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terça-feira, 8 de maio de 2018

O lavajateiro CARLOS LIMA era CASADO COM FUNCIONÁRIA DO BANESTADO quando já atuava no caso

Quatro professores e doutores em Sociologia de universidades do Paraná divulgaram, em 2017, um artigo sobre os antecedentes (familiar, acadêmico e profissional) de membros estrelados da Lava Jato. Neste artigo consta uma informação que parece ter sido esquecida pela velha mídia: o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos algozes de Lula em Curitiba, esteve casado com uma funcionária do Banestado quando já atuava na investigação sobre a evasão de 30 bilhões de dólares.
Boa parte do perfil de Santos Lima foi escrito a partir de uma reportagem de Amaury Ribeiro Jr para a IstoÉ, em setembro de 2003.
Foi a IstoÉ o veículo de imprensa a revelar que Santos Lima, que entrou no caso Banestado em 1997, era marido de Vera Márcia Ribas de Macedo dos Santos Lima. Esta, por sua vez, trabalhou no Banco entre 1995 e 2001, em dois cargos diferentes.
De 1995 a 1997, "quando ocorreu a maior parte das remessas irregulares para o Exterior, Vera Márcia, ainda casada com Santos Lima, trabalhava como escriturária no setor de abertura de contas da agência da Ponte da Amizade, em Foz de Iguaçu. A investigação da Polícia Federal sobre a evasão de divisas por intermédio do banco mostra que a maioria das contas de laranjas, usadas para mandar o dinheiro para o Exterior, foi aberta exatamente nessa agência."
Em 1997, Vera se mudou com o marido para Curitiba e passou a trabalhar, ainda de acordo com IstoÉ, "em um setor ainda mais estratégico da lavanderia: o Departamento de Operações Internacionais do Banestado, onde eram fechadas transações fraudulentas de câmbio."
Segundo delatores (não premiados) da época, "os funcionários desse setor recebiam comissão para recrutar doleiros e pessoas interessadas em enviar recursos para o Exterior. Ainda de acordo com sua ficha funcional, Vera Márcia trabalhou no local até 2001." 
Em 2002, Santos Lima e Vera se divorciaram.
No meio das investigações da CPI no Congresso, Santos Lima chegou a ser interrogado por parlamentares, ocasião em que omitiu que estivera casado com a então funcionária do Banestado enquanto atuava no caso. IstoÉ ouviu do então deputado do PT, Eduardo Valverde, que o procurador deveria ter se declarado impedido de atuar naquela investigação.
IstoÉ ainda revelou, naquela mesma reportagem, que senadores e deputados estavam "indignados" com Santos Lima por outro motivo: o procurador teria se recusado a receber documentos que os membros da CPI, da Polícia Federal e do Ministério Público foram buscar em Nova York. As mais de "300 caixas de papéis sobre a movimentação de dezenas de contas milionárias que receberam dinheiro sujo do esquema Banestado" teriam sido menosprezadas sob o argumento de que "o MP brasileiro não era obrigado a considerar provas ou conclusões" de CPIs.
DECLARAR SUSPEIÇÃO NÃO ERA SEU FORTE
A apuração de Amaury Jr. não parou por aí. Escreveu o jornalista, naquela edição de 2003, que outro episódio provava que declarar suspeição não era o forte de Santos Lima. A reportagem relatou que, em 2000, estourou no Paraná um escândalo envolvendo a venda irregular de ações de uma empresa de telefonia pública de Londrina para a companhia Paranaense de Energia. A transação usou um braço do Banestado e foi condenada pelo Tribunal de Contas do Estado.
O TCE também apontou outra irregularidade na negociação: o advogado contratado para dar respaldo legal à transação, por R$ 2 milhões, sem licitação, foi Cleverson Merlin, que era casado com a então chefe do Ministério Público Federal do Panará, Marcela Peixoto.
Marcela e Santos Lima nutriam laços de amizade desde 1990 e, ainda assim, ele não se declarou suspeito para atuar no caso. Ao contrário disso, avocou o processo que pertencia ao MP de Londrina para si. 
PGR POR SANTOS LIMA 
Para finalizar, contou a IstoÉ que o escândalo envolvendo Santos Lima mobilizou o então procurador-geral da República Cláudio Fonteles.  
Sobre o episódio da CPI, Fonteles disse que Santos Lima "agiu de forma 'perfeita' para resguardar a validade das provas e tentou minimizar o fato de que sua ex-mulher trabalhava no Banestado na época em que investigava o caso", algo que o PGR taxou de "sem importância", pois Vera seria uma mera "escriturária", sem nenhuma participação no esquema. 
Fonteles ainda destacou que Santos Lima era um procurador importante para o caso Banestado, e prova disso era que tinha protocolado, em agosto de 2003, denúncia contra várias pessoas suspeitas de atuar no esquema de levagem de dinheiro. 
"Santos Lima, no entanto, só começou a agir em março, depois de ISTOÉ denunciar o abandono das investigações e quando já havia sido a instaurada a CPI na Assembléia Legislativa", ressaltou o jornal. 
Por conta da série de reportagens de IstoÉ - que envolve também um processo contra o procurador por "uso ilegal do dinheiro das diárias" - Santos Lima anunciou que iria processar a revista. 
A reportagem completa pode ser acessada aqui. 
DE UMA FAMÍLIA DE "OLIGARCAS" 
Segundo o artigo dos professores do Paraná, Santos Lima graduou-se na Faculdade de Direito Curitiba. Entre 1978 e 1991 foi Escriturário do Banco do Brasil. Entre 1991 e 1995, promotor de Justiça do MP-PR. Depois, Procurador Regional da República. Foi membro da força-tarefa Banestado. Fez Mestrado na Cornell Law School entre 2008 e 2009. 
Santos Lima é filho do deputado estadual da ARENA Osvaldo dos Santos Lima, que foi promotor, vice-prefeito em Apucarana e presidente da Assembleia Legislativa do Paraná, em 1973, no auge da ditadura. 
O avô foi Luiz dos Santos Lima, comerciante e juiz em São Mateus do Sul, na época do coronelismo local. "A partir daí encontramos esta família na Genealogia Paranaense situada nas oligarquias da Lapa entre latifundiários escravistas, família aparentada ao Barão dos Campos Gerais e outros membros da classe dominante tradicional desta região", afirmam os autores do artigo.
Em 2015, o irmão Ovídio dos Santos Lima foi empossado como procurador do Ministério Público do Paraná. No dia da posse, foi lembrado que o pai de Lima e o irmão Luiz José também foram promotores de Justiça do MP-PR. 
No mesmo artigo, os professores do Paraná também abordam o histórico familiar de Deltan Dallagnol, Sergio Moro e Rosangela Wolff Moro, além de estender a pesquisa sobre o Ministério de Temer.
O artigo "Prosopografia familiar da operação Lava Jato e do Ministério Temer" foi escrito por Ricardo Costa de Oliveira, José Marciano Monteiro, Mônica Helena Harrich Silva Goulart e Ana Crhistina Vanali, e publicado na Revista NEP-UFPR (Núcleo de Estudos Paranaenses da Universidade Federal do Paraná). Leia a íntegra em anexo.
Arquivo
Do GGN

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

A morte do reitor e o espírito punitivista, por Luís Nassif

A tragédia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que levou ao suicídio do reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo é ilustrativa desses tempos tormentosos que o país atravessa, com o punitivismo entrando em todas as áreas e abrindo espaço para os tipos mais doentios e desequilibrados.

Os jornais cobriram a tragédia burocraticamente, tratando o volume de recursos fiscalizados – R$ 80 milhões dos cursos de educação à distância – como se fosse a corrupção final. E estabelecendo relações de causa e efeito com o suicídio, não permitindo o direito da dúvida ao reitor, mesmo depois de morto. Afinal, os que recebem a pecha de corrupto não tem direito nem à morte digna.

No entanto, é um episódio exemplar, de como o punitivismo criou uma nova legião, os agentes de controle, os templários da nova ordem, pessoas cuja métrica de avaliação é o rigor sem limites, não distinguindo pequenos delitos de grandes crimes, não entendendo outra forma de punição que não a da destruição total do inimigo.

Os órgãos de fiscalização e de repressão assumiram tal influência que passaram a se imiscuir em vários setores da vida do país, trazendo consigo altas doses de intolerância e de pensamento policialesco e abrindo espaço para personalidades desequilibradas, a verdadeira banalização do mal praticando a crueldade com a segurança de quem tem o Estado atrás de si.

Nos últimos tempos, começou a se disseminar a figura do corregedor da Universidade federal. Ali, plantou-se o ovo da serpente, do poder externo se sobrepondo ao da comunidade.

Em geral, as universidades padecem de problemas sérios de gestão. Muitas vezes pesquisadores competentes são transformados em chefes de departamento, sem nenhuma experiência nem paciência para lidar com problemas administrativos. Criadas para permitir buscar outras fontes de recurso, muitas vezes as fundações não têm a devida transparência na prestação de contas. Por outro lado, há um enorme cipoal burocrático que torna mais difícil ainda a gestão nas universidades e transforma o mero exercício contábil de prestação de contas em um inferno sem fim.

Em vez de aprimoramento nas formas de controle e de induzir as universidades a buscar gestores profissionais, decidiu-se pelo caminho burocrático, de criar uma corregedoria, figura esdrúxula, cujo titular responde administrativamente à reitoria e funcionalmente à CGU (Controladoria Geral da República). Trocaram a gestão pelo espírito policial. Some-se o punitivismo de juízes emulando Sérgios Moros, procuradores imitando a Lava Jato e delegados da PF sendo delegados da PF, e se terá a síntese da tragédia atual e das que ainda estão por ocorrer.

O corregedor policial
A figura central da tragédia da UFSC é o corregedor Rodolfo Hickel do Prado.

Foi Hickel quem solicitou o afastamento do reitor, que encaminhou as denúncias à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal e, segundo rumores que correm por lá, instruiu uma professora a gravar uma conversa com o reitor.

Figura estranha à Universidade, Hickel assumiu o cargo no ano passado, indicado pela reitora que saía. Imediatamente tratou de se transformar em um poder autônomo, colocando-se acima da reitoria e das demais instâncias administrativas, um comportamento que refletia, no microcosmo da Universidade, o clima persecutório que tomou conta do país, e o poder apropriado pelos cabeças-de-porta-de-cadeia ganhando um status até então inimaginável.

Alguns conflitos com o Centro Acadêmico do Centro Tecnológico da Universidade deixaram claro esse comportamento de Hickel.

Houve dois episódios iniciais envolvendo estudantes.

Um, mais grave, foi de uma aluna que falsificou provas. Abriu-se um processo administrativo, que é julgado pelo colegiado do curso. A aluna foi suspensa por oito meses.

O segundo incidente foi uma cola, uma molecagem de um estudante, já reprovado, que copiou parcialmente o trabalho de um colega. O caso também foi apreciado pelo colegiado e o aluno punido com 30 dias de suspensão.

O Centro Acadêmico reagiu, julgando a segunda punição por demais severa e  entrou com recurso e o caso foi para o Conselho da Unidade, espécie de 2a instância. Houve um parecer mantendo a punição.

A reação do corregedor foi típica de um perfil psicológico já estudado: se não punir exemplarmente o aluno, hoje é a cola, amanhã estará roubando e traficando.

No dia 16 de outubro, o CA da Produção publicou nota do Facebook onde dizia não concordar com o parecer. Na nota, apontavam denúncias de alunas sobre assédio sexual na sala de aula.

Quatro dias depois, os alunos receberam ofício do Chefe de Departamento solicitando que fossem apresentados nomes. Os alunos suspeitaram que havia intenção de abafar o escândalo. Como estava em fim de ano letivo, as alunas não queriam deflagrar nada antes de encerrado o período.

Nesse ínterim, continuava em andamento o primeiro caso, da aluna que falsificou as notas.  No dia 1o de novembro estava agendada reunião com a aluna e o advogado, para acontecer na sala da professora presidente da Comissão, no Centro Tecnológico.

O local foi alterado a pedido do corregedor.

Terminada a reunião, o corregedor chegou até os alunos do CA e começou a ameaça-los explicitamente. Dizia que estavam espalhando calúnias contra os professores. Exigia nomes. Os alunos explicaram que as colegas estavam esperando terminar o semestre para avançar com as denúncias.

Na 6a feira, a presidente do CA recebeu SMS intimando-a a se apresentar na corregedoria. Presentes na sala, apenas ela e o corregedor. Foi pressionada de todos os modos para entregar nomes. A moça permaneceu firme na postura de só entregar após encerramento do ano letivo.

Na semana seguinte, começou o terremoto. Mais de 100 alunas passaram a receber intimações, no meio das aulas, para que se apresentassem na corregedoria. Algumas das intimações interromperam aulas com provas de cálculo, o terror dos politécnicos.

O critério adotado pelo corregedor foram os cliques na nota do Facebook. Todas as alunas que “curtiram” a nota foram intimadas e submetidas a métodos policialescos. Para uma das primeiras convocadas, Hickel informou haver denúncia de cola em sala de aula. A ameaça desestabilizou-a por inteiro. Ai o corregedor explicou que era brincadeira.

No total, foram intimados mais de 200 alunos, obrigando o CA a contratar um advogado para entrar na história. Criou-se um clima de terror amplo, com o entorno dos alunos entrando em pânico com as ameaças.

O advogado abriu denúncia no Comitê de Ética da Universidade, para fugir do cerco do corregedor. Era nítido para os alunos que sua intenção era abafar o caso e transformar os alunos em réus. No auge do terror, os alunos procuraram o reitor Cancellier. O reitor recebeu-os prontamente, ligou para o corregedor, que foi até à sala.

- Olha, Rodolfo, você não tem poder coercitivo. Se alguém não atender a essa chamada, você não terá nada a fazer.

O corregedor sentiu-se desautorizado. Depois, circularam pela Universidades queixas de diversas pessoas sobre os problemas criados recorrentemente pelo corregedor, que atropelava procedimentos e não seguia os ritos da Universidade.
Certa vez, por conta própria Hickel chegou a afastar um professor de suas atividades. O chefe de gabinete da reitoria precisou retificar a medida, que havia sido publicada no Diário Oficial.

Essa sucessão de episódios ampliou o fosso entre o corregedor e a reitoria.
Pouco depois, foi apresentada a denúncia ao MPF e à Polícia Federal. Ali, começava a ser montada a tragédia.

A delegada Erika Marena, personagem do filme sobre a Lava Jato, fez o pedido de prisão preventiva e, no momento em que ocorreu, toda a imprensa de Florianópolis já estava a postos. Como sempre ocorre nesses casos, o MPF foi a reboque. Sem acesso aos autos, o procurador da República André Bertuol endossou burocraticamente o pedido. E a juíza Janaína Cassol Machado aquiesceu com a gana de carnívoros famintos.

Como não havia celas na PF, os prisioneiros foram submetidos a um amplo ritual de humilhação. Despidos, colocados em uniformes de presidiários, algemados e transportados para o presídio estadual. Em geral, , em Florianópolis, apenas dois tipos de personagem tiveram tratamento similar: traficantes e um empresário que respondia a mais de 60 processos. O empresário conseguiu responder aos processos em liberdade.

Em todo caso, a delegada Erika, o procurador Bertuol, a juíza Janaína, o próprio corregedor Hickel são personagens menores. O grande personagem é o espírito punitivista desses tempos de cólera, e uma imprensa sensacionalista, totalmente dissociada de princípios civilizatórios básicos, que acabou conferindo a mentes perturbadas o poder inaudito de assassinar reputações.

A morte física do reitor foi apenas um acidente de percurso. E os protagonistas, não mais que de repente, perderam a atração pelos holofotes.

Do GGN