Foto: Andre
Bueno/CMSP/Fotos Públicas
Dória: um
prefeito faccioso
A cada dia
que passa, João Dória se revela menos o prefeito de todos os paulistanos e mais
o prefeito de uma facção radical. Prima pelo desrespeito a adversários, a
cidadãos, a sindicalistas, a trabalhadores e ao seu próprio secretariado.
Manifesta uma clara vocação para humilhar os outros. Mais ofende do que agrega;
mais agride do que une. Despreza um princípio que deveria ser cardeal na conduta
de todo governante: promover a concórdia dos governados, a paz e o entendimento
com todos. Como principal magistrado do município, deveria buscar sempre a
mediação racional para resolver os conflitos. Mas faz o contrário: os estimula,
com práticas de arruaça política. Se, pela sua esperteza e inteligência, Dória
deixava dúvidas e esperanças acerca de seu potencial de evoluir para a condição
de um líder político efetivo, aos poucos, pela atitudes agressivas e facciosas
com que se conduz, vai consolidando a impressão de que trilhará cada vez mais o
caminho dos vaidosos e dos inconsequentes.
No contexto
da greve geral que parou o Brasil, Dória verbalizou várias agressões contra
grevistas, trabalhadores e sindicalistas. Classificou-os de preguiçosos e
vagabundos, entre outros tipos de ofensa. Cultiva um solene desprezo pela
alteridade, pelo outro, pela diferença. Vangloria-se de acordar cedo,
definindo-se, desde a campanha eleitoral, como um trabalhador. Esmera-se em
aparecer vestido de gari e de outras fantasias para criar uma imagem de algo
que não é.
Há uma
indignidade na conduta de Dória ao travestir-se, por mero proselitismo
político, de trabalhador. Embora possa acordar cedo, ser hiperativo e trabalhar
muito, pelas categorias analíticas da sociologia e da economia, ele, na
condição de empresário, é um capitalista. Possui meios de produção e aufere (ou
auferiu antes de ser prefeito) a sua renda desses meios.
Trabalhador,
de fato, é um conceito amplo que, de modo geral, indica aquele que vive da sua
força de trabalho, vendendo-a. Nos tempos modernos, trabalhador veio sendo
considerado, legal e formalmente, como aquele que realiza uma atividade a
partir de um contrato de assalariamento, de acordo com a lei, na medida em que
as relações de trabalho foram cada vez mais legalizadas e reguladas pela ordem
estatal. Aqui também está implicada a venda da força de trabalho.
O empresário
ostentação e o capitalista asceta
Definitivamente,
Dória não é um trabalhador. A indignidade desta comparação reside no fato de
que as condições de vida de Dória comparadas com as dos trabalhadores são
drasticamente distintas, brutalmente desiguais. Como empresário e capitalista,
Dória tem um capital declarado próximo dos duzentos milhões de reais. Vive numa
mansão nos Jardins, tem empregados como serviçais e já chegou a ser processado
na Justiça do Trabalho. Dispõe de muitos recursos e meios de vida, de
deslocamento, de fruição em termos de viagens, cultura, lazer, gastronomia etc.
Dispõe de helicóptero e jatinho, segundo noticiário da imprensa.
O verdadeiro
trabalhador não tem nada disso de que o Dória dispõe. Vive uma vida de
sacrifícios e de carecimentos. Se acorda às 4 ou 5 horas da manhã para
trabalhar, não o faz por decisão própria e por prazer, mas porque é obrigado.
Vive cansado, dorme pouco, perde horas no trânsito. O trabalho exaure as suas
forças e energias com o passar dos anos. Chegará à velhice e terá uma
aposentadoria miserável, que será ainda mais precária se a reforma da
previdência, que Dória apóia, for aprovada. Dória não tem por que se preocupar
com aposentadoria, com plano de saúde, com as vicissitudes da velhice. Terá
recursos para enfrentar tudo isto sem o temor de ter uma vida indigna nos
tempos finais da existência.
Enquanto
Dória vive no conforto de uma mansão luxuosa e frequenta a opulência das festas
dos salões dos Jardins, milhões de trabalhadores não têm casa, pagam o aluguel
ou prestações intermináveis da casa própria. Muitas vezes, falta-lhe o pão na
mesa, a alegria nos rostos, o brilho nos olhos, porque suas vidas são de
padecimentos e angústias. Diante dessas e de muitas outras diferenças, Dória
deveria sentir vergonha na cara e não declarar-se mais o "João
trabalhador". Que se declare empresário e gestor, e isto estará
certo.
Já que não
dá para comparar o empresário e capitalista Dória a um trabalhador verdadeiro,
tome-se como termo de comparação o proselitismo e a vanglória que ele faz de si
mesmo por trabalhar muito e acordar cedo, com a conduta e as atitudes de
Antônio Erminio de Morais, conhecido pela sua austeridade, pelo seu
despojamento, por trabalhar mais de 12 horas por dia e ainda por fazer hora
extra no Hospital da Beneficência Portuguesa, já que dedicou boa parte de sua
vida à assistência social.
Ao que se
sabe, Antônio Erminio nunca teve o desplante hipócrita de declarar-se
trabalhador ou mesmo de vangloriar-se por acordar cedo e trabalhar muito. Teve
um estilo de vida marcado pela ascese e foi avesso ao luxo e às festas dos
altos círculos da elite branca dos Jardins. Usava ternos surrados, era
econômico em pares de sapatos por ter apenas dois pés, dirigiu por décadas seu
próprio carro para ir ao trabalho e dispensava seguranças. Sabia que era
empresário e capitalista e honrava a sua condição com humildade, sem a vaidade
e a ostentação de um Dória.
Dória não é
gentil, nem como prefeito e nem como homem.
Ao receber
flores de uma moça, neste domingo, dia 30 de abril, em "homenagem aos
mortos das marginais", ele atirou-as ao chão, faltando com o respeito
tanto com a moça, quanto com os mortos. Com essas atitudes agressivas e
belicosas, ele vai deixando um rastro de perplexidade nos munícipes, que passam
a vê-lo como um arrogante, como um chefete medieval que se considera dono da
cidade. Ao demitir Soninha Francine da Secretaria de Assistência e
Desenvolvimento Social impôs-lhe uma humilhação pública. Passa por cima de
secretários, desrespeitando-os, quase que diariamente.
Declarando-se
fiel a Alckmin, manipula todos os cordões da infidelidade, estimulando sua
candidatura presidencial, seja pela via do MBL, seja nos salões da ostentação
nos Jardins ou seja, ainda, através dos empresários seus amigos do Lide, com a
promessa de abrir-lhes as portas de negócios fabulosos no futuro.
Dória
não mostrou ainda a que veio. Vangloria-se de ter zerado a fila das consultas,
mas os hospitais públicos estão mandando pacientes que precisam de cirurgia
para casa, pois não tem vagas, não tem equipamentos, não tem médicos e nem
remédios. A cidade não está nada linda: esburacada, com semáforos queimados
para todos os cantos e com a violência crescendo assustadoramente. Moradia,
educação e assistência social enfrentam vários problemas. Programas sociais e
culturais vão sendo podados.
O marketing
e o proselitismo podem muita coisa, mas não podem tudo. Aos poucos, os
paulistanos vão caindo na real e percebem que a vida no bairro não mudou ou
está mudando para pior. Banheiros perfumados podem mudar as aparências e o
odor, mas não mudam o esgoto a céu aberto de vários bairros, a falta de
zeladoria e o lixo espalhado. O marketing e o proselitismo político têm data de
validade e o João precisará fazer bem mais do que a ostentação do título de
"trabalhador" se quiser manter parte do seu capital político e
eleitoral e o benefício da dúvida que muitos paulistanos ainda lhe concedem.
Do GGN, Aldo
Fornazieri