É
curiosa a maneira como porta-vozes midiáticos da Lava Jato justificam a
ausência de provas que têm marcado os inquéritos, depois que viram denúncias.
Alegam
que crimes financeiros são mais complexos, organizações criminosas são mais
estruturadas, por isso mesmo não se pode esperar provas simples, como no caso
de um homicídio.
Fantástico!
Significa que em outros países as investigações também chegam ao final sem a
apresentação de provas substanciais porque, por princípio – segundo eles –
crimes complexos não têm soluções racionais, mas apenas convicções?
Justamente
por não ser uma investigação trivial, a Lava Jato contou com um conjunto de
facilidades inéditas na história das investigações criminais do país.
Contou
com o poder de pressionar mais de uma centena de delatores, dispostos a
entregar até a mãe por uma redução da pena. Premiou os maiores criminosos com a
quase extinção da pena. Contou com ampla colaboração internacional, do
Departamento de Justiça dos Estados Unidos aos Ministérios Públicos suíço e
espanhol, rastreando contas em paraísos fiscais. Internamente, teve acesso
integral aos bancos de dados da Receita Federal, do COAF, dos cartórios, das
remessas ao exterior. Ganhou até o poder de torturar psicologicamente
suspeitos, afim de pressioná-los a delatar. Provavelmente apenas a luta contra
o terror, nos EUA, conseguiu suspender tantas normas constitucionais de
direitos individuais.
Nenhum
dos álibis da má investigação – má vontade do Judiciário, excesso de recursos –
vale para a Lava Jato. Certamente foi a investigação que consumiu mais recursos
do Ministério Público Federal e da Polícia Federal e que dispôs de mais poder
institucional, mais influência, em relação aos juízes e advogados de defesa.
Depois
de todo esse aparato, surge a cândida explicação: a opinião pública cobra
provas por ser desinformada e não saber que, em investigações de crimes de
colarinho branco, não é fácil levantar provas.
O
que a Lava Jato expõe, com a falta de provas, é a supina incompetência tanto
dos procuradores quanto dos policiais federais da força tarefa, em trabalhar
com eficiência os dados levantados.
Entraram
na investigação com viés ideológico, mais preocupados em alimentar a imprensa
com declarações de réus confessos, sem a preocupação de conferir as provas,
porque para a imprensa só interessa a perfumaria. E havia a preocupação de
gerar manchetes diárias, de acordo com a receita formulada em 2005 por Sérgio
Moro ao analisar a operação “mãos limpas”.
A
preocupação em transformar a Lava Jato na “maior investigação do planeta”
- como a definiu a procuradora deslumbrada de São Paulo – engoliu a capacidade
de investigação da turma, que já não deveria ser das mais experientes.
Em
vez de concentrar nos casos centrais e formular narrativas condizentes com os
dados delatados e levantados, comportaram-se como repórteres
principiantes, primeiro criando a narrativa, depois juntando declarações que
coubessem nela, sem a preocupação de checar a consistência dos fatos ou
reformular as narrativas à luz dos dados levantados.
Será
conhecida, no futuro, como uma operação malcuidada, cujo único objetivo foi
contribuir para um golpe de Estado e conferir fama – e os ganhos provenientes
dela – aos seus protagonistas. E tudo isso se vangloriando de estar enfrentando
as forças mais temíveis da Nação – na verdade, um governo mais indefeso do que
freira carmelita em cabaré. Quando finalmente estiveram frente a frente com o
poder, dançaram. Estão sendo comidos com pão e farofa.
Nem
se culpe a arrogância de procuradores e delegados da Lava Jato, quando se
consideraram donos da cocada preta. São apenas funcionários públicos que se
deslumbraram da mesma maneira que um anônimo quando contemplado pela loteria.
A
culpa é de um país que, em nome de um combate a um partido, aboliu regras
jurídicas, respeito à democracia e às instituições.
GGN