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domingo, 14 de maio de 2017

Sérgio Moro, se o seu julgamento não fosse político, seria só uma bobagem, diria Lula

Sérgio Moro gastou uma passagem para Londres para dizer que “julgamentos não são políticos” e que “o juiz tem de julgar de acordo com a prova“.

Para verificar o grau de sapiência contido nestas duas declarações é só invertê-las e ver se poderiam ter sido ditas ao contrário. Evidente que não e, por isso, não passam de obviedades, conquanto não sejam verdade no caso de seu julgamento sobre Lula.

É fácil demonstrar.

Lula é acusado de receber um “triplex” em troca de corrupção na Petrobras, praticada por dirigentes da empresa.

A questão a responder é: Lula recebeu o apartamento? Recebeu pessoalmente ou por interposta pessoa, um “laranja”?

Nem mesmo o delator Léo Pinheiro consegue dizer que recebeu e admite que o apartamento não deixou de pertencer, por um dia sequer, à empreiteira e pertence ainda hoje.

Portanto, se não recebeu o apartamento, não há crime a julgar, como não se pode julgar um homicídio onde o “morto” está vivo e gozando de boa saúde.

Juridicamente, falta materialidade no suposto “crime”. Mesmo que se considere um suposto “pedido” de vantagem, quem o teria feito, nas palavras do próprio (e único) acusador de Lula, quem o teria feito não foi Lula. Seria preciso provar que quem pediu – se pediu – o fez por determinação do ex-presidente, e igualmente, não há quem afirme que foi.

Mesmo que Lula tivesse interesse no apartamento, quem garante que, decidido a comprar, não fosse perguntar à dona do imóvel, a OAS, quanto mais teria de pagar, além da cota em nome de Marisa Letícia?

Então, o que o Dr. Moro tem em sua pauta de julgamento, em relação a Lula é ter recebido um apartamento que não recebeu ou de tê-lo solicitado, o que ninguém diz que fez.

Mas Sérgio Moro vai condenar Lula, sem ter prova alguma de que ele recebeu ou que sequer pediu o imóvel para si, condenará por um “crime” que não há uma prova sequer de que existiu.

O que resta ao  Dr. Moro para condenar Lula é dizer que uma empresa pagou a armazenagem de uns quantos caixotes de tralhas presidenciais, o que além de absurdo é ridículo: o “chefe da propinocracia”, segundo o powerpoint de Deltan Dallagnol teria como benefício um depósito de caixas de papelão ou de plástico.

Difícil alegar que seria esta a contrapartida por contratos de bilhões é patético.

Como, entretanto, o Dr. Moro diz que o um juiz julga de acordo com as provas e provas não há,  a condenação será aprova de que o julgamento é e será político.

Como tudo o que ele fez, em todo o processo, é político.

Se não é, teria de absolver Lula.

E destruir-se, por tudo o que fez ao ex-presidente.

Quem leu Os Miseráveis, entretanto, sabe que Moro sequer tem a grandeza de Javert na cena final, ao atirar-se às águas do Sena.

Do Tijolaço

Luís Roberto Barroso STF, que ganha R$ 50 mil, diz que problema do Brasil é ação trabalhista e servidor-marajá.

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, aparece fazendo palestra no Brazil Forum, neste sábado (13), em Londres.

Com seus modos elegantes e sabido, apontou dois grandes problemas do país. Marajá falando de Marajá, sem contar as palestras que vendem os magistrados e que são desobrigados a declarar, assim é bom demais.

Ele comentou que o Brasil, sozinho, é responsável por 98% dos processos trabalhistas em todo o planeta – o país tem 3% da população mundial.(…)Depois comentou que 4% do PIB brasileiro é gasto com o custo do funcionalismo público, com o que procurou indicar o alto custo do Estado.

Não se vai tirar a razão do Dr. Barroso, um homem fino e sofisticado.

É verdade que o Brasil tem um imenso número de processos trabalhistas. Mas o Dr. Barroso talvez pudesse informar que há empresas que são verdadeiras indústrias de lesões de direitos, em parte porque -como são as maiores de seus setores – confiam que nem todos irão reclamar ou só irão faze-lo depois de demitidos. Caso contrário, perdem a vaga e lá não voltam nunca mais.

Alguns exemplos para ajudar a clarividência do Dr. Barroso, recolhidos do insuspeito Estadão: “os cinco maiores bancos do País – Banco do Brasil, Bradesco, Caixa, Itaú/Unibanco e Santander – respondem a cerca de 130 mil processos. Do total de R$ 17,4 bilhões pagos em ações trabalhistas em 2015, R$ 5,6 bilhões vieram dessas instituições.”

Repetindo e destacando: quase um terço das indenizações trabalhistas foram pagos pelos cinco bancos, os mesmos que apuram, a cada trimestre, lucros bilionários. Talvez o problema esteja em que na Justiça do Trabalho não se encontre a “moleza” que ocorreu no Carf com o Itaú, que escapou “grátis” de uma autuação de R$ 25 bilhões.
Sabem quem é a campeã de ações, entretanto?

Sim, a robusta Volkswagen, com a marca de 30 mil processos trabalhistas em um ano.
Ainda que se possam pinçar casos de exagero, será que não passa na cabeça de Sua Excelência que, mesmo com isso, o que existe é uma cultura empresarial de desrespeito a seus empregados ou, como agora preferem chamar, colaboradores?

Do segundo mal, o excesso no funcionalismo público, é inacreditável que o Dr. Barroso, que ganha mais de R$ 50 mil mensais (R$ 33,7 mil no STF e R$ 17,3 mil como professor da UERJ.Embora seja também professor visitante da UNB, não posso informar a remuneração) possa dizer isso.

Pois ele votou, não tem 20 dias,  a favor de que a remuneração de quem, como ele, tem mais de um cargo público possa superar o teto constitucional, que a limita – mas já nem tanto – ao vencimento de Ministro do Supremo.

Permita-me agora, Dr. Barroso, depois de tanta concordância com suas teses, dizer algo diferente: o grande problema do Brasil é uma elite à qual o senhor se integrou em unha e carne, que acha que o problema do Brasil são os pobres que reclamam no único ramo do Judiciário que os ouve. E outros, com muito mais luzes, que não praticam aquela máxima atribuída a Anatole France: “Viva como aconselhas, diga o que fazes, faça o que dizes.”

Do Tijolaço

domingo, 30 de abril de 2017

Marx e Engels visitam Machado de Assis para falar de revolução, por Sebastião Nunes

Imagem: Reprodução

Corria o ano de 1882. Comodamente instalados numa velha otomana, dois alemães esperavam o dono da casa. Acabavam de chegar de Londres.

– Será que vai dar certo? – perguntara o mais velho, antes da viagem.

– Não tenho dúvida – respondeu o mais moço. – Um sujeito que escreveu uma novela como “O alienista” e um romance como “Memórias póstumas de Brás Cubas” deve compreender tudo desse país. Ou quase tudo.

Marx, o mais velho, duvidou:
– Sei não. Esses escritores são pouco confiáveis.
– Mas você não adora Balzac? – divergiu Engels, o mais novo. – Se gosta daquele janota maluco que parasitava mulheres ricas, pode gostar do brasileiro que, até onde sei, e pelo menos aparentemente, é o sujeito mais pacato do mundo.
– Veremos – disse o cético Marx. E embarcaram no Tâmisa rumo ao mar.

ANTECEDENTES
A visita fora acordada por telegrama, invenção recente e que só há 10 anos permitia mensagens da Europa para o Brasil. Entre chiados, estática e mal-entendidos, foi estabelecido que os visitantes se hospedariam num hotel do Catete.

Assim fizeram e ali estavam eles, na casa do Cosme Velho.

Alquebrado, Marx relutara bastante. No ano anterior escrevera a Engels: "Você sabe que há poucas pessoas mais avessas ao patético-demonstrativo do que eu; contudo, seria uma mentira não confessar que grande parte do meu pensamento está absorvida pela recordação de minha mulher, boa parte da melhor parte da minha vida".

Nada mais adequado, portanto, que uma viagem longa para distrair e refazer as forças, decidiu Engels. Depois de resistir bravamente, Marx concordou.

Apesar de todos os esforços de Engels, a viagem foi preocupante. Sentado no convés horas e horas, Marx deixava o olhar se perder na distância. A força do velho combatente estava minada, sua imensa capacidade de trabalho e de luta parecia no fim.

Ao avistar a costa do Rio de Janeiro, contudo, recobrou o ânimo. “Bom sinal”, alegrou-se Engels. “Vamos ver se aqui ele volta à velha forma”.

O DONO DA CASA
Machado de Assis entrou, seguido por Carolina. Conhecia a fama dos visitantes e se orgulhava dessa visita, que considerava um privilégio. Só não entendia o motivo.

Machado estendeu a mão:
– Muito prazer em recebê-los – disse em inglês, que falava com desenvoltura. – Sintam-se à vontade. Espero que tenham feito boa viagem.
– Fizemos sim, obrigado – respondeu Engels. – Até o meu amigo Marx, que durante a travessia se mostrou macambúzio, se aninou na chegada.
– Carolina Augusta – pediu o escritor –, você poderia nos servir chá? E então, senhores, o que os traz à minha humilde residência?

OS MOTIVOS SÃO ÓTIMOS
– Embora distantes – começou Engels –, ficamos sabendo de seu prestígio entre os intelectuais brasileiros. Foi isso que nos trouxe aqui.

– Estamos cansados da Europa – emendou Marx. – Escrevemos muito e muito longamente debatemos nossas ideias com os mais variados públicos.

– Estou ciente – disse educadamente Machado –, embora soubesse pouco sobre os visitantes: sabia apenas que eram esquerdistas, que pregavam a luta de classes, que não eram bem vistos na maioria dos países europeus etc... Mas nada lera deles. Soubera do bombástico “Manifesto comunista”, mas não se interessou em ler.

– Em que país teria a revolução possibilidade de sair vitoriosa? – retornou Marx. – Este é o principal dilema. Pensamos na Alemanha e na Inglaterra em primeiro lugar, como países desenvolvidos que são. Pesando prós e contras, desistimos e passamos a mirar a Rússia, com seu imenso campesinato. Mas não tem operariado. Estados Unidos? Não serve. Caótico, individualista e arrogante. Foi assim que chegamos ao Brasil. Queremos descobrir se o Brasil está maduro para a revolução.

O ZERO E O INFINITO
Machado se espantou: “Revolução no Brasil? Como assim?”, mas logo se recompôs, guardando para si o pensamento.
Sorte que Carolina Augusta entrou com o chá naquele momento. Serviu aos três, perguntando com amável sorriso: – Mais açúcar? Uma gota de leite? Conhecem nossos biscoitos de araruta? As torradas estão fresquinhas, não querem provar?

O ambiente se tornou leve e descontraído; os visitantes, bem à vontade. Marx abriu o colete e até sorriu para a dona de casa:
– Obrigado – disse ele. – Aceito um biscoito de araruta. 
Mastigaram ruidosamente. As torradas, de fato, estavam fresquinhas.
Durou bastante o silêncio. Afinal, Machado de Assis reiniciou a conversa:
– Sinto desapontá-los, mas aqui será impossível. – Sorveu um gole de chá, mordiscou um biscoito e continuou: – Não temos operariado, apenas artesãos que, quase sempre, trabalham por conta própria em pequenos cubículos. Não temos camponeses, pois a mão de obra na roça é toda ela escrava.
 – E quanto à administração pública?
 – Desculpem ser tão direto, mas são todos uns ladrões, descendentes dos ladrões portugueses que colonizaram este país. Passam rasteira uns nos outros durante o dia e, à noite, encontram-se nos salões como se nada tivesse acontecido. São uns cínicos.

E os fazendeiros?
 – Uns broncos, todos eles. Fazem-se chamar de coronel e capitão, mas os títulos são comprados junto à corte. Analfabetos e ignorantes. Mal assinam o nome.
 – Quer dizer que não podemos pensar num Brasil revolucionário?
 – Nem sonhando – concluiu Machado. – E daqui a 100, 200 anos será pior.

Foi convivendo com as nossas elites que garimpei matéria para meus livros. Se querem uma opinião sincera, sugiro que tentem o Paraguai, aqui pertinho. Quem sabe lá?
 E foi assim que a revolução comunista não aconteceu no Brasil.

Do GGN