Quem recusou
a proposta de delação do dono da Engevix sobre Temer? Saiba o que ele pretendia
dizer sobre o usurpador
“Te respondo
só com uma frase. Não fui eu quem desistiu. Você me perguntou por que eu
desisti. Estou dizendo que não fui eu quem desistiu. Ponto”. José Antunes
Filho, dona da Engevix, que passou seis meses preso em Curitiba, sobre a
delação premiada que pretendia fazer, em entrevista ao Valor Econômico.
O AMIGO DO TEMER
Em 2009, a
pequena Argeplan, empresa paulistana de arquitetura e engenharia, ganhou um
belo contrato. Por R$ 232 mil, iria reformar o forro da biblioteca do Tribunal
de Justiça de São Paulo. A sede da empresa é uma casa de dois andares numa
viela residencial da Vila Madalena, na capital, onde não há letreiro. A
Argeplan é “especializada em obras públicas no Estado de São Paulo”, conforme
revela seu próprio portfólio na internet.
É comandada
por dois sócios: o arquiteto Carlos Alberto da Costa e o coronel da Polícia
Militar João Baptista Lima Filho, ambos septuagenários.
João
Baptista, que todos conhecem somente como Lima, obteve diploma de arquiteto
depois de se aposentar da corporação.
Três anos
depois, enquanto acabava a reforma na biblioteca do Tribunal de São Paulo, a
Argeplan obteve um contrato melhor.
Em maio de
2012, venceu, por R$ 162 milhões, uma licitação internacional da estatal
Eletronuclear, para serviços altamente especializados de eletromecânica na
usina nuclear de Angra 3.
A empresa do
coronel Lima não obteve sozinha o contrato.
Entrou num
consórcio com a finlandesa AF, que criou uma filial no Brasil para participar
da licitação. Segundo documentos obtidos por ÉPOCA, Lima também é sócio dessa
empresa.
Como a
empresinha do coronel Lima conseguiu tamanho contrato? Em sua proposta de
delação, Antunes afirma que a Argeplan é uma empresa ligada ao vice-presidente
Michel Temer. Segundo Antunes, o coronel Lima “é a pessoa de total confiança de
Michel Temer”.
Aos 74 anos,
Lima é do círculo próximo de Temer desde os tempos em que o vice assumiu cargos
de alto escalão no governo de Franco Montoro, em São Paulo. Lima também é
próximo do almirante Othon Pinheiro, presidente da Eletronuclear nos governos
Lula e Dilma, que foi preso na Lava Jato, acusado de corrupção nos contratos de
Angra 3.
Segundo dois
chefes do PMDB e um lobista do partido, o almirante foi indicado por Temer e
pelos senadores do PMDB — Temer nega ter feito a indicação.
Consta da
proposta de delação de Antunes que “Lima foi diretamente responsável pela
indicação de Othon junto a Michel Temer, e por sua manutenção no cargo de
presidente da Eletronuclear”.
O delator
disse ainda ter ouvido de Lima que a manutenção de Othon na presidência da
empresa estava diretamente associada a “resultados”.
Antunes
disse que foi procurado pelo coronel Lima para entrar no contrato de Angra 3. A
empresa de Lima, afinal, não tinha quaisquer condições de executar os serviços.
Antunes
topou e foi subcontratado pelo consórcio AF/Argeplan, criado, segundo ele e
documentos comerciais, por Lima e pessoas ligadas ao almirante Othon.
Antunes
afirma que “entre as condições para que Othon fosse mantido no cargo, estava a
de ajudar Lima nesse contrato e em outros futuros, de modo que a Argeplan/AF e
mesmo a Engevix se posicionassem bem nos futuros projetos nucleares”.
Fontes da
Engevix ouvidas por ÉPOCA garantem, contudo, que, apesar de integrar o
consórcio, a AF Consult do Brasil não realizou nenhuma obra em Angra 3, e que
sua participação no contrato jamais foi explicada pela direção da empresa.
Antunes
afirmou ainda, em sua proposta de delação, que esteve por duas vezes no
escritório de Michel Temer em São Paulo, acompanhado de Lima, “tratando de
assuntos, incluindo a Eletronuclear”.
Diz que foi
cobrado por Lima, que dizia agir em nome de Temer, a fazer um pagamento de R$ 1
milhão. Esse dinheiro, segundo Antunes, iria para a campanha do peemedebista em
2014. Antunes disse aos procuradores que fez o pagamento por fora, por
intermédio de uma fornecedora da Engevix.
Segundo
Antunes, a Lava Jato amedrontou Lima. Antunes diz que Lima o procurou no ano
passado, para propor a devolução do dinheiro. Antunes diz que não topou.
Não é a
primeira vez que Lima surge na Lava Jato. O nome do coronel é citado em uma
troca de e-mails de Antunes sobre o contrato Eletromecânico 1 de Angra 3,
justamente o que foi firmado pela Engevix, com participação da Argeplan. Lima e
sua empresa também aparecem em interceptações telefônicas do almirante Othon
Pinheiro.
Em 7 de
julho de 2015, Lima perguntou se Othon teria previsão de ir a São Paulo para um
encontro. Num diálogo que denotava subordinação de Othon a Lima, o almirante
dizia que não tinha previsão, porém poderia rapidamente organizar a viagem para
segunda-feira, menos de uma semana depois da ligação.
“Segunda-feira,
se o senhor vier aqui, a gente precisava ter uma conversa. Tem de tomar uma
providência aí que… eu acho que tá chegando no ponto que vai culminar naquele
tema”, diz Lima na gravação.
Procurado,
Temer disse conhecer Lima há mais de 30 anos. Também afirmou que recebeu
Antunes e Lima em seu escritório em São Paulo, mas que o encontro foi para
falar sobre o Porto de Rio Grande, obra tocada pela Engevix. Temer não revelou
em maiores detalhes o teor da conversa. Disse apenas que os pleitos do
empreiteiro não foram atendidos.
Afirmou que
não ajudou a indicar o almirante Othon para o cargo, que não tinha qualquer
influência na Eletronuclear e que não autorizou ninguém a buscar recursos
ilícitos em nome dele.
O almirante
Othon disse que só se pronunciaria em juízo. A Eletrobras, que tem se
pronunciado sobre questões envolvendo a Eletronuclear, não retornou o pedido de
informação até o fechamento da reportagem.
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