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Pedro Ladeira/Folhapress
O
papagaio sai de cena e entra, para gáudio de alguns, a última do Supremo. Janio
de Freitas, em sua coluna na Folha, demonstra que as eminências conseguiram
entrar para a perplexidade popular, já que não há humor nenhum naquilo que
fazem.
Os
integrantes do Supremo tiraram o valor da ‘lei não retroage’ e impingiram novas
regras, desconsiderando que sua função é impedir que leis sejam criadas contra
desafetos e não a serviço da sociedade. E dá-lhe malabarismo jurídico.
Confira
o artigo da Folha a seguir: Já
ouviu a última do Supremo?
O
papagaio não saiu de cena por desgaste de imagem ou desgosto do humor. Com
séculos de serviços que punham risos nas caras humanas de cansaço e desengano,
o bom papagaio viu-se abandonado pelas pessoas áridas que nos tornamos.
Sujeitos a circunstâncias antipáticas, sempre mais perplexos, forçados a ser o
que nunca fomos, hoje em dia temos que perguntar: "Sabe a última do
Supremo?", "Já ouviu a última da Câmara?", "Ah, e a do Gilmar,
hein, já te contaram?".
Pois
é, a última do Supremo. A maioria de suas eminências decidiu vetar também os
pretendidos candidatos que, de algum modo, infringiram os termos da Lei da
Ficha Limpa antes que essa lei surgisse em 2010. Talvez muitos deles merecessem
ser alijados da política. Mas o velhíssimo preceito de que a lei não retroage,
ao que se saiba, não foi retirado da legislação. Nascido para prevenir leis
criadas contra desafetos, com invocações ao passado, é um preceito fundamental
em eleições de limpidez razoável.
Leis
têm certa semelhança com estatísticas: cabeças espertas as viram do avesso. Os
malabarismos jurídicos podem muito, mas entender que ocorram no Supremo é
penoso. Afinal de contas, no Supremo supõe-se o último chão firme antes do
abismo. Vá lá, gilmarmente arenoso -mas ainda chão.
Além
de espantos menores produzidos nas duas turmas em que se dividem os ministros
do Supremo, com casos problemáticos decididos apenas por três votos a dois -o
enroscado afastamento de Aécio Neves do Senado, com sua retenção domiciliar
noturna, é um dos muitos -há ao menos outra acrobacia ainda dividida entre
aplausos raivosos e vaias estarrecidas.
Trata-se
da prisão de acusados que têm a condenação confirmada em segunda instância. Uma
decisão do Supremo que introduz no regime nascido em 1988 modificações muito
mais profundas do que aparentam. A começar de que abandona o preceito da
Constituição, próprio da dedicação dela aos direitos humanos, de que o acusado
só é propriamente condenado, e pode ser preso, depois de esgotados todos os
seus recursos judiciais. E a segunda instância é só o meio do caminho.
A
maior presença do Supremo nestes tempos conturbados do Brasil não tem
contribuído para reduzi-los, na intensidade ou no tempo. Como nos dois exemplos
maiores dados aqui, o Supremo induz à impressão de que se substitui à
Constituição, onde a considere insatisfatória, substituindo também o processo
normal de alterá-la. Mas o caminho mais curto para chegar-se a um Brasil
admissível seria, até imprevista prova em contrário, seguir-se com rigor
milimétrico a Constituição que nem sequer mereceu, até hoje, ser posta em
prática por inteiro.
OS MALES
Dado
influente para considerações sobre a eleição presidencial. A ideia, resultante
da Lava Jato e muito difundida, de que a corrupção será o carro-chefe da
disputa não se confirma no Datafolha sobre o "Pior problema do país, em
%". A assistência à saúde está à frente de todos, o que indica os horrores
que a população tem vivido com a falta de remédios nos hospitais e nos
programas permanentes, médicos e leitos em número insuficiente, os prazos para
exames e os meses para início de tratamentos urgentes, como de câncer.
Para
liderar a lista, a corrupção precisaria crescer mais um terço do que ocupa hoje
nas preocupações da população. Está no mesmo nível do desemprego, mas, entre
estes dois problemas, não cabe dúvida sobre qual será mais influente na decisão
eleitoral.
GGN