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quarta-feira, 12 de setembro de 2018

LULA, HADDAD E O POVO BRASILEIRO - CORDEL

Lula, Haddad e o Povo
Por Reginaldo Veríssimo 

O melhor presidente do Brasil
Sofre vergonhosa perseguição
Estrategista como Virgulino
Lula a Haddad passa a missão
Para salvar o país do confisco
Como dizia o valente Corisco
--Sou um cabra de Lampião
  
--O golpe me encarcerou
Haddad é minha indicação
Uma ideia não se apreende
Por mais fornido grilhão
Não sou nenhum maluco
Sou filho de Pernambuco
Assim como o Lampião

A elite fingida não perdoou
Na minha administração
Negro e índio virou doutor
Pau de arara andou de avião
Na urna ninguém me enfrenta
Haddad hoje me representa
Ele é minha ressurreição
  
Chamam-me de analfabeto
Pelo mundo fui condecorado
Nisto tem muito de inveja
Da rançosa elite do passado
Donde a direita é resultante
Haddad é meu representante
Com ele é golpe noucateado


II. Lula, Haddad e o Povo

Sou uma vítima inocente
Deve ser uma provação
Afastaram-me das ruas
Os golpistas de plantão
FHC e a sua pinguela
Com Haddad e Manuela
Venceremos esta eleição

Amargo uma prisão política
Está mais do que provado
Mesmo sem nenhuma prova
Fui velozmente condenado
Assim recomendo Haddad
Desde o campo até a cidade
Pra nesta eleição ser votado

Jaz um judiciário nocivo
O Direito se fez político
A toga condenou o povo
Trocar trabalho por bico
Haddad traz a esperança
É mais comida na pança
É a mensagem que indico

O golpe segue sua narrativa
Minha ideia voa como pluma
As togas negras recrudescem
Nos tribunais não ganho uma
O TSE nem a ONU obedeceu
Fernando Haddad vai ser eu
A vitória do bem se avoluma

IIILula, Haddad e o Povo

Com os Trópicos agitados
2013 inicio da manipulação
A Democracia se balança
O judiciário avança a mão
O legislativo uma bomba
Onde deputado rir e zomba
Rasgaram a Constituição
  
O fascismo vai ter baixa
O entreguismo cessará
Lula agora é uma ideia
Que se propaga pelo ar
Indica Fernando Haddad
Um cidadão sem maldade
Para esse Brasil restaurar

A nação foi sabotada
O epicentro em Brasília
Forjaram um impeachment
Cunha liderava a matilha
“Com o STF e com tudo”
Esse tribunal ficou mudo
Temer chefia a quadrilha
  
Rapinas o país destruíram
Por desculpas a corrupção
Na verdade os sem votos
Querem mandar na nação
É um desenfreio sinistro
Juiz enquadrando ministro
Só Haddad tem a solução

IV. Lula, Haddad e o Povo

Venderam nosso pré-sal
Queimaram a cê ele tê
Os royalties da educação
As crianças não vão ter
Por isso Lula é Haddad
Com toda a integridade
Para tudo isso reverter

A dilapidação é crescente
A Eletrobrás está na mira
A Embraer foi negociada
Na Globo só sai mentira
Lula disse para Haddad
--Vá e só fale a verdade
Essa é tua ninguém tira

O preço do gás nas alturas
14 milhões sem ocupação
A gasolina sobe todo dia
Pro pobre restou o carvão
E uma carrada de maldade
Por isso Lula traz Haddad
Pra resolver esta questão

Lealdade para mim é verbo
Diz Haddad ao professor
--Tenho formação política
Na academia sou doutor
Direito, Economia e a bula
Aprendi com o velho Lula
Como ser um bom gestor

V. Lula, Haddad e o Povo

Não se esquecer dos pobres
Uma lição que levo a sério
Fui gestor de São Paulo
Na educação, o ministério
Deixei 100 bi de orçamento
Não descuidei um momento
Só com técnica e critério

Haddad é um cara do bem
Diz Lula para sua gente
--Podem votar sem medo
Nesse jovem e inteligente
Vai fazer o que eu disser
Vai empoderar a mulher
Botar o Brasil pra frente

Faremos o Brasil crescer
Para isso não tem estorvo
Vai ser uma nação plural
É Lula, Haddad e o povo
Gerando emprego e renda
Casa ao invés de tenda
É o Brasil feliz de novo

--Do cárcere dou as cartas
Fiz disso a minha missão
Não renuncio a dignidade
Em catedrático dou lição
É Corrida em revezamento
A Política o instrumento
Pra Haddad passo o bastão

Teresina (PI), 07 de setembro de 2018.

sábado, 19 de maio de 2018

O RECADO DAS URNAS E O ERRO DOS ANALISTAS POLÍTICOS, por William Nozaki

A sociedade brasileira está fraturada, (i) mas não no sentido clássico de "direita x "esquerda"; (ii) nem com o nível de polarização radical que se sugere; (iii) tampouco isso pode ser considerado a crise do lulismo. Vejamos cada um desses pontos. 
(i) O golpe fracassou em construir uma agenda para a sociedade e a ampla maioria dos candidatos à presidência não tem um projeto de país. 
Entretanto, a população brasileira tem um projeto de nação, que envolve a defesa da igualdade de oportunidades, o combate aos privilégios e um Estado que garanta educação, saúde, assistência e segurança. Trata-se inegavelmente da reivindicação majoritária por um programa liberal clássico, smithiano. Onde alguns analistas políticos ouvem Roosevelt, a maioria da população talvez esteja dizendo Marshall. 
Na contramão desse processo restam aqueles que convictamente defendem um projeto conservador no campo político-econômico e na esfera da moral e dos costumes. Fazem barulho, mas são minoria. 
Nesse momento, talvez o dístico liberais e conservadores nos seja mais útil do que o par esquerda e direita para compreender para onde está se deslocando a luta de classes nesse processo eleitoral. 
(ii) Se organizarmos a leitura das pesquisas eleitorais pelos termos acima sugeridos, o programa demandado pela sociedade, perceberemos que a amplíssima maioria dos eleitores deseja um projeto de sociedade com mais liberdades e igualdades e menos privilégios e vantagens indevidas. Quando Guilherme Boulos (PSOL) é interrogado sobre o que é o soilcialismo, quando Manuela D'Ávila (PCdoB) é questionada sobre o que é o comunismo, quando Ciro Gomes (PDT) é perguntado sobre o que é seu desenvolvimentismo e quando Lula é questionado sobre o seu "trabalhismo" todas as respostas passam por um mesmo ponto: a igualdade de oportunidades. Uma agenda, a propósito, que também tem a adesão de uma parcela dos eventuais eleitores de Marina Silva (Rede) e de Joaquim Barbosa (PSB), por isso esses candidatos tem tido melhor desempenho nas pesquisas. 
A sociedade não-organizada enxerga mais as proximidades entre essas figuras do que as diferenças, na direção oposta do que desejam os partidos e militantes organizados.

Nesse sentido, a polarização social não pode ser lida como um mecânico "fifty-fifty", há uma hegemonia da defesa da igualdade de oportunidades contra uma minoria que defende a naturalização da desigualdade e o silenciamento das diferenças. Por isso o processo eleitoral deve ser tratado com muita responsabilidade pelas forças progressistas. 
(iii) Esse cenário, em última instância, é resultado das transformações sociais provocadas pelos próprios governos do PT. A população não aceita perder certos direitos e políticas públicas que asseguraram algum nível de meritocracia e que combateram algum nível de privilégios. A população não aceita mais o bloqueio de certos direitos civis e liberdades individuais. E por ter tido sua subjetividade construída nessa cultura política é que agora essas pessoas não se manifestam nas ruas, mas nas urnas. 
Foi assim que o lulismo ensinou e nesse sentido o lulismo venceu, ele é hegemônico na sociedade brasileira. Resta saber se as lideranças partidárias do campo progressista terão paciência, frieza e discernimento para não perderem esse ativo eleitoral incomparável.
Não é democrático lutar contra o desejo da maioria. Fingir não enxergar o problema, não vai fazer o problema desaparecer: ou as forças progressistas passam a destacar mais suas convergências do que suas divergências ou o que sobra da democracia brasileira terminará de ruir. 
Do GGN

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

A bestialização do povo brasileiro, por Fornazieri

Diante do fracasso histórico dos setores progressistas e de esquerda é forçoso reconhecer que eles mesmos foram co-artífices desse fracasso e que contribuíram significativamente para com a manutenção das subalternidade das classes populares à hegemonia das elites econômicas e políticas do país. Em outras palavras: contribuíram para com a manutenção do povo brasileiro na condição de bestializado.
​Como se sabe, a ideia de um povo bestializado foi criada pelo jornalista, jurista e político Aristides Lobo no contexto da passeata militar que proclamou a República. Ao testemunhar aquela passeata, comandada por um marechal monarquista, Lobo escreveu: "O povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem saber o que significava". A coisa do povo - a res publica - nascia, desta forma, sem povo. Pior ainda, nascia sem povo, sem armas e sem terras, logo após a Abolição, levada a efeito por uma princesa que era mais uma carola de sacristia do que propriamente uma estadista.  
Assim nascera também a Independência, emergida de um grito abestalhado do filho do monarca metropolitano . O novo país que nascia não era soberano, mas uma extensão da Coroa portuguesa. Note-se ainda que todas as revoltas pré-independência se definiram por duas características: ou eram conspirações de pequenos grupos ou tinham uma dimensão popular, mas localizada e isolada em determinadas províncias. Nunca houve um movimento nacional-popular que construísse um sentido de unidade de um povo. O único movimento que conseguiu imprimir uma dimensão nacional-popular, mesmo que parcial, foi a Revolução de 1930 e varguismo.
Mas o varguismo foi também uma via estatal de modernização, assim como foi a redemocratização de 1945, o golpe militar de 1964, a campanha das diretas com seu desfecho no Colégio Eleitoral, a Constituinte e, finalmente, os governos petistas. Todos esses processos, alguns com sentido contrário aos outros como foi o caso do golpe militar, buscaram a modernização do país e a mudança pela via do Estado, pelo alto, com negociações e conciliações com as elites. As chamadas classes populares nunca tiveram um protagonismo. A nova Constituição não significou uma refundação democrática e cidadã do Brasil, pois o povo não foi chamado a se pronunciar acerca dela por meio de um referendum. O povo nunca foi o sujeito constituinte da soberania nacional.
Ao se fazer essas constatações de natureza histórica não se pretende menosprezar as importantes contribuições do varguismo, do antigo PTB e do PT em avanços sociais. O que se quer dizer é que, mesmo com esses avanços, a derrota histórica dos progressistas e das esquerdas não pode não ser assinalada. E mais do que isto: o que se quer dizer é que os progressistas e as esquerdas adotaram estratégias que podem ser inseridas no conceito de revolução passiva, elaborado por Antônio Gramsci a partir de um livro de história da Revolução Napolitana de 1799, escrito por Vincenzo Cuoco.
Mudança de Estratégia
Em síntese, Gramsci entende por revoluções passivas todos os processos de transformação que podem vir por reformas, guerras, golpes etc., sem passar por uma revolução política de tipo "radical-jacobina". Isto quer dizer: sem uma participação efetiva das classes populares que, desta forma, não criam uma vontade coletiva nacional-popular. Em outras palavras: não há um processo constituinte, da sociedade contra o Estado, de um povo com consciência nacional. Assim, muitas revoluções têm um caráter restaurador e muitos governos progressistas terminam fracassando, abrindo as portas para a restauração conservadora. No Brasil, sequer houve uma reforma agrária radical-jacobina tal como ocorreu na França. As mudanças que ocorreram no campo ficaram muito aquém do próprio processo de distribuição de terras que ocorreu nos Estados Unidos.
Quando setores populares e progressistas participaram dessas tentativas modernização, fracassaram. Fracassaram com Vargas, com Jango, com as Diretas, com a Constituinte e com os governos do PT. Os momentos subsequentes a esses governos foram restaurações conservadoras. A singularidade desses governos, partidos e movimentos é que sempre buscaram atuar mais no Estado do que na sociedade civil e nos movimentos sociais. Nos momentos dos embates e de ruptura dos débeis processos democráticos não tinham força para resistir, não tinham força para impor um momento "radical-jacobino".
Tudo isto indica que as esquerdas estão adotando estratégias erradas ou parciais. Não há como sustentar reformas e mudanças mais radicais sem conseguir que as classes populares e os movimentos sociais se articulem em organizações consistentes da sociedade civil, sofram um processo de mudança de cultura e de consciência por um intenso trabalho crítico e formativo e se tornem o centro das lutas e  das mobilizações políticas. Não há como criar uma vontade coletiva nacional-popular, adverte Gramsci, sem que os diversos grupos sociais urbanos e do campo irrompam na vida política.
Os progressistas e as esquerdas não conseguem tirar as camadas subalternas da hegemonia das elites conservadoras que permitem apenas definir as lutas no campo do corporativismo e, mesmo assim, com um recorrentes recuos na garantia de direitos. Gramsci preconiza que a luta anti-hegemônica e a construção de uma nova hegemonia requer uma reforma intelectual, cultural e moral associada a um programa de reforma econômica. Os partidos e os movimentos devem subverter "todo o sistema de relações intelectuais e morais", retirando o povo de sua condição de "massa de manobra", de bestializado.
A impotência dos partidos progressistas e de esquerda de promoverem uma reforma intelectual, cultural e moral, articulada com um programa de reforma econômica, abriu o campo das periferias para que as igrejas evangélicas e pentecostais fizessem a reforma religiosa. A reforma religiosa conduz as massas periféricas para uma condição de subalternidade ainda mais aguda, mais conservadora, aprofundado sua condição de "massa de manobra", que se entrega a líderes, a partidos e a governos retrógrados, anti-sociais e anti-direitos.
Os partidos e movimentos sociais progressistas e de esquerda precisam ser ativos e atuantes nessa disputa de concepções de mundo e de valores através da propaganda, formação e organização dos vários grupos e segmentos sociais. Sem a criação desse terreno propício ao desenvolvimento de uma vontade e de uma força politicamente ativa nacional-popular o Brasil terá seu futuro condenado e nenhuma transformação modernizadora de sentido progressista se fará efetiva. Os campos largos da periferia ficarão a mercê da reforma religiosa conservadora e do crime organizado. Os joãos trabalhadores da demagogia e do charlatanismo e outras expressões autoritárias terão um terreno fértil para colher votos e vitórias eleitorais.
Aldo Fornazieri - é Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP).
Do GGN 

sábado, 8 de julho de 2017

#SomosTodosJuízes ou a “pátria de toga”, por Rubens Casara

Linchamento ocorrido no Brasil em 2015 que vitimou Cleidenilson Pereira Silva. Foto: Biné Morais

 1 – Apresentação do Problema
Era uma vez, um tempo em que o brasileiro se orgulhava de conhecer como ninguém a beleza, as estratégias e os segredos do futebol. Esse tempo passou, talvez em razão da transformação dos campeonatos brasileiros em mercadoria (e de qualidade ruim), talvez diante da ferida narcísica provocada pela derrota para a Alemanha na última Copa do Mundo. Hoje, abandonada a sensação de que todo brasileiro entende de futebol, o Brasil tornou-se a pátria dos juízes. Os duzentos milhões de técnicos de futebol tornaram-se duzentos milhões de especialistas em direito, duzentos milhões de juízes prontos para julgar com celeridade fatos e pessoas. Todos se sentem habilitados a julgar e, enquanto isso, os juízes profissionais, aqueles concursados ou indicados para exercer a jurisdição estatal, tornaram-se protagonistas da vida política brasileira (alguns falam em efeito colateral do ativismo judicial, outros em hegemonia do “partido da justiça”).

O que interessa neste texto é analisar a “pátria de toga” à luz da formação cultural desses milhões de julgadores. Em uma sociedade de “juízes” forjados em uma tradição autoritária, os julgamentos serão sempre marcados pelo autoritarismo. E o Brasil, até agora, fracassou na missão de construir uma cultura democrática e isso repercute no teor dos julgamentos.

Os brasileiros, de um modo geral, acreditam no uso da violência para resolver os mais variados problemas sociais e, em consequência, apostam e apresentam respostas violentas como a solução para qualquer situação problemática. Não há que se estranhar, pois, o aumento do número de agressões a pretexto de fazer “justiça”, com especial destaque para os linchamentos tanto físicos quanto virtuais, tanto nas ruas das cidades quanto nas redes sociais. Em uma sociedade de milhões de juízes que foram levados a acreditar que os direitos e garantias fundamentais são obstáculos transponíveis à eficiência repressiva do Estado ou aos lucros dos empreendedores (e até os explorados, hoje, acreditam ser empreendedores), os julgamentos tendem a desconsiderar os limites civilizatórios.

Em apertada síntese, pode-se afirmar que uma cultura autoritária produz julgamentos autoritários, nos quais se verifica não só forte aderência aos valores da classe média (valores produzidos – vale frisar – em favor da elite econômica), mesmo quando esses valores estão em oposição à normatividade constitucional, como também o recurso à simplificação da realidade e ao pensamento estereotipado. Nos julgamentos do dia-a-dia cresce a tendência a explicações hipersimplistas de eventos humanos hipercomplexos; a reflexão é demonizada em tempo de anti-intelectualismo, típico de momentos autoritários. No país de duzentos e oito milhões de juízes verifica-se uma preocupação em afirmar desproporcionalmente os valores “força” e “dureza”, em manifestações de hostilidade generalizada, com muito cinismo e a desconsideração dos valores atrelados à dignidade da pessoa humana.

Mas, para além da tradição autoritária que condiciona os julgamentos do dia-a-dia, o problema é ainda mais grave. Basta lembrar que, não raro, esses julgamentos que se dão nas ruas, sem informação suficiente e por pessoas sem formação jurídica ou mesmo democrática, passaram a influenciar os julgamentos dos juízes profissionais (dos funcionários públicos a que se reserva o exercício da jurisdição estatal), inclusive nos tribunais superiores. Muitos juízes passaram a justificar suas decisões a partir da necessidade de “ouvir as ruas”, de ouvir a opinião dos milhões de juízes sem toga em seus sofás. Com isso, progressivamente o caráter contramajoritário da função jurisdicional, necessário ao modelo de democracia constitucional, passou a ser abandonado.

Nas democracias constitucionais, marcadas por limites rígidos ao exercício do poder, a “voz das ruas”, a “opinião pública” e as “maiorias de ocasião” não são suficientes para afastar os diretos e garantias fundamentais de qualquer pessoa concreta, culpado ou inocente, amado ou odiado. Em outras palavras, na democracia constitucional o principio da maioria (ou a percepção do juiz acerca da “voz das ruas” ou do “clamor popular”) não se sobrepõe à normatividade extraída da Constituição da República, dos tratados e das convenções internacionais que reconhecem direitos humanos.

Neste pequeno artigo, a proposta é analisar a mudança que parece ocorrer na atuação do juiz brasileiro, que estaria a abandonar o modelo racional e eticamente regrado de apuração dos fatos para aderir à lógica de uma espécie de “cognição mística radicada nas vísceras comunitárias” (Cordero). A hipótese assumida aqui é a de que o recurso às “vísceras comunitárias” estaria a serviço de justificar decisões a partir das convicções dos atores jurídicos (muitas vezes, certezas delirantes do julgador), ainda que essa convicção se revele afastada do acervo probatório ou em desatenção aos limites constitucionais, éticos ou epistêmicos.

2 – Dos Ordálios à “voz do povo”
Com as invasões bárbaras, tornou-se comum no Ocidente um instrumento usado para resolver controvérsias de todo o tipo: o ordálio. Pode-se, em certo sentido, afirmar que os ordálios constituíram uma espécie de sistema probatório composto de uma variedade de técnicas (duelo judicial, prova d`água, caldeirão fervente, etc.) que poderiam ser utilizadas em cada situação, a depender das tradições locais e, em alguns casos, da vontade das partes ou mesmo do juiz.

Alguns afirmam que os ordálios eram meios de prova irracionais. Isso não parece estar correto, como percebeu Taruffo. Os ordálios obedeciam a uma lógica racional, funcional e amplamente aceita no contexto (dominado pelo enchantment) em que eles eram utilizados: o divino podia e diria a verdade para solucionar um conflito. Na realidade, pode-se afirmar que o ordálio era tido como a liturgie d`um miracle judiciaire (Jacob).

Em um contexto de profunda fé religiosa, os ordálios eram a prova de que Deus estava presente nas disputas judiciais, sempre que outros meios se revelavam insuficientes para por fim à controvérsia. O ordálio caracterizava-se por ser decisivo e o seu resultado, as consequências positivas ou negativas da prova (então, mais um desafio do que um elemento de cognição), sempre claro e incontrastável (como duvidar da resposta fornecida por Deus?). Após o órdálio, não havia mais dúvida possível, Deus definia a parte vencedora.

O declínio do recurso aos ordálios, ao que parece, coincide com profundas mudanças na sociedade, e em especial nas práticas judiciárias. Passou-se a acreditar que a verdade dos fatos, a solução justa para uma determinada controvérsia, podia e devia ser apresentada a partir de condutas humanas e não mais por revelações divinas. Do ponto de vista teológico, aderiu-se à tese, já presente em São Tomás de Aquino, de que não se deveria desafiar Deus a resolver matérias que a razão humana poderia dar conta.

Michele Taruffo aponta o surgimento de “caminhos divergentes” após o declínio dos ordálios. Na Inglaterra e no Continente Europeu, o fim dos ordálios produziu consequências diferentes. Na Inglaterra, esse declínio guarda conexão com a consolidação do jury trial. Enquanto isso, na Europa Continental, a probatio substituiu a divinatio, com o aparecimento de novos meios de prova (apresentados como “racionais”), voltados a descoberta da verdade dos fatos (a principal técnica era a inquisitio), que passaram a ser geridos, no mais das vezes, por juízes profissionais.

Na Inglaterra (e de lá para o mundo anglo-saxão), o Júri se consolidou como o principal método à resolução dos conflitos postos à apreciação judicial. Os jurados, antes “testemunhas dos fatos” e depois “juízes do fato”, tornam-se autores de um veredicto imperscrutável (e nesse particular, se assemelha à solução alcançada pela via dos ordálios). É importante lembrar que o juramento solene dos jurados, que ainda hoje se faz presente, invoca a intervenção de Deus no julgamento. Pode-se afirmar que o jury trial, construído como uma garantia individual contra a opressão do poder, busca nas “vísceras comunitárias” a legitimidade dos julgamentos (o que no sistema dos ordálios era obtido mediante a evocação divina).

No modelo originado na Europa Continental, e em princípio adotado no Brasil, procurou-se abandonar os ordálios em uma tentativa de “racionalizar” a busca pela verdade como condição para a realização do valor justiça. O “mito de Deus” acabou substituído pelos mitos da “razão” e da “ciência”. Nesse modelo, os julgamentos têm por base a reconstrução dos fatos através de meios probatórios admitidos na legislação, razão pela qual tanto a “divindade” quanto a “voz das ruas” ou as “vísceras comunitárias” mostram-se estranhas à solução justa dos casos postos à apreciação do Sistema de Justiça. A “verdade” é elevada à condição de legitimidade dos julgamentos e, ao mesmo tempo, as garantias processuais e demais direitos fundamentais, limites jurídicos e éticos ao exercício do poder, passam a funcionar como condições de legitimidade da busca da verdade.

Em apertada síntese: enquanto no modelo europeu-continental (civil law) a verdade dos fatos é tida como um dos principais escopos do processo, no modelo de common law a confiança na correção e na justiça do veredito dos jurados baseia-se no fato dele ser formulado por pessoas que retratam a vox populi (nesse sentido, por todos, Taruffo).

Costuma-se aproximar a “voz do povo” do princípio majoritário. Este, por sua vez, costuma ser apontado com uma manifestação necessariamente democrática. Trata-se de uma concepção que identifica a vontade da maioria (ou, ao menos, a “voz do povo”) com a democracia. Não faltam exemplos históricos de que essa visão é equivocada. Basta pensar na maioria alemã que levou Hitler ao poder e apoiou o projeto nazista ou na maioria dos estadunidenses que apoiava a segregação racial. A democracia e a justiça, coo se percebe, não guardam relação com a opinião das maiorias.

Em princípio, decisões que buscam legitimidade a partir da “voz do povo”, isso é, a partir da opinião (algo da ordem da doxa) dos milhões que se consideram aptos a fazer julgamentos no Brasil, não se mostram sensíveis a limites, sempre que os limites se revelem incompatíveis com o princípio majoritário. Em outras palavras: levar em consideração a “voz do povo” nas decisões judiciais, muitas vezes, vai significar a violação dos limites jurídicos, éticos e epistêmicos (e aqui não se esta problematizando a questão do significado da expressão “voz do povo”). Nada assegura que a “voz do povo” retrate a verdade ou produza justiça.

Registre-se que nos Estados Unidos da América, o trial by jury, pensado como uma garantia contra o poder (a voz Populi em defesa das garantias individuais), vem sendo substituído por técnicas da chamada “justiça negocial” (bargain), adequadas à razão neoliberal, que faz com que todos os valores (verdade, liberdade, etc.) sejam tratados como meras mercadorias (negociáveis, portanto).

III – O Brasil da voz autoritária
No Brasil, apesar da adesão inicial ao modelo europeu-continental, verifica-se, nos últimos anos, a incorporação de institutos, práticas e modos de ver o Sistema de Justiça cunhados para o modelo anglo-saxão. Esse fenômeno, todavia, ocorreu sem a incorporação dos correlatos limites à atividade das partes, à produção e à valoração das provas. Com isso, a vox populi foi elevada a fator decisório, mas sem a dimensão de garantia que existia no modelo do Júri. Mas, qual é a “voz das ruas” que passou a justificar as decisões no Brasil? Uma vox populi selvagem, sem limites, desconstituinte e autoritária.

No Brasil, para satisfazer “as vísceras comunitárias” e atender à “voz das ruas”, atores jurídicos passaram a desconsiderar direitos e garantias fundamentais, vistos não como conquistas civilizatórias, mas como obstáculos à eficiência do Estado. No lugar da busca pela verdade (respeitados os limites jurídicos e éticos), surgem construções narrativas adequadas ao que o julgador afirma ser a “voz das ruas”, mas que muitas vezes não passa de uma estratégia discursiva para decidir contra a lei ou a doutrina.

Muitas sentenças passaram a assumir como “verdade” o que é uma mera possibilidade. São acolhidas as versões que vão ao encontro das convicções dos atores jurídicos (e dos milhões de julgadores), mesmo que os fatos afirmados não encontrem respaldo nas provas produzidas ao longo do processo. Aliás, se verifica uma mutação na valoração da prova: a prova vista como positividade (a “boa prova”, a informação útil, etc.) é apenas aquela que confirma a hipótese já assumida como verdadeira pelo julgador ou pela “voz das ruas”. A verdade judicial passa a ser aquilo que o juiz afirma ser “verdade” a partir de “convicções” prévias (leia-se: preconceitos e pré-compreensões), mesmo que inexista prova nesse sentido (ressuscitou-se a máxima de viés autoritário: auctoritas facit veritas).

Em nome da “voz das ruas”, a natureza contramajoritária da função jurisdicional acaba por desaparecer, o que representa risco concreto aos direitos das minorias e facilita a opressão estatal. Como já se disse no início deste texto: sociedades autoritárias, produzem decisões autoritárias. Escutar a vox populi em um contexto autoritário equivale a abandonar não só o modelo de democracia constitucional como também qualquer pretensão de verdade e justiça.
     
Rubens Casara é Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais, Juiz de Direito do TJ/RJ e escreve a Coluna ContraCorrentes, aos sábados, com Giane Alvares, Marcelo Semer, Marcio Sotelo Felippe e Patrick Mariano.

GGN

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Aldo Fornazieri: Um país que não tem dignidade não sente indignação pelos malfeitos de quem quer que seja

Foto Ubes

O presidente da República foi flagrado cometendo uma série de crimes e as provas foram transmitidas para todo o país. Com exceção de um protesto aqui, outro ali, a vida seguiu em sua trágica normalidade. Em muitos outros países o presidente teria que renunciar imediatamente e, quiçá, estaria preso. Se resistisse, os palácios estariam cercados por milhares de pessoas e milhões se colocariam nas ruas até a saída de tal criminoso, pois as instituições políticas são sagradas, por expressarem a dignidade e a moralidade nacional.

Aqui não. No Brasil tudo é possível. Grupos criminosos podem usar das instituições do poder ao seu bel prazer. Afinal de contas, no Brasil nunca tivemos república. Até mesmo a oposição, que ontem foi apeada do governo, dá de ombros e muitos chegam a suspeitar que a denúncia contra Temer é um golpe dentro do golpe. Que existem vários interesses em jogo na denúncia, qualquer pessoa razoavelmente informada sabe. Mas daí adotar posturas passivas em face da existência de uma quadrilha no comando do país significa pouco se importar com os destinos do Brasil e de seu povo, priorizando mais o cálculo político de partidos e grupos particulares.

O Brasil tem uma unidade política e territorial, mas não tem alma, não tem caráter, não tem dignidade e não tem um povo. Somos uma soma de partes desconexas. A unidade política e territorial foi alcançada às custas da violência dos poderosos, dos colonizadores, dos bandeirantes, dos escravocratas do Império, dos coronéis da Primeira República, dos industriais que amalgamaram as paredes de suas empresas com o suor e o sangue dos trabalhadores, com a miséria e a degradação servil dos lavradores pobres.

Índios foram massacrados; escravos foram mortos e açoitados;  a dissidência foi dizimada; as lutas sociais foram tratadas com baionetas, cassetetes e balas. A nossa alma, a alma brasileira, foi ganhando duas testuras: submissão e indiferença. Não temos valores, não temos vínculos societários, não temos costumes que amalgamam o nosso caráter e somos o povo, dentre todas as Américas, que tem o menor índice de confiabilidade interpessoal, como mostram várias pesquisas.

Na trágica normalidade da nossa história não nos revoltamos contra o nosso dominador colonial. Ele nos concedeu a Independência como obra de sua graça. Não fizemos uma guerra civil contra os escravocratas e não fizemos uma revolução republicana. A dor e os cadáveres foram se amontoando ao longo dos tempos e o verde de nossas florestas foi se tingindo com sangue dos mais fracos, dos deserdados. Hoje mesmo, não nos indignamos com as 60 mil mortes violentas anuais ou com as 50 mil vítimas fatais no trânsito e os mais de 200 mil feridos graves. Não nos importamos com as mortes dos jovens pobres e negros das periferias e com a assustadora violência contra as mulheres. Tudo é normal, tragicamente normal.

Quando nós, os debaixo, chegamos ao poder, sentamos à mesa dos nossos inimigos, brindamos, comemoramos e libamos com eles e, no nosso deslumbramento, acreditamos que estamos definitivamente aceitos na Casa Grande dos palácios. Só nos damos conta do nosso vergonhoso engano no dia em que os nossos inimigos nos apunhalam pelas constas e nos jogam dos palácios.

Nunca fomos uma democracia racial e, no fundo, nunca fomos democracia nenhuma, pois sempre nos faltou o critério irredutível da igualdade e da sociedade justa para que pudéssemos ostentar o título de democracia. Nos contentamos com os surtos de crescimento econômico e com as migalhas das parcas reduções das desigualdades e estufamos o peito para dizer que alcançamos a redenção ou que estamos no caminho dela. No governo, entregamos bilhões de reais aos campões nacionais sem perceber que são velhacos, que embolsam o dinheiro e que são os primeiros a dar as costas ao Brasil e ao seu povo.

No Brasil, a mobilidade social é exígua, as estratificações sociais são abissais e não somos capazes de transformar essas diferenças em lutas radicais, em insurreições, em revoltas. Preferimos sentar à mesa dos nossos inimigos e negociar com eles, de forma subalterna. Aceitamos os pactos dos privilégios dos de cima e, em nome da tese imoral de que os fins justificam os meios, nos corrompemos como todos e aceitamos o assalto sistemático do capital aos recursos públicos, aos orçamentos, aos fundos públicos, aos recursos subsidiados e, ainda, aliviamos os ricos e penalizamos os pobres em termos tributários.

Quando percebemos os nossos enganos, nos indignamos mais com palavras jogadas ao vento do que com atitudes e lutas. Boa parte das nossas lutas não passam de piqueniques cívicos nas avenidas das grandes cidades. E, em nome de tudo isto, das auto-justificativas para os nossos enganos, sentimos um alívio na consciência, rejeitamos os sentimentos de culpa, mas não somos capazes de perceber que não temos alma, não temos caráter, não temos moral e não temos coragem. 

Da mesma forma que aceitamos as chacinas, os massacres nos presídios, a violência policial nos morros e nas favelas, aceitamos passivamente a destruição da educação, da saúde, da ciência e da pesquisa. Aceitamos que o povo seja uma massa ignara e sem cultura, sem civilidade e sem civilização. Continuamos sendo um povo abastardado, somos filhos de negras e índias engravidadas pela violência dos invasores, das elites, do capital, das classes políticas que fracassaram em conduzir este país a um patamar de dignidade para seu povo.

Aceitamos a destruição das nossas florestas e da nosso biodiversidade, o envenenamento das nossas águas e das nossas terras porque temos a mesma alma dominada pela cobiça de nos sentirmos bem quando estamos sentados à mesa dos senhores e porque queremos alcançar o fruto sem plantar a árvore. Se algum lampejo de consciência, de alma ou de caráter nacional existe, isto é coisa restrita à vida intelectual, não do povo. O povo não tem nenhuma referência significativa em nossa história, em algum herói brasileiro, em algum pai-fundador, em alguma proclamação de independência ou república, em algum texto constitucional em algum líder exemplar.

Somos governados pela submissão e pela indiferença. Não somos capazes de olhar à nossa volta e de perceber as nossas tragédias. Nos condoemos com as tragédias do além-mar, mas não com as nossas. Não temos a dignidade dos sentimentos humanos da solidariedade, da piedade, da compaixão. Não somos capazes de nos indignar e não seremos capazes de gerar revoltas, insurreições, mesmo que pacíficas. Mesmo que pacíficas, mas com força suficiente para mudar os rumos do nosso país. Se não nos indignarmos e não gerarmos atitudes fortes, não teremos uma comunidade de destino, não teremos uma alma com um povo, não geraremos um futuro digno e a história nos verá como gerações de incapazes, de indiferentes e de pessoas que não se preocuparam em imprimir um conteúdo significativo na sua passagem pela vida na Terra. 


Do GGN, por Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e Política.

sábado, 13 de maio de 2017

A miopia cultural impede o brasileiro de vê a Mídia como ator político decidindo seus próprios interesses ao ivés do coletivo

Por que o brasileiro não vê a Mídia como ator político?
O fim do principal entrave para o país não é necessariamente o fim das Organizações Globo, mas o contexto na qual ela se alimenta. Um país com pouca fome de cultura democrática, e acostumado a fazer piada com tudo como se isso fosse um traço de genialidade dado por Deus, estará sempre fadado a seguir orientações de qualquer que seja a mídia de massa dominante.

Um traço particular não só do brasileiro, mas de muitas outras nacionalidades, é a incapacidade de enxergar a Mídia como agente politico, com seus próprios interesses, com suas próprias aspirações de se perpetuar.  A maior parte das tentativas de alerta são geralmente ridicularizadas. A palavra consipração é a maior amiga do Status Quo por que ela neutraliza questionamentos pela via da acusação de paranóia, de fanatismo esquerdista, entre outras bobagens.

Parece crescer o consenso de que a Globo é a maior inimiga do Brasil, isso é sedutor devido ao longo histórico de desserviço dessa emissora para o Brasil. Mas ela, a Globo, sabe de algo que talvez ainda não tivessemos atinado, o brasileiro em geral só consegue distinguir as partes de um embate quando elas são diametralmente opostas. Isso significa que, para que o Brasil começar a enxerga a Globo como agentes politico atuante, será preciso que nós deixemos de acreditar que só porque chove no Deserto ele não é predomeninate seco.

A metáfora das chuvas no deserto se enquandra no modus operandi da Mídia tupiniquim, e como ela faz da falta de percepção dos brasileiros seu maior trunfo para acabar com qualquer projeto inclusivo de país. Basta que depois de uma bateria de notícias negativas sobre o país ela, a Mídia, pingue algumas gotas de otimismo para que a ignorância brasileira passe a acreditar na sua imparcialidade, que ela bate nos dois lados. Assim como basta que a Mídia noticie algo negativo sobre Aécio, Temer, Dória, ou qualquer um que não lembre vermelho, para que os fanáticos encontrem suporte para combater a narrative progressista de que a Mídia manipulou o povo para dar o Golpe, ou mesmo que a Lava-Jato não persegue o Lula. Ou seja, basta uma chuva, uma breve garoa, para que a condição dominante de parcialidade seja transformada em imparcialidade no cérebro brasileiro médio.

Esse tipo de estratégia, chuvas no deserto, para disfarçar uma posição dominante, é também usada no braço de humor da Veja, o Sensacionalista. A ideia de “bater em todos” e as piadas que garante o obscurantismo são parte do jogo de esconder um viés. É o acumulado que interessa, é a posição dominate que interessa, mas para milhares de brasileiros, bastou fazer piadas com todos os lados para voltarmos a estaca zero da aparente imparcialidade. Isso é desolador.

Não há o que fazer quando as pessoas são incapazes de detectar vieses. A globo pode sumir do mapa que rapidamente aparecerá um grupo tão ou mais esparto sabendo explorar essa deficiência nata de perceber a Mídia como agente politico.  Até o momento, a operação chuvas no deserto vem garantindo que a corda da Globo não arrebente totalmente. Por exemplo, os patos amarelos que foram as ruas com a FIESP e a FIRJAN, a mando da GloboNews,  são resultado dessa operação. Desse modo, entendo e compartilho da preocupação de todos com o mal que a Globo faz à Democracia, mas a Globo é apenas o instrumentalizador e não a origem do problema.

Do GGN

segunda-feira, 1 de maio de 2017

71% dos brasileiros rejeitam reformas de Temer, Datafolha

A pesquisa Datafolha que apontou a disparada do ex-presidente Lula e também um consenso nacional por diretas-já revelou que sete em cada dez brasileiros são contra a reforma da Previdência proposta por Michel Temer; o levantamento, portanto, revela a encalacrada em que o Brasil se meteu com o golpe de 2016.

Concretamente, o Brasil tem hoje um governo ilegítimo que faz o oposto do que deseja a população; somada à greve geral, que paralisou o País na última sexta-feira, o Datafolha praticamente sepulta as reformas, pois mesmo que Temer esteja comprando parlamentares com cargos na máquina pública, deputados e senadores terão que pedir votos em 2018 para se reeleger.

Sete em cada dez brasileiros se dizem contrários à reforma da Previdência, segundo aponta o Datafolha, na mesma pesquisa que apontou a disparada do ex-presidente Lula (leia aqui) e também um consenso nacional por diretas-já (leiaaqui).

"Há maioria antirreforma entre todos os grupos sociodemográficos, e a taxa cresce entre mulheres (73%), brasileiros que ganham entre 2 e 5 salários mínimos (74%), jovens de 25 a 34 anos (76%) e os com ensino superior (76%)", revela a Folha.

O levantamento, portanto, revela a encalacrada em que o Brasil se meteu com o golpe de 2016: o Brasil tem hoje um governo ilegítimo que faz o oposto do que deseja a população.

Somada à greve geral, que paralisou o País na última sexta-feira, o Datafolha praticamente sepulta as reformas, pois mesmo que Temer esteja comprando parlamentares com cargos na máquina pública, deputados e senadores terão que pedir votos em 2018 para se reeleger.


A pesquisa comprova que a mensagem mais importante da chamada "voz das ruas" é a que aparece na imagem acima: Temer sai, aposentadoria fica.

Do 247

segunda-feira, 10 de abril de 2017

Por que o Brasil aceita tão passivamente os abusos de Temer, Moro, Gilmar, Globo etc?

Ele abusa
 Etienne de La Boétie é o pai dos “99%” – a vasta maioria da sociedade para a qual cabe uma pequena parcela de um bolo quase todo devorado pelo restante “1%”, para usar expressões vinculadas a um movimento que marcou intensamente o mundo moderno, o “Ocupe Wall Street”.

La Boétie escreveu aos 18 anos, em 1548, um pequeno grande livro chamado “Servidão Voluntária”. Nele, La Boétie sustentava que são as pessoas que dão poder aos tiranos. Por isso elas são mais dignas de desprezo do que os ditadores de ódio.

Por essa ótica, somos nós mesmos os culpados por Temer, Moro, Aécio, Gilmar e outras calamidades do gênero. Podemos incluir nesta conta a mídia que temos, a começar pela Globo.

Foi o primeiro livro francamente libertário. Foi usado pelos protestantes franceses como uma inspiração para reagir à violência dos católicos, expressa tenebrosamente no Massacre de São Bartolomeu, na segunda metade do século XVI. Milhares de protestantes que tinham acorrido a um casamento da família real francesa foram mortos por forças católicas.

Mais tarde, o tratado circulou entre revolucionários em vários momentos da história. Em 1789, por exemplo. Os teóricos do anarquismo foram também fortemente influenciados por la Boétie. O autor avisa, logo no início de “Servidão Voluntária”, que seu objetivo é entender como “tantas pessoas, tantas vilas, tantas cidades, tantas nações sofrem sob um tirano que não tem outro poder senão o que a sociedade lhe concede”.

La Boétie formou-se com louvor advogado pela Universidade de Toulouse, e depois foi um juiz especialmente admirado pela integridade. Arbitrou, por seu caráter libertário e equânime, muitas disputas entre católicos e protestantes.

Morreu aos 33 anos. Deixou todos os seus papéis a um amigo que o imortalizaria num ensaio sublime sobre a amizade: Montaigne. Tinham-se aproximado na juventude, depois que Montaigne leu com encanto uma cópia manuscrita de “Servidão Voluntária”. É com base na amizade entre ele e la Boétie que Montaigne escreveu seu célebre tratado sobre a amizade. “Dois amigos formam uma unidade tão absoluta que é como se fossem dois tecidos em que é impossível ver a costura que os junta”, disse Montaigne.

Montaigne tinha 31 anos quando seu amigo morreu. Ficou arrasado a ponto de se recolher e largar tudo que fazia. A dor da morte de la Boétie acabaria sendo vital para que ele começasse a escrever seus Ensaios.

O livro de La Boétie foi lido durante muito tempo em edições clandestinas por pequenos grupos de gente culta e rebelde. Um editor francês, muito tempo depois da morte de Montaigne, teve a idéia de publicar o tratado de La Boétie como um apêndice dos Ensaios, logo depois do que tratava da amizade e do próprio La Boétie.

Foi então que “Servidão Voluntária” ganhou reconhecimento em grande escala.

Quando os “99%” se insurgem contra a desigualdade em várias partes do mundo, eles podem até não saber – mas estão prestando um tributo a um gênio que ainda na universidade compôs linhas perenes contra a tirania e os tiranos.

Que La Boétie um dia nos inspire: é meu maior desejo neste momento.

Do DCM, por Paulo Nogueira.