais puramente estatal que se possa imaginar, porque
distante de qualquer controle democrático e que vê a si mesmo como um poder
intocável, um poder perfeito, absoluto.
O
ministro Luis Roberto Barroso, do STF, a quem chamamos carinhosamente de
“príncipe do Estado de Exceção” é um exemplo desse liberal às avessas, tão
comum na história brasileira. Ao mesmo tempo em que fecha os olhos para um
recrudescimento sem precedentes da repressão policial e da partidarização da
justiça, ele flana por aí ressaltando o papel “iluminista” do judiciário. Ou
então fala, após apoiar uma reforma da previdência que só penaliza os pobres,
ou publicar um artigo defendendo a privatização do ensino superior, que a nova
missão do judiciário é “refundar o país”…
Alguém
deveria lembrar a Barroso que o judiciário, em momento algum da história da
humanidade, representou outro papel a não ser o de porta-voz do autoritarismo e
da violência estatal. Durante séculos, os juízes europeus exerceram o papel de
sádicos e torturadores. Aliás, o jurista italiano Luigi Ferrajoli denunciou
Sergio Moro como um juiz da Inquisição. Como a crítica não apareceu na Globo,
as nossas cortes superiores fingiram que não existiu. A única realidade que
existe, para a elite brasileira, é a que aparece no Jornal Nacional.
Talvez
entre os antigos atenienses, na fase mais radical de sua democracia, tenha
existido juízes menos retrógrados: para que isso ocorresse, todavia, o processo
de seleção de juízes teve de ser democratizado. Os juízes atenienses eram
escolhidos por sorteio (eles consideravam o processo eleitoral muito elitista)
e os cargos duravam apenas um ano. Encerrada sua função, os juízes eram por sua
vez julgados – severamente – por seus atos. Se seus pares achassem que alguma
decisão tomada por eles tinha sido injusta ou excessiva, eles eram punidos
imediatamente.
Mas
não precisamos ir tão longe em nossa análise. Eu queria trazer aqui um autor
moderno, o qual já andamos citando no Cafezinho: Otto Kirchheimer, autor do
livro Political Justice: The use of legal procedures for political ends
(Justiça Política: o uso de procedimentos jurídicos com objetivos políticos).
Esse
é um clássico que elegi como um de meus livros de cabeceira, ao menos enquanto
formos vítimas, no Brasil, dessas odiosas conspirações midiático-judiciais.
Kirchheimer
entende a justiça política como aquela em que tanto o réu como juiz tem
objetivos políticos além da questão estritamente jurídica do processo.
Logo
no início de seu livro, o autor lembra que boa parte dos juristas estão sempre “querendo
negar que exista tal coisa como um julgamento político; dizer que exista tal
coisa, e que acontece com frequência, trazendo consequências graves à
sociedade, aos olhos desses homens puros da Lei Imaculada, equivale a
questionar a integridade das cortes, e a própria moral da profissão do
Direito”.
Entretanto,
Kirchheimer explica que essa (falsa) aparência de neutralidade e imparcialidade
do judiciário é, exatamente, a razão pela qual o processo penal tornou-se uma
arma política tão eficaz.
É
justamente o que observamos com a Lava Jato. A operação é sustentada, e o
próprio juiz responsável por ela já o confessou que o faz deliberadamente, por
uma narrativa midiática. O papel da imprensa na Lava Jato sempre foi essencial,
e por isso mesmo a Lava Jato, para obter resultados, precisa aparecer, junto à
opinião pública, como uma operação puramente técnica, apartidária e imparcial.
A
estratégia não é nova. Kirchheimer observa que a República de Weimar, o regime
que antecedeu o nazismo, foi vitimada por um judiciário muito parecido com o
que estamos assistindo agora.
“A
república de Weimar oferece o exemplo oposto [ao da França, onde a política
tinha preponderância exagerada sobre o judiciário, na opinião do autor] e
igualmente pernicioso espetáculo de um rápido crescimento de um aparato de
justiça semi-independente, intimamente vinculado à Procuradoria Geral da
República e à Suprema Corte. (…) esses profissionais do Direito, sob a máscara
da neutralidade e livres de qualquer interferência externa desenvolveram,
decididamente, critérios partidários próprios na condução de seus
departamentos”.
E
aí o autor explica como o judiciário alemão teve participação ativa na
construção do ambiente que levou o país a submergir nos horrores do nazismo.
“A
maioria dos juízes alemães deu suporte ao governo contra os seus inimigos à
esquerda, mas estabeleceu um padrão consistente de se recusar a pôr freios à
direita. Durante os primeiros e críticos anos da república (1919-1923), isso
consistiu principalmente na falta de vontade de tomar conhecimento da sedição
direitista e planos para derrubar o governo à força; quando agitadores eram
pegos, o judiciário os liberava, ou completamente, ou com sentenças ridículas,
dando-lhes aposentadorias, cobrindo os traços de assassinos da direita, e
limpando suas fichas.”
O
autor nos conta ainda o caso de um procurador da Suprema Corte de Leipzig,
Mr.Jorns, que não apenas fez vista grossa nas investigações contra os
assassinos de Rosa Luxembourg e Karl Liebknecht, como os ajudou expressamente.
Apesar de todas as evidências de que ele havia prevaricado e abusado de seu
poder, a corte suprema alemã enviou o seu caso para um tribunal inferior,
seguido de instruções detalhadas sobre como absolver o “colega”. E ele foi
absolvido.
Algum
tempo depois, Jorns será nomeado o primeiro presidente da Suprema Corte de
Hitler.
Há
um outro trecho do livro de Keichhmer que também reputo interessante para nossa
discussão:
“Juízes
serão vistos como partidários se eles proferirem duras sentenças penais contra
um grupo político, e ao mesmo tempo aliviar a barra de outro grupo, talvez mais
corrupto que o primeiro. Nenhuma questão será levantada, é claro, se a maioria
da comunidade partilhar da inclinação do juiz de olhar o primeiro grupo como
inimigos da ordem social, e o segundo apenas patriotas mal orientados, que
escolheram os amigos errados.”
O
trecho acima me lembrou muito o raciocínio de Merval Pereira, um dos
porta-vozes da Lava Jato, e de todas as conspirações judiciais, na Globo: a
corrupção do PT era muito mais maléfica do que a do PSDB, porque os petistas
trabalhavam para se perpetuar no poder, enquanto os tucanos queriam apenas
juntar um dinheiro extra.
Ayres
Brito, que saiu do STF para assumir uma sinecura da Globo, cansou de defender a
tese de que a corrupção do PT era algo intrinsicamente diabólico, por causa do
famigerado desejo de se “perpetuar no poder”, uma acusação que jamais imprensa
ou ministério público ou judiciário usou contra uma iniciativa tucana
diretamente ligada à uma estratégia de “perpetuação no poder”, que foi o
escândalo da reeleição de FHC.
Hoje
FHC posa de santo, de figura ilibada, e ninguém mais lembra que foi ele o
radical bolivariano que patrocinou, sem plebiscito, sem constituinte, a
patranha de mudar as regras do jogo para si mesmo: instituindo uma reeleição da
qual ele mesmo iria se beneficiar.
Nem
Ministério Público, nem Polícia Federal, nem o STF, jamais pensou em prender
todos os envolvidos naquela operação pela reeleição, e torturá-los com um,
dois, três anos de prisão preventiva, ou ameaças de condenações medievais, de
décadas de regime fechado, em troca de delações.
Outra
história contada por Keichhmeier, e que igualmente me transportou para os dias
de hoje, é o processo envolvendo o presidente da República de Weimar, Friedrich
Ebert, do partido social-democrata.
É
um dos melhores exemplos do uso da justiça para atacar um adversário político
através de uma leitura enviesada do passado. A direita política de hoje, no
Brasil, centrada na mídia e no próprio judiciário, está abusando dessa
ferramenta. Através desse método, busca-se pintar os governos de Lula/Dilma não
como aqueles que inauguraram instrumentos de transparência e combate à
corrupção, que tiraram todas as estatais de um processo de sucateamento deliberado
(porque visando privatizá-las), mas tão somente um partido que “roubava”.
Quando um grupo – e isso também está no livro de Kirchheimer – não encontra um
flanco político vulnerável em seu adversário, ou seja, quando ele não pode
atacar no campo das ideias, então a judicialização é um método muito útil,
porque ele não discute se a “causa” do adversário era nobre. O meu adversário
tinha causas muito nobres, dirá aquele que usa a justiça política, e
efetivamente adotou ações neste sentido, mas o fato é que ele “roubou”.
Não
importa se as gestões na Petrobrás, na Caixa, no Banco do Brasil, no BNDES,
foram espetacularmente democráticas e bem sucedidas, com cada uma dessas
estatais crescendo como jamais haviam crescido em sua história, uma encontrando
as maiores jazidas de petróleo descobertas nos últimos anos, outro ampliando
financiamentos para pequenas, médias e grandes empresas a um nível jamais visto
na história do crédito no país…
Nada disso importa. O que importa é que havia
corrupção! E o que importa não é exatamente combater a corrupção e sim produzir
um espetáculo que corresponda a uma adaga no coração do meu adversário.
Voltando
a história de Ebert, eu quase pude sentir o desespero do presidente
social-democrata diante da manipulação judicial de um processo que o triturava
politicamente, porque expunha todas as suas fragilidades e contradições.
Imaginei que a atmosfera opressiva da Alemanha dos anos 20 deveria ter algumas
semelhanças com o Brasil de hoje.
Aconteceu
o seguinte. Durante uma visita pública a alguma obra do governo, um militante
nazista xingou Ebert de “traidor”. Para um país que acabara de sofrer uma
traumática derrota militar (I Guerra), a palavra devia ter um peso muito forte.
Talvez Ebert não quisesse processar o militante, mas depois que um jornal
nazista publicou o xingamento na capa, ele sentiu que deveria tomar a ofensiva
e levou o caso ao tribunal.
A
imprensa nazista acusava Ebert de ter sido um dos responsáveis pela derrota
militar da Alemanha na I Guerra, porque ele teria participado de uma das greves
gerais que os trabalhadores fizeram ao final do conflito, a partir de janeiro
de 1918, que paralisaram as fábricas de armamentos e outros suprimentos.
Não
era verdade. O partido social-democrata não havia apoiado essas greves, que pipocavam
espontaneamente, sem orientação de sindicatos ou partidos, embora esses logo se
unissem aos movimentos. No início de 1918, a situação da classe trabalhadora
alemã era desesperadora e não havia mais como dar continuidade à guerra. Havia
muitos debates na imprensa em defesa da paz. O partido social-democrata é
convidado, pelo comitê de greve, a enviar um representante, que é o próprio
Ebert. Essa participação de Ebert na greve é a base para as acusações nazistas
de que ele teria sido um “traidor”.
Os
dois juízes responsáveis pelo processo, e o governo perceberia isso apenas mais
tarde, tinham forte afinidade com os nazistas, e trabalharam todo o tempo para
ajudar o partido nacional socialista a usar o julgamento para atacar
politicamente não apenas o presidente, como a própria república. Os nazistas
trouxeram inúmeras testemunhas, a maioria com histórias falsas, para darem
declarações contra Ebert e subsidiarem a imprensa nazista com manchetes
sensacionalistas contra o governo social-democrata.
Ao
cabo, o nazista difamador seria absolvido, por uma sentença em que os juízes
dariam razão a ele, já que ficara “provado” que o presidente tinha, de fato,
participado de greves que prejudicaram o desempenho militar da Alemanha.
Keichheimer
observa que “durante os últimos anos da república de Weimar (1930-1932), quando
a balança de poder estava pendendo rapidamente para a direita, o judiciário não
viu nenhuma razão para mudar a sua jurisprudência política [que já vinha se
inclinando à direita desde o início da república]. Entretanto, no mesmo momento
em que esse movimento empurrava o judiciário a uma posição cada vez mais
partidária, as mais altas autoridades judiciais do país cuidavam zelosamente
para preservar o mito de sua imparcialidade política aos olhos da população.”
Isso
não lembra o Brasil de hoje, com nossos orgulhosos ministros do STF se
esforçando, cada vez mais, para transmitir à população a imagem de que as
“instituições estão funcionando”?
***
Para
finalizar este post, eu gostaria de comentar um outro livro, do qual ouvi falar
através de um artigo no livro Resistência ao Golpe 2016, e que comprei via
Amazon: Towards Juristocracy (Em direção à Juristocracia), de Ran Hirschl. Esse
livro é importante para contextualizarmos o que acontece no Brasil num cenário
maior. As conspirações midiático-judiciais dão certo no Brasil porque elas
estão inseridas numa tendência muito forte do capitalismo contemporâneo, de
transferir poder de legislaturas e executivos para os tribunais, o que é um
movimento atrativo às elites que gozam de melhor acesso e influência no
judiciário. É a mesma tendência que leva o capital a transferir poder para
burocracias “técnicas” que exercem papel central na administração do Estado,
como as que comandam os bancos centrais. O grande capital tem se tornado cada
vez mais hostil à democracia, vista como um risco, um motivo de instabilidade
e, sobretudo, como um estorvo ao esforço de transformar o mundo num grande
banco privado.
Essa
transferência de poder da classe política para uma elite judicial é defendida
por setores da própria política, sobretudo quando querem implementar medidas
que serão mais facilmente aceitas se impostas por uma burocracia supostamente
técnica e imparcial, como o judiciário.
Entretanto,
alerta o autor, “uma vez conferida toda essa autoridade ao judiciário, há o
risco de que os tribunais se transformem num monstro de Frankenstein:
corporações judiciais imprevisíveis e autônomas cujas decisões contrariem os
interesses e as expectativas dos grupos políticos que as defenderam”.
Por
outro lado, Hirschl entende que os tribunais dificilmente se posicionam, por
muito tempo, contra o establishment. As elites políticas que patrocinam essa
migração de poder para o judiciário, esvaziando legislativo e executivo,
geralmente estão confiantes de que possuem os instrumentos que lhes permitam
controlar o monstro.
No
Brasil, é fácil identificar a maneira pela qual a elite poderá controlar o
frankestein judicial: através da mídia, cuja concentração em poucas famílias
garante à mesma elite um poder excepcional de pressão sobre o espírito dos
juízes.
No
depoimento de Lula a Sergio Moro testemunhamos, portanto, um momento
determinante na história mundial das democracias.
De
um lado, um homem, tendo a seu lado uma parte importante da população. Do
outro, a máquina do Estado e da mídia, com todos os seus instrumentos de
controle da narrativa.
Os
últimos movimentos da crise política já deixaram claro, por exemplo, que
estamos vivendo uma espécie de rebelião judicial fascista. É um movimento
inaugurado pela própria Lava Jato, em 2014, e foi ele que levou ao golpe. As
ações parlamentares foram inteiramente articuladas de fora do parlamento,
através de pressões midiáticas e judiciais, seguindo uma agenda política
meticulosa, que levaram ao impeachment.
Essa
agenda permanece. Evidentemente, as ações de um Fachin, derrubando o sigilo dos
vídeos de João Santana e Mônica Moura exatamente um dia após o depoimento de
Lula, visavam produzir um contra-ataque semiótico ao que havia sido uma vitória
narrativa do ex-presidente. A mesma coisa vale para o sequestro de 37
funcionários do BNDES, ordenado pelo mesmo juiz que mandou fechar o instituto
Lula. Foram decisões tomadas como resposta ao depoimento de Lula.
Após
três anos de operação, a agenda política da Lava Jato e de seus apoiadores
ficou evidente. Ela usa as delações para controlar a narrativa e produzir a
atmosfera política que lhe interessa, visando a próxima etapa.
Os
advogados do ex-presidente Lula lhe aconselharam a não viajar à Suécia, onde
ele participaria, nos próximos dias, de um encontro com parlamentares, para
denunciar a perseguição de que é vítima. Disseram que o momento seria
inadequado, porque Sergio Moro está, mais que nunca, com sangue nos olhos para
expedir uma ordem de prisão.
Alguns
agora falam até na possível prisão da presidenta Dilma, com base em provas
forjadas na delação de Mônica Moura.
Enquanto
a mídia organiza o circo romano da Lava Jato, distraindo o público, o Executivo
faz a sua parte, acelerando reformas antissociais que jamais foram alvo de
debate durante eleições.
O
jogo é todo combinado.
De
um lado, a máquina do Estado, liderada por autócratas frios, inconscientes de
sua própria loucura e maldade, apoiados por uma massa de zumbis acéfalos
produzidos por anos de violenta manipulação midiática.
De
outro, a população brasileira, vulnerável, fragilizada, sem mídia, sem justiça,
sem governo, assistindo, perplexa, os novos donos do poder humilharem cada vez
mais seus representantes, ameaçando-os à luz do dia com delações e prisões de
longo prazo, e avançarem, qual vampiros, sobre direitos sociais e individuais
consolidados desde a década de 30.
A
tortura moral e psicológica que a Lava Jato (mídia + judiciário) inflinge à
sociedade brasileira não encontra paralelo em nossa história.
A
campanha de difamação de Getúlio Vargas durou apenas um mês e conseguiu levar
um político experiente ao suicídio. A Lava Jato dura três anos e, mesmo tendo
sido responsável pela mais rápida, devastadora e abrangente destruição
econômica já vista em qualquer país que não vive uma guerra, continua sendo
defendida pela mídia e por seus operadores.
Alguns
setores conservadores da política já temem a Lava Jato porque entenderam que os
instrumentos de controle não estão em suas mãos. Apenas a Globo pode controlar
a Lava Jato. Em dois ou três editoriais, a Globo pressionaria os tribunais a
imporem um freio na operação, mas os Marinho representam interesses muito
distantes de um PSDB, de uma empreiteira, ou mesmo de um banco privado
nacional.
Os
Marinho, quando trocaram
sua dívida por bonds em 2005, em três lotes monstruosos, um de 325,
outro de 300, outro de 200 milhões de dólares, tornaram-se ainda mais ligados
aos interesses corporativos imperialistas. Os donos desses bonds de US$ 825
milhões da Globo são fundos internacionais, alguns dos quais, como a
Brookfield, estão comprando a Petrobrás e a Odebrecht. Com a crise que arrasa o
Brasil, o preço de todos os nossos ativos está ficando cada vez mais baixo.
Sergio
Moro, em palestras, já deixou claro qual é o objetivo: preparar o Brasil para
investidores estrangeiros, que viriam em “3, 4 ou 10 anos”. Rodrigo Janot
completou o raciocínio em Davos, ao dizer que a Lava Jato é “pró-mercado”.
Evidentemente,
porém, ambos estão completamente loucos. Ninguém, em sã consciência, destrói o
seu país para melhor vendê-lo mais tarde. Estamos falando, afinal, de uma
população de 206 milhões de pessoas, com dezenas de milhões de crianças que
precisam comer e estudar e serem tratadas por médicos agora, e não daqui a 10
anos. E que tipo de empresário investirá num país destruído, instável
politicamente, com suas instituições jurídicas completamente tomadas de loucura
autocrática, com uma sociedade adoecida pelo monopólio midiático, vítima de
frequentes e crescentes erupções fascistas?
Do
Cafezinho