Paulo
Fonteles Filho*: Mentiras sobre o massacre no Pará começam com um “arsenal” de
armas de caça; telejornal “que não tem lado” fez press release nojento.
A postura da
Globo, está comprovado, é a de quem não tem lados. Ali Kamel, no artigo em que
criticou colunista da Folha de S. Paulo.
As mentiras
do general e a curva do “S” de Temer e Jatene.
“Eu entendo
que não eram trabalhadores rurais. Eles estavam armados”.
(General
Jeannot Jansen, Secretário de Segurança Pública do Pará)
Sim,
general, eram trabalhadores rurais os chacinados em Pau D’arco, sul do Pará.
Não eram
quadrilheiros, bando de malfeitores ou criminosos de índole vil, como
corrupiões zangados.
Era gente,
general.
No corolário
da tragédia anunciada desta Amazônia tão espoliada e ultrajada cometes, caro
Jeannot Jansen, mais um tosco crime contra a consciência social de nosso povo,
o da mentira.
E a mentira
não tem só pernas curtas, ela, sobretudo, alimenta a impunidade.
A primeira
mentira é a do confronto, de que os ocupantes da fazenda Santa Lúcia teriam
recebido agentes de segurança do estado à bala.
Um escarcéu
vergonhoso tentou ser montado com a apresentação de armas de caça, numa região
onde todo camponês tem sua vinte.
O que não
for espingarda de caça sugere mais um “plantio” das carabinas, conhecemos bem
essa prática.
A segunda
mentira, histórica, é de que os trabalhadores são “invasores”.
No alvorecer
pérfido das explicações governamentais uma profunda ignorância — será? — sobre
as últimas cinco décadas na Amazônia e todo processo que a penetração do
capital ensejou na maior — e mais abandonada — região do país.
Aqui, a
grilagem corre solta com o apoio da polícia, cartórios, judiciário, governos e
políticos picaretas.
O Pará,
segundo os registros cartorários, tem quatro vezes o seu tamanho.
A família
Babinski, supostamente proprietária da fazenda Santa Lúcia, é denunciada por
transformar terra pública — que deveria servir para assentar pequenos
agricultores — em pasto privado, com direito a jagunços, decisão judicial,
proteção do generalíssimo e meganhas de dedos mais que quentes.
A terceira mentira
é a própria descaracterização do perímetro da chacina.
Como, em sã
consciência, policiais experientes devassam o local e só apresentam os mortos
em Redenção? Essa turma não assiste CSI?
Um engodo
macabro vai se enredando e a mentira dança com as botas do satanás.
Nessas horas
sinto saudades do Ariano Suassuna.
Todos
sabemos — ou deveríamos saber — que o Pará é um reino de grileiros,
latifundiários, pistoleiros e gatos do trabalho escravo.
Há décadas
que ostentamos os mais infames números e continuamos no topo do ranking da
violência no campo.
Muitos
acadêmicos e jornalistas já escreveram sobre isso e os movimentos sociais, por
décadas, têm denunciado que a disputa de terras — sempre violenta contra os
empobrecidos do campo — é a expressão cruenta da fronteira amazônica.
Mas não
interessa se trabalhadores viram defuntos, apenas neste mês de maio 17 foram
mortos em solo paraense. Não é mesmo?
Hoje,
exatamente hoje, um dia após a chacina, 35 trabalhadores rurais foram presos em
Canaã do Carajás (PA) sob acusação de esbulho e formação de quadrilha.
Em meio à
crise política no país, marcada pelo golpe midiático e desmonte dos direitos
sociais e trabalhistas, o episódio em Pau D’arco confere ao ilegítimo Temer e
ao tucano Jatene – a cada um – uma curva do “S”.
Tal curva
foi onde 19 trabalhadores foram mortos em 1996, em Eldorado dos Carajás, numa
ação da PM paraense.
O impostor
que ocupa o Palácio do Planalto tem sob seus ombros a responsabilidade de ter
extinto à Ouvidoria Agrária Nacional e, com isso, sedimentou o caminho de
retorno aos violentos conflitos no campo brasileiro, como são os casos de
Colniza (MT) e Pau D’arco (PA).
A Ouvidoria,
criada no governo de Fernando Henrique Cardoso, era um espaço de observatório,
denúncia e apuração de situações de violência no espaço rural.
Liderada
pelo corajoso e incansável Dr. Gersino José da Silva Filho era, sobretudo, um
instrumento para a redução e pacificação das contendas fundiárias.
Temer é no
mínimo um irresponsável, leviano. Isso sem falar na extinção, também, do
Ministério do Desenvolvimento Agrário, voltado à agricultura familiar e aos
pequenos lavradores do país, além da aliança de alcova com o velho latifúndio,
hoje travestido de agronegócio.
Mas, pro
crime ser perfeito, tem que ter o dedo do Simão.
Há muitos
anos que a Comissão Pastoral da Terra (CPT) ousa colocar a questão das terras
do Pará em pratos limpos.
Aqui, o
governo tucano celebrou acordos para vender terras públicas — à preço de banana
— para poderosos grupos econômicos, como é o caso do banqueiro Daniel Dantas.
Essas
denúncias são de 2012.
O que
verdadeiramente depõe contra o Tucanistão do Norte e seus dirigentes é a umbilical
relação com os poderosos do campo, dentre elas a Federação da Agricultura do
Estado do Pará (Faepa), conhecida organização dos grandes proprietários rurais
no estado.
Tal entidade
nos lembra a União Democrática Ruralista (UDR) na década de 1980.
Nós, que
sabemos o que é a viuvez e a orfandade não podemos permitir que mais essa
chacina — e as mentiras envoltas em discurso oficial — possam seguir impunes,
como centenas de casos de trabalhadores rurais mortos no campo paraense nas
últimas décadas.
Justiça!
*Paulo
Fonteles Filho é presidente do Instituto Paulo Fonteles de Direitos Humanos e
militante do Partido Comunista do Brasil.
OBSERVAÇÃO: O telejornal que não tem lado, o Jornal Nacional, fez uma reportagem
vergonhosa, nojenta, sobre o caso. A reportagem conseguiu culpar os mortos num
“confronto” que não teve um policial sequer arranhado. A “reportagem” ouviu
duas autoridades paraenses e nenhum parente das vítimas. O telejornal que não
tem lado é exibido numa emissora que, incrivelmente, faz parte da associação do
agronegócio! Duvida? Clique aqui. Ou aqui, no site da Abag, a Associação
Brasileira do Agronegócio.
Viomundo