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quarta-feira, 5 de julho de 2017

O fator que forja o atraso da queda de Michel Temer

O início da análise da denúncia por corrupção passiva contra Michel Temer na Câmara dos Deputados esbarra em um complexo jogo de alianças e interesses numa das maiores crises políticas do país. Enquanto deputados analisam até que ponto podem sacrificar imagens ao veredito público pelo simples apoio a Temer da grande base no Congresso, as ameaças constantes da Lava Jato a diversos políticos e as eleições de 2018 complicam ainda mais o cenário.

Por parte do comando da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) é um claro fiel aliado do mandatário peemedebista. Apesar de publicamente afirmar que os prazos para a denúncia de Temer na Casa serão respeitados, táticas vem sendo usadas para protelar ao máximo a conclusão da análise dos deputados sobre se o presidente será ou não julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Em outra frente, Maia também evita se expor ou tirar proveito como um possível herdeiro da cadeira do Planalto, caso Michel Temer seja afastado. O presidente da Câmara é o próximo da linha sucessória da Presidência da República. Em gesto de que não pretende, nem temporariamente, comandar o país, a ausência de Temer em agenda internacional fez o deputado também marcar viagem ao exterior para não estimular as hipóteses.

Mas a motivação resguardada por detrás de tanta fidelidade foi evidenciada, recentemente, quando a denúncia de Temer teve início: "Vamos respeitar todos os prazos, os debates, e encerrar esse assunto, para que a Câmara possa focar na agenda para mudar a vida dos brasileiros, para garantir crescimento e empregos, a começar pela reforma da Previdência", disse Maia.

As reformas são prioridades não somente do atual presidente, como também de grande parte dos partidos que formam a base dominante no Congresso. E é delas que os parlamentares, ainda que na contramão do senso público, tentam resgatar apoios para permanecer no poder: além de angariar proteção de investidores, ativar o apoio do mercado.

No contexto da Operação Lava Jato, que não demonstra cessar as investigações e punições a esquemas de corrupção e caixa dois, ápice das piores ameaças ao financiamento de campanhas eleitorais, o que os deputados, senadores e demais políticos necessitam é de confiança e garantia de que empresários (na condição de pessoas físicas) garantam as doações para 2018, ainda que sob o temor das investigações.

Nessa corrida pelas reformas, grande interesse do mercado, os parlamentares também estudam alternativas para sustentar as campanhas do próximo ano. Uma queda imediata de Michel Temer não favorece o tempo que necessitam para trabalhar nelas. É o caso da Proposta de Emenda à Constituição para criar um fundo eleitoral que use recursos públicos na ordem de R$ 3,5 bilhões para alimentar os pleitos.

A urgência para o cenário de imprevisibilidade da Lava Jato e de até que ponto a impopularidade de Michel Temer pode segurar a fúria da população fez com que os congressistas agilizassem a proposta, unindo diversas partidos, da base e da oposição, para iniciar as votações da medida ainda antes do recesso parlamentar.

A discussão atual está em torno de como será feita a partilha desse fundo e de incluir a criação deste fundo na próprio reforma política, que por nome e aparência obtém o apoio popular. Mas a pressa é consenso. Para tomar proveito da emergência, a bancada do governo se compromete à rápida aprovação se, por outro lado, os peemedebistas e aliados saírem beneficiados.

Isso porque a proposta é que não somente o fundo da Câmara seja incluído, mas também a bancada do Senado na divisão dos recursos e, se seguir a proporcionalidade de cadeiras do Congresso, o PMDB deve obter a maior parte dos R$ 3,5 bilhões das quantias. A estratégia é que os partidos administrem o fundo, destinando metade a campanhas do Legislativo e outra metade ao Executivo (presidente e governadores).

Nesta terça-feira (04), o próprio líder do governo no Senado e um dos principais porta-vozes de Michel Temer, Romero Jucá (PMDB-RR), reuniu-se com o  relator da Comissão Especial da Reforma Política da Câmara, deputado federal Vicente Cândido (PT-SP), da oposição. À parte as discórdias, eles decidiram que o fundo público deve ser incluído na reforma, e iniciando a análise já nesta semana.

"Temos que entregar uma mudança no processo político-eleitoral para a população brasileira, ela está cobrando isso. Essa reforma política tem que ser pra valer, ela tem que ser dura, firme e clara para a sociedade", disse Jucá, cativando o discurso público, sem se esquecer: "o fundo é uma necessidade imperiosa, senão não haverá como fazer eleição."

Para que sejam preparadas todas as estratégias de saída para as ameaças na forma de se postular um candidato, seja deputado e senador, governador e presidente, até o próximo ano, o tempo é conveniente a todos eles. É neste contexto que a denúncia contra o mandatário deve ser atrasada, ainda que não a ponto de colocar em xeque as imagens de possíveis sucessores.

Nessa linha, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, pretende ampliar o número de debatedores, para além de somente a defesa, dois parlamentares a favor de Temer e dois contrários. No discurso de que a mudança é um ato democrático e de direito à ampla defesa, o deputado assinalou:

"A única diferença para o rito do impeachment é que, naquele caso, cada partido tem uma hora, e agora, pelo Regimento Interno, são apenas dois deputados para cada lado. Por óbvio, é muito pouco. Vamos tentar organizar que o debate seja um pouco maior que isso. Será um debate republicano. Não é para defender a posição de Temer, nem a da oposição, nem a do procurador-geral. É para preservar o rito e a democracia."

A oposição vem pressionando para que a denúncia contra Temer não seja protelada na Câmara dos Deputados. "O ‘não’ ao seguimento da denúncia significará que somos cúmplices com os crimes relatados e estaremos jogando esta Casa ainda mais no fundo do poço em que está. Vamos decidir se queremos ou não entrar no lixo da história", disse o vice-líder do PSOL, Chico Alencar (RJ).

Na noite desta terça-feira (04), foi escolhido o deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) para relatar a acusação contra Temer na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara. O deputado deve apresentar um equilíbrio entre os aliados peemedebistas, por integrar o partido, e a oposição, por ser novato na sigla e já ter transitado pelo PSD.

De acordo com a coluna Painel, da Folha de S. Paulo, de hoje, a escolha do relator não é tão bem vinda ao grupo dos protetores de Temer. Ainda que aliado Rodrigo Maia, Zveiter vem de uma "família forjada no Direito" e teria a tendência a fazer uma análise técnica. A sua nomeação não é notícia boa, indicou o cenário de parte da base aliada, que teria afirmado que "agora acabou [para Temer]".

Coincidentemente ou não, imediatamente após o resultado no novo relator, o presidente Michel Temer recebeu no início da manhã desta quarta-feira (05) o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, no Palácio do Jaburu.
  
GGN, por Patricia Faermann