Foto: Ricardo Stuckert
"Esta não foi uma eleição normal", escreveu
o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de dentro da prisão na sede da
Polícia Federal em Curitiba. A nova carta de Lula alerta para todos os riscos,
contra avanços do país, do novo governo a partir de janeiro de 2019. E conclama
a população a "manter acesa a chama da esperança, o que significa a
defesa da democracia, do patrimônio nacional, dos direitos dos
trabalhadores e do povo que mais precisa".
"Tudo isso está ameaçado pelo futuro governo, que tem
como objetivo aprofundar os retrocessos implantados por Michel Temer a partir
do golpe que derrubou a companheira Dilma Rousseff em 2016",
lembrou.
"Jair Bolsonaro se apresentou ao país como um candidato
antissistema, mas na verdade ele é o pior representante desse sistema. Foi
apoiado pelos banqueiros, pelos donos da fortuna; foi protegido pela Rede
Globo e pela mídia, foi patrocinado pelos latifundiários, foi bancado pelo
Departamento de Estado norte-americano e pelo governo Trump, foi apoiado pelo
que há de mais atrasado no Congresso Nacional, foi favorecido pelo que há de
mais reacionário no sistema judicial e no Ministério Público, foi o verdadeiro
candidato do governo Temer."
Leia a íntegra da carta de Lula:
Companheiras e companheiros,
Do fundo do meu coração, agradeço por tudo o que fizeram
neste processo eleitoral tão difícil que vivemos, absolutamente fora da
normalidade democrática. Quero que levem meu abraço e minha gratidão a cada
militante do nosso partido, pela generosidade e coragem diante da mais sórdida
campanha que já se fez contra um partido político neste país.
Agradeço à companheira Gleisi Hoffmann e a toda a
nossa direção nacional, por terem mantido o PT unido em tempos tão
difíceis; por terem sustentado minha candidatura até as últimas consequências e
por terem se engajado totalmente, com muita força, na candidatura do
companheiro Fernando Haddad.
Agradeço ao companheiro Fernando Haddad por ter se entregado
de corpo e alma à missão que lhe confiamos. Ele enfrentou com dignidade as
mentiras, a violência e o preconceito. Saiu das eleições como um líder
brasileiro reconhecido internacionalmente.
Agradeço à companheira Manuela D’Ávila e aos partidos que nos
acompanharam com muita lealdade nessa jornada.
Saúdo os quatro governadores que elegemos, em especial a
companheira Fátima Bezerra, e também os que não conseguiram a reeleição, mas
não desistiram da luta nem dos nossos ideais. Saúdo os senadores e deputados
eleitos e todos os que, generosamente, se lançaram candidatos, fortalecendo a
votação em nossa legenda.
A luta extraordinária de vocês nos levou a alcançar 47
milhões de votos no segundo turno. Apesar de toda perseguição, de todas as
tramoias que fizeram contra nós, o PT continua sendo o maior e mais importante
partido popular deste país. E isso nos coloca diante de imensas responsabilidades.
O povo brasileiro nos deu a missão de manter acesa a chama da
esperança, o que significa a defesa da democracia, do patrimônio nacional, dos
direitos dos trabalhadores e do povo que mais precisa. Tudo isso está
ameaçado pelo futuro governo, que tem como objetivo aprofundar os retrocessos
implantados por Michel Temer a partir do golpe que derrubou a companheira
Dilma Rousseff em 2016.
Esta não foi uma eleição normal. O povo brasileiro foi
proibido de votar em quem desejava, de acordo com todas as pesquisas. Fui
condenado e preso, numa farsa judicial que escandalizou juristas do mundo
inteiro, para me afastar do processo eleitoral. O Tribunal Superior Eleitoral
rasgou a lei e desobedeceu uma determinação da ONU, reconhecida
soberanamente em tratado internacional, para impedir minha candidatura às
vésperas da eleição.
Nosso adversário criou uma indústria de mentiras no
submundo da internet, orientada por agentes dos Estados Unidos e
financiada por um caixa dois de dimensões desconhecidas, mas certamente
gigantescas. É simplesmente vergonhoso para o país e para a
Justiça Eleitoral que suas contas de campanha tenham sido aprovadas diante
de tantas evidências de fraude e corrupção. É mais uma prova da seletividade de
um sistema judicial que persegue o PT.
Se alguém tinha dúvidas sobre o engajamento político de
Sérgio Moro contra mim e contra nosso partido, ele as dissipou ao aceitar ser
ministro da Justiça de um governo que ajudou a eleger com sua atuação parcial.
Moro não se transformou no político que dizia não ser. Simplesmente saiu do
armário em que escondia sua verdadeira natureza.
Eu não tenho dúvida de que a máquina do Ministério da Justiça
vai aprofundar a perseguição ao PT e aos movimentos sociais, valendo-se dos
métodos arbitrários e ilegais da Lava Jato. Até porque Jair Bolsonaro tem um
único propósito em mente, que é continuar atacando o PT. Ele não desceu do
palanque e não pretende descer. Temos de nos preparar para novos ataques, que
já começaram, como vimos nas novas ações, operações e denúncias arranjadas que
vieram neste primeiro mês depois das eleições.
Jair Bolsonaro se apresentou ao país como um candidato
antissistema, mas na verdade ele é o pior representante desse sistema. Foi
apoiado pelos banqueiros, pelos donos da fortuna; foi protegido pela Rede
Globo e pela mídia, foi patrocinado pelos latifundiários, foi bancado pelo
Departamento de Estado norte-americano e pelo governo Trump, foi apoiado pelo
que há de mais atrasado no Congresso Nacional, foi favorecido pelo que há de
mais reacionário no sistema judicial e no Ministério Público, foi o verdadeiro
candidato do governo Temer.
Não teve coragem de participar de debates no segundo turno,
de confrontar conosco suas ideias para a economia, o desenvolvimento, a geração
de empregos, as políticas sociais, a política externa. E vai executar um
programa ultraliberal, de entreguismo e privatização, que não foi apresentado
aos eleitores e muito menos aprovado nas urnas.
Ele explorou o desespero das pessoas com a violência; a
indignação com a corrupção e a decepção com os políticos. Mas não tem respostas
concretas para nenhum desses desafios. Primeiro porque a proposta dele para
segurança é armar as pessoas, o que só vai aumentar a violência. Segundo,
porque Sérgio Moro e a Lava Jato premiaram os corruptos e corruptores da
Petrobras. A maioria está solta ou em prisão domiciliar, gozando as fortunas
que roubaram. E por fim, Bolsonaro é, de fato, o representante do sistema
político tradicional, que controla a economia e as instituições no país.
As mesmas pessoas que elegeram Bolsonaro vão julgá-lo todos
os dias, pelas promessas que não vai cumprir e pelo que vai acontecer em nosso
país. Temos de estar preparados para continuar construindo, junto com o povo,
as verdadeiras soluções para o Brasil, pois acredito que, por mais que queiram,
não vão conseguir destruir nosso país.
O PT nasceu na oposição, para defender a democracia e os
direitos do povo, em tempos ainda mais difíceis que os de hoje. É isso que
temos de voltar a fazer agora, com o respaldo dos nossos 47 milhões de votos,
com a responsabilidade de sermos o maior partido político do país.
E como diz a companheira Gleisi, não temos de pedir desculpas
por sermos grandes, se foi o eleitor que assim decidiu. Queremos e devemos
atuar em conjunto com todas as forças da esquerda, da centro-esquerda e do
campo democrático, num exercício cotidiano de resistência.
Temos de voltar às ruas, às fábricas, aos bairros e favelas,
falar a linguagem do povo, nos reconectar com as bases, como disse o Mano
Brown. Não podemos ter medo do futuro porque aprendemos que o impossível não
existe.
Até o dia do nosso reencontro, fiquem com um grande abraço do
Luiz Inácio Lula da Silva.
GGN