Moro
e a delegada Érika Marena
A
delegada federal Érika Marena, indicada pelo ministro da Justiça, Sergio Moro,
para chefiar o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras),
participou de uma ação in loco nos Estados Unidos para prender um cidadão brasileiro
por meio de um flagrante forjado, mostram documentos obtidos pelo DCM.
O
expediente do flagrante forjado consiste em criar uma situação fantasiosa para
induzir um suspeito a tentar cometer um crime, efetuando sua prisão logo em
seguida. Permitido nos EUA, esta manobra policial é expressamente proibida pela
lei brasileira (leia mais abaixo).
Apesar
disso, foi autorizada integralmente por Sergio Moro, que não apenas enviou a
delegada Érika Marena ao exterior para auxiliar na operação como também, para
viabilizar o plano norte-americano, determinou que fossem criados nomes,
números de CPF e uma conta bancária falsa no Brasil, para onde foram destinados
depósitos ilegais de R$ 100 mil.
O
valor foi sacado, com autorização de Moro, pelo delegado federal Algacir
Mikalovski (que hoje em dia é representante sindical dos delgados), que teria a
incumbência de entregar o valor às autoridades norte-americanas. Mikalovski é o
mesmo delegado que recentemente defendeu Jair Bolsonaro em suas redes sociais e
que pediu que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fosse transferido para um presídio militar.
Sergio
Moro conduziu a maioria dos passos da operação feita em conjunto com os
norte-americanos sem antes consultar o Ministério Público Federal na maioria
das diligências efetuadas. O órgão é, por lei, quem deve fiscalizar e trabalhar
em conjunto com a autoridade policial em ações deste tipo. Apesar disso, o
procurador federal que respondia pelo caso em nome do MPF não fez qualquer
reclamação.
Seu
nome: Deltan Dallagnol.
Assim,
se constata que figuras que vieram a ocupar postos chaves na Operação Lava Jato
já atuavam conjuntamente e em parceria com autoridades norte-americanas desde,
pelo menos, sete anos antes da criação da força-tarefa do MPF-PR.
Essas
informações, parte delas trazidas à luz em reportagem dos Jornalistas Livres
de junho de 2017, constam nos autos do processo nº. 2007.70.00.011914-0,
que correu sob a fiscalização do Tribunal Regional Federal da 4ª Região até
2008, quando a competência da investigação foi transferida para a PF, o MPF e a
Justiça no Rio de Janeiro.
Na
realidade, ali deveriam ter começado, já que nunca houve nenhum suspeito
residente no Paraná envolvido no caso. Até hoje, permanece um mistério o motivo
que levou as autoridades dos Estados Unidos a buscar na vara de Sergio Moro a
autorização que queriam.
Em
2011, o caso inteiro foi arquivado no Brasil, visto que instâncias superiores
da Justiça brasileira não encontraram motivos para que a operação tivesse se
dado por meio da Polícia Federal no Paraná, além de ter apontado uma série de
irregularidades durante a condução da investigação policial.
Quando
Moro autorizou o flagrante forjado do qual Érika Marena tomou parte, alegou que
a investigação serviria para desbaratar uma organização criminosa de lavagem de
capitais que atuava por meio de empresas e operadores brasileiros. Com as
irregularidades identificadas no processo, tudo foi arquivado e ninguém foi
preso no Brasil.
A
ação integrada com os EUA, em solo brasileiro, sob a lei americana
A
ação ocorreu em 2007. No dia 14 de março daquele ano, autoridades do DHS
(Department of Homeland Security) procuraram a Polícia Federal no Paraná (sem
nenhuma indicação do motivo que levou à escolha específica desta
superintendência estadual), na pessoa do delegado Algacir Mikalovski,
solicitando ajuda para prender um cidadão brasileiro suspeito de evasão de
divisas nos EUA.
Ao
receber o pedido, o delegado federal foi direto a Sergio Moro, que autorizou o
envio de dados sigilosos do suspeito brasileiros à autoridades policiais
norte-americanas que o investigavam por remessa ilegal de dinheiro ao Brasil, e
estavam preparando um flagrante.
Delegado
da PF vai direto a Sérgio Moro, sem passar perlo MPF, pedir para o juiz
solicitar à Receita Federal a emissão de um CPF para ajudar autoridades
norte-americanas a prender um brasileiro
Sem
informar autoridades do governo federal brasileiro, o juiz paranaense foi, na
sequência, atendendo a todos os pedidos estrangeiros, determinando ainda que
fossem criados no Brasil um CPF e uma conta bancária falsa para uso da polícia
dos Estados Unidos.
O
Ministério Público Federal só tomou ciência do caso mais de dois meses após o
juiz ter deferido integralmente as solicitações da polícia norte-americana. O
próprio juiz Moro admite que deixou de informar o MPF no tempo devido. Quando o
fez, registrou que entregou os documentos diretamente ao procurador federal
“DD”, querendo dizer Deltan Dallagnol.
O
plano norte-americano era o seguinte: eles suspeitavam que um cidadão
brasileiro residente nos EUA estava realizando remessas ilegais de dinheiro
para o Brasil. Pelas investigações conduzidas naquele país, o suspeito oferecia
seus serviços de remessa ilegal de divisas utilizando uma rede de empresas
laranjas para por fim depositar o dinheiro a ser evadido na conta determinada
pelo cliente do crime.
Assim,
visando forjar um flagrante e prender o suspeito, os norte-americanos montaram
um plano:
- Um agente infiltrado entraria em contato com o suspeito dizendo querer transferir um valor correspondente a R$ 100 mil para o Brasil. O dinheiro seria fornecido pelo DHS.
- A Justiça brasileira providenciaria um CPF, um cartão de banco e uma conta bancária falsos ao agente norte-americano. Eles seriam fornecidos ao suspeito, para que este realizasse a remessa ilegal e fosse preso.
- Um delegado federal de Curitiba iria até o banco, sacaria o dinheiro e devolveria às autoridades norte-americanas.
Sem
consultar o Ministério Público ou qualquer autoridade brasileira, Moro atendeu
a todos os pedidos dos norte-americanos. Enviou, ainda, a delegada Érika Marena
para participar das diligências nos Estados Unidos. Enquanto esteve lá, ela
prestou contas diretamente ao juiz Sérgio Moro sobre o andamento das operações,
como se vê no exemplo abaixo, em correspondência diretamente enviada ao
magistrado, e constante no processo ao qual o DCM teve acesso.
“Senhor
Juiz,
Serve
o presente para encaminhar o relatório COMPLETO dos últimos três períodos dos
monitoramentos levados a cabo, incluindo o resumo das conversas em inglês numa
tradução livre feita pela signatária (delegada da PF do Brasil).”
“A
signatária foi informada pelo Agente Especial do DHS/ICE/Atlanta que a operação
para a prisão do alvo XXXXX ocorrerá no próximo dia XXXX, incluindo busca e
bloqueio de contas. Já há autorização para o compartilhamento dos dados com
esse Juízo”.
“A
signatária esteve na cidade de Atlanta-Geórgia no mês de agosto, por convite do
governo americano, e acompanhou várias diligências relacionadas a tal operação
conjunta com o DHS/SAC/Atlanta.”
A
ação que Moro permitiu é prevista pela legislação norte-americana, trata-se da
figura do agente provocador: o policial que instiga um suspeito a cometer um
delito, a fim de elucidar ilícitos maiores praticados por quadrilhas ou bandos
criminosos.
No
caso em questão, o agente norte-americano, munido de uma conta falsa no Brasil,
induziu o investigado nos EUA a cometer uma operação de câmbio irregular (envio
de remessa de divisas ao Brasil sem pagamento dos devidos tributos).
Ocorre,
porém, que o Direito Brasileiro não permite que um agente do Estado promova a
prática de um crime, mesmo que seja para elucidar outros maiores. O máximo que
prevê a legislação brasileira é a chamada “Ação controlada”, quando se permite
que o agente policial acompanhe a ação criminosa sem tentar detê-la, a fim de
obter provas irrefutáveis do delito.
Não
tem nada a ver com o que foi feito. Sobre isso, a Súmula 145 do STF é taxativa
sobre o assunto:
“Não
há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua
consumação.”
Ou
seja, quando aquele que tenta praticar um delito não tem a chance de se
locupletar por seus atos, caindo apenas em uma armadilha da polícia, o crime
não se consuma.
É
o que explica o advogado criminalista André Lozano Andrade, coordenador do
IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais): o agente infiltrado não
deve ser um agente provocador do crime, ou seja, não pode incentivar outros a
cometer crimes.
“Ao
procurar uma pessoa para fazer o ingresso de dinheiro de forma irregular no
Brasil, o agente está provocando um crime. É muito parecido com o que ocorre
com o flagrante preparado (expressamente ilegal), em que agentes estatais
preparam uma cena para induzir uma pessoa a cometer um crime e, assim,
prendê-la. Quando isso é revelado, as provas obtidas nesse tipo de ação são
anuladas, e o suspeito é solto”, expõe Lozano.
Se
a lei brasileira não prevê, Moro usa a dos Estados Unidos
Ciente
de que não havia como justificar pela lei brasileira os atos que perpetrava a
Polícia Federal sob sua anuência, o então juiz Sérgio Moro fez uso da
jurisprudência norte-americana para sustentar sua decisão:
A
manobra de Moro serviu para que ele mesmo aprovasse as ações da PF brasileira
nos EUA, mas não para que o processo prosperasse até o final. A prática de
sistematicamente conduzir a investigação alijando o titular da ação penal (O
MPF) do processo, não passou despercebida pela Defesa de um dos acusados no
processo, que fez constar nos autos, chamando a procuradoria no Paraná de
“marido traído”:
Chama
a atenção nos autos que o advogado em questão, já em 2007, antes que sequer se
aventasse a hipótese de criação da Operação Lava Jato, já identificava os métodos
pouco ortodoxos de trabalho em conjunto e pouco atento às leis que praticavam
Sérgio Moro e Deltan Dallagnol. O advogado, por fim, afirma o que muitos depois
dele vieram a afirmar ao longo dos anos seguintes: que Sérgio Moro agia não
como um juiz de Direito, mas como um “homologador automático de toda a qualquer
pretensão o MPF ou da Polícia”.
Assim,
pelo menos toda esta operação conduzida por Moro e sua equipe, terminou
arquivada, porque ilegal. Se o mesmo vai ocorrer com a Lava Jato, só o tempo
dirá.
Por
ora, o que se sabe é que o agora Ministro da Justiça Sérgio Moro acaba de autorizar nova ida de Érika Marena aos Estados Unidos, para
“visitas institucionais em Washington e em Nova York”. Pelo jeito, as ações do
grupo paranaense com seus colegas norte-americanos estão longe de acabar.
******
O DCM entrou
em contato por telefone com o Ministério da Justiça para que Sérgio Moro
pudesse comentar o assunto abordado nesta reportagem.
A
assessoria do órgão solicitou que as perguntas fossem enviadas por email, o que
foi feito no mesmo dia, com os questionamentos abaixo:
Em
relação ao processo nº. 2007.70.00.011914-0:
–
Qual a sustentação legal para a solicitação do juiz Sérgio Moro para que a
Receita Federal criasse CPF e identidade falsa para um agente policial dos
Estados Unidos abrir uma conta bancária no Brasil em nome de pessoa física
inexistente?
–
Por que o juiz Moro atendeu ao pleito citado acima, originário da Polícia
Federal, sem submetê-lo, primeiramente, à apreciação do Ministério Público
Federal, conforme determina o ordenamento em vigor no país?
–
Por que o juiz Moro não levou ao conhecimento do Ministério da Justiça os
procedimentos que autorizou, conforme também prevê a legislação vigente?
–
Por que a escolha da delegada Érika Marena para o Coaf? Por que a indicação de
uma policial para um órgão de natureza burocrática? Por que a transferência do
Coaf para o Ministério da Justiça, quando sempre esteve subordinado a pasta que
cuida da fazenda?
Até
a publicação desta reportagem, não houve qualquer resposta.
Playvolume00:00/00:40Diário
do Centro do MundoTruvidfullScreen
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