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sábado, 29 de abril de 2017

Globo faz jornalismo pífio e culpa Greve Geral

Sandra Annenberg fala da greve no Jornal Hoje.

Passei a tarde de 28 de abril hoje ouvindo – na TV – depoimentos de cidadãos comuns a repórteres da Globo que ficaram sem transporte em função da greve geral. O tom da cobertura era previsível: pobres cidadãos indefesos que tiveram seu dia arruinado pela paralização de trabalhadores, a maior de nossa história.

Parece que a culpa pelos transtornos enfrentados pelas pessoas nas rodoviárias e nas estações de trem e do metrô deve ser atribuída ao movimento sindical. Bobagem.

Com um mês de antecedência, as centrais sindicais informaram ao país inteiro que os trabalhadores iriam cruzar os braços no 28 de março. Incluía-se aí, evidentemente, a paralização dos transportes, ação tradicional em toda paralisação desse porte – na Grécia, na França, ou no Brasil.

Como se não fosse suficiente, nos cinco dias que antecederam a greve geral, uma centena de bispos da Igreja católica publicaram vídeos, na internet, convocando a população a cruzar os braços no dia 28.

O próprio governo federal preparou-se, reforçando o aparato policial. O mesmo fizeram as PMs, na maioria dos estados. Anunciaram esquemas de policiamento, avenidas e regiões liberadas e assim por diante.

O que fez a Globo? Embora bastasse ler os jornais e dar um simples telefonema as partes envolvidas para qualquer estagiário de jornalismo inteirar-se do que acontecia, preferiu fingir que a greve não existia. Retirou o assunto de sua pauta, quando, em nome do interesse público, poderia ter antecipado a situação e alertado  os espectadores.

Num clássico exercício  jornalismo de serviço, poderia sugerir providências para enfrentar aquela emergência. Não precisava apoiar nem divulgar a paralização. Tinha mesmo o direito de fazer críticas – ainda que estas seriam mais aceitáveis se o Brasil não tivesse uma mídia dominada pelo pensamento único.

Em qualquer caso, bastava não esconder de seu  público que – era previsível – o protesto teria grande adesão e era prudente tomar as providências cabíveis. Algo que qualquer emissora de Tv, em qualquer país do mundo, aprendeu a fazer décadas atrás. Pauta banal do tele-jornalismo norte-americano quando um desastre metereológico se anuncia.

Mas não foi o que ocorreu. Possivelmente embriagada com um poder de manipulação social que possuía em tempos que felizmente não existem mais, imaginou que seria possível impedir um fato – a greve – pelo boicote da notícia.
O vexame — cuja origem profunda se encontra no desprezo histórico pela capacidade de luta dos trabalhadores – se comprovou ao longo do dia.

Desprevenidos como cidadãos que não são alertados para sair de casa com capa e guarda-chuva em dia de tempestade, milhares de pessoas chegaram desavisadas às estações de trem e metrô. Encontraram microfones e câmaras sempre abertas  para ouvir seus depoimentos, sendo colocados na posição de vítimas de grevistas. Com isso, cumpriam a função política de desgastar as lideranças dos trabalhadores, evitando reconhecer que elas indiscutivelmente expressam um ponto de vista partilhado por uma maioria imensa dos brasileiros.

Ainda que uma greve geral como a de ontem seja um evento particularmente grave na conjuntura de um governo enfraquecido como Temer, é preciso reconhecer que paralizações desse porte são eventos corriqueiros sob regimes democráticos. Ao demonstrar que não aprendeu a conviver com elas, a Globo confirma que pouco aprendeu com a história do país e com seus próprios erros.

Há 37 anos, a emissora boicotava a campanha pelas diretas-já, a maior mobilização popular da historia republicana.  Chegou dizer que um comício contra a ditadura, na Praça da Sé, havia sido uma festa pelo aniversário de São Paulo. Agora, culpa a luta de trabalhadores, apoiada por várias forças legítimas da sociedade, inclusive bispos da Igreja católica, pelos efeitos previsíveis de uma opção politicamente errada de seu jornalismo. Se tivesse mesmo preocupada com eventuais dores de cabeça que uma greve geral poderia causar aos brasileiros, o mínimo que poderia ter feito era orientá-los a se preparar para ela em vez de fazer o possível para esconder uma gigantesca mobilização em curso.

Do DCM

Globo Camufla a Greve Geral de 2017 com artifícios piores do que os utilizados com as Diretas Já de 1984

Na histórica Greve Geral de 2017, Globo fez pior do que nas Diretas Já de 1984
28 de abril de 2017 às 23h24.
  
Em 1983 eu era repórter da TV Bauru, afiliada da Globo no interior paulista. Porém, vivia “cedido” à emissora em São Paulo, cobrindo férias de colegas. Morava no Hotel Eldorado da rua Marquês de Itu, no Higienópolis, na capital paulista, como repórter do chão de fábrica.

Fui, como pessoa física, à primeira manifestação pelas Diretas Já em São Paulo, diante do estádio do Pacaembu, à qual compareceram cerca de 15 mil pessoas. Foi em 27 de novembro de 1983, poucos dias depois de meu aniversário.

Outros protestos já tinham acontecido antes, pedindo que a ditadura estabelecida em 1964 tivesse fim com eleições presidenciais diretas. Outras aconteceriam depois, com destaque para Curitiba, onde se reuniram cerca de 40 mil pessoas.

Portanto, posso dizer que eu estava lá vivendo a realidade paralela pela primeira vez: enquanto as notícias fundamentais para o futuro do Brasil aconteciam do lado de fora, a TV Globo desconhecia as notícias do lado de dentro — especificamente, na sede da emissora em São Paulo, na praça Marechal Deodoro.

Era uma sensação bizarra. As ordens vinham do Rio: na Globo, nada de Diretas Já.

Portanto, não houve exatamente surpresa quando, no aniversário de São Paulo, em 25 de janeiro de 1984, o repórter Ernesto Paglia falou sobre a manifestação de cerca de 300 mil pessoas na praça da Sé, que reivindicava outra vez Diretas Já, como se fosse a comemoração da efeméride. Sim, é fato que a reportagem tratou dos discursos e da manifestação em si, mas foi embalada pelos editores, a mando da direção da Globo no Rio, como se fosse a cobertura de uma festa.

A maneira como a TV Globo tratou a histórica Greve Geral do 28 de abril de 2017 é, na minha avaliação, muito pior do que aconteceu com a cobertura das Diretas Já em 1983/1984.

Àquela época, a emissora poderia alegar — como alguns globais chegaram a alegar — que vivíamos os estertores de uma ditadura militar e que desafiar o regime poderia ter consequências para a própria abertura “lenta, gradual e segura” prometida pelo ditador João Figueiredo.

Agora, não. Graças às redes sociais — facebook, twitter, whatsapp — qualquer pessoa pode avaliar o grau de descontentamento com as medidas de impacto social tomadas por um governo que tem o presidente da República e nove de seus ministros sob suspeita e/ou investigação, medidas que por sua vez são submetidas a um Congresso igualmente sob suspeita.

Mesmo os mais devotos apoiadores do impeachment de Dilma Rousseff e antipetistas vários sabem que Michel Temer não foi eleito vice-presidente para tomar o rumo que tomou, nem tem legitimidade para golpear os direitos sociais da forma como pretende fazê-lo.

Age em nome do 1% do topo, com 4% de ótimo/bom na pesquisa de opinião pública mais recente e desemprego na casa dos 14%, quando a promessa era de que a derrubada de Dilma provocaria um cavalo-de-pau imediato na economia.

Portanto, desta feita a TV Globo e seus satélites não tem onde se esconder: o apoio dado às medidas do governo Temer expressa acima de tudo o interesse político e econômico dos próprios donos da mídia e dos usurpadores do poder no Planalto e no Congresso que os representam.

No caso da emissora, é absolutamente impossível do ponto-de-vista jornalístico que uma organização com tantos tentáculos espalhados por todo o Brasil tenha sido incapaz de registrar o descontentamento popular ANTES da greve geral, de forma a expressá-lo em seu noticiário.

Será que só nós, internautas, vimos por exemplo as manifestações da CNBB e de um terço dos 100 bispos da Igreja Católica, os quais certamente não podemos acusar de agirem a mando do anarco-sindicalismo?

A Globo, para ficar apenas na nave mãe, simplesmente fez mau jornalismo. Não foi pela primeira, nem será pela última vez.

Agora, porém, não tem como se esconder atrás da ditadura, da qual foi a principal beneficiária, como fez em 1984.

Agora, fez mau jornalismo — distorcido, omisso, descontextualizado — porque coloca seus interesses empresariais, representados pelo governo Temer, acima do interesse da maioria dos brasileiros.

PS: Que fique registrado. Quando Lula se elegeu presidente e foi à Globo do Rio dar entrevista ao Jornal Nacional — estava em minha segunda passagem pela emissora — eu fui um dos poucos jornalistas presentes que não o aplaudiram na entrada. Não acho que o papel de jornalista seja bater palma para autoridade, tampouco negar a realidade que o cerca.

Do Vi o Mundo