Peça 1 – os núcleos de
poder
Conforme já descrevemos em outros Xadrez, há quatro grupos
iniciais de poder do futuro governo Bolsonaro.
A corte familiar, englobando os três filhos, mais os
ministros ideológicos.
A núcleo militar, ocupando a infraestrutura e monitorando as
ações de Bolsonaro, corrigindo cada declaração estapafúrdia.
Paulo Guedes e seus chicagos boys.
Correndo por fora, Sérgio Moro tentando fincar uma torre fora
do alcance de Bolsonaro.
Peça 2 – sobre a a
família Bolsonaro
Trata-se de um jogo de fácil previsão:
Bolsonaro, o Jair, é emocionalmente frágil, intelectual e
socialmente dependente dos filhos.
Os filhos têm a agressividade dos toscos. Não se trata
meramente de grossura. Grosso por grosso, ACM era, assim como Gilmar Mendes e
outros personagens da política, mas que sabem utilizar a grossura como recurso
político. Os Bolsonaro são grossos de graça, primários, valentões de rede
social.
Agora, as revelações do COAF (Conselho de Controle de
Atividades Financeiras) comprovam que a família compartilha hábitos comuns ao
baixo clero político, de receber mesadas e dinheiro de fontes desconhecidas.
Não têm escrúpulos, mas também não têm a sofisticação para as grandes tacadas.
O caso COAF foi apenas um aperitivo. A rapidez com que Carlos
Bolsonaro e o futuro governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, correram a
anunciar negócios milionários com Israel, na área de segurança, mostra um
apetite e uma imprudência que atropelam qualquer noção de autopreservação.
Há pistas que surgiram ao longo dos últimos tempos, mostrando
ligações dos Bolsonaro com policiais ligados a milícias. Pode ser que sejam
apenas apoiadores da família. Mas, com a total falta de noção dos irmãos, e com
dinheiro brotando nas contas dos seguranças, reforçam as suspeitas de seu
envolvimento com as milícias.
A maneira como reagiram às denúncias demonstra falta de
malícia a toda prova. Indagado sobre o dinheiro recebido pelo segurança, Carlos
Bolsonaro limitou-se a responder que ele é de sua estrita confiança e não há
nada que o desabone. Claro que é de sua estrita confiança! Como o contador de
Al Capone era de sua estrita confiança. Só faltava terceirizar operações dessa
natureza para alguém que não merecesse sua confiança.
Indagado sobre o tema, Onyx Lorenzoni, o porta-voz político,
limitou-se a perguntar “onde estava a COAF” nos escândalos petistas. Recorreu
ao álibi universal – de se defender mencionando o PT -, sem saber que a COAF
foi peça central no rastreamento do dinheiro pela Lava Jato.
O pai Jair teve comportamento pior. Depois de segurar a taça
do campeonato do Palmeira com total desenvoltura, alegou recomendação médica
para fugir do primeiro evento público após a divulgação da denúncia. Bateu em
retirada mesmo.
Tem-se aí, portanto, um quadro de ampla vulnerabilidade para
a governabilidade do futuro governo.
Peça 3 – a esperteza de
Sérgio Moro
O abre-te Sésamo de Sérgio Moro continua sendo a cooperação
internacional. Sua última tacada é a tentativa de induzir o Congresso a aprovar
uma legislação tendo por
base a resolução 1373, de 2001, do Conselho de Segurança da ONU, sobre
lavagem de dinheiro e terrorismo.
Hoje a CBN diz que se o Brasil não adotar essa legislação irá
para as catacumbas do inferno, perderá investimentos, dinheiro sairá do Brasil.
Explica nosso colunista André Araújo:
Resoluções da ONU são milhares, e de valor sempre RELATIVO.
Alguns países cumprem, muitos nem tomam conhecimento. Os EUA usam essas
resoluções quando lhes convém, quando não ignoraram completamente. Israel nem
se fala, a Rússia e a China descumprem a maioria.
Essa Resolução veio no rescaldo do 11 de Setembro nos EUA e
seu foco é muito mais o terrorismo do que o tráfico, corrupção, crimes
financeiros. Mas como é um balaio onde cabe tudo o que se quiser colocar.
A Resolução já está rondando há mais de 15 anos, e o Brasil
até agora não tomou conhecimento. A própria consultoria jurídica da ONU opinou
que a resolução 1273 é ilegal dentro do direito internacional. Lia aqui: “Medidas
do Conselho de Segurança contra terrorismo não têm base legal, afirma
especialista independente da ONU”
O Ministro Moro joga com a bandeira da ONU, na verdade ele
quer mais poder. O Brasil não está sendo pressionado pela ONU. Esse modo
de usar a mão da ONU, do FMI, da OCDE, do Banco de Liquidações Internacionais
como arma interna de poder é esperteza antiga.
Nos próximos meses Moro terá que enfrentar desafios bem mais
complexos do que como juiz da Lava Jato. Estará sob exposição constante. E terá
que demonstrar uma desenvoltura muito maior do que nos interrogatórios de réus
e testemunhas.
Além disso, terá pela frente as denúncias contra aliados. Na
Lava Jato havia o álibi de que o alvo único era o PT por ser ele o partido que
estava no poder.
Será difícil encontrar outra narrativa para eximi-lo de atuar
nas denúncias envolvendo o governo Bolsonaro.
Peça 4 – Paulo Guedes e
seus chicagos boys
Paulo Guedes continua preso ao dogma de que um ajuste fiscal
imediato e radical trará imediatamente os investimentos de volta. A ideologia
cega o impede de pensar qualquer política anticíclica.
Esta semana, Michel Temer divulgou a relação das heranças
virtuosas que deixará para o sucessor, provavelmente antes de ser preso por
corrupção. Entre elas, investimentos de ordem de R$ 300 bilhões prontos para
serem deflagrados.
Na verdade, a carteira de financiamentos aprovados pelo BNDES
é bem maior do que essa quantia. Mas está tudo paralisado pelas loucuras
cometidas pela Lava Jato do Rio de Janeiro, os atos atrabiliários contra
funcionários do banco, criminalizando operações normais. O governo Temer não
teve sequer a competência de destravar esses financiamentos. E, agora, os
apresenta como se tivessem sido preparados em sua gestão.
Nesse ponto, a entrega da infraestrutura para os militares
facilitará esse destravamento.
Mas as expectativas fantasiosas do mercado – como a de uma
reforma radical da Previdência – não sairão do papel.
Tem-se, hoje em dia, um quadro complexo:
A recessão continua derrubando a arrecadação fiscal. A nova
lei trabalhista, ao desestimular o emprego formal, está reduzindo drasticamente
as contribuições previdenciárias e a arrecadação fiscal.
A ideia de instituir um regime de capitalização é totalmente
fantasiosa. Hoje em dia o sistema é de repartição simples: isto é, a
arrecadação de hoje paga os benefícios de hoje. Se a arrecadação está sendo
insuficiente para a repartição simples, de onde tirará recursos para a
capitalização? Por acaso irá reduzir os benefícios aos militares ou ao
funcionalismo público?
A reforma ocorrida anos atrás, instituindo um regime de
capitalização para novos funcionários, é a maneira correta, com os benefícios
aparecendo gradativamente. Não há milagres que tragam resultados instantâneos.
As únicas medidas de resultado imediato seriam um encontro de
contas com os estados, visando resolver a questão da previdência estadual. Mas
dificilmente a equipe de Guedes terá imaginação criadora e convicção cartesiana
para superar o ideologismo rotundo que a domina.
Peça 5 – o fator militar
A cada dia que passa, a cada declaração dos filhos, dos
Ministros da cota dos Bolsonaros, mais nítido fica a falta absoluta de
condições de governabilidade. Já se abriram as comportas do escândalo, apesar
de todo antipetismo da mídia e do tempo de carência que, geralmente, se trata
um novo governo.
Dependendo do ritmo dos escândalos, será inevitável o
enquadramento final de Bolsonaro, obrigando-o a afastar os filhos e a reduzir a
máquina de falar besteiras. E, pelo fato de ser o único centro de racionalidade
do governo, cada vez mais os militares assumirão poder.
GGN