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sexta-feira, 12 de julho de 2019

AÉCIO PROVA O CÁLICE AMARGO DA INQUISIÇÃO QUE ELE INSTAUROU, POR LUIS NASSIF

Quando Aécio Neves decidiu comandar o golpe do impeachment, desarticular todo o sistema institucional brasileiro, abrir as jaulas para a população sedenta de sangue, devia saber que aquilo deu nisso.
Primeiro, o jacobino teve seu poder capado, tombando sob mesma lógica que ceifou todos os sanguinários da história, de Robespierre a Joseph McCarthy e outros vultos infames da história, a mesma lógica que levou à execução de Marat, e ao mesmo bordão que inspirou Tomás de Torquemada, apenas trocando a palavra judeu por petista.
“Se observar que os seus vizinhos vestem roupas limpas e coloridas no sábado, eles são judeus.
Se eles limpam as suas casas às sextas-feiras e acendem velas mais cedo do que o normal naquela noite, eles são judeus.
Se eles comem pão ázimo e iniciam a sua refeição com aipo e alface durante a Semana Santa, eles são judeus.
Se eles recitam as suas preces diante de um muro, inclinando-se para frente e para trás, eles são judeus.”
Sessão do Supremo Tribunal Federal. Brasilia, 16-08-2018. Foto: Sérgio Lima/Poder 360
Foi poupado pelo sentimento de solidariedade que acometeu aliados no Supremo Tribunal Federal (STF) e na Procuradoria Geral da República (PGR).
Mas, despido do manto de rei, teve que sair dos palácios e enfrentar os pequenos políticos que passaram a usá-lo de escada, a exemplo do que ele próprio fizera com o antilulismo. Agora, nas suas próprias hostes, a escada passou a se chamar antiaecismo.
E foi assim que o prefeito de São Paulo, o minúsculo Bruno Covas, político que vive exclusivamente do sobrenome, incapaz de um lance de brilho, de ousadia, uma marca que o aproximasse do avô ilustre, mira no pequeno Aécio, encolhido em um canto, e dispara: “Ou ele ou eu”.
E os aecistas, revoltados, denunciam o tribunal de exceção do partido que criou o tribunal de exceção graças a Aécio (aqui).
O deputado Paulinho Abi-Ackel, cujo pai Ibrahim Abi-Ackel foi vítima de uma campanha infame na Globo, nos anos 90, um monumento de fake news, mostrou que o mineiro é definitivamente solidário no câncer e bebeu na sabedoria política do pai: “A presunção de inocência é uma conquista do Estado democrático de Direito e no PSDB essa regra não será diferente”. O pai foi acusado de ter colocado a Policia Federal para investigar um avião que, supostamente traria equipamentos para a rede Globo. Foi alvo de uma campanha terrível da Globo, acusado até de contrabandear pedras preciosas. A comprovação da inocência viria anos depois, quando o mal estava feito.
Agora, Paulinho se comporta como um grande democrata à brasileira que descobre, depois de muito sangue derramado, que o devido processo legal é essencial, mas para os nossos; para os outros, a Lei de Moro.
No início da década, em um almoço no Massimo, na época o restaurante mais caro de São Paulo, Fernando Henrique Cardoso se autodefiniu a ele, Aécio e José Serra como os “malacas”, os espertos, em contraposição a Geraldo Alckmin, o provinciano.
Agora, se tem Aécio escorraçado por seus pares, Serra escondido e fugindo até de golpe de ar, e Fernando Henrique se agarrando como náufrago à boia de Sérgio Moro, o juiz que o poupou por tê-lo como aliado.
É apenas um dos capítulos que se segue à instauração do caos.
Do GGN

quinta-feira, 30 de maio de 2019

XADREZ DOS PREPARATIVOS INICIAIS PARA 2022, POR LUIS NASSIF

Ao contrário dos contos de Cortazar, não será possível manter indefinidamente na sala o cadáver de um presidente pesadamente envolto com milícias.
Peça 1 – o governo Bolsonaro
Como tenho exposto aqui, as circunstâncias políticas atuais, de um presidente da República pesadamente envolvido com organizações criminosas, traz um grau de imprevisibilidade extrema. Ao contrário dos contos de Cortazar, não será possível manter indefinidamente na sala o cadáver de um presidente pesadamente envolto com milícias.
Além disso, o governo Bolsonaro se enredou em uma armadilha econômica ao conferir o poder absoluto da economia a um economista, Paulo Guedes, sem experiência nem conhecimento para tirar o país do atoleiro em que se meteu.
Os resultados do PIB do 1o trimestre, divulgados hoje,  são fruto direto da inoperância cia de Guedes, que não conseguiu sequer, aproveitar o bônus que sempre acompanha os primeiros meses de uma novo governo.
É incapaz de pensar qualquer ação coordenada, no super-ministério que recebeu para comandar. Escondeu-se atrás da bandeira única da reforma da Previdência, como se fosse questão de vida ou de morte. Não tem sequer uma estratégia adequada para escapar da armadilha da Lei do Teto.
A reforma da Previdência não vai acrescentar um centavo a mais na arrecadação. No máximo reduzirá os encargos futuros. Mas o governo continuará à míngua, contando apenas com a queima de estatais para se manter.Mesmo assim, há analistas que enxergam a possibilidade de Jair Bolsonaro ir até o fim de seu governo. E se ter eleições livres em 2022.
As apostas residem no papel que o Congresso tem assumido, de moderador dos abusos de Bolsonaro. As reformas sairão a conta-gotas com descontos variáveis.
Pelo sim, pelo não, as estratégias estão sendo montadas.
Peça 2 – os grupos políticos
Em princípio, há quatro grupos que entrarão no jogo em 2022
Grupo progressista- É o mais forte e o mais articulado. Junta PT, PDT, PSB, PSOL, PCdoB, governadores nordestinos, de Rui Costa e Flávio Dino a Renan Filho em Alagoas, entre outros. É a aliança que caminha melhor, sujeita a alguns tropeços na intemperança de Ciro Gomes. Mas há maturidade suficiente do grupo para minimizar seus arroubos em nome da unidade.
Os autênticos do PMDB e PSDB- o grupo de centro-esquerda que preservou as raízes históricas dos respectivos partidos e que hoje estão sendo expulso do PSDB por João Doria Jr e o PMDB pelo desmanche. Entram aí quadros históricos do PSDB, expoentes do velho PMDB, como o ex-senador Roberto Requiao e outros. Mas é um grupo desarticulado, sem uma liderança unificadora, depois que Marina Silva e Ciro Gomes aparentemente perderam o poder aglutinador. E João Dória Jr não os atrai.
Os liberais- entram aí os liberais clássicos, mais os anarquistas de mercado, como o Novo, MBL e outros. Não tem ainda muita expressão nem no Congresso nem nas ruas. E, por vezes, aceitam as estultices bolsonarianas em nome das bandeiras liberalizantes.
Lideranças- individualmente, só existem Lula e Bolsonaro, com perto de 20% dos votos e com poder de mobilização. As manifestações de domingo passado demonstraram que efetivamente Bolsonaro empoderou politicamente seus eleitores, abrindo campo para um segmento selvagem, que deixou de ser civilizado pelos partidos tradicionais e pelos movimentos sociais.
Peça 3 – juntando forças para 2022
Se Bolsonaro chegar inteiro até 2022, haverá a seguinte distribuição política.
O grupo mais liberal em tese teria dois cavalos para encilhar: Joao Dória Jr ou Luciano Huk. Dória definitivamente aposta na estratégia de bolsonarismo, apresentando-se como um bolsominion tão truculento quanto o original, mas que sabe comer com garfo e faca.
Será insuficiente. Não atrairá a direita civilizada, nem com a malta, que se identifica com o estilo coçando-o-saco-em-público de seu guru.
Daí a aposta maior em Luciano Huk. A avaliação de Fernando Henrique Cardoso é que, no quadro atual de redes sociais, a única alternativa é o personagem carismático, cinzelado no campo da mídia e das redes sociais. O clube dos bilionários trouxe paulo Hartung para ser o conselheiro de Huk e trabalha para prepará-lo para a arena de 2022.
Do lado progressista, o que se vislumbra é uma disputa entre o bolsonarismo e o lulismo. As alianças do 2o turno é que decidirão o jogo. Daí, a importância de buscar uma aproximação gradativa com o chamado centro democrático.
Mas há o fator Lula.
Peça 4 – o lulismo x antilulismo
Aí se entra na armadilha montada pela mídia contra o país: a estigmatização de Lula. Em qualquer democracia europeia, uma figura como Lula seria preservada por todos os lados, por se tratar de um ativo nacional, do político capaz de ser o coordenador ou o interlocutor dos grandes pactos nacionais.
Em uma democracia selvagem como a brasileira, esse ativo foi jogado fora, deixando o próprio Lula prisioneiro dessa armadilha. Ele ficou grande demais para participar do jogo, por falta de um interlocutor de sua dimensão política. E a correlação de forças atual o mantém como prisioneiro político. Mais que isso, o antilulismo como único elemento de agregação das forças do golpe.
Compreensivelmente, Lula luta para voltar ao jogo. Mas insiste em uma aposta perigosa, de atrasar sua própria sucessão.
E aí entra-se em um dilema moral, entre o direito de Lula de voltar ao jogo, o único político brasileiro com dimensão internacional, cuja prisão política é a mancha maior no atual estágio da democracia brasileira, e o realismo de, sem sair do jogo, recolher-se à posição de estrategista.
Daqui até 2022 essa aliança será cada vez mais relevante para redução de danos do país. 
GGN

domingo, 5 de maio de 2019

TEM QUE TIRAR BOLSONARO, ANTES QUE ACABE COM O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO, POR LUIS NASSIF

O bloqueio das verbas de custeio, autorizado por Jair Bolsonaro, vai paralisar todo o sistema de ensino superior e dos Institutos Federais de Educação. E foi motivado exclusivamente pela tal guerra ao marxismo cultural que orienta todas as ações de governo e pelos investimentos de Paulo Guedes no setor privado.
É tão maluco esse desmonte quanto seria a ideia de estatizar o setor privado. São posições ideológicas sem nenhuma avaliação sobre o resultado final para o país.
Essa loucura vai desestruturar o sistema universitário, prejudicar milhares de alunos, interromper pesquisas científicas, comprometer o atendimento dos hospitais universitários.
Insisto: o país não pode continuar refém desses celerados. O governo é transitório. Dura um mandato, dois, com reeleição. Há obras que são permanentes, como é o caso do sistema de ensino público. Não há nenhuma possibilidade de conferir a um mandatário o poder de destruir uma construção intergeracional e, mais do que isso, essencial para o desenvolvimento do país.
Talvez essa irresponsabilidade  seja derrubada em breve, por uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). Mas como se pode conviver com armadilhas diárias, desmontes diários de toda uma construção política, social, de várias gerações de brasileiros, não apenas destruindo o que foi construído ao longo de décadas, mas deixando um vácuo, sem nenhum projeto alternativo?
O STF, o Congresso, o Judiciário, as Forças Armadas são parte do Estado brasileiro. Não podem permitir a continuidade dessa loucura. Se não agirem, serão cúmplices da destruição do país como Nação.
GGN

sábado, 11 de novembro de 2017

Os marajás do Estado e os do mercado financeiro, por Luís Nassif

Dia desses, uma notável economista, através das páginas do Estadão, conclamou a sociedade a investir contra os marajás do serviço público, que perderam o foco de sua missão, que é servir ao público.
Escrevi recentemente sobre a crise do liberalismo patrício, a incapacidade de casar o discurso da eficiência e redução do Estado, com um mínimo de sensibilidade social, solidariedade, generosidade, princípios legitimadoras de uma ação política. Enfim, mostrar que o modelo que defendem é mais eficaz que o modelo intervencionista na promoção da condição de vida da maioria da população.
Mas não conseguem deixar de olhar o próprio umbigo. Isto é, admitir as distorções amplas e óbvias no quadro fiscal, dos quais o mercado, associações de profissionais liberais e as diretorias das grandes corporações são os maiores beneficiários.
Desde o governo FHC há uma lei que isenta tanto a distribuição de dividendos quanto os pagamentos feitos a título de juros sobre o capital próprio – uma distribuição simples de lucros, a título de pro-labore.
No fundo, a crítica ao Estado e aos salários dos funcionários públicos fica algo mesquinha, uma mera disputa pelo bolo orçamentário. Ou seja, a redução do custo do Estado não significará melhoria dos gastos que revertem diretamente para a população, mas garantir espaço fiscal para a ampla elisão fiscal que caracteriza o sistema brasileiro.
Tome-se a economista e sua instituição.
Cálculo 1 – a isenção fiscal com os juros sobre capital.
Vamos comparar duas situações: um marajá do serviço público, alvo da economista; e um jovem analista ou operador de corretora.
O teto do funcionalismo – para aqueles funcionários com mais de 20 anos de carreira – é de R$ 35.000,00. Um procurador da República toma decisões que afetam toda a coletividade.
R$ 35.000 é um salário de quase iniciante no mercado financeiro. E a única função do operador é ganhar mais dinheiro em operações de arbitragem, e nenhuma responsabilidade mais ampla.
Compare o imposto de ambos, um pela tabela progressiva, outro pelo sistema de distribuição a título de juros sobre capital próprio.
Ou seja, ganhando o mesmo que um funcionário público – ou um assalariado que pague pela tabela progressiva – o operador paga 40% a menor de Imposto de Renda.
E, mesmo assim, comparando com a tabela progressiva, cuja alíquota máxima é 27,5%, ínfima comparando com países desenvolvidos.
Cálculo 2 – a equiparação de IR entre o operador e o marajá.
Imagine dois casos: um salário pagando impostos pela tabela progressiva e outro pelo sistema de juros sobre o capital. Um salário de R$ 35.000 pela tabela progressiva paga o mesmo imposto que um salário de R$ 58.817 pelo sistema de distribuição a título de juros sobre o capital próprio.
Em cada exercício, o brilhante operador iniciante pagou R$ 45.473 a menos de IR – o que daria para sustentar 45 benefícios do Bolsa Família.
Nas faixas mais altas, a economia de IR para quem ganha R$ 178 mil daria para sustentar 148 Bolsas Família.
Pergunto: sem abordar a questão da elisão fiscal no mercado financeiro, escritórios de advocacia, diretorias corporativas, dá para criticar o marajá o serviço público?
Só para os absolutamente desinformados.
GGN

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

O Xadrez da falência da macroeconomia brasileira, Luís Nassif

Peça 0 – a Semana do Economista da Escola de Economia da FGV
A Semana de Economia da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas, tem permitido uma visão bastante nítida dos limites e das pretensões da macroeconomia no país.
A diversidade de linhas de pensamento permitiu montar um quadro preciso do momento atual, cujas principais conclusões são:
·      O predomínio do financeiro sobre o estratégico.
·  O reconhecimento do conhecimento da economia como arma política dos economistas, encastelados nos Bancos Centrais.
·     O pastel de vento que está sendo vendido por Henrique Meirelles, uma bomba para estou em 2019.
·      A manipulação das estatísticas como instrumento de marketing.
Vamos por partes.
Peça 1 – o economista e o financeiro dos anos 80
Nos anos 80, em função da inflação e a volatilidade dos ativos, o diretor financeiro era o principal executivo das empresas, muito mais relevante que o gestor maior, que o sujeito de qualidade, que os departamentos de inovação, que a própria presidência..
Todas as decisões, inclusive estratégicas, eram subordinadas ao financeiro.
Houve um caso clássico, que marcou o último momento desse modelo de gestão. A Sharp estava no vermelho. Contratou um financista que em três meses colocou a empresa no azul. Em um ano, quebrou a empresa. Para obter resultados imediatos, desativou a área de desenvolvimento, encolheu a de vendas, reduziu a assistência técnica, peças centrais para o futuro da companhia.
A partir dos anos 90, houve enorme sofisticação no modelo de gestão das grandes corporações brasileiras. Visão estratégica, políticas de qualidade total, investimento em produtos ou, com o câmbio desfavorável, importação e maquiagem de produtos. Nos eventos da Fundação Nacional de Qualidade (FNQ), as premiações passaram a levar em conta visão de futuro, ambiente de trabalho.
Nesse modelo, o financeiro voltou ao seu lugar de receber os planos estratégicos, estimar os custos e encontrar formas de financiá-los. E alertar quando os planos estavam além dos recursos disponíveis ou com taxas de retorno insuficientes.
No subdesenvolvimento macroeconômico brasileiro, ocorreu o inverso. A política macroeconômica é que passou a determinar o todo, dentro de uma lógica primária: as receitas fiscais estão dadas; nada de aumento de impostos ou de uma reforma tributária mais equânime. Quanto às despesas, virem-se! Havendo insuficiência, preservem-se os ganhos do mercado, os rendimentos do capital, os salários e aposentadoria das corporações públicas, e cortem-se os gastos finalísticos – aqueles que são devolvidos à população na forma de política de rendas ou de serviços ou em áreas igualmente críticas, como inovação, investimento.
É o que explica esse Ponte Para o Futuro. Para obter o equilíbrio fiscal, cortam-se investimentos em educação, saúde, segurança, financiamento da inovação, financiamento de longo prazo. O corte nos investimentos públicos derruba a atividade econômica que derruba as receitas fiscais, obrigando a mais cortes até cavar um fundo do poço de 10 pontos percentuais de queda do PIB.
Mais ainda.
A política monetária não é eficaz. Um dos problemas apontados é a existência de linhas de crédito e financiamento com juros abaixo da Selic. Acaba-se, então, com a TJLP e inviabiliza-se qualquer financiamento de longo prazo – pois não há mercado privado de financiamentos de longo prazo.
Nos balanços das empresas privadas, há a taxa de depreciação. A empresa tem suas máquinas. A cada ano, poderá abater um percentual do valor das máquinas a título de depreciação, com base na hipótese de que no final do período de vida útil se terá que comprar outra.
Os cortes de custeio e investimento estão paralisando obras em andamento, desmontando institutos de pesquisa, promovendo atrasos insanáveis em educação, saúde, segurança. Quanto custa para o país o atraso educacional de milhões de crianças, a cooptação de parte delas pelo crime, as perdas com roubos e assaltos pelo desaparelhamento das policias.
Não pergunte para um macroeconomista.
A visão primária da eficiência
Há uma geração deles obcecada pelas análises de eficiência. E não conseguem avançar além da primeira operação.
Hoje em dia, com os grandes bigdatas, a economia caminha para a análises de realidades complexas. Isto é, não apenas os efeitos diretos de uma medida, mas as consequências totais sobre outros setores, inclusive implicações sociais, ambientais.
No Brasil, a discussão econômica não passou dos cálculos de um ou dois fatores, e olhe lá!
Quatro exemplos:
1.     O aumento do salário mínimo permitiu que em 55% dos lares com um aposentado ou pensionista, este se tornasse o arrimo de família. Os filhos e netos puderam estudar mais tempos, entrar mais tarde no mercado de trabalho. A saúde da família foi preservada, assim como o poder de atração do crime organizado. Para os que pensam apenas na eficiência dos gastos: quanto o país economizou com essas externalidades? Jamais os cabeções se interessaram em levantar esses dados. Tratam os gastos como um valor em si, como se fosse mero desperdício.
2.     O Tesouro empresta ao BNDES. Há uma diferença entre o custo do dinheiro para o Tesouro (Selic) e o que vai receber do BNDES (TJLP). No entanto, o financiamento do BNDES permitirá que fábricas sejam construídas, que comecem a produzir, a pagar impostos sobre a produção, a criar vagas formais de empregos. Qualquer análise minimamente competente sobre eficiência do investimento, do ponto de fiscal fiscal, teria que levar em conta esses dados.
3.     A Previdência é um sistema de repartição simples: as contribuições dos da ativa servem para bancar os benefícios dos aposentados. Vai-se produzir uma reforma que desestimulará os mais jovens de contribuir. Ao mesmo tempo, a reforma trabalhista irá aumentar exponencialmente a informalidade (ou pejotização) no setor de serviços, o que mais cresce. A sustentabilidade da Previdência depende fundamentalmente de dois estudos: o nível de desistência dos que entram; o nível de informalidade do trabalho. Nenhum estudo foi feito sobre dois pontos fundamentais.
Cena 2 – o poder político dos cabeças de planilha
A palestra mais retumbante do evento foi a de André Lara Rezende, o principal pai do Cruzado, abordando os erros que foram cometidos pela ortodoxia econômica nas últimas décadas, a o poder político dado a tecnocratas do Banco Central e da área econômica.
Afirmações de André:
·    Os juros brasileiros são tão altos que provocam perplexidade em toda parte.
·    A ideia da independência do Banco Central foi um clichê sem reflexão, permitindo, em nome de uma suposta competência técnica, que só um tipo de economista, formados nos EUA, pudesse manter o controle sobre o BC e a política monetária.
·   Ser economista hoje em dia é um atalho muito melhor para o poder do que fazer carreira política.
·  O BC tem muito mais poder que o Ministério da Fazenda. Além de poder, o economista do BC usufrui da exploração de prestígio e não apenas aqui. Alan Greenspan era tratado como um gênio até perceber o desastre que fez.
·  Se o equilíbrio fiscal é fundamental para melhorar as expectativas, o maior peso sobre o orçamento são os juros. No momento em que o BC baixasse os juros vigorosamente, imediatamente se acenaria para o mercado sobre a sustentabilidade da dívida pública.
·   Hoje em dia, as faculdades de economia servem apenas para ensinar matemática de baixa categoria.
Sobre a palestra de André, escreverei um artigo à parte.
Os ataques que sofreu dos economistas ortodoxos foi pesado. O mínimo que fizeram foi trata-lo como “traidor”. E a razão é simples. Esses economistas fizeram sua fama, reputação, em cima de um tipo de conhecimento enganoso e que está prestes a ser reavaliado. Para garantir a reputação, bastava repetir o manual de respostas prontas do livrinho. Desmontada a teoria, terão que pensar, competir no mercado compondo cenários criativos, sem poder se escudar nos erros coletivos para justificar os seus.
Cena 3 – o autoengano do mercado
O jogo do mercado é simples.
Há um conjunto de grandes operadores que comandam as expectativas do mercado. Eles se posicionam, montam suas carteiras e passam a gerar pontos de expectativa, usando o jornalismo econômico como canal de transmissão. Quando a realidade começa a se impor sobre a fantasia, eles despejam sua carteira no mercado, vendendo no pico. E acelerando.
Hoje em dia, a taxa de auto-engano é tal que o mercado comemorou quando o Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot se enrolou, pois acreditou que aumentou a sobrevida de Michel Temer. Fundamentos da economia, análise da política econômica?, que nada.
A PEC do Teto incidirá exclusivamente sobre gastos federais – saúde, educação, segurança, custo da máquina pública. Não enquadra Judiciário, Ministério Público e corporações públicas. À cada ano, os setores não enquadrados irão comer fatias cada vez maiores do orçamento, reduzindo o do Executivo federal até o ponto da ingovernabilidade. Ou seja, os gênios do “dream team” econômico não previram pontos básicos da análise.
André Perfeito, um dos mais independentes economistas de mercado mostrou o circuito do auto-engano do mercado:
·      O governo Temer pratica um populismo fiscal amplo, gastos fiscal com objetivos políticos imediatos.
·      Vai-se chegar a 2019 sem um modelo fiscal consistente.
·      O próximo governo, seja quem for, não manterá a PEC do Teto simplesmente porque é inviável.
·      O nó fiscal está chegando perto do muro, vai bater e ninguém está fazendo nada.
·      A reforma da Previdência, relevante, não dará em nada senão for feita em cima do funcionalismo público, o único que ainda tem renda.
·      O mercado adjetiuva a política econômica de acordo com os ganhos imediatos que traz. Se for lógica, mas impuser sacrifícios ao mercado, é tratada como desastrosas. Se for desastrosa, mas trouxer ganhos de curto prazo, é genial. Mas chega a hora da verdade.
·      Hoje em dia, a Bolsa – que continua subindo – trabalha em cima de apenas cinco papéis, dois de bancos (Bradesco e Itau), da Ambev, de uma empresa de commodities (Vale). Para ter uma ideia do tamanho do estouro da Bolsa, o P/L (relação preço/lucro) do Bradesco está em 20 anos. É um indicador próximo ao dos grandes momentos de crack da Bolsa no início dos anos 70 e no fim dos anos 80.
O próximo candidato assumirá, terá que abrir o jogo sobre a impossibilidade de avançar nas tais reformas. Quando isto suceder, explodirá a taxa longa de juros e ai será o estouro da boiada.
Cena 4 – as políticas alternativas
Coube a Ricardo Carneiro, do Instituto de Economia da Unicamp, repor os pontos fundamentais, os objetivos do desenvolvimento econômico.
1. Aumento da produtividade
2. Melhoria da distribuição da renda: com o tipo de sociedade que se quer
3. A preservação do meio ambiente.
O melhor exemplo do fracasso da ortodoxia está na comparação Estados Unidos-China.
China usou vários instrumentos de intervenção na economia; os Estados Unidos, uma desregulação radical.
Além da crise do subprime, em 2007 e 2008, os Estados Unidos pioraram em vários indicadores: distribuição de renda, deterioração da classe média, deterioração ambiental, merda do dinamismo produtivo tecnológico, com a inovação sendo gerada de maneira assimétrica e desigual.
De posição subalterna, a China se tornou a segunda economia do mundo, com uma ação firme de Estado: 
É evidente que há características chinesas que não são transportáveis, próprias de um regime autocrático. Mas demonstra que o desenvolvimento não se consegue com manuais que ignoram totalmente os efeitos macroeconômicos na ponta, sobre empresas e pessoas.
Assim como é evidente que tem que se enfrentar a questão fiscal sim, com uma análise abrangente da estrutura de receita e despesa e, se for o caso, com mudanças na Previdência. Mas, antes dela, na estrutura de tributação, na distribuição equânime dos sacrifícios.
GGN

sábado, 24 de junho de 2017

As palestras de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol e a arte de sofismar o direito, por Luís Nassif do Jornal GGN

Lava Jato proporcionou, junto à cobertura de mídia, criação de figuras públicas que comercializam autoimagem e informações públicas. Confira o vídeo ABAIXO.
Um novo fato volta a chamar atenção à cúpula que coordena a Operação Lava Jato. Há alguns dias começou a rodar no Twitter um post com a imagem de um site de palestras vendendo apresentações do procurador Deltan Dallagnol, que por sua vez vende em suas palestras conteúdo público, levantado no trabalho público que realiza na Lava Jato.  

O Twitter viralizou, levando Dallagnol a usar sua conta pessoal no Facebook para desmentir o objetivo de lucro das palestras, deixando-o em uma situação complexa. Dallagnol dizia no texto que, por modéstia, não tinha divulgado que todo o dinheiro da palestra ia para uma grande causa, que era financiar ações do tipo Lava Jato. 

Mas tem um problema que pesa contra a argumentação de Dallagnol: não existe possibilidades legais de acontecer a doação de pessoas físicas para áreas públicas, em benefício de qualquer tipo de ação, e para ter qualquer tipo de repasse ele teria que ter uma pessoa jurídica. Então, para comprovar que não está mentindo, Dallagnol teria que mostrar o CNPJ da pessoa jurídica que recebe o dinheiro das palestras. Ele não poderia alegar, por exemplo, que o dinheiro ficou na sua conta, e estando na sua conta, esperava abrir a pessoa jurídica para transferir. Isso caracterizaria que está faltando com a verdade. 

O procurador deve estar, de fato, com uma demanda considerável de pedidos de palestras. Vamos supor, três palestras por mês, em uma faixa de R$ 30 mil, por evento, portanto R$ 90 mil por mês. Em dez meses, R$ 900 mil.

A demanda é isso, ou seja, a Lava Jato proporcionou através de uma ação pública, com a cobertura de mídia, a criação de uma figura midiática, que passa a comercializar a imagem e as informações que ela levantou em um trabalho público. 

Outros procuradores seguem assim. Por exemplo, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima deu outro dia entrevista para o El País admitindo que dá palestras. O juiz Sérgio Moro, como já sabemos, também concede palestras. 

Eu fiz uma pequena pesquisa no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para ver como eles estão regulamentando a questão de palestras de juízes. O órgão prevê que um juiz pode participar de seminários que tenham parte do financiamento privado, desde que seja só 30% dos gastos do seminário. Porém, o juiz precisa comunicar ao CNJ quando o transporte e a hospedagem forem subsidiados pelos realizados do evento, acrescentando: "Ao magistrado é vedado receber, a qualquer título ou pretexto, prêmios, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei". 

Sobre congressos e seminários, especificamente, o CNJ, afirma ainda:  "Congressos, seminários, encontros jurídicos, empórios culturais, quando promovidos por tribunais, conselhos de justiça ou que podem contar com subvenção privada, desde que seja apenas 30%".

Vejam, portanto, que a única menção que se faz aqui é a proibição de juízes receberem palestras pagas. Outro ponto é que tem que se dar a plena publicidade para essas palestras. Que nem o próprio deputado Wadih Damous, quando entrou com uma representação junto ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) colocou, não há sigilo bancário e fiscal para funcionário público. Então, no mínimo, Deltan Dallagnol terá que mostrar as palestras, o que recebeu. E aí entra um ponto relevante: e se ele faltou com a verdade na história de destinar o que recebeu de dinheiro para fins beneficentes contra a corrupção, como que fica? Tem-se aí uma quebra decoro importante. 

Outro ponto relevante está nas argumentações de um ex-procurador que se tornou jurista, Lênio Streck, um sujeito oceânico nas discussões que realiza. Em um recente artigo, que republicamos no GGN, "Teorias exóticas do MP no caso Lula, seriam chumbados pelo CNMP", Lênio pegou as teorias das quais se valeu Dallagnol para tentar fundamentar a acusação contra Lula e uma dessas teorias são as questões probabilísticas. Por exemplo, você não tem em mãos a prova cabal do crime, mas tem um conjunto de probabilidades que o crime tenha ocorrido. Então Deltan usa isso para dizer que em cima das probabilidades e das tais teorias ele pode acusar.

Eu conversava hoje com um procurador para tentar entender essa lógica. Como ela funciona: digamos que lá no aeroporto de Guarulhos de cada cinco nigerianos que desembarcam, três sejam mulas, pessoas que transportam escondido drogas. Então, de cada cinco que entrar no país eu detenho três e levo preso, porque probabilisticamente eles podem estar trazendo cocaína. A lógica e bom senso, evidentemente, mostram que isso seria uma tolice. A parte probabilística você pode utilizar para definir suspeitos. Para definir a culpa você tem que mostrar que a pessoa que você pegou transportava a cocaína, portanto era mula efetivamente.

Essa jogada é muito semelhante com o que os economistas de mercado fazem, os tais cabeças de planilha, que usam os fundamentos da teoria econômica como se fosse uma sofisticação. Quem conhece vê que é um escracho enorme, mas para a opinião pública passam a ideia de erudição. E o que Lênio faz com a peça de Deltan é arrasador.

Deltan, assim como seus colegas, incluindo Moro, não joga para o especialista em leis, joga para massa, para o padrão Globonews. Apresentam fórmulas e apresentam teorias aparentemente sofisticadas, e daí vêm especialistas sobre o tema apontado a grande falta de lógica de tudo que defendem. Voltando ao exemplo do aeroporto: você tem a probabilidade de que aqueles três detidos sejam transportadores de cocaína, mas para condená-los eu tenho que provar que eles transportaram a droga. Portanto a probabilidade não é suficiente para condenar ninguém. 

Essa falsa erudição é típica de redes sociais e de uma mídia que nunca foi imparcial. 

Nessa quinta-feira (22), aconteceu no Supremo Tribunal Federal a consolidação da delação premiada, mantendo a decisão em favor da JBS, por conta dos indícios e provas ligando Temer a crimes evidentes, mas a maneira como estão utilizando o mecanismo delação premiada é abusivo. Na recente cessão do STF, Luis Roberto Barroso disse que a delação é um instituto novo que não pode ser desmoralizado pela Corte, mas quem está desmoralizando a delação premiada é a Lava Jato! 

E isso ficou mais claro em uma matéria do jornal O Globo que, mesmo com um histórico pendendo para um lado que favorecia a Lava Jato, apresentou uma entrevista com o presidente da OAS e seus advogados onde a redução da sua pena foi possível porque delatou o ex-presidente Lula. O que Deltan, seus colegas e Moro querem é a criminalização de Lula. Mas daí se eu não tenho a prova, não precisa, basta apenas conseguir uma afirmação do jeito que eu quero, caso contrário o empresário preso não terá a redução da pena, e daí eu pego esse conjunto de delações que consegui dessa forma e crio uma probabilidade. 

Cá para nós, os especialistas já desmoralizaram a teoria econômica, a profissão do economista, não vamos deixar que aconteça o mesmo com o lado jurídico.

Está começando a ter uma freada para a arrumação. A partir do momento em que o corregedor do Conselho Nacional do Ministério Público aceita essa representação contra as palestras do Deltan Dallagnol, começa a haver uma luz contra esse abuso que desmoraliza o Ministério Público que é uma corporação acovardada porque vocês, procuradores, sabem que o caso é desmoralizante para o Ministério Público, e poderá atingir as prerrogativas da organização, futuramente. Entretanto, ninguém se manifesta. 

GGN