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quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

IDIOTAS DOMINAM DE VEZ O PAÍS?, POR CLEITON LEITE COUTINHO


Em curto período conseguiu destruir parte considerável da Amazônia, armar ainda mais os ruralistas e milicianos, ampliar de forma considerável a violência nas suas diversas formas.
Foto: AFP
Ou disputamos os espaços de reflexão e opinião pública ou os idiotas dominam de vez o país.

Nelson Rodrigues certa feita disse que “os idiotas iriam tomar conta do mundo”, pela quantidade ao observar que eram muitos.

Infelizmente esse tempo chegou. Somos governados em todas as esferas por eles.

Em São Bernardo do Campo, por exemplo temos um prefeito idiota, que impõe forte pauta de retrocessos na cidade que vai da retirada de direitos dos servidores públicos municipais, como no caso da nefasta reforma da previdência aprovada à derrubada de casas de famílias, que residem em determinadas regiões da cidade há décadas, como é o caso dos moradores do Novo Parque e região.

A situação se repete no Estado de São Paulo, onde o também governo tucano liderado pelo governador, não menos idiota, João Dória impõe intenso sofrimento aos servidores públicos estadual, com a mesma fórmula da reforma da previdência, acompanhada de um alto índice de desemprego, desindustrialização, desaquecimento da economia e, por consequência, aprofunda à forte recessão econômica.

Em Brasília está o idiota mor. Não consegue passar um único dia, sem falar ou fazer algo que prejudique o nosso país.

Em curto período conseguiu destruir parte considerável da Amazônia, armar ainda mais os ruralistas e milicianos, ampliar de forma considerável a violência nas suas diversas formas, como: à violência doméstica, que já conta com o registro histórico de alta do feminicídio, passando pela homofobia e toda forma de crimes violentos, além de suprimir direitos trabalhistas que haviam sidos consagrados à preço de sangue e com muita luta, impondo nesse contexto uma forte depressão social no país.

Não bastasse tudo isso, ainda sanciona o famigerado pacote anticrime que tende a aumentar de forma considerável a população carcerária, na contramão de qualquer proposta que observe a causa do aumento da criminalidade que indiscutivelmente tem suas raízes na profunda e secular desigualdade social.

Diante do quadro que vivemos cabe a reflexão: como essas pessoas chegaram a esses postos de comando do país e como praticam tantas atrocidades sem que o povo passe a se indignar ao ponto de reagir e fazer cessar tamanho absurdo?

A resposta não exige grande esforço intelectual ou mesmo uma análise sociológica profunda sendo tão óbvia que custa até acreditar.

Culpar a população por ter votado nesses idiotas não basta. O povo vota na sua maioria, a partir da referência de alguma pessoa que o tem por “liderança”.

Essas pseudolideranças estão em várias partes: nos bares, salão de cabeleireiro do bairro, nos campos de futebol, nas igrejas, pontos de ônibus, festinhas de aniversários, churrascos…

Basta juntar duas ou três pessoas que elas já entram em ação. Parecem “isentos” à política e com isso penetram mais fácil nos espaços e a partir daí o estrago é enorme.

Com uma superficialidade incrível induzem um diálogo desprovido de dados, estatísticas ou qualquer base sólida de informação e sem qualquer aprofundamento começam a “formar opinião” na cabeça das pessoas em um processo degradante de despolitização social, situação que serve as redes sociais e WhatsApp também.

Gostam da abordagem genérica e já de cara fazem questão de dizer que todo o político é ladrão. A frase é irresistível de ter aceitação, o que se dá de forma quase unânime em qualuqer lugar, ainda mais considerado que os meios de comunicação já fizeram e seguem fazendo parte do trabalho de desinformar e deformar nesse sentido.

Contudo, na sequência induzem a conversa de forma direcionada, para atingir políticos e verdadeiras lideranças políticas, que de fato atuam ou podem atuar em prol da comunidade e do conjunto da sociedade.

A conversa então passa a ser direcionada e seletiva, com ataques a temas globais, porém, sempre sugerindo determinada figura ou partido que geralmente estão no campo da esquerda.

Então você deve estar se perguntando: por qual razão a esquerda não faz o mesmo?

Não faz e não fará! A esquerda sempre foi vocacionada a formar o cidadão crítico. Não aceita essa fórmula de ganhar eleições a todo custo, ainda mais apostando em despolitizar as pessoas.

A esquerda quer que essas pessoas entendam de economia, saúde, segurança e aprofunde nos temas participando de forma ativa da construção de uma sociedade justa, plural, fraterna e democrática.

Assim, parece óbvio que a mudança na estrutura política combalida de nosso país, impactando diretamente nos governos que iremos eleger nos próximos anos e o que farão ou não pelo nosso país, passa diretamente pela capacidade que teremos de conscientizar politicamente as pessoas.

Que a educação é importante isso é indubitável. Mas, o avanço ba politização da população nesse sentido, não passa necessariamente pelo grau de escolaridade e a formação acadêmica das mesmas, ao que esse padrão de formação produzida pelo Estado, não representa a libertação do nosso povo da alienação política. Contudo, não sejamos pretenciosos de afastar com isso à importância da formação em todos os graus, o que seria evidente equívoco.

Basta observar as pesquisas de opinião, onde as pessoas que atingiram maior grau de escolaridade, na sua grande maioria acabam por apoiar e votar nos piores governos e são avessos aos programas de governos mais avançados e de concepação política no mesmo sentido, ao mesmo tempo que acabam desconsiderando as liderancas produzidas e forjadas nas lutas populares ou nas camadas mais abastadas da nossa sociedade.

Precisamos politizar as pessoas, para que tenham compreensão da política de forma macro e deixem de serem alienados.

Isso não é possível em um papo de meia hora no bar, salão de cabeleireiro, igreja…, mas é possível em vários papos repetidos, por médio e longo períodos, nesses espaços.

Desta forma devemos disputar a narrativa dos temas que importam e impactam o conjunto da sociedade e só conseguiremos fazer isso estando efetivamente junto ao povo, pois é nessa ausência do diálogo direto com as pessoas que está o vácuo dos idiotas e eles estão prevalecendo. Tal fato, todavia, não deve ser restrito a população de baixa renda ou menos favorecida do nosso país, já que a consciência política deve atingir à todas as pessoas, momento em que nossa nação poderá ser realmente liberta dos idiotas.
Do GGN

Cleiton Leite Coutinho. Advogado. Presidente do Partido dos Trabalhadores de São Bernardo do Campo, Dirigente do SASP (Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo) e membro da ABJD (Associação Brasileira de Juristas Pela Democracia).

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

A BARBÁRIE CHEGOU, POR MARCELO AULER

A 19 dias do segundo turno, portanto, sem qualquer definição do que acontecerá e de quem presidirá o país nos próximos quatro anos, os adeptos da candidatura do capitão já se sentem donos do país. Respaldados apenas no bom resultado do primeiro turno, demonstram a quem ainda não conseguiu enxergar como pretendem comandá-lo. Não é nada agradável. Ao que parece, sentiram-se livre para demonstrar do que são capazes: impor medo e terror.
O quadro ao lado, recebido pelas redes e ampliado, demonstra apenas alguns acontecimentos ocorridos nos últimos dias nos mais diversos cantos do país. São fatos reais, em cidades diversas, sempre com a mesma marca: foram protagonizados por adeptos da candidatura de Jair Bolsonaro e mostram a violência. O desprezo pela vida. O desrespeito ao diferente ou a quem não pensa igual.
Não é demais lembrar que no dia 6 de setembro, o gesto tresloucado de Adélio Bispo de Oliveira, um mineiro com suspeitas de problemas psíquicos, atingiu o presidenciável Jair Bolsonaro em plena campanha, em Juiz de Fora (MG). Mesmo conscientes de estarem em uma disputa eleitoral acirrada, os demais candidatos se solidarizaram ao deputado federal do PSL, condenaram o gesto e até reduziram, na época, os ataques políticos. Manifestaram repúdio à violência com a qual não tinham qualquer envolvimento.
Nos últimos dias, porém, cenas de violência se repetem com uma frequência grande. Em comum o fato de serem protagonizadas por eleitores ou militantes da campanha do capitão do Exército. Muitas delas gravadas em vídeos. A maioria com registros na polícia. Demonstram que os militantes da candidatura militar – que acabam se confundindo com verdadeiros milicianos – diante dos resultados do primeiro turno, sentiram-se autorizados para, à luz do dia, e mesmo na presença de testemunhas, mostrar a violência que defendem e são capazes de realizar.
O mais impressionante é o silêncio obsequioso – autorizador? – de Bolsonaro. Ele próprio ainda se recuperando de um tresloucado ato de violência. Violência que, há muito, defende e propaga.
Se ele não pode responder pelos gestos de seus seguidores, apesar de muitos deles terem sido incentivados pelo discurso de ódio que sempre pregou, pode sim ser cobrado pelo silêncio diante de tamanha violência.
Silêncio que não se resume ao candidato à presidência. É compartilhado também pelo candidato ao governo do Rio de Janeiro, Wilson Witzen. Este, mesmo se vangloriando de ser ex-tenente dos Fuzileiros Navais – “onde aprendemos a hierarquia e a disciplina” – e ex-juiz federal, assiste impassível – e aplaude –  discursos de ódio dos candidatos coligados, como se fosse algo natural.
Tal como ocorreu em Petrópolis, cidade serrana fluminense, dias antes do primeiro turno. Ali, em momento lembrou-se de defender a lei e, principalmente, a civilidade. Tal como deveria ter aprendido ao pertencer às Forças Armadas e à magistratura. Em compensação, no debate político com o adversário, tenta se mostrar forte ao prometer dar-lhe voz de prisão diante de possível crime de injúria.
GGN

domingo, 3 de junho de 2018

FHC, O DEMIURGO DE ALMA PEQUENA, por Luis Nassif

Desde seus tempos iniciais em política, Henrique Cardoso se perdeu pela falta de coragem e excesso de oportunismo. De certa forma ele lembra CFOs de uma empresa, que se preocupam exclusivamente com o próximo balanço trimestral e em preparar as desculpas para a assembleia de acionistas.
Não cometeria a indelicadeza de compará-lo ao ex-Ministro Cristovam Buarque, que é um FHC sem nenhuma sutileza intelectual.Também não gosto de reduzir os grandes conflitos públicos aos fatores pessoais, aos pequenos sentimentos de inveja, arrogância, prepotência, tão ao gosto dos diagnósticos de redes sociais.
Mas, em FHC, há algumas características de caráter nítidas como prego em vinil, essenciais para entender suas atitudes.
A primeira é a abulia, a falta de vontade absoluta em intervir na realidade social ou política. Sua única lógica é abrir a economia para os grandes capitais e esperar como resultante a geração expontânea de uma corte renascentista. É típica de um certo tipo de intelectual que, ascendendo a uma posição política, ganha um gramofone de tal potência, que o transforma em demiurgo das frases feitas. O intelectual precisa de pensamento. Ao demiurgo, basta apenas os bordões e a fé. Em graus distintos, são da mesma natureza FHC, Carmen Lúcia, Ayres Brito, Luís Roberto Barroso e seu guru Flávio Rocha, Cristovam Buarque.
A segunda é a inveja, na sua expressão mais comezinha. Na campanha de 2002, José Serra, candidato do PSDB, acusava FHC de boicotá-lo com receio de sua sua gestão ofuscasse a dele e sabendo que, com Lula, o desastre seria tal que o povo o chamaria de volta. Quem passou a conhecer Serra – e FHC conhecia-o como a um filho – sabia que sua desconfiança era infundada. Mas Serra conhecia profundamente a alma do parceiro-padrinho para identificar os sentimentos preponderantes.
O artigo de FHC no Estadão de hoje, “Decifra-me ou te devoro” é uma reedição do velho FHC. Traz um diagnóstico óbvio - a necessidade de um pacto que organize o centro -, em cima de um sentimento óbvio – o cansaço de parte da opinião pública com a radicalização e a falta de um candidato competitivo em seu campo.
Quando o sentimento óbvio da turba era a de massacrar os adversários, lá vinha FHC acendendo a pira. Quando era o de cantar o Hino Nacional, lá surgia ele abraçado a Aécio Neves e José Serra, berrando a plenos pulmões. Quando Lula foi preso, lá foi ele avalizar a prisão, logo ele que, mal saído da cadeira de presidente adquiriu um apartamento por um terço do valor de mercado..
Agora, a prisão de Lula alçou-o à condição de preso político, conferindo-lhe uma dimensão de martírio similar ao de outros grandes pacificadores do século 20. É óbvio ululante que qualquer pacto nacional teria que passar pela libertação de Lula e pelo fim da perseguição política a que está submetido.
Mas FHC jamais conseguiu atender ao último desejo do amigo Sérgio Motta, que lhe implorava: não se apequene. Um ego gigantesco em uma alma pequena.
Do GGN

sexta-feira, 11 de maio de 2018

FILME O PROCESSO. O PESADELO DO BRASIL EM REGISTRO, por Urariano Mota

Assistimos ontem no Recife à pré-estreia de O Processo. O cinema São Luiz estava lotado, como em suas melhores noites, com todas idades e classes sociais. Estávamos  jovens e muito jovens, maduros e muito maduros, a cantar e gritar várias bandeiras, das quais a mais unitária foi #LulaLivre. A agitação no público era tamanha, que gritos se ouviam até mesmo quando as luzes no cinema se apagaram. Quanta rebeldia reprimida. As vozes somente pararam quando alguém gritou: “quem fizer barulho é golpista!”. Silêncio na plateia. Então o documentário começou.
Agora, enquanto escrevo, pesquiso e leio uma sinopse onde se fala: “O documentário acompanha a crise política que afeta o Brasil desde 2013 sem nenhum tipo de abordagem direta, como entrevistas ou intervenções nos acontecimentos. A diretora Maria Augusta Ramos passou meses no Planalto e no Congresso Nacional captando imagens sobre votações e discussões que culminaram com a destituição da presidenta Dilma Rousseff do cargo”. E mais descubro. Na estreia mundial de O Processo, no Festival de Berlim, o filme foi aplaudido sob gritos de “bravos”, o que nunca havia acontecido com um filme antes em terra alemãs. Em Portugal, quando recebeu o prêmio de melhor longa-metragem no festival de cinema IndieLisboa, o júri assim falou sobre as razões da escolha: "Pela sua montagem aberta, que é fluente e elegante. Trata-se de um drama político contado através da narrativa clássica sem cair no classicismo gramatical e formal."
Mas nós, que assistimos à pré-estreia no Recife, bem podemos acrescentar outras razões de público e amantes do cinema. Tanto na abertura, quando um voo de helicóptero sobre Brasília nos mostra os lados de amarelos e vermelhos em confronto sobre a terra, até atingir as cenas finais, atravessa a gente um sentimento de indignação e afeto profundo pela memória da militância contra o impeachment. Então sabemos que O Processo é um dos melhores documentários do Brasil até hoje. E se me fazem um desconto do entusiasmo, pois o filme continua dentro da cabeça até agora, ouso  escrever mais claro: O Processo é um dos melhores documentários do mundo. Entendam as razões.
Quando o debate se abriu para o público, pude falar no microfone em meu natural pouco eloquente. Na medida do que lembro de ontem à noite, consegui falar: “Ao ver os últimos 10 minutos, quando se completa o golpe, e a digna representação dos parlamentares do PCdoB e do PT que discursaram contra o impeachment, senti que O Processo devia se chamar O Pesadelo. E pude perceber que o documentário no Brasil, que já havia  atingido um ponto culminante com Eduardo Coutinho, e passa pelos belos filmes de Vladimir Carvalho, ganhou um novo caminho com esse documentário. De todas as maneiras se faz arte. Neste, o que parecia ser uma grande reportagem se fez arte. Acredito que este é um filme que sobreviverá a estes malditos anos. Se me permite uma sugestão, só lhe peço que não siga o roteiro de alguns estetas da reportagem da imprensa, que lhe pedem o relato do  método ou técnicas do filme. Para mim, seria como transformar o quadro Lição de Anatomia, para pegar a experiência holandesa da diretora, e limitá-lo à descrição do desenho, tons, sombra e tintas. Transformar a arte em um verdadeiro cadáver da composição. Creio que de modo mais simples você poderá dizer que fez esse filme com intensa paixão. E com imenso talento, como acabamos de ver”.
O que disse no microfone ontem,  bem ou mal, bem e mal no calor da emoção, continuo aqui: os discursos da bancada de bravos que resiste, no dia da conclusão do impeachment, o discurso de Dilma ao se despedir, o rosto de Lula no plenário,  nessas imagens pudemos ver o Brasil de hoje,  com o pior parlamento da nossa história, com o presidente mais entreguista que tivemos, e a desgraça anunciada nos discursos que se cumpre com a perda de direitos inalienáveis do povo,  como saúde e trabalho.  
Já antes, a militante e professora Isa Ferreira me perguntou o que fazer diante dessas agressões contra os brasileiros, e se eu achava que sairíamos desta e como sair. Quem sou eu para achar, se me encontro tão perdido? Mas na hora lhe respondi que não sei como, mas que se houver uma saída popular, talvez não alcance os nosso dias. Enquanto isso, não poderemos submergir à depressão e desespero desta má hora. Cada um que lute à sua maneira, da melhor forma possível.
Ao voltar para casa, o motorista do Uber, que é músico e trabalho pela madrugada a dirigir um carro, me falou que vivemos hoje uma distopia. É isso, sim, é isso, eu me falei para mim, surpreso da qualificação que o jovem trabalhador dá para o que vivemos. Então me veio à lembrança de novo de O Processo como O pesadelo. O nome de uma obra sempre vem  depois. Nunca antes, como o batismo que damos a um filho.
Em uma ocasião, a diretora falou em entrevista: “Nós não sabemos para onde isso vai, e isso é angustiante e doloroso... Essa é a minha contribuição para esse momento que estamos vivendo”. Sem dúvida. O documentário de Maria Augusta Ramos realiza o seu presente deste infeliz momento. E mal pude dormir até a hora de escrever estas linhas.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

O agravamento da crise e Lula como saída, por Aldo Fornazieri

Foto Ricardo Stuckert

Duas pesquisas publicadas nos últimos dias confirmaram a tese que defendemos no artigo publicado na semana passada: a de que houve um efeito saturação com as denuncias e ataques a Lula. A pesquisa CNT mostra que Lula venceria as eleições de 2018 em todos os cenários. E a pesquisa Ipsos mostra que a rejeição de Lula cai e que aumenta a rejeição do juiz Moro, de Dória, Bolsonaro e vários outros políticos. A falta de materialidade de provas contra Lula reforça a ideia de que ele é alvo de um ataque persecutório por parte de Moro. Dória vem se evaporando no ar por diversos motivos. Já, Bolsonaro, começa a assustar os eleitores na medida em que, de sua boca, saem investidas de cavalaria.

A crise política e institucional, contudo, parece não ter chegado ao apogeu e a complexidade e incertezas que ela suscita tendem a aumentar. O fato é que o golpe desorganizou o funcionamento institucional e já não há governo, não há Congresso e não há Judiciário funcionando nos parâmetros da normalidade democrática e institucional. Nem o Judiciário e nem o Congresso mostram-se capazes de solucionar a crise. A questão central é essa: há um governo ilegítimo, sem nenhum apoio social, cujo presidente da República é chefe de uma organização criminosa, nas conclusões da Procuradoria Geral da República. O presidente e as instituições estão desmoralizados e sem legitimidade.

O povo brasileiro está posto de joelhos em face da incapacidade da oposição de produzir um movimento de massas para tirar o presidente. O presidente, por força da Constituição, é comandante-em-chefe das Forças Armadas. Não é normal que as Forças Armadas de um país, com os seus padrões de disciplina, hierarquia, ordem, sensos de honra e moralidade, sejam comandadas por um chefe que, ao mesmo tempo, é chefe de uma organização criminosa, conforme conclusão de investigações. É neste contexto que deve ser compreendido o pronunciamento de militares, agora da ativa.

O pronunciamento dos militares faz crescer o impasse da crise. Se, por um lado, é correto que eles não podem aceitar como comandante alguém que chefia uma organização criminosa, por outro, há um claro limite constitucional para a sua ação política. Eles não podem agir como poder interventor acima da Constituição. Mas ao mesmo tempo, o Judiciário e o Congresso mostram-se incapazes de solucionar a crise, ao menos parcialmente, com a remoção do presidente ilegítimo.

Ao impasse militar e ao impasse do Congresso e do Judiciário, soma-se um terceiro impasse: A investida de vários setores na sanha quase cruenta para impedir a candidatura de Lula à presidência. Esses setores são legionários do caos, estimuladores da desobediência civil, engendradores de rebeliões. Se o Brasil, a República, as instituições e o sistema político estão destroçados e carentes de legitimidade, como tirar do processo eleitoral o líder com maior legitimidade? E como tirá-lo a golpes arbitrários, sem provas cabais de ter cometido os delitos de que é acusado? Como tirar do jogo eleitoral justamente o líder que pode reconfigurar a legitimidade institucional? Na verdade, esses setores, estão armando um ciclone de grandes  proporções no horizonte da política brasileira.

A hora do confronto
A crise brasileira só poderá ter um início de solução pacífica se o processo eleitoral for marcado pela legalidade e legitimidade, o que implica permitir que Lula dispute as eleições. Se este é o requisito condicional de uma eleição democrática, as forças progressistas e de esquerda precisam se organizar e organizar linhas de defesa desde já para salvaguardar a democracia. Os líderes progressistas atuais terão seus nomes inscritos na ignominiosa histórica da covardia se agirem como agiram na derrubada de Dilma, na aceitação de fato de Temer e na falta de reação na votação da reforma trabalhista.

Alguns analistas, inclusive de esquerda, afirmam que Lula é passado, que faz parte do arranjo que emergiu da Constituição de 1988 e que este arranjo desmoronou porque expressava a conciliação e esta não tem mais lugar a partir do golpe. Nisso tudo, apenas a última afirmação é verdadeira. Na verdade, há uma enorme incompreensão na avaliação de que Lula é passado. Ocorre que o movimento positivo do país que nasceu com a nova Constituição e que teve nos governos Lula seu ponto mais alto, teve sua trajetória interrompida e o Brasil está passado por um grave retrocesso nos direitos, na cidadania, na democracia, na ciência e tecnologia, na soberania, na pluralidade, na convivência, na cultura etc..

Lula é o único líder, neste momento, capaz de interromper este retrocesso, pois as forças democráticas e progressistas estão desorganizadas e desorientadas. O país não vive nenhuma situação revolucionária. Pelo contrário, o memento é de resistência para impedir uma destruição maior. Este momento requer unidade das forças progressistas e capacidade de liderança e comando. O conteúdo que o movimento em defesa da candidatura Lula e de sua possível candidatura vierem a assumir dependerá do grau de unidade e de engajamento das esquerdas, dos democratas e progressistas nesses esforços. Trata-se de um conteúdo em disputa, que dependerá da força política o organizacional que os setores progressistas dispuserem para barganhar no programa  ser construído e nas políticas públicas que poderiam vir a ser implementadas.

A fragmentação das forças progressistas as despotencializará, reduzindo o número de deputados, senadores e governadores eleitos. Dividir e fragmentar significa ser a esquerda que a direita quer. A unidade tem que ser com Lula ou sem Lula, se ele for impedido. Se o momento é de resistência e de recuperação terreno tomado pelo inimigo, trata-se de ser prudente, econômico nas expectativas e severo nas advertências, pois os riscos de novas derrotas são significativos. Lula terá que ter a  sabedoria e a humildade para conduzir essa unidade e o PT terá que deixar de lado o seu costumeiro exclusivismo, fazendo concessões justas ao seus aliados.

Mas tudo isto é possível? A resposta a esta pergunta é mais de dúvida do que de certeza. A esquerda é madrasta de sua própria desgraça. Lutar para afastar Temer, mobilizar para garantir a candidatura Lula e construir a unidade democrática e progressista são as três principais tarefas da conjuntura. Mas o que se vê nos partidos, movimentos e organizações sociais e de esquerda é mais confusão, dispersão, falta de unidade e de rumos.

A fragmentação que está se armando caso Lula não possa concorrer poderá produzir uma nova derrota devastadora: nenhum candidato progressista no segundo turno das eleições presidenciais. Este seria o preço a ser pago pela ausência de responsabilidade histórica e pela ambição inconsquente dos partidos e de potenciais candidatos do campo progressista.  A incapacidade de perceber o momento histórico-político do país faz com que partidos e grupos mirem os seus egoísmos particulares ao invés de olharem para o sofrimento do povo e suas necessidades.

Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP). 


Do GGN

terça-feira, 18 de julho de 2017

'A convulsão social já está ocorrendo', Aldo Fornazieri

Na opinião de professor de Filosofia Política da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp) Aldo Fornazieri, "Temer está dando uma aula de como os profissionais de uma quadrilha reagem com força para se manter no poder". Para ele, "a esquerda está acomodada", Michel Temer “está quebrando o país mais do que já está quebrado”.

Em meio à maior crise política de sua história recente, o Brasil espera o fim do recesso parlamentar para conhecer a decisão, pelo plenário da Câmara dos Deputados, sobre o futuro de Michel Temer. A votação que pode ou não autorizar o Supremo Tribunal Federal a dar prosseguimento ao processo está prevista para o dia 2 de agosto, quando o peemedebista precisará de 172 votos para evitar esse desfecho e, na prática, o fim de seu governo.

Para Fornazieri o país já vive uma convulsão social. “Na verdade, a convulsão social está ocorrendo, mas não pela via política. Está ocorrendo na guerra civil no Rio de Janeiro, com a violência espalhada pelo país e a quebradeira geral dos serviços brasileiros pelo governo”, diz.

Para ele, o problema é que Temer até o momento tem sido bem sucedido em suas manobras e articulações para se manter no poder. “Do ponto de vista político não acontece nada. A esquerda está acomodada, o Lula é condenado e não vimos ainda manifestações contra a condenação. Por esse caminho não acredito em convulsão social.” A apelação do ex-presidente Lula da sentença do juiz Sergio Moro, que o condenou a 9 anos e 6 meses de prisão, será julgada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em data ainda imprevisível.

Na visão de Fornazieri, Temer tem “grandes chances” de se salvar. “Ele está fazendo um jogo pesado para isso. Está dando uma aula de como os profissionais de uma quadrilha reagem com força para se manter no poder, gastando bilhões do dinheiro público. Não vejo mobilizações suficientes para tirar Temer do governo”, afirma Fornazieri.

Ele acredita que as manifestações dia 20 precisarão ser grandes para configurar um contraponto popular à mobilização parlamentar e articulação política do grupo palaciano. “Qual vai ser o tamanho e o alcance dessas manifestações? Até hoje as manifestações da esquerda na Paulista não passaram de piqueniques cívicos”, diz Fornazieri. Em sua opinião, as mobilizações teriam que envolver muito mais gente do que a militância organizada que faz parte das estruturas dos partidos e sindicatos.

Para se manter no poder, o presidente “está quebrando o país mais do que já está quebrado”. “E não se vê uma contrapartida das oposições nas ruas. As oposições são minoria no Congresso, mas estão se submetendo ao jogo puramente parlamentar, enquanto no contexto do golpe e do impeachment da Dilma foram mobilizadas milhões de pessoas nas ruas", afirma ainda o professor.

Na quinta-feira (13), a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara rejeitou, por 40 votos a 25, o relatório do deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), favorável à autorização para abertura do processo contra Temer no STF.

Segundo a ONG Contas Abertas, o governo federal liberou em junho R$ 134 milhões em emendas parlamentares a 36 dos 40 deputados que votaram a favor de Temer na CCJ.Para Antônio Augusto de Queiroz, diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), os cenários na atual conjuntura são basicamente três: “a) renúncia, por exaustão do governo; b) a cassação, por decisão do STF, após autorização da Câmara dos Deputados; e c) a Sarneyzação do governo, ou a imagem do “pato manco”, com a equipe econômica e o Congresso fazendo o feijão com arroz, sem qualquer reforma relevante”. Na opinião do analista, o primeiro cenário “é realista, o segundo pessimista e o terceiro otimista”.

Da RBA

domingo, 2 de julho de 2017

Xadrez dos atos estranhos do Ministro Fachin, por Luis Nassif

Nos últimos dias aconteceram vários episódios que, de certo modo, enfraquecem o Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot e dão algum alento à organização que tomou conta do Executivo. Mas não indicam  mudança radical na correlação de. Mesmo porque ainda há um enorme acervo de malfeitos de Michel Temer e seu bando a serem revelados.

O STF (Supremo Tribunal Federal) continua sendo uma incógnita.  Não  se sabe para que lado vai e o que motivou a mudança surpreendente de posição do Ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato.

Há algo de podre no ar, mas ainda não há clareza sobre tamanho e consistência.
Nos últimos dias houve uma confluência de fatores que permitiu algum contra-ataque da turma de Michel Temer.

Passo 1 – críticas gradativas dos jornais aos métodos da Lava Jato, por aplicar o direito penal do inimigo nos amigos.

Passo 2 – o impacto da nomeação da nova Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, marcando simbolicamente o fim da era Janot.

Passo 3 – Mudanças no comportamento do STF. Aumentou a intenção de enquadrar a Lava Jato nos limites da lei. Mas  não está claro se já começou, em definitivo, a operação pizza.

Passo 4 – movimentos de reação da Lava Jato contra Raquel Dodge, valendo-se de suas parcerias com a mídia. Não duraram meio dia. Foi a verdadeira batalha de Itararé, na qual Dodge venceu sem precisar combater. Dodge se consolida antes de precisar atuar.

Vamos entender em mais detalhes o que se passa.

Peça 1 – a mudança de Luiz Edson Fachin
Fiscaliza-se um juiz pela análise de suas sentenças.

Todo juiz tem direito à liberdade de julgar, de formar suas próprias convicções. Mas não o de usar um critério para cada caso. E quando usa dois critérios distintos para o mesmo caso, tem algo estranho no caminho.

Dr. Fachin era garantista com veleidades sociais. Depois se tornou um vingador impiedoso.

Um pequeno balanço de algumas decisões recentes dele :

No dia 26 de abril de 2017, investiu contra a libertação de presos da Lava Jato.

Mostrou-se indignado com a libertação de João Cláudio Genu, ex-tesoureiro do PP, e com a pena alternativa de prisão domiciliar para José Carlos Bumlai, ambos condenados por Sérgio Moro. Os jornalistas perguntaram se as decisões facilitariam outras medidas semelhantes. E Fachin respondeu: “Saí daqui ontem com vontade de reler o Ibsen, ‘Um Inimigo do Povo’ e a história do doutor Stockmann".

No dia 2 de maio de 2017 foi derrotado na votação que decidiu pela libertação de José Dirceu. Sua justificativa: “Eventual excesso na duração de prisões cautelares não deve ser analisado diante de prazos estanques, não se trata de uma questão aritmética. É indispensável que tal circunstância seja aferida de modo particularizado, à luz das peculiaridades de cada caso (...) Estamos aqui nesse caso a tratar em acusação, digo e repito, a tratar da criminalidade do colarinho branco”. Anote suas palavras.

No dia 4 de maio negou habeas corpus para Antônio Pallocci.  Fez mais: para impedir que a 2aturma revogasse sua decisão, decidiu levar a questão para plenário.

No dia 3 de junho de 2017, autorizou a prisão preventiva do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures. Considerou que Loures, em liberdade, representaria risco às investigações: “o teor dos indícios colhidos demonstra efetivas providências voltadas ao embaraço das investigações, de modo que não é difícil deduzir que a liberdade do representado põe em risco, igualmente, a apuração completa dos fatos”. “Não é difícil deduzir” significa que os fatos não deixam margem a dúvidas.

Ai aparece uma pedra no caminho do nosso templário.

No dia 10 de junho de 2017 a revista Veja informou que a ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) teria sido acionada por Michel Temer para investigar a vida de Fachin.

No mesmo dia, Fachin prosseguiu em sua sanha penalista, negando habeas corpus ao procurador da República Ângelo Goulart Vilella, acusado de levar propina da JBS, e preso há 45 dias sem sequer ter sido interrogado. “Tratando-se de decisão de natureza cautelar, eventual modificação do panorama fático-processual que autorize a sua revisão deve ser objeto de deliberação pela autoridade judiciária competente que, no caso em análise, não é mais o Supremo Tribunal Federal, mas o Tribunal Regional Federal da 3ª Região”.

Aí se entra o caso Loures.

O que é solicitado pela defesa 
Segundo consta da própria decisão de Fachin, os advogados de Loures solicitaram uma das três alternativas: prisão domiciliar, remoção para o 19o Batalhão Militar ou retorno ao presídio da Papuda.

O tempo de julgamento na Câmara 
Volte ao argumento de Fachin ao negar a libertação de José Dirceu.

Compare com o argumento utilizado para libertar Rocha Loures:

“A necessidade de se aguardar a autorização pela Câmara dos Deputados implica em alongamento da prestação jurisdicional que, neste momento, não merece ser suportada com a privação da liberdade. O tempo para o cumprimento da regra constitucional que impõe exame dessa autorização prévia não pode se converter em redobrado gravame ao ora denunciado”.

O que Fachin oferece a Loures 
Os advogados de Loures tinham requerido transferência para outros presídios ou prisão domiciliar. Fachin oferece mais do que isso, a liberdade:

a) recolhimento domiciliar no período noturno (das 20h às 6h) e nos  dias de sábados, domingos e feriados, a ser fiscalizado por monitoração eletrônica;

b) proibição de manter contato com qualquer investigado, réu ou testemunha relacionadas aos feitos a que responde;

c) proibição de ausentar-se do País, devendo entregar seu passaporte em até 48 (quarenta e oito) horas;

d) comparecimento em juízo para informar e justificar atividades sempre que requisitado, devendo manter atualizado o endereço em que poderá ser encontrado.

O álibi da isonomia 
Vale-se, para tanto, do uso escandaloso do conceito de isonomia.

Andrea Neves não tem cargo parlamentar, não tem proximidade com o grupo de Temer e foi detida por supostamente ter negociado o apartamento da mãe com a JBS. Do primo de Aécio, a única coisa que se sabe é que se ofereceu para servir de mula e transportar o dinheiro.

Loures é operador de Temer, homem da estrita confiança, foi gravado negociando propinas em troca de facilidades com o setor público.

No entanto, ele apela para a libertação de Andrea como álibi para libertar Loures.

Acompanhe a cronologia abaixo:

·       No dia 16 de março de 2017, Loures reuniu-se com Joesley Batista que lhe solicitou resolver negócio no Cade (Conselho Administrativo de Direito Econômico) envolvendo a venda de gás da Petrobras para a Âmbar, empresa do grupo. Na gravação, negocia 5% do lucro da operação para Temer.

·       No dia 13 de abril a Petrobras assinou o contrato com a Âmbar.

·       No dia 8 de junho o contrato é cancelado.

Tem todos os elementos de convencimento de um ato de corrupção:

1.     A indicação, por Temer, do seu homem de confiança para negociar com Joesley.

2.     A negociação entre Loures e Joesley Batista em torno dos interesses da JBS na Âmbar.

3.     Loures sai do encontro com uma mala de R$ 500 mil.

4.     Logo depois, a Petrobrás assina o contrato com a Âmbar.

Havia sinais nítidos de que Loures iria aceitar o acordo de delação.

Mesmo assim, Fachin esqueceu completamente o que escreveu menos de um mês antes.

A governabilidade
Em nenhum momento invocou-se o chamado periculum in mora, o risco da decisão tardia, para segurar o impeachment de Dilma.

O Supremo (ou seria apenas Fachin?) envereda agora, por um garantismo tardio, visando preservar o equilíbrio entre os poderes.

Ora, para se manter a organização criminosa controlando o Executivo, a condição essencial – justamente para evitar o periculum in mora seria manter detido o principal operador de Michel Temer. Enquanto o presidente permanece, pela necessidade de aprovação do julgamento pelo Congresso,  se mantém fora do jogo seu operador.

O fato é que Fachin voltou atrás radicalmente sem uma explicação plausível. Não havendo, há três hipóteses:

1.     Cedeu às ameaças do grupo de Temer.

2.     Foi seduzido por alguma conversa com o velho Rocha Loures, grande ex-presidente da FIEP (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), conterrâneo de Fachin.

3.     Produziu um documento fake pelo fato de Loures ter concordado com a delação.

Não há hipótese benigna para o ato de Fachin.

Peça 2 – a retórica afasta-de-mim este cálice
A Suprema Corte brasileira desenvolveu uma metodologia tupiniquim para não correr riscos desnecessários (para seus autores), embora essenciais (para a garantia constitucional).

O princípio do comigo-não-violão 
Um ou outro Ministro assume uma atitude, ainda que pequena, contra a unanimidade. Dada sua contribuição, ele faz mentalmente uma contagem de sacrifícios individuais em defesa da Constituição. E diz para si próprio: comigo não, violão, já cumpri a minha parte.

O álibi da referência jurídica 
Primeiro, desenvolve-se a tese que atenda aos interesses pessoais, políticos ou ideológicos da corte. Depois, busca-se uma referência jurídica para avalizá-la.

No caso do mensalão, o Ministro (e ex-procurador) Joaquim Barbosa adotou a “Teoria do Fato”, do alemão Claus Roxin para condenar acusados, pelo simples fato de estarem no comando de partidos ou do governo, sem a necessidade da busca de provas maiores.

A interpretação foi criticada pelo próprio  Roxin em entrevista á Tribuna do Advogado.

Agora, para bater em retirada, o bravo STF recorreu ao jurista português José Joaquim Gomes Canotilho. Durante duas semanas Canotilho foi servido ao molho pardo nas discussões do Supremo, para fortalecer a tese de que a casa deve exercer poder moderador, para evitar instabilidade política e confronto entre poderes.

E, depois de deglutir Canotilho com quiabo, decidiram – na competente descrição do jornalista José Casado – “reafirmar seu poder até o limite (...) em nome da confiança do Estado e da segurança jurídica”. Alvíssaras!

E chamam a debandada de “reafirmação de poder”.

A tilápia e a piranha 
Para embasar uma decisão esdrúxula, encontre um caso anterior qualquer e o trate como precedente para uma decisão de isonomia, mesmo que não tenha nada a ver com o caso presente. Tipo, posso liberar uma piranha para nadar no rio, porque há um precedente liberando a tilápia e, sendo ambos peixes, há que se garantir a isonomia de tratamento.

As interpretações a posteriori
A Constituição escolheu o modelo presidencialista. Por ele, não há maneira de tirar o presidente por problemas administrativos. Isso só ocorre no parlamentarismo, com o voto de desconfiança.

Depois de consumado o impeachment de Dilma, em entrevista à Globonews o Ministro Luís Roberto Barroso resolve “olhar retrospectivamente” para admitir o ataque à Constituição : “Olhando pelo retrovisor, eu penso que se utilizou um instrumento parlamentarista para a destituição de um chefe de governo no modelo presidencial, e, portanto, houve um abalo institucional”.

Pela manipulação política constante da interpretação jurídica, fica-se sem saber para onde sopra o vento do STF.

Peça 3 – o fim do estrelismo da Lava Jato
São promissores os primeiros sinais da futura gestão da nova PGR Raquel Dodge.

Mal foi indicada, já sofreu o primeiro ataque de procuradores da Lava Jato lotados na força tarefa da PGR.

O recado foi curto e grosso – mais grosso do que curto . Esses procuradores não gostam de Raquel Dodge, acreditam que não terão a mesma liberdade que tiveram com a falta de comando de Rodrigo Janot e, se não receberem atenção especial dela, pedirão demissão.

Valeram-se dos canais habituais que consolidaram na imprensa.

Na parte da tarde, soltaram uma nota oficial de apoio a Raquel.

De Brasília, provavelmente não restará ninguém da Lava Jato. No novo grupo que assumirá a PGR a opinião é que o grupo de Brasília foi montado às pressas, sem colocar especialistas. Os que entraram primeiro convidavam conhecidos.
 Em alguns casos, um procurador entrou porque a cônjuge foi convocada para um trabalho em Brasília.

Em reportagem do Valor Econômico, antes de ser indicada, Raquel Dodge resumiu o estilo que pretende implantar na PGR:

·       Mecanismos que permitam um controle maior sobre os inquéritos e dificultem os vazamentos.

·       Cooperação entre órgãos da administração pública para agilizar os acordos de leniência.

·       Diagnóstico das ações civis públicas, para impedir que a paralisação de uma obra, ainda que seja por questão de corrupção, não acabe sendo mais onerosa para o país do que o próprio custo da corrupção. “A obra foi paralisada, mas resolveu-se o problema do asfalto esburacado?”pergunta.

·       Criação de grupo de trabalho para monitorar o cumprimento, pelos delatores, do que foi acertado no acordo de delação.

·       Manter o sigilo das investigações para garantir a dignidade das pessoas envolvidas, já que vazamentos podem induzir a erros, como o de tratar uma testemunha como suspeito.

Foi um discurso não apenas para o pessoal de dentro, mas uma promessa de trazer o MPF de volta ao leito institucional e aios princípios que devem nortear a ação de um procurador – isenção, discrição, respeito aos direitos individuais, não-exibicionismo.

Não apenas isso.

A indicação de Raquel Dodge renovou as esperanças do Ministério Público suíço, de montar uma colaboração com o Brasil. 15 meses depois de anunciada a criação de uma força-tarefa conjunta, para investigar casos de corrupção, a proposta não andou, bloqueada pelo Ministério da Justiça do Brasil.

Talvez, aí, destrave as investigações sobre as relações de Ricardo Teixeira com a CBF (Confederação Brasileira de Futebol), que jamais avançaram no período Rodrigo Janot.

Vamos aguardar mais desdobramentos dos últimos capítulos antes de arriscar os desdobramentos desses dias imprevisíveis.

PS - Como o Ministro Marco Aurélio de Mello não é de panelinhas, preferi ter mais informações antes de analisar sua atitude em relação a Aécio Neves.

GGN

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Luis Fernando Vitagliano: O paradoxo da crise política e a ascensão autoritária que perpassa o Brasil hoje

Junho de 2013 fez emergir a crise da representação, o incômodo generalizado com as coalizões que fundamentaram a governabilidade na Nova República. O golpe não foi resposta positiva à crise política, e o caminho está aberto para uma solução autoritária ou totalitária.
O paradoxo da crise política e a ascensão autoritária

Para aqueles que supõem que a crise política está próxima do seu fim, a resposta positiva é improvável. Pelo contrário, a crise política pode se agravar. Essa verdade desnuda demonstra que uma possível eleição de um aventureiro qualquer pode nos tirar da crise para algo pior. Porque saídas mágicas para a crise política como o afastamento de Dilma não nos livrou de nenhum dos problemas da república e nos acrescentou vários, agravando, ampliando e perpetuando o caos.

A saída da crise política não pode ser posta, principalmente pelo campo progressista, para além da política. Será uma saída política e pela política. Mas, para isso é preciso entender as origens e as causas desta encalacrada situação que começa em 2013.

Parece haver um relativo consenso de que junho de 2013 é um marco. Mas, ainda são contraditórias suas interpretações. De um lado há análises que defendem que a fonte principal daqueles eventos foi o conflito distributivo que aflorava com a ascensão dos pobres à sociedade de consumo, que fez eco nas classes médias incomodadas com o encarecimento dos serviços para a casa grande e a ampliação do status das grandes massas. De outro lado, afirma-se que os movimentos de direita assumiram a pauta e a mobilização. Ambas as análises têm contribuições à interpretação dos protestos, mas o ponto nevrálgico de 2013 é outro: crise e fragmentação e a crise da representação.

Por isso, entender 2013 vai além dos protestos que aconteceram naqueles meses e desde então e pode ser lido como o desenrolar do que se configurou como o sistema político da Nova República – filho pródigo em termos institucionais da ditadura civil-militar de 1964. Defendo aqui que Junho de 2013 não é o começo, portanto, mas o primeiro ato do final da conciliação da classe política que fez a redemocratização com a base social que deu sustentação ao sistema político.

As diretas de 1984 dão início ao momento ótimo da conciliação da política com a sociedade civil pós-ditadura. A constituição de 1988 renovou as esperanças na política como objeto de transformação da realidade brasileira. Todavia, a Nova República se faz à base de conciliação político-partidária que não é exatamente de classe. E como fiador do alicerce desse sistema está o espólio da ditadura.

Sarney assumiu no lugar de Tancredo. Collor governou sem pudores com os coronéis do nordeste. FHC trouxe o PFL de Antônio Carlos Magalhães para a sala de estar do Palácio do Planalto e os Governos Lula e Dilma tinham suas bases no mesmo PMDB que esteve em todos esses governos aos quais se opunham.

Desde sempre a justificativa é a mesma: governabilidade. Pois junho de 2013, para além das passagens de ônibus, a corrupção e a desonestidade política tem como pano de fundo o incômodo generalizado em relação às coalizões que fundamentam a governabilidade. Essa crise de representatividade significa que embora a disputa pelo poder executivo tenha evoluído para uma espécie de binômio entre neoliberais e trabalhistas, a disputa pelo legislativo fragmentou-se de tal forma no pluripartidarismo que muitos dos eleitos representam seu próprio projeto político local.

Como conciliar a eleição de um projeto nacional no plano executivo com a fragmentação do legislativo em interesses mesquinhos e provincianos? Durante boa parte da Nova República isso se manifestou em forma de acordos e de cargos de governo. Junho de 2013, em certo sentido, foi um basta a isso. Seu espólio teve continuidade no crescimento da oposição e fez-se sentir na crise do impeachment, onde os interessados na substituição do projeto político trabalhista enxergam a oportunidade de impor o projeto político derrotado nas urnas.

O que faz o PSDB no governo Temer? Associou-se para dar a direção macro dos rumos do Estado. Aproveitou-se da oportunidade que as urnas não os deu. A história de reconciliação com a política, de tirar a Dilma para as coisas melhorarem, que tudo estava contaminado e a política se renovaria com a saída do PT é apenas cortina de fumaça, só havia dois objetivos no impeachment e nenhum dizia respeito a uma resposta para a crise. De um lado a proposta era estancar a sangria das delações e de outro lado implementar o projeto neoliberal. Nenhuma relação remota com a crise de representação que se agravaria com ambas as pretensões.

O golpe constitucional não foi uma resposta positiva à crise política, nem uma mudança que visava a reformar os termos da representatividade. Pelo contrário, foi uma resposta negativa à crise política: deixou bem claro que as formas de chantagem do legislativo para com o executivo poderiam vencer.

Os critérios pelos quais as pessoas votam no Brasil para o legislativo é, via de regra, mais relaxado em relação ao voto do executivo. Isso nos leva a um paradoxo na política brasileira: a sustentação do governo depende da base fragmentada do Congresso que não tem compromisso com o projeto eleito. A população agora mais atenta e acostumada com a democracia cobra do executivo a coerência que ela própria não tem ao eleger o legislativo. É o Deputado e o Senador com representatividade baixa e que se elege a partir do mesmo clientelismo dos anos 1910 que negocia seu apoio ao governo e impõe seus critérios de adesão.

A partir de junho de 2013 (com pegadas à direita ou não) iniciou-se um movimento na sociedade civil para não tolerar esse tipo de acordo. A mídia e o judiciário aparentemente perceberam o movimento e se tornaram os porta-vozes dessa aclamação. Assim, se sem esses acordos não se governa e com esse tipo de acordo a popularidade não se sustenta, como ter base social para governar sem cair em novas armadilhas?

A atual crise política não deixa espaço para dúvidas: ninguém governará sossegado até que as coisas mudem. Ou seja, é o fim da estabilidade do sistema político da Nova República. O que nos leva a um último ponto: se não há saída sustentada na popularidade nem à direita e nem à esquerda sem ceder aos caprichos da corja clientelista, qual a saída para a crise política?

Historicamente, conhecemos a resposta: autoritarismo ou totalitarismo. Sempre que houve crises de representatividade tão agudas como as que se desenham no Brasil, a resposta foi a ascensão (eleitoral ou não) de figuras que abusaram do poder para dominar a crise. Em nome de uma suposta moralização da política, figuras como Franco, Mussolini, Hitler, Pinochet tomaram as rédeas do poder e usaram de métodos violentos para domar a crise. Isso implicou, entre perdas de direitos civis, perseguições e cassações, ditaduras com maior ou menor grau persecutório.

Luis Fernando Vitagliano - É cientista político e professor universitário. É colunista do Brasil Debate

Do GGN