Os sinos da Capela do Padre Faria não soam nem melhor nem pior do que os outros, mas têm uma história diferente de todos.
A pequena Capela de
Nossa Senhora do Rosário do Padre Faria é uma das tantas joias arquitetônicas
de Ouro Preto. O exterior despojado não prepara o visitante para a opulência
barroca do interior. O campanário fica afastado do corpo da igreja, como a
“casinha” numa morada sem banheiro, e nada tem de imponente. Os sinos da Capela
de Padre Faria badalam em concerto com os outros sinos da região, cantando as
horas e os eventos, e não soam nem melhor nem pior do que os outros. Mas os
sinos da Capela do Padre Faria têm uma história diferente dos outros.
Quando Tiradentes foi
enforcado e esquartejado no Rio de Janeiro todos os outros sinos celebraram a
notícia. Afinal, tratava-se da execução de um traidor, de um inimigo da
sociedade. Os sinos de Ouro Preto festejaram o castigo exemplar de um réprobo e
o triunfo da legalidade sobre a rebeldia. Mesmo que o toque festivo não tivesse
sido recomendado pela Coroa, a celebração se justificaria. Mas os sinos da
Capela do Padre Faria dobraram Finados. Pela primeira e única vez na história,
talvez, os sinos da Capela do Padre Faria destoaram do concerto. Tocaram,
sozinhos, uma batida fúnebre pelo martírio de Tiradentes.
Não conheço bem a
história e não sei o que motivou as badaladas subversivas. Um pedido de
secretos simpatizantes da Inconfidência? Apenas uma manifestação de piedade
cristã? Um sineiro bêbado? Não sei. Minha tese preferida é que alguém
responsável pelos sinos teve um vislumbre histórico. Teve a presciência que
ninguém mais teve e ordenou o toque plangente, em homenagem precoce ao futuro
herói e pelo ocaso do poder colonial que seu sacrifício desencadearia.
Nossa Senhora do
Rosário serviria como padroeira, não necessariamente de quem consegue adivinhar
a História, mas de quem entende o momento que está vivendo ou destoa da
maioria, com ou sem razão. Destoantes deveriam ir regularmente em romaria à
pequena capela e pedir a bênção dessa Nossa Senhora do Contexto Maior, para
melhor poder enfrentara a maioria que badala o que não tem importância e o fato
errado e menospreza qualquer batida diferente.
Os outros sineiros de
Ouro Preto não tinham como saber que estavam festejando a morte de um herói.
Faltava-lhes a perspectiva histórica para entender o momento e só cumpriram o
que se esperava deles. Estão perdoados. Mas que nos sirvam de lição.
GGN