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terça-feira, 13 de março de 2018

CARMEN LÚCIA, a que diz SIM aos GRANDES e NÃO aos mais FRACOS, por Luis Nassif

Foto: Fellipe Sampaio - STF
Ao declarar, de forma altissonante, que não se dobra a pressões, a Ministra Carmen Lúcia encontrou sua melhor tradução. A física diz que a característica de todo corpo não submetido a pressão é a inércia.
A inércia sempre foi a maneira de Carmen Lúcia agir.
Teve em suas mãos a decisão sobre as “pipelines”, a jogada dos laboratórios internacionais de renovar patentes já vencidas. Se aceitasse a tese da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PDFC) e não reconhecesse as patentes, haveria um amplo impacto sobre o custo dos medicamentos para o SUS. Como não se submete a pressões, Carmen Lúcia não disse sim, nem não: engavetou a ação. Engavetando disse SIM aos grandes laboratórios sem precisar dizer NÃO ao SUS.
Como ninguém, Carmen Lúcia representa o estereótipo mais negativo do mineiro, sintetizado no brado de Magalhães Pinto ante o golpe de 64: “Minas está onde sempre esteve e daqui não arredará pé”. Do mineiro não preservou a sagacidade, a compreensão do mundo a partir do seu canto,  a sabedoria das decisões analisadas e a capacidade de dar um boi para não entrar na briga, e uma boiada para não sair.
Carmen Lúcia é do tipo mais comum de pessoa: a que não se dobra às pressões dos mais fracos. Da parte de Lula, a pressão maior é solicitar direitos concedidos a qualquer pessoa. Da parte contrária a Lula, a pressão maior é expor os pontos fracos da Ministra à opinião pública, valendo-se dos expedientes conhecidos de taxar qualquer crítica ao arbítrio como concessão à corrupção. Ou relembrando os macaquinhos guardados no sótão de Carminha.
Assim, a brava Carmen Lúcia se dobra à pressão do mais forte, não se dobrando à pressão do mais fraco. Transfornou o recuo em relação ao mais forte com um grito retumbante de independência em relação ao mais fraco.
É pos-doutorada na técnica da tergiversação.
GGN

segunda-feira, 12 de março de 2018

Marcos Valério enfim entrega o esquema de corrupção do PSDB. Por Joaquim de Carvalho

Na sexta-feira da semana passada, o publicitário Marcos Valério ficou sete horas no Departamento Estadual de Investigações sobre Fraudes em Belo Horizonte, no primeiro depoimento que prestou depois que fez um acordo de delação premiada com a Polícia Civil de Minas Gerais.
“O Valério implodiu o PSDB”, disse uma pessoa que acompanhou o depoimento. Conversei com outras pessoas que estiveram presentes no depoimento. Os relatos são impactantes. Rodrigo Pinho de Bossi, chefe do Departamento, não deu entrevista, mas anunciou que deve falar sobre o caso em coletiva.
Ele, entretanto, não liberará o depoimento até que o acordo de delação premiada seja homologado pela Justiça.
Marcos Valério cumpre pena de 37 anos e cinco meses de prisão por participação no caso conhecido como Mensalão de Brasília ou Mensalão do PT.
Ele tinha uma agência de publicidade usada para repassar recursos a políticos de todos os partidos, durante os primeiros anos do primeiro mandato do governo Lula.
Era um operador. O dinheiro de caixa 2 passava por ele.
O que a velha imprensa quase não diz  — e quando diz não destaca — é que Marcos Valério começou a operar no submundo da política muito antes do PT chegar ao governo.
“Foi no governo de Eduardo Azeredo, do PSDB, que ele criou os mecanismos para ser o maior trem pagador da política brasileira”, disse uma pessoa que acompanhou o depoimento.
Marcos Valério tentou fazer delação premiada em outros momentos, mas o Ministério Público Federal rejeitou seu depoimento.
“Agora nós sabemos por que. É porque ele arrebenta o PSDB e seus apoiadores. É muita sujeira, e o Ministério Público não quis ouvir”, afirmou a fonte.
Valério confirmou a autenticidade de documentos apreendidos pela Polícia Civil em casas de pessoas que estavam sendo investigadas por envolvimento em esquemas de corrupção, como Denise Landim e o advogado Joaquim Engler.
Um dos documentos apreendidos é a cópia da chamada Lista do Valério, um documento que foi considerado apócrifo. Nesta lista, a exemplo de outra lista famosa, a de Furnas, aparecem os nomes de pessoas que receberam recursos operados por Valério.
São pessoas que ocupavam postos de destaque no governo de Fernando Henrique Cardoso. O que Valério contou à Polícia Civil é a origem desses recursos.
“A origem está na negociação na venda da CEMIG”, contou ele, em referência à estatal de energia controlada pelo governo de Minas Gerais.
Em 1997, o governo de Minas Gerais, por decisão de Eduardo Azeredo, vendeu 32,7% das ações da CEMIG para o que se chamou à época “parceiros estratégicos”, que formaram o consórcio Southern Electric Brasil Participações Ltda.
O consócio foi costurado pelo Banco Opprtunity, de Daniel Dantas, com duas empresas de eletricidade dos Estados Unidos, a Southern Electric e a AES.
Pelo lado do governo, quem conduziu a venda foi o vice-governador Walfrido dos Mares Guia. O consórcio arrematou quase 33% das ações ordinárias da Cemig por R$ 1,13 bilhão.
O dinheiro que financiou a compra saiu dos cofres do BNDES, na época presidido por Luiz Carlos Mendonça de Barros.
Metade do dinheiro seria paga em 12 meses sem juros e, a outra metade, em 10 anos, com financiamento do BNDES, que cobrava do consórcio juros de 3,5% ao ano.
O governador Azeredo não se reelegeu. Em seu lugar, assumiu Itamar Franco, que em 1999 entrou com ação para desfazer o acordo de acionistas e retomar para o Estado o controle da CEMIG.
O Tribunal concedeu liminar favorável a Itamar, que demitiu os três diretores que representavam o consórcio.
Mas as ações continuaram nas mãos do consórcio, que até hoje recebem altos dividendos, o que demonstra que as empresas capitaneadas por Daniel Dantas fizeram um excelente negócio.
Se foi bom para os investidores, foi péssimo para a estatal, e um negócio desse tipo não se concretizaria sem o pagamento de propina, muita propina.
É aí que entra Marcos Valério.
Ele já tinha negócios com Daniel Dantas, através das contas de empresas de telefonia controladas pelo Banco Opportunity.
Para Valério, publicidade sempre foi um meio de fazer caixa 2, e era essa a natureza dos negócios com Dantas.
“Ele pagou todo mundo, a maior parte gente graúda do PSDB, graúda não, muito graúda, do governo de Minas Gerais e do governo federal”, contou a fonte.
Quando estourou o escândalo do Mensalão, começou a circular a lista com o nome das pessoas que receberam recursos de Valério. Não fazia referência explícita à CEMIG, mas os nomes que apareciam lá eram de pessoas envolvidas, de uma forma ou de outra, com a venda das ações.
A lista tem a assinatura de Valério e documentos desse tipo, como o de Furnas, servem para intimidar recebedores de recursos ilegais.
Na época, a velha imprensa noticiou que Valério havia negado a autenticidade da lista, mas nunca se fez perícia para verificar se a assinatura era dele.
A lista original foi entregue pelo advogado Dino Miraglia, na época advogado do lobista Nílton Monteiro, delator de Furnas e do Mensalão de Minas, ao então presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, que foi o relator do Mensalão de Brasília.
O documento nunca foi investigado e se encontra nos arquivos do Supremo Tribunal Federal. Mas a lista teve repercussão. Negativa para quem a denunciou.
O ministro Gilmar Mendes, que fazia parte do governo Fernando Henrique Cardoso, aparece na lista como recebedor de propina. O caso foi noticiado pela revista Carta Capital.
Gilmar processou a publicação, o jornalista autor da reportagem e o advogado. Todos foram condenados.
Com o depoimento de Marcos Valério, abre-se nova oportunidade para um mergulho no submundo que une política, Ministério Público, Judiciário e grandes empresas.
Sempre se soube que a corrupção não nasceu com o governo do PT, mas uma blindagem institucional nunca permitiu que as investigações avançassem sobre o PSDB.
O delegado Rodrigo Bossi de Pinho, da Polícia Civil de Minas, abriu uma brecha, deu voz a um grande operador do submundo do dinheiro, um profissional do crime de colarinho branco que prestou serviços a A, B, C e até Z.
Vai começar uma operação abafa.
A parte do Brasil que já foi civilizada não pode permitir que isso aconteça.
A lucrativa CEMIG foi o bem que, segundo Valério, os corruptos do PSDB venderam
DCM

terça-feira, 17 de outubro de 2017

O Senado pode se impor moralmente sobre o Supremo, por Luís Nassif do Jornal GGN

Há uma boa possibilidade de que o Senado cumpra com seus deveres e vote contra Aécio Neves na votação desta terça feira.
A primeira razão é o fato do STF (Supremo Tribunal Federal) ter abdicado de suas obrigações de julgar e transferido a batata quente para o Senado. Será a oportunidade do Senado demonstrar que tem autorregularão. A degola de Aécio será uma demonstração irretorquivel da superioridade moral do Senado sobre o STF, afastando vez por todas os riscos da ditadura do Judiciário.
Ao contrário da Câmara, que se transformou em uma casa da mãe Joana, e do Supremo, que se transformou em uma Babel, no Senado ainda existe um grupo de senadores com responsabilidade institucional – mesmo entre aqueles que estão na linha de fogo da Lava Jato.
A segunda razão é que Aécio já era. Absolvido, será um cadáver político assombrando o Senado, cada passo seu sendo acompanhado pela opinião pública e cada aproximação com um colega sendo encarada com suspeição. Mantido no cargo, Aécio será um incômodo permanente, mesmo que não avancem as investigações sobre o helicoca.
Já o Supremo vive uma situação inédita de desmoralização. Se votasse pela cassação de Aécio, reforçaria os piores temores sobre a politização excessiva do órgão e sobre a caminhada na direção da ditadura do Judiciário. Não votando, salientou como nunca a ideia dos dois pesos, duas medidas: o voto que condenou Eduardo Cunha e Delcídio do Amaral é o que absolveu Aécio.
O voto estabanado da presidente Carmen Lúcia ampliou o desgaste da corte. Seu voto foi interpretado não como sinal de respeito por outro poder, mas como solidariedade ao conterrâneo: a Carminha salvando o Aecinho.
Fosse qual fosse a decisão sobre Aécio, o Supremo se enredou na armadilha da incoerência. Pressionado pelo clamor da turba, aprovou decisões, contra Cunha e Delcídio, que não passariam em um ambiente político “normal” – isto é, sem a presença do “inimigo”, no caso o PT. Abdicou de seus deveres constitucionais não por prepotência, mas por se curvar ao clamor das ruas.
Com isso, ficou prisioneiro dos seus atos.
No momento seguinte, não tem condições de sustentar a mesma posição, porque agora o alvo é alguém da banda branca. Por mais prudente e correta que seja a posição atual, de não confrontar o Senado, como justifica-la à luz das votações anteriores?
Não há mais o menor sinal de haver juízes no Supremo, ou seja, julgadores que se atenham aos fatos e saibam pesar todos os lados. Metade do Supremo é de vingadores em qualquer circunstância; metade é de garantistas em qualquer situação. E a presidente se achava indecisa, mas agora não tem muito certeza.
No pano de fundo, o esgarçamento total de princípios doutrinários, a fé na democracia, a defesa intransigente da Constituição, a busca do equilíbrio social, o combate às diferenças sociais e outros pontos centrais na Constituição brasileira. Hoje, o Supremo se permite Ministros dispostos a derrogar a Constituição sem terem recebido um voto sequer dos eleitores.
É nesse quadro que o Senado poderia assumir um papel relevante, de ser o coordenador institucional da volta à normalidade democrática. Basta ter a coragem de cortar a própria carne.
 GGN

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Carta aberta aos Ministros do Supremo - STF, por Luís Nassif

O jogo da Lava Jato está decidido. No caso dos inquéritos e processos da primeira fase – contra o PT e o PMDB – dê-se continuidade e abram-se quantas representações forem possíveis com base em qualquer tipo de indício – como demonstrou ontem a 11a Vara Federal do Distrito Federal.

Em relação à fase tucana, duas formas de anulação.

Na fase dos inquéritos, direcionamento para Policiais Federais do grupo de Aécio Neves.

No âmbito do Supremo, a distribuição dos inquéritos e processos para o Ministro Gilmar Mendes, através da inacreditável coincidência de sorteios.

Depois dos processos de Aécio Neves, José Serra e Aloysio Nunes, hoje Gilmar acabou sorteado para relatar também o do senador Cássio Cunha Lima.

É uma sucessão de coincidências.  

E vamos falar um pouco de escândalos e da capacidade de gerar indignação.

Escândalo é uma das formas de controle da sociedade sobre autoridades, desde que gere indignação. A maneira de reagir ao escândalo, de avaliar objetivamente o escândalo, mostra o grau de desenvolvimento de uma sociedade e, especialmente, da sua mídia.  Em sociedades permissivas, os escândalos produzem pouca indignação.

Quando se cria um escândalo em torno da compra de uma tapioca com cartão corporativo e se cala ante o fato de um presidente ser denunciado por crimes e se manter no cargo, algo está errado, como observou recentemente Herta Däubler-Gmelin, que ocupou o cargo de ministra da Justiça na Alemanha entre 1998 e 2002. Ela lembrou o caso do presidente Christian Wulff, que renunciou devido a um depósito de 700 euros em sua conta.

Por aqui, há tempos a mídia aprendeu a conviver com o escândalo seletivo e fugir dos escândalos essenciais. Com isso, um dos freios centrais de uma democracia, contra abusos de autoridades  – as reações públicas a atitudes escandalosas – perde a eficácia.

Só um notável entorpecimento moral para explicar a falta de reações dos Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) às atitudes de Gilmar Mendes.

Tanto no STF quanto no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) é idêntica a (não) reação a Gilmar. Para não ter que enfrentá-lo, colegas inventaram o álibi da excentricidade. Ele é excêntrico, ninguém leva a sério, logo a melhor política é ignorá-lo.

Pessoal, não dá mais! Esse álibi para a não-ação não cola.

Admitir que um Ministro do STF fale o que Gilmar falou sobre o Procurador Geral da República, aceitar que ele visite um presidente da República que está sendo processado e o aconselhe, a sucessão de processos sorteados para ele, os patrocínios aos seus eventos por corporações com pleitos no Supremo, é de responsabilidade pessoal de cada Ministro do Supremo.

Não há biografia que resista, por mais elaborada que seja, à tolerância a um Gilmar. Cada vez que Gilmar extrapola, e Celso de Mello se cala, o silêncio não é um grito, nem solidariedade corporativa: é sinal de medo, de falta de solidariedade e respeito para com o país, porque é o país que sai humilhado e se rebaixa ao nível das nações onde impere a ausência de qualquer regramento. E não se compreende um Ministro indicado para a mais alta corte do país, que não saia em defesa dela, quando exposta a atos que a desmoralizam.

Celso de Mello tem medo, assim como Marco Aurélio de Mello, Ricardo Lewandowski, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, a presidente Carmen Lúcia,  Luiz Fux, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Rosa Weber.  E não adianta tirar o corpo: Gilmar desmoraliza todo um país, mas é um problema do STF e de responsabilidade individual de cada um dos Ministros, porque os únicos em condições de contê-lo.

Com esse silêncio ensurdecedor, o que fazer?

Vocês, senhores Ministros, obrigam pessoas sem nenhum poder de Estado, a externar em um blog a indignação ante a falta de reação aos abusos e de desrespeito ao país, ficando exposto a processos e retaliações de Gilmar. Nós estamos pagando, com as ações abertas por Gilmar, para cumprir uma tarefa que deveria ser dos senhores.

Esperamos que, passada a fase do espanto ante Gilmar, possa se esperar dos senhores uma atitude à altura do poder que representam e do país que deve merecer seu respeito.

GGN

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Xadrez dos sorteios do Supremo Tribunal, Nassif

Nesses tempos de pós-verdade, há uma tempestade de teorias conspiratórias circulando pelo mercado. Uma delas é a respeito dos sorteios de relatoria no STF (Supremo Tribunal Federal), a enorme coincidência de processos fundamentais caírem com o Ministro Gilmar Mendes.

É um exemplo de como um conjunto de coincidências abre espaço para que mentes conspiratórias elucubrem à vontade.

Peça 1 – as coincidências
A primeira peça do nosso xadrez são as coincidências mencionadas.
Direito de resposta do PT contra a revista Veja, às vésperas das eleições presidenciais.

Cai com Gilmar que obviamente nega.

O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Dias Toffoli, quatorze horas depois do final do mandato do Ministro Henrique Neves, decide distribuir seus processos, sem aguardar a nova indicação pela presidente da República. Dentre milhares de processos, dois centrais – sobre a prestação de contas do PT e de Dilma – caem com Gilmar. Segundo o post do GGN “entre 7 juízes do TSE, a probabilidade dos dois principais processos de Neves caírem com Gilmar é de 2 para 100. Há todos os sinais de um arranjo montado por Toffoli”.

O PT entrou com recurso questionando a abertura do processo de impeachment. O recurso foi sorteado e caiu para Gilmar Mendes. Após o sorteio, o PT desistiu por não ver nenhuma possibilidade de conseguir algum voto favorável de Gilmar, em qualquer matéria. Gilmar reagiu e pretendeu penalizar o PT pela desistência, fazendo uma candente defesa do juiz natural (aquele que é sorteado de forma imparcial): “Ninguém pode escolher seu juiz de acordo com sua conveniência, razão pela qual tal prática deve ser combatida severamente por esta corte, de acordo com os preceitos legais pertinentes”.

Relatoria do HC para impedir a posse de Lula. Caiu com Gilmar Mendes. Que obviamente concedeu e suspendeu a nomeação de Lula como Ministro-Chefe da Casa Civil de Dilma Rousseff, última tentativa do governo para segurar o golpe. Aproveitou para taxar o PT de organização criminosa.

Inquérito 4246 contra Aécio Neves, em função da delação do ex-senador Delcídio do Amaral. O inquérito foi protocolado em 03/05/2016, distribuído por prevenção ao Ministro Teori Zavascki e no dia 11 de maio de 2016 sorteado para Gilmar Mendes. Inquérito 4244, também contra Aécio Neves. Da mesma maneira, caiu por prevenção para Teori e no mesmo dia 11 de maio foi redistribuído por sorteio para Gilmar Mendes.

Inquérito 4428, contra José Serra e Aloysio Nunes, em função da delação da Odebrecht. Em 16 de março de 2017. Inicialmente foi para Edson Facchin, por prevenção. No dia 27 de junho de 2017 é redistribuído para Gilmar Mendes.

Relatoria de novos inquéritos contra Aécio Neves. O sorteio entrega o caso a Gilmar.

Peça 2 – a construção da narrativa
A primeira conclusão é que, de fato, foram coincidências. Afinal, seria inimaginável supor que os sorteios do STF pudessem ser manipulados por quem quer que seja.

Mas imagine que, mesmo assim, houvesse uma investigação, só para sanar as suspeitas. O primeiro passo do nosso inspetor Clouseau seria investigar o algoritmo que comanda os sorteios.

O algoritmo leva em conta a quantidade de ações distribuídas aos Ministros no período, separadas por classe de ação. A compensação não é sequencial. Desse modo, pode ocorrer a distribuição de mais de uma classe de ação para o mesmo ministro.

Haveria três maneiras de direcionar os processos:
Maneira 1 - Uma das hipóteses que aventei aqui seria o Supremo ter uma espécie de especialista em algoritmo, que analisaria antecipadamente as probabilidades de cada sorteio, de maneira a saber em qual rodada o inquérito x cairia com o ministro y.

Maneira 2 - a manipulação ocorreria se o responsável pela distribuição tiver acesso ao algoritmo da distribuição. Algo fácil de comprovar pois o acesso fica registrado.

Maneira 3 – um especialista desenvolver um sistema que ficasse de fora do algoritmo, mas que permitisse incluir o(s) nome(s) dos Ministros a serem sorteados. Ou seja, o único ponto de contato seria a área de alimentação de nomes. E seria suficientemente flexível para permitir colocar apenas UM ministro no sorteio.

Das três possibilidades, a mais eficiente seria a 3.

No caso da Maneira 1, envolveria muitas pessoas, até o presidente do STF, responsável pela distribuição dos casos. Inviável.

Na Maneira 2, haveria vestígios das interferências a não ser que... se valesse da Maneira 3.

Um superespecialista criaria uma camada acima do algoritmo, para poder incluir o nome que quisesse no sorteio.

Peça 3 – as investigações iniciais
Obviamente, esse Xadrez é uma enorme peça de ficção, porque não se pode imaginar esse tipo de golpe sendo aplicado na mais alta corte. Apenas como livre-pensar, vejamos como se comportaria nosso Inspetor Clouseau.

As primeiras pessoas a procurar seriam os responsáveis pela informatização do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde as coincidências foram mais ostensivas.

Imediatamente, saltariam à vista dois dos maiores craques do setor.

O primeiro, é Paulo Bhering Camarão, homem responsável pela implantação das urnas eletrônicas e figura-chave na informatização do Judiciário, além de fazer parte do grupo que implantou o Infojus, a primeira intranet do Judiciário.

Também fazia parte desse grupo nosso segundo personagem, Leonardo Alam da Costa, responsável pela informática do STF.

Ambos são técnicos renomados e personagens polêmicos.

Camarão foi um dos responsáveis pela implantação da urna eletrônica. Ficou por quase dez anos como Secretário de Informática do TSE. Em 2006 contratou uma empresa, a Probank, para serviços junto às urnas nas eleições. A Probank tinha um histórico de rolos não explicados. Em 2004 conseguiu vencer a Embratel em uma licitação para fornecer serviços temporários para todo o país, nas eleições. Apesar de estar presente em todos os estados, a Embratel não teria conseguido comprovar a capacidade de fornecer os trabalhadores, segundo a comissão de licitação.

No mesmo ano, Camarão tornou-se proprietário da Probank que, depois, acabou vendida para Wilson Brumer, ex-Secretário de Desenvolvimento Econômico no governo Aécio Neves e um dos arrecadadores de suas campanhas. Ex-presidente da Usiminas, o que Brumer tinha a ver com a área?

A empresa pediu falência. Assumiu outra, a Engetec, que, depois, constatou-se que mantinha relações administrativas com a Probank. Em 2012 a Probank venceu uma licitação do TSE de R$ 129 milhões, colocada sob suspeita. Aqui, se tem uma ampla reportagem do GGN, de autoria da repórter Patricia Faerman.

O nome da empresa voltou a ser ventilado apenas este ano, como um dos pontos de lavagem dos pagamentos da Andrade Gutierrez a Romero Jucá.

Igualmente polêmico é Leonardo Alam, até hoje responsável pela área de informática do Supremo. Em 2015 foi alvo de uma sindicância aberta pelo presidente do STJ, ministro Francisco Falcão, acusado de compras superfaturadas. No início do ano, o escândalo voltou à tona e seu nome aparece na qualidade de Secretário de Tecnologia de Informação do STJ. Os acusados alegam inocência. Diversos Ministros atribuíram a denúncia à revanche de Falcão contra seu antecessor.

Peça 4 – os coronéis da SEI e o voto eletrônico
Nosso inspetor precisaria dedicar um bom tempo para apurar mais sobre os sistemas informatizados do Poder Judiciário.

A maior parte dos quadros veio da comunidade de informática dos anos 70. A comunidade era formada por servidores do Serpro, acadêmicos e, principalmente, os coronéis da SEI (Secretaria Especial de Informática) e oficiais da Marinha, a força que mais investia em informática.

A SEI ficou ligada diretamente à presidência da República (João Baptista Figueiredo) e nela entraram vários coronéis, como Joubert Brízida de Oliveira, Edson Dytz, Ezil Veiga da Rocha.

Assim que assumiu o Ministério da Justiça, aliás, o Ministro Márcio Thomas Bastos me chamou a Brasília para pedir dicas sobre a informatização do Judiciário – eu tinha escrito sobre o tema na minha coluna da Folha.

Sugerimos a ele um levantamento dos melhores sistemas em vigor no país. Depois, convidar os desenvolvedores, ligados aos tribunais, para montar um grupo de trabalho e desenvolver o sistema em software livre. Era nítido o enorme lobby da Microsoft e da Oracle para vender seus softwares. Mostramos a Márcio que a parte mais relevante era o conhecimento acumulado dos técnicos, não o software utilizado. Esse sistema, em software livre, ficaria em nuvem e seria disponibilizado para qualquer tribunal que resolvesse aderir à informatização.

Na segunda reunião, o represente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) foi justamente o coronel Ditz. A proposta emperrou no STJ e não foi mais adiante.  Ditz foi sogro do então jovem deputado Eduardo Cunha, avô de uma filha de Cunha, mas não tem nenhuma relação com os malfeitos do ex-genro.

De qualquer forma, esses coronéis egressos da SEI mantinham os laços profissionais e de amizade, mas sem nenhuma relação maior com as Forças Armadas.

O que chamou a atenção do GGN foi o empresário que comprou a Módulo Systems.

Especializada em segurança, a Módulo foi uma das desenvolvedoras da urna eletrônica. Tempos atrás foi adquirida por Sérgio Schiler Thompson Flores, parente do presidente do TRF4, e de uma família com ligações históricas com militares.

Ex-diplomata, Thompson Flores enriqueceu na privatização, em sociedade com Felipe Reichstull, ex-presidente da Petrobras. Depois, meteu-se no setor privado, em rolos enormes tentando adquirir a Gazeta Mercantil, depois montando um fundo na Bolsa da Inglaterra para investir em usinas de álcool. Quebrou e reapareceu como proprietário da Módulo.

 As dúvidas sobre as reais intenções de Thompson Flores foram apresentadas aqui em artigo de outubro de 2014, quando apareceram dúvidas sobre a segurança das urnas eletrônicas.

Recentemente, na operação da Polícia Federal que estourou o esquema de caixinhas da Fetranspor, do Rio, ficou-se sabendo que a Módulo tinha a função de auditar as vendas de passagens para calcular o valor do subsídio a ser pago pela prefeitura.

Peça 5 – os fantasmas dos códigos fechados
Pode ser que no meio dessa piração conspiratória, o nosso Clouseau venha a tomar conhecimento dos alertas que estão sendo feitos por especialistas, a respeito dos riscos de manipulação nos códigos de software não auditados.

Poderia ser um artigo de 6 de fevereiro de 2017 do especialista Ronaldo Lemos: “Falta auditabilidade no algoritmo do Supremo”.

Diz Ronaldo Lemos:
“Em 1999, um professor da Universidade Harvard, Lawrence Lessig, um caro amigo, lançou o livro que é considerado pioneiro no estudo do direito aplicado à internet (chamado "O Código e Outras Leis do Ciberespaço"). Nele foi cunhada uma famosa frase que diz que "o código é a lei".

Lessig chamava a atenção para o fato de que programas de computador ("códigos") são cada vez mais responsáveis por embutir neles regras que regulam o destino de milhões de pessoas, todos os dias.

(...) Basta olhar para o sorteio eletrônico do ministro Edson Fachin como novo relator da Lava Jato no Supremo para ver que Lessig tinha razão. O caminho para a escolha de qual ministro do STF será responsável por um processo é definido por um programa de computador que opera com base em algoritmo. Só que há um problema: ninguém sabe como esse algoritmo funciona.

(...) Para ter certeza de que o algoritmo do Supremo funciona como deveria, sem interferências externas, é fundamental que tanto seu código quanto seu hardware sejam conhecidos, transparentes e auditáveis.

Nada disso acontece hoje. Há, aliás, suspeitas de que o algoritmo não seja tão simples assim. Ele seria "calibrado", por exemplo, para distribuir processos de modo a equiparar a carga de trabalho de cada ministro. Não há informações públicas confirmando ou negando isso. Também não se sabe em que termos essa suposta calibragem aconteceria.

(...) Em seu livro paradigmático, Lessig apontou que um dos desafios de embarcar normas em códigos é que eles são escritos em linguagem que não é compreensível para a maioria das pessoas. Essa opacidade poderia ser chamariz para a corrupção. Por essa razão, mais do que nunca, é hora de jogar transparência e inteligência pública sobre os códigos que regem o país”.

Aí, talvez essa história da teoria da conspiração caísse para um campo mais real. E os bravos procuradores da República ganhassem coragem para investigar as suspeitas e ouvir técnicos do STF e do TSE. Vá que eles tenham boas informações para dar.

E, para que não pairassem dúvidas sobre a isenção do Supremo, a presidente Carmen Lúcia autorizaria uma auditoria no tal algoritmo e entregaria todos os resultados dos sorteios dos últimos anos a uma análise probabilística feita por especialistas.

Doutores da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) se dispõem a fazer o estudo sem custos para o Supremo.

GGN

terça-feira, 18 de julho de 2017

'A convulsão social já está ocorrendo', Aldo Fornazieri

Na opinião de professor de Filosofia Política da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp) Aldo Fornazieri, "Temer está dando uma aula de como os profissionais de uma quadrilha reagem com força para se manter no poder". Para ele, "a esquerda está acomodada", Michel Temer “está quebrando o país mais do que já está quebrado”.

Em meio à maior crise política de sua história recente, o Brasil espera o fim do recesso parlamentar para conhecer a decisão, pelo plenário da Câmara dos Deputados, sobre o futuro de Michel Temer. A votação que pode ou não autorizar o Supremo Tribunal Federal a dar prosseguimento ao processo está prevista para o dia 2 de agosto, quando o peemedebista precisará de 172 votos para evitar esse desfecho e, na prática, o fim de seu governo.

Para Fornazieri o país já vive uma convulsão social. “Na verdade, a convulsão social está ocorrendo, mas não pela via política. Está ocorrendo na guerra civil no Rio de Janeiro, com a violência espalhada pelo país e a quebradeira geral dos serviços brasileiros pelo governo”, diz.

Para ele, o problema é que Temer até o momento tem sido bem sucedido em suas manobras e articulações para se manter no poder. “Do ponto de vista político não acontece nada. A esquerda está acomodada, o Lula é condenado e não vimos ainda manifestações contra a condenação. Por esse caminho não acredito em convulsão social.” A apelação do ex-presidente Lula da sentença do juiz Sergio Moro, que o condenou a 9 anos e 6 meses de prisão, será julgada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em data ainda imprevisível.

Na visão de Fornazieri, Temer tem “grandes chances” de se salvar. “Ele está fazendo um jogo pesado para isso. Está dando uma aula de como os profissionais de uma quadrilha reagem com força para se manter no poder, gastando bilhões do dinheiro público. Não vejo mobilizações suficientes para tirar Temer do governo”, afirma Fornazieri.

Ele acredita que as manifestações dia 20 precisarão ser grandes para configurar um contraponto popular à mobilização parlamentar e articulação política do grupo palaciano. “Qual vai ser o tamanho e o alcance dessas manifestações? Até hoje as manifestações da esquerda na Paulista não passaram de piqueniques cívicos”, diz Fornazieri. Em sua opinião, as mobilizações teriam que envolver muito mais gente do que a militância organizada que faz parte das estruturas dos partidos e sindicatos.

Para se manter no poder, o presidente “está quebrando o país mais do que já está quebrado”. “E não se vê uma contrapartida das oposições nas ruas. As oposições são minoria no Congresso, mas estão se submetendo ao jogo puramente parlamentar, enquanto no contexto do golpe e do impeachment da Dilma foram mobilizadas milhões de pessoas nas ruas", afirma ainda o professor.

Na quinta-feira (13), a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara rejeitou, por 40 votos a 25, o relatório do deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), favorável à autorização para abertura do processo contra Temer no STF.

Segundo a ONG Contas Abertas, o governo federal liberou em junho R$ 134 milhões em emendas parlamentares a 36 dos 40 deputados que votaram a favor de Temer na CCJ.Para Antônio Augusto de Queiroz, diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), os cenários na atual conjuntura são basicamente três: “a) renúncia, por exaustão do governo; b) a cassação, por decisão do STF, após autorização da Câmara dos Deputados; e c) a Sarneyzação do governo, ou a imagem do “pato manco”, com a equipe econômica e o Congresso fazendo o feijão com arroz, sem qualquer reforma relevante”. Na opinião do analista, o primeiro cenário “é realista, o segundo pessimista e o terceiro otimista”.

Da RBA

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Silêncio do Supremo diante de abusos virou um escudo para Moro, Cíntia Alves para o Jornal GGN

Juiz de Curitiba mostra que não aprendeu nada com a reprimenda quase solitária do ministro Teori Zavascki no episódio do vazamento de áudio de Dilma e Lula.
Foto: Lula Marques

A sentença do caso triplex mostra que o juiz Sergio Moro não aprendeu nada com a reprimenda sofrida pelo então ministro Teori Zavascki no episódio do vazamento de conversa de Lula com figuras com foro privilegiado, como Dilma Rousseff e Jaques Wagner, em março de 2016.

Mais do que isso: Moro usou o silêncio dos ministros - com a exceção de Marco Aurélio Mello e do próprio Teori - diante de eventual abuso como uma espécie de escudo. Ele ainda afirmou que se não cabia à primeira instância revelar "o segredo sombrio dos governantes", o Supremo deveria fazê-lo.

À época, Zavascki e Mello apontaram que Moro afrontou a Constituição ao deixar gravar e levantar o sigilo de interceptações que envolviam políticos diplomados.

Pouco mudou na postura dos demais membros da Corte após a queda de Dilma Rousseff. O destaque fica por conta de Gilmar Mendes e a aparente defesa do novo governo em exercício.

Moro comenta o ocorrido no extenso trecho da sentença do caso triplex dedicado exclusivamente a rebater a tese da defesa de Lula sobre lawfare, ou seja, o uso dos meios jurídicos para fazer perseguição política contra o ex-presidente.

No trecho a seguir, extraído da sentença, o juiz de Curitiba fala do silêncio do Supremo e usa em seu próprio benefício o fato de não ter sofrido nenhuma sanção por ter vazado o grampo em Lula à emissora da Rede Globo.

"É certo que o eminente Ministro Teori Zavascki, na decisão datada de 13/06/2016 na Reclamação 23.457, quando concedeu liminar para avocar o processo de interceptação, utilizou palavras duras contra a decisão do Juízo de levantamento do sigilo sobre os autos. 

Entretanto, quando, em seguida, submeteu a liminar à ratificação do Plenário do Supremo Tribunal Federal, não mais fez qualquer referência à suposta atuação arbitrária do magistrado ou à necessidade de qualquer espécie de responsabilização. No mesmo sentido, nada foi afirmado a esse respeito pelos seus pares, os demais eminentes Ministros do Supremo Tribunal Federal quando da ratificação da liminar em 31/03/2016.

E, ao final, por decisão de 13/06/2016 na mesma Reclamação, o eminente Ministro Teori Zavascki devolveu ao Juízo os processos relativos ao ex- Presidente, inclusive a interceptação telefônica, não reconhecendo a competência do Egrégio Supremo Tribunal Federal para processá-los. Na ocasião, igualmente não fez qualquer referência à necessidade de providências disclipinares."

Em suma, se não houve imposição de limites por parte da mais alta corte do País, não há margem para se falar em abuso nem lawfare, insinua Moro.

Na sequência, o juiz diz que, no seu "entendimento", apesar da crítica de Teori, não existiu nenhum problema em ter vazado o grampo. O único problema foi a convulsão social ocasionada pela revelação da conversa de Lula e Dilma. Na tese da Lava Jato e entusiastas, Lula usaria o cargo na Casa Civil para obstruir a Justiça.

"No entendimento deste julgador, respeitando a parcial censura havida pelo Ministro Teori Zavascki, o problema nos diálogos interceptados não foi o levantamento do sigilo, mas sim o seu conteúdo, que revelava tentativas do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva de obstruir investigações e a sua intenção de, quando assumisse o cargo de Ministro Chefe da Casa Civil, contra elas atuar com todo o seu poder político ('eles têm que ter medo')."

Sustentado que tampouco caberia ao Supremo engavetar o conteúdo daquele grampo, Moro afirmou:

"Não deve o Judiciário ser o guardião de segredos sombrios dos Governantes do momento e o levantamento do sigilo era mandatório senão pelo Juízo, então pelo Supremo Tribunal Federal."

Segundo o juiz, "ainda que, em respeito à decisão do Supremo Tribunal Federal, este julgador possa eventualmente ter errado no levantamento do sigilo, pelo menos considerando a questão da competência, a revisão de decisões judicias pelas instâncias superiores faz parte do sistema judicial de erros e acertos."

No final, Moro ainda disse que a interceptação telefônica contra Lula durou "por menos de trinta dias" e o "levantamento do sigilo sobre o conteúdo das interceptações, ainda que se possa questionar este último pela questão da competência, não é nada equivalente a uma 'guerra jurídica'."

À época do vazamento, juristas apontaram que a decisão de Moro de dar publicidade ao conteúdo das conversas contrariava a lei de interceptações telefônicas, que determina o sigilo sobre o material que interessa às investigações. O que não interessa deve ser, por outro lado, destruído. 

Na semana passada, o GGN mostrou que Moro não descartou conversas irrelevantes de Lula e familiares que foram captadas no grampo da Lava Jato. Ao contrário disso, mantém esse material em sigilo e disse que se fosse sua intenção "expôr" o ex-presidente, teria determinado o fim do segredo de Justiça. Leia mais aqui.

Do GGN

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Pressentindo a prisão, defesa do senador Aécio Neves pede julgamento para o pleno do Supremo

A defesa do senador Aécio Neves (PSDB-MG) pediu hoje (16) ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o pedido de prisão contra ele seja julgado por todos os 11 integrantes da Corte, em plenário, e não pela Primeira Turma, composta por cinco ministros, conforme previsto.

Para a defesa de Aécio Neves, o tema afeta a relação entre os poderes e deve ser julgado pelo plenário. Está marcada para terça-feira (20), na Primeira Turma, o julgamento de dois recursos: um do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que quer a prisão preventiva de Aécio, e outro do próprio senador pedindo que seja assegurada sua liberdade.

Para julgar a questão, os ministros deverão analisar a aplicação ao caso do artigo 53 da Constituição, segundo o qual os parlamentares “não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável”.

O advogado Alberto Zacharias Toron, que representa Aécio, argumentou que o tema afeta a relação entre os poderes, e, por isso, deve ser analisado pela composição completa do Supremo, “diante do inegável alcance político/institucional que a controvérsia assume”.

Ao negar um primeiro pedido da PGR pela prisão de Aécio, o ministro Edson Fachin, então relator do caso, mencionou a garantia constitucional do parlamentar, mas disse que, em um momento posterior, o assunto deveria ser melhor discutido em plenário. Entretanto, após a redistribuição do processo, a pedido da defesa, o novo relator, Marco Aurélio Mello, pautou a questão para a Primeira Turma.

Nesta semana, a Primeira Turma do STF decidiu, por 3 votos a 2, manter Andréa Neves, irmã de Aécio, presa preventivamente, ao julgar improcedente um recurso da defesa.

Votaram a favor da prisão os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux, enquanto o relator, Marco Aurélio Mello, e Alexandre de Moraes votaram pela soltura da investigada.

247

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Juiz Gilmar Mendes, o mal exemplo da discrição esperada do Judiciário, Ivar Hartmann

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Em artigo publicado ontem (4) no caderno Ilustríssima da Folha de S. Paulo, o professor da FGV Direito Rio Ivar Hartmann defende que a legitimidade do Poder Judiciário depende também não só das sentenças, mas “daquilo que se dá fora dos autos”.

Para o pesquisador, os juízes devem se manter como observadores “rigorosamente passivos”das negociações entre Executivo e Legislativo, ressaltando que a “atual demanda por exposição e transparência do Judiciário não tem precedentes”.

Como um dos exemplos, Hartmann cita Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, relembrando as diversas vezes nas quais o ministro atuou como ator político. “Declarações excessivas à imprensa, na hipótese mais branda, são ilegais por anteciparem seu julgamento; na mais grave, provocam o descrédito da instituição e dos colegas”, afirma.

Da Folha - Gilmar Mendes é contraexemplo da discrição esperada do Judiciário

IVAR HARTMANN

Quando questionado sobre o processo que pode cassar a chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), seu relator, ministro Herman Benjamin, nada diz. Afirma estar em "silêncio beneditino".

Há cerca de um ano, Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi criticada em conversa grampeada de investigados da Lava Jato porque "não deu o negócio do Lula [PT]". Apesar de suposta intervenção de Dilma Rousseff (PT), a ministra negou pedido para afastar do juiz federal Sergio Moro a investigação sobre o ex-presidente.

Ambos os magistrados adotam comportamento essencial em tempos de normalidade e decisivo durante período de crise política aguda. Sabem que a legitimidade do Judiciário depende não apenas da qualidade e da celeridade de suas sentenças mas também daquilo que se dá fora dos autos.

Infelizmente, a parcialidade de magistrados em todo o país tem sido cada vez mais questionada, pois certos juízes não cumprem duas regras básicas. Primeiro, não se pode antecipar a posição pessoal sobre o mérito de questões que acabam judicializadas. Segundo, deve-se permanecer como observador rigorosamente passivo de negociações no Executivo e no Legislativo.

A primeira regra parece mais simples. Antigamente, bastava ao juiz não conceder entrevista sobre questões que poderiam acabar na sua vara ou em seu tribunal. Essa proibição está na lei que fixa o código de conduta dos magistrados.

Um exemplo recente ilustra bem o problema. Há cerca de dez dias, esta Folha informou que o STF, contrariando seu entendimento, poderia deixar Lula solto mesmo após condenação em segunda instância. O ministro Celso de Mello logo emitiu nota informando como se posicionaria no caso. Ao adiantar seu entendimento, prejudicou sua própria imparcialidade –farão diferença os argumentos que defesa e acusação venham a trazer?

Outros exemplos tendem a ser mais complexos. A atual demanda por exposição e transparência do Judiciário não tem precedentes. Falar à imprensa passou a ser apenas uma de muitas maneiras de interagir com a opinião pública.

Nos anos 1990, ainda que um ministro do STF decidisse dar uma declaração polêmica, o fato dificilmente ganharia a capa dos jornais de grande circulação.

Hoje, os brasileiros conhecem o poder decisivo de uma liminar que bloqueia o WhatsApp ou de uma decisão que afasta o presidente da Câmara dos Deputados. Acompanham esperançosos os processos criminais de figurões da política. Comparam seus rendimentos com os contracheques dos juízes e avaliam se isso deveria ser pauta de protesto nas ruas ou no Facebook.

Essa busca de mais informação sobre a Justiça é satisfeita e estimulada por notícias que chegam segundo a segundo, seja por veículos tradicionais, seja por novas agências, seja por redes sociais.

PARA A PLATEIA

No caso das redes sociais, em particular, a via é de mão dupla. Transmitem o que se escreveu ou se disse sobre os juízes, mas são também ferramenta que magistrados usam para escrever e falar diretamente com o público. É saudável que os cidadãos estejam mais interessados no que faz o Judiciário. Mais cobertura da mídia traz mais transparência –mas também mais oportunidades para excessos.

Moro aprendeu com a operação italiana Mãos Limpas a importância do apoio popular para combater a corrupção sistêmica. Quando sente necessidade, usa a internet para falar diretamente com os brasileiros, estimulando o clamor que acaba legitimando a Lava Jato.

Mas nem sempre há cálculo estratégico. O juiz de Brasília que suspendeu a nomeação de Lula como ministro no ano passado publicou em seu perfil foto com adesivo de Aécio Neves (PSDB-MG), conclamou os amigos a "ajudar a derrubar a Dilma" e fez manifestações em uma rede social relacionadas ao caso no qual mais tarde deu a liminar.

Assim também a juíza que proibiu o acampamento de defensores do ex-presidente durante seu interrogatório em Curitiba. Em seu perfil, ela compartilhava postagens do Movimento Brasil Livre e aplaudiu a condução coercitiva daquele que os afetados por sua decisão queriam prestigiar. Ambos restringiram o acesso ao seu perfil no Facebook quando viraram notícia, mas as manifestações ainda assim foram amplamente disseminadas.

Esses e outros casos ajudam a alimentar a crença de que o PT é perseguido pela Justiça. Isso põe em questão as decisões não só desses dois magistrados mas também as de seus colegas. A impressão de que juízes decidem com um viés partidário está entre os maiores problemas da primeira instância.

Nos tribunais superiores, existe outro. Há um tipo específico de uso da imprensa que permite a ministros quebrar a segunda regra básica: não virar ator político.

Durante o mensalão, os jornais repercutiam as falas dos magistrados nos autos. Os julgadores eram observados, descritos, criticados e até santificados por suas decisões. Os ministros, porém, nem sempre se contentam em ser objeto passivo de observação. Alguns buscam os jornalistas e ativamente dialogam com os observadores. A imprensa repercute mais suas entrevistas que suas sentenças.

O projeto Supremo em Números utilizou a base de dados Media Cloud da Escola de Matemática Aplicada da FGV. Ela cataloga diariamente, entre outras publicações, todas as notícias online dos grandes veículos de imprensa do país. Identificamos todas as menções a ministros do STF nos últimos seis meses.

Os dias de maior repercussão foram causados pela chocante morte de Teori Zavascki e pela divulgação da chamada "lista do Fachin", com nomes de investigados a partir da delação da Odebrecht.

Esses eventos excepcionais fazem com que os dois ministros sejam mais citados do que qualquer outro no período. Entre os demais, não está em primeiro lugar a atual presidente, ministra Cármen Lúcia. É Gilmar Mendes quem mais aparece –e isso ainda não diz tudo.

GILMAR MENDES

Para quase todos os ministros, o dia com o maior número de citações na mídia foi resultado de uma decisão judicial –ou de um trágico acidente. É o caso da liminar de Luiz Fux suspendendo o trâmite das dez medidas contra a corrupção no Congresso ou do pedido de vista de Dias Toffoli em julgamento sobre a linha sucessória da Presidência.

Mendes é diferente. Seu dia mais midiático ocorreu quando criticou projeto de lei que mudaria as regras sobre prestação de contas de partidos. Caso a proposta avançasse, provavelmente seria questionada no STF, onde Mendes deveria atuar como julgador imparcial.

No segundo dia de maior visibilidade, o ministro se reuniu com Michel Temer (PMDB) e os presidentes da Câmara e do Senado para discutir reforma política. Isso apesar de ser Cármen Lúcia a atual autoridade máxima e representante do Judiciário nacional.

No terceiro, as notícias são de um evento acadêmico que Mendes organiza com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e com João Doria (PSDB), prefeito de São Paulo, bem como sua afirmação de que a Justiça do Trabalho é um "laboratório do PT".

No quarto dia de maior número de citações, Mendes acusa a Procuradoria-Geral da República de crime por ter supostamente vazado nomes de políticos alvo de pedido de investigação no Supremo. A lista segue.

No caso de ministros de tribunais superiores, declarações excessivas à imprensa, na hipótese mais branda, são ilegais por anteciparem seu julgamento; na mais grave, provocam o descrédito da instituição e dos colegas. Além disso, podem servir para dar poder excessivo a um ministro que já conta com fortes prerrogativas de função, facultando a essa pessoa atuar de forma privilegiada no campo da negociação política.

Há ainda os exemplos mais óbvios dessa atuação política. Há poucos dias, revelou-se o conteúdo de telefonema no qual Aécio Neves discutia com Gilmar Mendes estratégia para o sucesso da tramitação do projeto de lei de abuso de autoridade.

O contraste é claro entre Rosa Weber, criticada em um grampo por não jogar o jogo, e Mendes, interlocutor de conversa em que demonstra buscar o protagonismo nesse jogo. Como é possível esperar imparcialidade de Mendes se a nova lei de abuso de autoridade for questionada no STF?

Os novos tempos da relação entre a opinião pública e o Judiciário trazem novas formas e oportunidades para que magistrados tomem a iniciativa de se comunicar com a população. Mas nem todos esses novos meios devem necessariamente ser aproveitados.

Não sabemos se os exemplos dos juízes de Brasília e Curitiba são apenas casos isolados ou se representam tendência nacional. Certo é que, em tempos de mais transparência e novos meios de comunicação, condutas republicanas como as de Herman Benjamin e Weber são ainda mais importantes.

É preciso poder acreditar que o Judiciário será o fiel da balança na iminência de uma segunda troca de presidente da República em 12 meses. É preciso poder acreditar que os tribunais serão imparciais ao enfrentar a constante judicialização da política e os inúmeros processos criminais de autoridades. O sistema não funciona se os juízes tiverem partido. Infelizmente, a proatividade mal direcionada de alguns tem jogado uma sombra sobre todos.

IVAR HARTMANN, 32, é professor e pesquisador do Centro de Justiça e Sociedade da FGV Direito Rio.


Do GGN