Nessa
nova etapa, com o governo Bolsonaro se apresentando como a maior possibilidade
de retrocesso já ocorrida na história, o país começa a buscar pontos de
construção.
O
cientista político José Luiz Fiori estava na Espanha no período do Pacto de
Moncloa, que uniu o país no pós-franquismo.
O
pacto foi conduzido por três personagens centrais. O presidente Adolfo Suárez,
o primeiro ministro Felipe Gonzales e seu braço direito Alfonso Guerra, o braço
guerreiro de Gonzales.
O
pacto reuniu partidos políticos, associações empresariais e sindicatos, visando
dois objetivos: preparar o país para a democracia e debelar uma profunda crise
econômica.
O
que seria o Pacto de Moncloa brasileiro, segundo Fiori?
O
primeiro ato, essencial, seria a libertação de Lula. Depois, a composição da
tríade espanhola.
Para
presidente, poderia ser Fernando Henrique Cardoso, não fossem seus defeitos
insanáveis de caráter. Olhando no devastado horizonte político brasileiro,
Fiori enxerga esse papel para o senador Tasso Jereissatti. Para primeiro
ministro, ele imagina Fernando Haddad. Para o papel de Afonso Guerra, Ciro
Gomes.
É
um desenho perfeitamente factível.
Aliás,
o fator Bolsonaro está abrindo espaço para o que se configura o início de um
processo profundo de busca de novas saídas e novas experiências.
Em
momentos de transição, abre-se espaço para a incorporação de novos atores e
novas ideias na construção de políticas públicas. Esse movimento ocorreu no
início do governo Fernando Henrique Cardoso, com uma profusão de propostas de
intelectuais socialdemocratas, desperdiçadas pela falta de vontade do
presidente.
O
movimento de renovação passou pelo Paraná de Jaime Lerner, por uma renovação
relevante das Federações de Indústrias dos três estados do Sul, pela visão
internacionalista assumida pela CUT.
Ocorreu
também em dois momentos importantes da vida política paulistana, nos governos
de Luiza Erundina e Martha Suplicy, assim como no início do governo Lula.
Posteriormente, Fernando Haddad desenhou algumas das mais bem concebidas
políticas públicas brasileiras, como Ministro da Educação e como prefeito de
São Paulo, mas, aí, com uma visão de gabinete.
Nessa
nova etapa, com o governo Bolsonaro se apresentando como a maior possibilidade
de retrocesso já ocorrida na história, o país começa a buscar pontos de
construção.
No
Sudeste, o ciclo de renovação da política estacionou há muito tempo. São Paulo
e Rio de Janeiro se tornaram o túmulo da política. Os partidos envelheceram, a
participação social mirrou, as experiências inovadoras ficaram para trás.
Nesse
mesmo período, houve uma renovação política no Nordeste, com as velhas
oligarquias sendo ultrapassadas e sendo gradativamente substituídas por uma
nova geração, aberta às inovações. Começa lá atrás pelo Ceará de Tasso e Ciro,
passa por Pernambuco de Eduardo Campos, entra pela Bahia de Jacques Wagner,
pelo Piauí – um estado que mereceria um estudo à parte -, até chegar ao
Maranhão de Flávio Dino, derrubando a mais longeva das dinastias políticas
brasileiras, a dos Sarney, e consolidando um modelo de gestão participativa que
irá se espalhar por toda a região.
O
lançamento do Consórcio do Nordeste, anunciado ontem, e juntando os 9
governadores da região, é o fato político mais importante do ano. E coloca o NE
como o projeto piloto do grande Pacto de Moncloa que começa a se desenhar, na
mesma proporção em que se desmancha o governo tenebroso de Bolsonaro.
É
questão de tempo para que os empresários se deem conta de que esse desmonte do
Estado brasileiro não obedece a nenhuma lógica liberal, mas a um ideologismo
irresponsável; para que os militares entendam que não se pode construir um
projeto de país sem paz social, e não existe paz social sem se abrir espaços de
respiro para o pensamento dissidente.
Do GGN